Destino escrita por Eve


Capítulo 24
Capítulo Vinte e Quatro


Notas iniciais do capítulo

[Esse capítulo continua com o ponto de vista misto mesmo depois da revisão; não consegui encontrar uma maneira melhor de reescrever a cena sem bagunçar o resto da história.]



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XXIV

 

 

Atena pendurou o véu em um cabide e deixou as presilhas que havia retirado do cabelo sobre a penteadeira. Seus dedos foram rápidos em abrir os botões e desatar os laços de seu traje e logo ela estava confortável em sua camisola e debaixo das cobertas. O dia atarefado lhe deixara exausta, mas ainda assim sentia-se grata por finalmente ter algo em que se ocupar. Os dias podiam ser terrivelmente tediosos quando tudo o que precisava estava à sua disposição e ainda não tinha tantos deveres a cumprir. Ser uma Lady vinha com mais conforto e comodismo do que Atena estava acostumada.

Uma dor de cabeça discreta mas persistente a incomodava há algumas horas, mas Atena atribuía a perturbação às horas de leitura seguida e ao esforço de escrever na claridade parca do gabinete de Poseidon. Revirou-se na cama até encontrar uma posição confortável, e soube que não demoraria a cair no sono.

...

Acordou de repente, desorientada e dominada pelo mal-estar. Demorou alguns segundos até perceber que ainda não era dia e que não conseguia respirar. Seu peito estava apertado e suas vias aéreas pareciam queimar pela falta de ar, que também a deixava tonta. O leve incômodo que sentia há algumas horas se transformara numa dor de cabeça tão intensa que ela mal conseguia pensar, e foi com esforço que se levantou, provocando pontos escuros em sua vista. Caminhou trôpega e ofegante até o criado-mudo e tentou servir-se de um copo d'água para amainar a sensação de queimação na garganta cada vez que ela respirava com dificuldade pela boca, mas suas mãos estavam trêmulas e a simples tarefa acabou num acidente de jarro caído no chão e copo em pedaços aos seus pés.

Deu alguns passos para trás para evitar se machucar nos cacos de louça espatifada; o movimento brusco fez sua visão escurecer novamente e ela perdeu a pouca firmeza que ainda tinha. Dobrou-se sobre si mesma e foi ao chão com tanta facilidade que já estava desacordada quando seu corpo desabou com um estrondo.

...

Poseidon acordou com uma sensação estranha. Pensou ter ouvido algo se quebrar, mas não pôde ter certeza se estava sonhando ou não. Olhou ao redor e não havia nada de anormal em seu quarto. Estava prestes a se deitar novamente quando ouviu uma série de barulhos abafados, vindos do quarto de Atena. Prestou mais atenção e percebeu que se tratava de alguém tossindo, Atena no caso. Pensou se deveria ir até lá perguntar se estava tudo bem ou se ela preferiria não ser incomodada. Mas então ouviu um barulho alto de algo atingindo o chão com força, e sua hesitação foi prontamente deixada de lado enquanto ele se levantava e corria até a porta que dividia seus quartos.

Quando chegou à câmara de Atena, imediatamente procurou por algo estranho ou fora de lugar. E de fato havia: cacos de louça quebrada ao lado da cama, água espalhada pelo assoalho e o mais preocupante: Atena, caída no chão parecendo desacordada. Poseidon aproximou-se rapidamente e ajoelhou-se ao seu lado, avaliando como podia a situação. Ela parecia estar respirando muito fracamente, mas não estava machucada até onde conseguia ver. Hesitou só por um segundo antes de trazê-la para seu colo e então levantar-se, carregando Atena nos braços até seu quarto.

A colocou sobre a cama e então lembrou do que Deméter havia feito quando ela desmaiara no baile de noivado; imitou como podia as ações da mulher mais velha na ocasião, abrindo as janelas para que alguma brisa circulasse e erguendo as pernas de Atena com algumas almofadas sob elas para que permanecessem naquela posição. Em seguida se sentou ao seu lado e a observou por alguns segundos. Estava tomado pela preocupação e a sensação de impotência frente ao acontecimento o deixava angustiado.

— Atena? - Ele arriscou. Queria levantar-se e buscar ajuda, chamar Madge ou mandar trazer uma curandeira da cidade, mas não se sentia à vontade em deixá-la ali sozinha. Esperou mais alguns minutos e estava prestes a sair para buscar alguém quando ela respirou mais fundo, tossindo de leve em seguida.

— Atena? Atena, por favor, acorde. - Ele tentou erguê-la um pouco para facilitar sua respiração e o gesto pareceu funcionar, pois ela tossiu mais algumas vezes, inspirou profundamente e então abriu os olhos. Não havia quase nada de cinza neles, suas pupilas extremamente dilatadas.

Ela se retraiu um pouco e Poseidon rapidamente percebeu que estava invadindo completamente seu espaço pessoal. Delicadamente retirou os braços que estavam ao seu redor e a colocou de volta na cama, apoiada em seus travesseiros. Ele estava tão aliviado por Atena estar finalmente acordada que seria capaz de beijá-la bem ali mesmo. Foi necessário mais do que o usual de seu autocontrole para não fazê-lo.

...

Atena tentou encontrar uma posição confortável para repousar mas essa era uma tarefa difícil quando cada membro de seu corpo parecia pesar toneladas, sua cabeça doía e ainda não conseguia respirar direito. Poseidon lhe trouxe um copo d'água que ela aceitou prontamente, ansiosa por amainar o desconforto em sua garganta. Ele estava sentado na ponta mais distante da cama em absoluto silêncio desde que ela havia despertado, mas bastava olhar em seus olhos para conseguir enxergar quantas perguntas haviam ali. Atena adiou o momento em que teria de explicar o motivo de mais um desmaio; tomou outro gole demorado de sua taça e correu o olhar pelo cômodo em que estava. Poseidon por algum motivo a havia trazido para o quarto dele e era a primeira vez que ela ocupava aquela câmara, muito parecida com a sua em tudo, apenas com a ausência notável de um tear, penteadeira e outros itens considerados femininos.

A brisa gelada invadiu o quarto e Atena se arrepiou.

— Se importa de fechar as janelas? - Ela pediu, forçando sua voz ainda fraca.

Poseidon prontamente se levantou e fez o que ela pedia. Então ele permaneceu de pé, como se hesitasse sobre o que fazer em seguida.

— Pensei em mandar chamar alguém para examiná-la. - Foi o que ele disse por fim.

— Não é preciso. - Ela se apressou em dizer. - Esse tipo de crise não me é estranha, sei que não há nada que possa ser feito além de esperar. - Percebendo que ele estava prestes a perguntar sobre o motivo das crises não lhe serem raras, ela completou - Estou exausta, gostaria apenas de tentar dormir agora.

Poseidon hesitou visivelmente em seu ímpeto de contestar aquilo, e por fim cedeu. Foi então até sua mesa e trouxe a cadeira de lá para perto da cama. Atena franziu as sobrancelhas.

— Qual a utilidade disso no momento?

— Vou passar a noite a observando, caso sinto algum mal-estar novamente. - E a preocupação era evidente no seu tom sincero. A onda de gratidão que invadiu Atena lhe era rara e não soube o que fazer com ela.

— Não seja tolo. - Ela por fim conseguiu dizer. - Não vou permitir que fique a noite acordado, tampouco que durma numa cadeira. A cama é sua, afinal.

Poseidon demorou um momento para compreender o que ela havia falado. A última coisa que pensara que presenciaria naquela noite era sua relutante esposa voluntariamente sugerindo que compartilhassem a mesma cama. Teve que fazer algum esforço para não permitir que seus lábios se curvassem um pouco num sorriso.

Deu então a volta e ajeitou as cobertas para que se deitasse no outro lado da cama. Atena afastou-se um pouco para lhe dar mais espaço. Ele queria muito perguntar qual era o motivo de ela ser acometida por aquele tipo de síncope, mas ela estava claramente esgotada, ainda pálida e um tanto trêmula, então havia decidido não exigir explicações agora.

Poseidon se deitou, muito consciente de cada centímetro entre os dois e de cada espaço que ocupava no colchão. Atena mudou sua posição de meio recostada para deitada de lado, e os dois ficaram frente a frente. O pensamento nervoso de que nunca conseguiria dormir com ela o observando daquele modo o invadiu, mas depois de alguns segundos Atena acomodou-se mais confortavelmente e descansou as pálpebras, não mais abrindo seus olhos cor de cinza. Ele percebeu quando ela rapidamente dormiu, sua respiração ficando mais constante e relaxada.

Ele ainda permaneceu muitas horas acordado, num misto de preocupação pelo bem-estar da esposa e ânsia de aproveitar cada segundo daquela proximidade que parecia ilícita. Era a primeira vez que estavam tão próximos espontaneamente e sem sentimentos hostis entre os dois desde o casamento, e ele se repreendeu por ser tão vulnerável a isso. Queria esticar a mão e correr os dedos pela pele exposta dela. Queria abraçá-la e aliviar seu frio com o próprio calor. Queria ela, simplesmente, sem todas aquelas barreiras e hesitações. Atena o enfeitiçara completamente e sequer tinha consciência disso. Aparentemente havia chegado num ponto sem volta, e de qualquer maneira ele não tinha certeza se queria retornar.

 


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Notas finais do capítulo

[Como acabamos no ponto de vista dele, o próximo capítulo será dela]



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