Destino escrita por Eve


Capítulo 6
Capítulo Seis


Notas iniciais do capítulo

Capítulo dedicado à AliceDiAngelo pela recomendação mais que perfeita. Juro que quase morri quando vi.



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VI

 

 

Atena foi acordada pelo barulho descomunal que tomava de conta do seu quarto. Revirou-se na cama e abriu os olhos com algum esforço, procurando a fonte daquela agitação. Sua irmã, com quem dividia o aposento, aparentemente estava tirando todos os seus pertences de lugar e tentando, sem sucesso, colocá-los em uma arca.

— Fique quieta, Ártemis. – Ela murmurou, ainda meio grogue.

— Ah, Atena, cale-se e se levante. Nós vamos para o feudo Ótris!

Essa notícia a fez despertar rapidamente.

— O que disse?

— Você ouviu. Seu baile de noivado é hoje, esqueceu? Nós viajaremos para lá agora pela manhã, e voltaremos amanhã durante a noite. Não está animada?

— Você nem imagina o quanto... – Ela murmurou sarcasticamente, mas levantou-se e deixou que as criadas preparassem um banho para ela. Foi até o armário, mas Ártemis a impediu, dizendo:

— Não, não. Tia Deméter já arrumou sua bagagem, e deixou separada a roupa que você usará na viagem.

Atena arqueou as sobrancelhas em sinal de descrença. Realmente, parecia que somente ela naquela casa não estava prestes a entrar em combustão espontânea de alegria pelo casamento. Era certo que agora ela não achava seu noivo tão detestável quanto pensara que ele seria, mas ainda assim... A palavra casamento não a deixava exatamente nas nuvens. Ignorando a resposta que pretendia dar à sua irmã, Atena seguiu para o quarto de banho, onde já havia uma criada à sua espera, juntamente com a grande banheira cheia de água fumegante. Atena deixou que a criada a despisse, mas depois a dispensou. Certamente ela ainda poderia tomar um banho sozinha. Demorou-se na banheira, a água quente a relaxando. Lavou as longas madeixas loiras cuidadosamente, ensaboou-se e passou alguns óleos aromáticos, e então saiu e se enrolou na toalha que a criada havia deixado em um banquinho à sua esquerda. Quando abriu a porta, a mesma criada já a esperava. Deixou que a ajudasse a se vestir, afinal, não era exatamente fácil amarrar um espartilho em si mesma.

A criada afastou-se por um momento, e quando voltou tinha em mãos um vestido roxo, de mangas compridas e justas, decote pequeno e quadrado e tecido grosso. Os botões eram dourados. Atena aprovou a escolha de tia Deméter, afinal com toda certeza ventaria muito durante a viagem. Quando a criada acabou de vesti-la, passou aos cuidados de seus cabelos. Penteou-os cuidadosamente, mas antes que pudesse fazer algo mais, Atena disse:

— Deixe-o solto. – Então a criada se retirou.

Atena a seguiu para fora do quarto, desceu a escadaria e caminhou para a parte sul do palácio, onde ficava a salão onde eles faziam as refeições. Quando ela chegou lá, todos já estavam sentados, servidos e conversando. Atena se constrangeu com o silêncio que se seguiu a sua presença, e ainda mais com o olhar que Poseidon lhe lançou. Murmurou um bom dia quase inaudível e sentou-se na ponta mais distante da mesa, mas não na cabeceira. Os criados a serviram o que ela sempre costumava comer nos desjejuns: uma taça de leite aquecido e adoçado com mel e uma fatia de torta de nozes, acompanhado de uma fatia de queijo. Atena comeu silenciosamente, e quando todos terminaram, Zeus falou:

— Reúnam-se nos jardins da frente, partiremos o quanto antes. – Assim, todos se levantaram e atravessaram o castelo rumo ao jardim norte. Atena via alguns criados carregando arcas e baús aqui e acolá, e ela foi a primeira a chegar aos jardins. Lá fora, já estava tudo pronto para a partida deles: Cavalos e carruagens preparados para viagens, carroças transportando as bagagens, e criados correndo de um lado para o outro finalizando pequenos pendentes. Um desses criados conduziu Atena, Ártemis, Hebe e Perséfone para uma das carruagens, e a outra foi ocupada por Deméter, Hera e a pequena Héstia. Os homens iam a cavalo.

Atena foi a primeira a entrar no veículo, e logo sentou-se perto da janela. Durante toda a viagem, escutou as irmãs e as primas conversarem, mas se absteve de participar de qualquer que fosse o assunto. Ficou apenas observando a paisagem dos lugares onde passavam, e talvez tenha cochilado alguma parte do tempo. Mas estava muito bem acordada quando eles chegaram ao feudo Ótris. Ela ficou sem reação quando viu o aspecto daquele local. Da última vez que estivera ali, só havia conhecido o castelo, mas agora ela via os mansos servil e comunal*, e sua surpresa não poderia ser mais evidente. Era tudo muito malcuidado, apertado, e a população não parecia nem um pouco feliz. Sem falar que o feudo devia conter apenas um vilarejo, pois ela via poucas casas ali.

Então eles passaram pela ponte e chegaram ao manso senhorial*. A mudança era evidente. Tudo muito bem-cuidado, organizado e preservado. O castelo era tão imponente quanto ela se lembrava, todo feito em pedra escura, e media praticamente o dobro do palácio do Olimpo.

Atena imediatamente entendeu como era o governo do pai de Poseidon. Um tirano, ela pensou. Deixava a população em condições miseráveis de vida, e vivia no luxo absoluto. De repente Atena viu-se desejando que Poseidon não fosse como o pai.

De repente, as carruagens pararam e os criados vieram ajuda-las a descer. Eles estavam em frente ao castelo, e Apolo, Ares, Poseidon e Zeus já desciam dos seus cavalos. Uma aia levava a pequena Héstia no colo, pois aparentemente ela havia dormido durante a viagem. Hera e Deméter estavam sendo ajudadas a descer da carruagem por alguns criados, e outros levavam seus pertences para dentro.

Agora todos se reuniam em frente aos degraus, e Atena viu Lorde Cronos e sua esposa lá em cima esperando para recebê-los. Atena subiu os degraus calmamente ao lado de Hebe, mas quando chegou ao mesmo nível dos anfitriões, seu passo vacilou ao notar o olhar que Cronos lhe lançava, e hesitou em continuar se aproximando. O senhor de Ótris a encarava com uma expressão hostil, como se ela fosse uma mercadoria e ele estivesse avaliando seu valor, e imediatamente ela se deu conta de que sua presença ali, como um futuro membro daquela importante família, havia sido discutida e considerada longamente, e pela expressão do Lorde Valence, ainda não representava a certeza de uma boa decisão. Perguntou-se quanto ouro seu pai teria oferecido na forma de dote para que aceitassem uma bastarda entre eles. 

Ela nunca fora muito boa em esconder emoções negativas, e provavelmente estava corada pelo constrangimento de ser tão cruamente avaliada antes mesmo de uma apresentação formal, mas ainda se surpreendeu quando foi Poseidon Valence que aproximou-se, aparentemente notando seu desconforto, e pressionou uma mão reconfortante em seu ombro, buscando seus olhos e murmurando discretamente:

— Não é você o problema. Ele tende a ser desagradável com todos.

Sua surpresa aumentou ao descobrir que não conseguia formular uma resposta esperta para disfarçar seu súbito momento de vulnerabilidade, então apenas anuiu, e respirando fundo, seguiu Poseidon enquanto este encaminhava-se para cumprimentar seus pais.

Aqueles seriam, com toda certeza, os dois dias mais difíceis de sua vida.


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Notas finais do capítulo

[Pequena porém útil aula de história medieval:
*mansos servil, comunal e senhorial: basicamente, as divisões de um feudo (feudos, para quem não se lembra, eram grandes extensões de terras doadas pelo rei aos nobres em troca de fidelidade e apoio militar, e eram nessas terras que os senhores feudais construíam seus castelos e consequentemente se estabeleciam vilas, cidades, etc ao seu redor). O manso senhorial correspondia à metade das terras cultiváveis do feudo, e tudo que fosse lá produzido pertencia integralmente ao Lorde. O manso servil também pertencia legalmente ao senhor, mas era utilizado pelos servos para a produção de seu próprio sustento e também do pagamento dos diversos tributos que estes deviam ao senhor feudal e à Igreja. E o manso comunal, por fim, era a parte do feudo que poderia ser utilizada por todos, como bosques, pastos, etc.
Sempre bom manter esses conceitos em mente para entender melhor as descrições que apareceram ou ainda irão aparecer por aqui. Caso queiram explicação sobre algum outro conceito da vida medieval, é só avisar nos comentários que eu preparo mais notinhas.
Viu só, "Destino?" também é cultura :)]