Soulmates Never Die escrita por Mychelle_Wilmot


Capítulo 4
Quarta Vez




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4.

No tempo em que permaneceu ao lado dos humanos, Spock sempre recebeu a impressão que eles pensavam que o trabalho de um embaixador era um trabalho entediante. O próprio Spock não podia discordar; ao se lembrar da infância e do trabalho de seu pai, ele não podia exatamente dizer que era uma profissão que fizesse a adrenalina de um corpo subir.

Então, Spock achava que de certa forma era irônico pensar na forma em que estava conduzindo sua vida profissional como embaixador; tentar ajudar no processo de unificação entre as culturas de Romulus e Vulcano já era um trabalho difícil, mas fazer isso às escondidas e, de certa forma, foragido, deixava ainda mais árduo o trabalho.

Jim estaria orgulhoso, Spock pensou divertido. No momento, estava em uma propriedade em Vulcano; não estava na casa de seu falecido pai, pois esperava evitar contato com a viúva de seu pai. Spock e Perrin nunca tiveram a melhor das relações, e não era agora, depois que Sarek morrera que a teriam.

Estar em Vulcano era um fato que causou alívio em Spock, pois dessa forma ele podia relaxar melhor e realmente meditar, e depois do que acontecera naquele dia, ele realmente precisava refletir muito.

Depois de tantas décadas, seu elo mental com Jim, bloqueado desde sua morte, voltou a ser sentido por preciosos minutos; não era a ligação forte que Jim e ele costumavam compartilhar, mas existia no fundo da mente de Spock.

“- Jim, eu confesso que, mesmo após tantos anos de convívio mútuo, ainda me encontro surpreso diante de certas atitudes suas. – disse Spock, de onde estava sentado na cama, observando Jim andar pelo quarto.

- É bom saber que eu ainda posso te surpreender. – disse Jim, sorrindo.

- Jim, não é um assunto para divertimento. Você está de férias, e mesmo assim, colocou sua vida em desnecessário risco novamente. Eu não entendo por que você insiste em... – Spock foi interrompido quando Jim se aproximou da cama e se sentou em seu colo, lhe calando com um beijo quase casto nos lábios, uma provocação.

- Spock, eu sempre irei tentar fazer a diferença se eu tiver a oportunidade, mesmo que não seja seguro. E, além disso – Jim sorriu mais amplamente, passando seus braços pelos ombros de Spock – foi divertido.”  

Spock piscou confuso diante da lembrança tão aleatória de tantos anos atrás, a presença do elo estranhamente viva. Porém, em um curto período de tempo após sua ligação ressurgir, ela cessou completamente, e aquilo não era nada parecido com o que Spock um dia sentira.

Quando Spock perdera Jim, ele achara que o bloqueio de aço, terrivelmente permanente era a única sensação da perda de um elo. Ele estava errado; se antes Spock sentia um bloqueio no elo que um dia compartilharia com Jim, ele agora sentia esse elo completamente quebrado, e precisou de todo o seu autocontrole para não sibilar de dor com a desagradável e inesperada sensação.

Abalado pelas fortes sensações, Spock resolveu que iria meditar o dobro do tempo que costumava dedicar diariamente a tal prática. Ele precisava tentar descobrir o que realmente acontecera, mas tinha uma estranha sensação de que suas respostas viriam de uma fonte externa.

X_X_X

Spock não estava surpreso quando, após algumas semanas após o estranho acontecimento com seu elo mental, encontrou capitão Picard na frente de sua porta.

“Embaixador, suponho que esteja surpreso em me encontrar aqui.”

- Não realmente, capitão. – Spock admitiu, vendo capitão Picard assumir uma expressão confusa.

“Então você já soube do que aconteceu com a Enterprise?”

Agora foi o turno de Spock de sentir-se surpreso, negando a pergunta feita pelo capitão Picard.

“Houve um... acidente. A Enterprise foi destruída.”

- Um acidente lamentável, sem dúvidas – Spock falou após alguns instantes – mas eu duvido que essa seja a última nave a carregar esse nome. Mas capitão, estou correto em assumir que esse não fora o único motivo que fizera com que você me procurasse?

“Você está correto, embaixador. Eu vim lhe contar o que aconteceu previamente aos eventos que destruíram a Enterprise. Apesar de algumas perdas, a nossa missão foi concluída. E eu não o teria conseguido sem a ajuda de um velho... amigo seu.”

Spock nem tentou esconder a expressão de surpresa que tomou sua face ao ouvir as palavras do capitão.

- De fato?

X_X_X

Por um longo tempo, sentado ao lado do capitão Picard, Spock ouvira o homem contar toda a narrativa que ele prometera lhe falar. Ouvira ele lhe contar em detalhes sobre o Nexus, sobre a insanidade de Soren, e que no final tudo terminara bem, graças à ajuda de Jim, que garantiu esse final com o preço de sua própria vida.

“Eu sei que não pode ser fácil saber que um amigo perdido há tanto tempo estava ainda vivo, e morreu antes de você poder encontrá-lo novamente. Mas ele mencionou seu nome, e a amizade de vocês é tão conhecida na história como vocês dois, então achei apenas justo eu lhe trazer essa informação, embaixador.”

As palavras do capitão da Enterprise chegaram perto demais do verdadeiro sentimento de Spock; ele estava ainda em choque e não começara a analisar a situação completamente, mas a ideia de que Jim ainda estava vivo após tantas décadas e Spock o perdera novamente antes de ter a oportunidade de recuperá-lo já começava a afetar sua mente.

- Eu... agradeço, capitão. – disse Spock, sinceramente; ele nutria um profundo respeito pelo homem, mesmo antes de realmente conhecê-lo, quando só o conhecia por capitão da Enterprise e como o homem que estabelecera um elo mental com seu pai – Confesso que a sensação realmente não é agradável, mas eu agradeço por você ter se comunicado pessoalmente comigo.

Capitão Picard assentiu, solenemente.

“Ele era um herói.”

- Isso ele era. – Spock concordou, tristemente.

Essas palavras lhe lembraram das palavras que Dr. McCoy havia lhe dito na vez em que pensaram que Jim havia morrido no encontro com os tholianos; uma irracional, pequena parte de Spock queria que novamente um engano houvesse acontecido, mas sua razão logo eliminava a possibilidade; dessa vez, havia um corpo.

Capitão Picard logo fez suas desculpas, pois precisava partir, o que Spock, é claro, sabia, e até lhe deixava aliviado; ele estava com uma ilógica e irresistível vontade de estar sozinho.

Picard já havia se virado e começara a sair andando, mas pareceu mudar de ideia e voltou, dizendo algumas últimas palavras a Spock:

“Eu não sei o que isso significa para você embaixador, mas antes de morrer, ele estava feliz de poder ter feito a diferença uma última vez. Suas últimas palavras foram ‘foi... divertido’.”

Spock olhou para Picard com inegável surpresa, imediatamente conectando essas palavras com a aleatória lembrança que ele tivera no dia em que sentira o elo novamente vivo.

- Significa muito, Picard. Obrigado. – disse Spock, por uma vez escolhendo não questionar o hábito humano de gratidão. Picard assentiu e lhe fez o ta'al, que Spock retribuiu, e então saíra de vez, deixando Spock só com seus pensamentos.

Spock sentou-se em sua casa em uma pose de meditação, mas seus pensamentos estavam agitados demais para ele contemplar a possibilidade.

Cuidadosamente, Spock pensou em tudo que capitão Picard lhe dissera. Jim não havia realmente morrido quando houve o acidente com a Enterprise, tantos anos atrás; ele estivera preso em Nexus, um local onde tempo não tinha significado algum. Segundo Picard lhe dissera, ele estava exatamente igual ao que estava quando o acidente ocorrera. Mas agora que Spock sabia de tudo isso, Jim estava, dessa vez, irrevogavelmente morto.

Os velhos sentimentos de profunda tristeza, luto, impotência por não ter tido uma oportunidade, sequer virtualmente, de salvar a vida de seu t’hy’la pela última vez retornaram com força para Spock. O pensamento de quantos anos solitários, perdidos e que nunca mais poderiam ser recuperados também.

Spock pensou nas últimas palavras que Picard lhe confiara, refletindo sobre o significado delas. Ao que tudo lhe parecia, Jim fora capaz de lhe enviar uma última lembrança através de sua perdida conexão, suas últimas palavras antes de morrer.

Foi divertido.

Para Spock, lhe parecia que Jim falara de sua vida em um aspecto geral, que apesar de ter tido momentos amargos e lamentáveis, tivera momentos preciosos.

Spock lembrou-se de uma memória, há muitos anos atrás, sobre o que refletira:

“- Sabe, Spock, não importa se eu estiver com trinta, cinquenta ou setenta anos de idade; perder pessoas sobre o meu comando nunca será fácil. – disse Jim, em tom cansado,sentado em um pequeno divã que havia em seus aposentos.

- Ashayam, eu entendo que perder vidas durante uma missão nunca será algo agradável ou perfeitamente aceitável, mas você precisa compreender que não havia nada que você pudesse ter feito para salvá-los. – disse Spock, sentando-se ao seu lado no pequeno divã.

- Após tantos anos em comando eu entendo isso, Spock, mas isso não torna mais fácil para eu aceitar emocionalmente. Serão momentos negros que sempre mancharão minha vida. – disse Jim, com um suspiro.

- Pelas minhas observações sobre a vida humana e a vida em uma concepção geral, eu sempre notei que há um equilíbrio entre momentos considerados ruins e momentos considerados bons. Você precisa apenas balancear melhor esses dois extremos, Jim. – disse Spock, suavemente.

- Ah, é claro que eu tenho meus bons momentos – disse Jim, sorrindo em sua direção – E eu não trocaria eles por nada. Todos os momentos em que passei com você – Spock tomou delicadamente a mão de Jim e apertou-a – e com todos os que significam algo para mim, toda a minha experiência... apesar de eu ter as minhas dúvidas, acho que minha vida vale e valeu a pena. Acho que... foi divertido.

- Meus pensamentos são similares aos seus neste assunto – disse Spock, soltando a mão de Jim para passar um braço por sua cintura, selando seus lábios juntos e fazendo logo com que outros pensamentos fossem esquecidos.

Uma parte de Spock se sentia feliz com fato de que Jim morrera em paz, sentindo-se bem com a sua vida; não queria que Jim terminasse sua vida sofrendo. Mas a outra parte estava em profundo luto; luto por anos perdidos, por momentos perdidos, luto por uma vida que nunca retornaria.

Spock nunca se dera ao luxo humano de chorar, sua única lembrança clara com tal experiência sendo quando estava infectado com o vírus que infectou a muitos a bordo da Enterprise, no primeiro ano de sua missão com Jim como capitão, mas dessa vez ele não tentou deter a lágrima que começou a escorregar por sua bochecha.

Jim estava completamente perdido para esse mundo, mas Spock sabia que jamais esqueceria seu rosto, sua voz ou suas feições, mesmo que vivesse por mais cem anos.


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