Folhas De Outono escrita por Sheeranator Mafia


Capítulo 75
Onze dias




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/267862/chapter/75

Onze dias. Esse era o tempo que eu estava mofando nesse lugar. Sempre me davam água, já não poderia dizer o mesmo sobre comida. Me sentia fraca e a esperança que eu tinha com o basculante, diminuía junto com minhas forças. Era 10 de Janeiro. Pelo que me lembro, era aniversário de Camilla. Prometi dar um presente a ela antes disso, porque eu já deveria estar em Framlingham, mas nada seguiu o roteiro que imaginei, aliás, nunca segue. Eu não conseguia dormir por mais de três horas. Sempre acordava assustada, achando que algo poderia acontecer enquanto eu estivesse vivendo em meus sonhos.

Bati na porta do porão cinco vezes. Ninguém me atendeu, como esperado. Me sentei na escada e por lá esperei por vinte minutos ou mais. Quilômetro abriu a porta e esperou eu dizer alguma coisa.

“Hoje é aniversário de uma amiga, gostaria de saber se posso...” –Ele me interrompeu com seu “Não”.

Fiquei encarando ele, procurando alguma chantagem emocional para dizer.

“Você não tem amigos?” –Perguntei com um sorriso.

“Não.”

“Aposto que tem!”

“Não.”

“Não” era a única coisa que saia de sua boca. Sua expressão era séria, zangada. Nunca o vi sorrindo, mas ele sempre atendia meu chamado, como uma certa demora.

“Eu sou sua amiga.” –Eu disse.

Dessa vez, Quilômetro não disse “Não”. Aliás, eu ainda não sei seu nome, nunca o chamaram pelo nome. Sempre era “coisa”, “rapaz”, “você ai”. Parecia que apenas ele sabia seu nome. Ele sabe que eu o chamo de Quilômetro por ele ser imensamente alto, ou eu que era baixa demais, mas ele nunca esquentou e quando o chamei por Quilômetro, ele sempre olhou. Ele deveria estar fazendo alguma troca de favor para Luiz, porque ele não parecia como os outros que lá moravam. Quilômetro aparentava ter vinte e sete anos ou um pouco mais. Magro, forte e negro. Quando ele segurava meu braço, o contraste de nossas cores se tornava muito forte.

“Deixa eu ligar, por favor.” –Insisti.

“Isso é com Luiz.” –Disse Quilômetro com sua voz um pouco grossa.

“LUIZ!” –Gritei.

“O que está fazendo?” –Quilômetro perguntou.

“Chamando ele, como você disse.” –Eu disse sorrindo.

Eu me assustava com minha calma. As vezes eu achava que tinha a mente de um psicopata cauteloso, que apenas repara ao seu redor e ataca quando menos esperam. Eu gostava de pensar assim. Estou vivendo em um filme e no final tudo vai dá certo.

Luiz finalmente chegou ao porão. Ele estava com uma calça jeans e uma blusa de meia manga preta. Que vontade de chamá-lo de seu madruga. Mas me contive.

“O que você quer?” –Ele perguntou.

“Ligar para uma amiga.” –Respondi.

“Ah, claro. Pode ligar.” –Ele disse.

“Mesmo?” –Perguntei feliz.

“Claro que não! Não sou esse tipo de idiota.” –Ele disse.

“Esse tipo de idiota? Então você é outro tipo de idiota?” –Perguntei.

Luiz parecia ter pensado no que ele mesmo havia dito e nada me respondeu.

“Pra que quer ligar?” –Ele perguntou.

“Hoje é aniversário dela.” –Respondi.

Luiz deu um leve sorriso, que por sinal, não me agradava muito.

“Por acaso essa garota é a Camilla?” –Ele perguntou.

Afirmei com a cabeça e ele parou de sorrir. Luiz fez um sinal para que Quilômetro fechasse a porta, o que ele fez. Fiquei encarando a porta fechada e acho que aquilo foi um “Não”. Desci as escadas. Um forte sol entrava pela janela e eu simplesmente estava derretendo. Meu celular ainda estava no buraco da parede. Tentei ligá-lo inúmeras vezes, mas nada adiantava. Tirei minha blusa e fiquei só de sutiã. Ainda era a mesma roupa do ano novo. Eu nunca suei tanto em minha vida. Eu me abanava com a minha blusa e não fazia muita diferença. Qualquer ameaça de porta abrindo, eu rapidamente vestia minha blusa. Ao contrário do que imaginei que fosse acontecer, eles não estavam mais me tratando mal. Apenas me deixavam ali, mas não me exploravam ou batiam em mim ou coisa pior. Pelo menos, não ainda.

Já era quase noite e Cristina entrou no porão. Eu havia comentado que ainda não haviam me explorado. Eu me enganei. Ela entrou com uma vassoura em sua mão esquerda e um balde na direita. Aguardei que ela chegasse perto de mim.

“Yolanda, teremos uma visita mais tarde, me ajude a arrumar a casa.” –Ela disse.

Bom, Cristina havia utilizado a palavra “ajude”, o que me fazia acreditar que ela também arrumaria a casa comigo. Pensei errado. Eu que tive que varrer e esfregar o chão. Passar um pano nas janelas, mesas. Até o banheiro eu tive que lavar e parecia que nunca haviam lavado aquilo antes. Todo lugar que limpei, Quilômetro estava atrás de mim, me observando com seus braços cruzados ou então com suas mãos nos bolsos. Ele pouco falava, apenas dizia onde eu tinha esquecido de limpar. Na verdade, eu não tinha esquecido de lavar, achei que não perceberiam. Minha roupa estava toda molhada e mais suja do que já estava. Minhas mãos imundas e meu cabelo bagunçado. Enfim terminei de arrumar tudo. Demorei três horas ou mais. Me sentei no chão da sala e para minha surpresa, Quilômetro não me obrigou a ir para o porão. Eu não sabia onde Cristina estava e queria aproveitar sua ausência.

A porta da frente se abriu e era Luiz. Me levantei rapidamente. Ele entrou e ficou me olhando. A porta permanecera aberta e depois de alguns minutos, ele fez um sinal para que alguém entrasse. Pelo vidro da porta aberta, notei que era uma criança. Camilla. Seu rosto estava banhado por lágrimas e ela ainda estava vendada. Como eu havia chegado. Me movi para ir até ela, mas Quilômetro entrou na minha frente. Eu não conseguia mais ver nada e apenas ouvia Camilla chorar.

“Solte-a.” –Disse Luiz.

Quilômetro obedeceu e corri até Camilla. Tirei sua venda e ela arregalou os olhos ao me ver. Seu abraço foi tão apertado que a dor que eu sentia em meu corpo por causa da queda do buraco do ar condicionado, havia voltado. Olhei para Luiz, que ria.

“Por que a trouxe?” –Perguntei.

“Uma companhia para você.” –Ele disse.

“O que?” –Perguntei assustada. –“Ela vai ficar trancada aqui comigo?”

Luiz afirmou com a cabeça e Camilla havia parado de chorar, mas ainda me abraçava apertado. Quilômetro nos levou para o porão e lá nos trancou. Levei Camilla para o colchão e nos sentamos. Camilla voltou a chorar.

“Como aconteceu?” –Perguntei.

“Foi tão rápido.” –Ela disse enquanto chorava.

Passei a mão em sua cabeça e ela chorava cada vez mais. Não insisti mais em saber. A deixei desabafar com suas lágrimas. Agora além de mim, eu teria que cuidar de uma criança. Por um momento, eu tinha esquecido que era seu aniversário. Como eu queria desejar “Parabéns”, mas não era a hora certa para se fazer isso. Minutos depois, Camilla acabou pegando no sono. Talvez estivesse cansada de tanto chorar. A cobri com o fino lençol e fui me sentar em um degrau na escada. Eu olhava para a frágil criança ali, que esperava que eu a tirasse de lá e a ajudasse a voltar para o conforto de sua casa. Queria eu ter um plano, mas não tinha. “O basculante!”, pensei. Camilla era magra o suficiente para passar por lá com facilidade, mas eu não poderia simplesmente jogá-la por lá sem saber o que havia do outro lado e para onde ela conseguiria fugir. Poderia acabar caindo na mesma emboscada que eu. Eu me importava muito com ela, como se ela fosse minha irmã.

Horas depois, Camilla acordou. Eu ainda estava sentada na escada, com a cabeça encostada  na parede. Ela se sentou, coçou os olhos e olhou ao seu redor. Tentando se lembrar onde estava. Ela me viu na escada e sorriu. Ainda com a cabeça encostada, sorri para ela.

“Um tal de Ed ligou para Mary semana passada.” –Ela disse.

Me levantei e fui até Camilla. Me sentei ao seu lado.

“Ed?” –Perguntei assustada.

“Sim. Mary não disse que você tinha sido sequestrada, disse que estava curtindo a praia.” –Ela disse amarrando seu cabelo.

“O que ele disse?” –Perguntei.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

FELIZ NATAL PARA VOCÊS! Tenham um lindo dia especial, amores.
Espero que tenham gostado desse capítulo e também espero que não parem de ler porque a vida com Teddy esta um pouco ausente.
Adoro vocês, Little Leaves.
eddictedhoran



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Folhas De Outono" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.