Carmim escrita por TinaCriis


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Claro que tenho muito o que dizer sobre essa fanfic, mas as palavras realmente me escapam agora. Resumidamente, trata-se de uma ideia que surgiu em minha mente da necessidade de escrever algo com um personagem semelhante ao Hisoka. Sim, aquele que prestar atenção, verá detalhes referentes a ele e ao Joker, de Kuroshitsuji, dois personagens que adoro. Também queria algo que envolvesse o circo de alguma forma, pois estava vidrada nisso, mas nem acho que tenha conseguido. No mais, parte importante do enredo foi baseada nesta única imagem. Fanfic betada pela RainForest, minha primeira beta. Thanks for her!! Vou logo avisando que o primeiro parágrafo refere-se ao FIM da história. Sendo assim, é interessante retoá-lo ao final da leitura.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/265456/chapter/1

Mikhail apossou-se do guarda-chuva e deixou a suite, dirigindo-se ao hall e permitindo que a chuva o tomasse. Abriu o objeto sobre sua cabeça e o sangue ainda fresco escorreu da extremidade superior, unindo-se às gotas d’água cintilantes. A mistura tocou-lhe a face e delineou um pranto falso sobre o símbolo tatuado. Por instantes, o homem de personalidade bipolar imaginou que realmente desejava que aquelas lágrimas fossem verdadeiras, ou que aquela mulher pudesse entregar-se a ele mais uma vez. Vermelho. Sua cor favorita, pensou. Instigante, persuasiva, perigosa. A seda vermelha estava bem ali, à sua frente, oscilando sobre aquela silhueta abandonada na estrada escura, brilhando com as gotas de uma tempestade não convidada.
O guarda-chuva transparente parecia não ser suficiente para manter seco aquele corpo feminino. Quando se aproximou da moça, oferecendo-lhe uma carona, pôde ver o quanto os pés delicados estavam ensopados, molhados pela humidade que já começava a pingar do vestido carmim.

"O que houve?", indagou a voz masculina, revelando um timbre entorpecente.

"Roubaram meu carro, então seria de grande ajuda se me deixasse no Hotel Hugsdan, por favor".

De certo ela sabia o quão indelicado seria negar um auxílio como aquele, numa situação feito aquela. Mesmo receosa, pôde ouvir seu corpo satisfeito, seu coração acelerar-se de alívio. Aquele homem era uma figura estranha, mas um estranho fascinante.

Rosas. O cheiro de rosas impregnava as paredes do veículo, cada peça, cada estofado. Um ambiente deliciosamente convidativo. "É mesmo uma pena", a mulher pensou, "o hotel não ser tão longe daqui".

"Vejo que ainda está em posse de sua bolsa", ele diz, com o olhar ora nela, ora no balanço dos pára-brisas.

"Sim, por sorte. Fui roubada antes de deixar a empresa, quando apenas o carro ainda estava no estacionamento".

"E não avisou ninguém?".

Preocupação ou mera curiosidade? A mulher perguntava-se, mas aquela indagação realmente parecia inofensiva. Não era.

"Não consegui", respondeu simplesmente, não uma resposta muito cautelosa. "Apenas a seguradora".

Ouviu o som do motor desligando. O homem estacionara o carro em frente a um hotel desconhecido. Algo não tão longe do Hotel Hugsdan, mas certamente longe dos caminhos pelos quais estava acostumada a passar. A julgar pela fachada, era mesmo um cinco estrelas, mas nenhum deslumbre poderia distraí-la naquela noite.

"Desculpe, acho que não fui clara. O nome do hotel era-".

"Hugsdan", ele disse rápido. "Fica a quatro quadras daqui. Infelizmente, não é uma boa noite para dirigir, não acha?".

Ele se virou para ela, permitindo que as luzes da noite revelassem o ruivo de seus cabelos e o brilho de seus olhos esverdeados. E sorriu, um sorriso ameaçadoramente doce e gentil.

"Sendo assim, já vou indo. Obrigada, de toda forma".

Os dedos longos seguraram os dela, impedindo a mulher de abrir a porta e assim sumir mais uma vez nos delírios da noite.

"Ir? Por quê?".

Não era uma pergunta, ela sabia. Era um pedido, um pedido para que ela permanecesse ali, em sua companhia.

"Desculpe, mas não tenho condições de pagar um serviço como o desse hotel". Os olhos verdes delataram os pensamentos do homem. "O vestido é caro, sim, mas foi um presente".

Um "ah" foi a simples resposta do ruivo, que não parecia convencido. Manteve-se a impedir a passagem da mulher, investindo num timbre encantador. "Não é cavalheiro deixar uma dama à deriva num lugar feito esse. Sou o culpado por estar tão longe de casa a essa hora, então devo recompensá-la por isso".

Ela tentou desenvencilhar-se, mais uma vez. "Não, obrigada", disse, não para convencer a ele, mas a si. Aquele corpo perto do seu, aquele cheiro de rosas, os dedos quase libidinosos a lhe tocar, a voz estonteante... Estar na presença daquele homem era obviamente perigoso, mas um perigo delicioso.

"Empresto-lhe minha suite para que se seque e então pode descer à recepção, até que possa contatar alguém, ou como preferir".

A mulher não precisava dizer nada. Para ele, o silêncio era resposta suficiente, mas ela ainda gritava na própria mente "apenas isso, e nada mais".

O odor floral invadiu mais uma vez os sentidos dela quando o homem enlaçou-a, ambos sob o guarda-chuva que ela carregara mais cedo. Entraram no hotel sem serem surpreendidos por qualquer funcionário do local, mas surpreendendo a todos eles, que tentavam disfarçar o crescente interesse naquela cena. Alguns se arriscavam a cumprimentá-lo, sendo sempre recompensados com um sorriso de dentes perfeitos e um "Boa Noite" gentil. A cada passo que davam, a cada segundo que se passava na presença daquela figura, a mulher sentia apaixonar-se por cada detalhe daquele perigo, tentando desesperadamente abandonar a sua mente de qualquer desejo insano.

Já dentro do cômodo tão almejado (a suite cujo aroma era ainda mais deliciosamente convidativo), o homem sentiu-se livre para desfazer-se dos sapatos e do casaco e deitar-se despejadamente sobre a própria cama, cujos lençóis estavam meticulosamente ajeitados. Antes disso, indicou de forma clara o caminho para o banheiro, onde a moça poderia secar sua roupa em equipamentos próprios ou ainda adaptar-se a alguma das vestimentas do homem.

"Pode tomar um banho se quiser", ele sugeriu.

"Não é necessário", ela respondeu do banheiro. O som da água corrente no lavatório não abafava o seu torpor em presenciar tanto luxo, da mesma maneira que suas negativas não pareciam suficientemente verdadeiras. "Farei como disse e deixarei sua suite assim que possível. Não quero incomodar mais".

Ele ri, sádico. "Incomodar? A coisa mais perturbadora no quotidiano de um homem que vive sozinho é o silêncio. Sua presença é uma dádiva para mim".

O que responder? Não havia resposta satisfatória para aquilo. "Preciso sair logo daqui", a mulher disse para si, "Antes que não consiga mais".

"Posso perguntar seu nome?", ele quis saber.

"Se me disser o seu primeiro". Estava fugindo, fugindo de ter de dizer a verdade. Talvez o nome verdadeiro não fosse propício, talvez perguntar-lhe antes de responder-lhe fosse menos ameaçador.

"Mikhail Larionov¹. E o seu?".

"Desculpe, como?".

"Mikhail Larionov, é russo. E quanto a você?".

"Então é russo? Por isso os cabelos avermelhados?".

Uma risada leve. "E o que uma coisa tem a ver com a outra?".

"Ouvi dizer que há grande ocorrência de rutilismo no país".

"É verdade. De fato vim da Rússia, mais precisamente de Udmúrtia². Saberei seu nome ainda hoje?".

"Ah, desculpe. É Chiara Rossi". O nome verdadeiro, causa do torpor proveniente pelo nome tão perfeitamente esculpido feito o dele.

"Italiana?".

"Descendente, apenas. Nasci aqui mesmo, na América".

"Nasceu em que mês?".

Chiara deixou o banheiro enobrecido por mármore antes de responder, prostrando-se frente à cama de Mikhail e fitando os olhos esmeralda. "Isso já é demais", disse, cruzando os braços frente ao busto. "Não precisa saber tanto assim sobre mim".

"Não seja acanhada. Responda uma pergunta minha e pergunte algo a mim também. Vamos, é divertido".

Realmente era. Saber mais sobre ele, sobre aquele homem aparentemente tão enigmático e cujo sorriso quase a fazia desmaiar, parecia realmente cativante. Afinal, chegara até ali e um "Agosto" não seria ofensivo.

"Leão?".

"Meu signo? Sim".

"Leões... Adoro leões".

"É mesmo?".

"Sim. Era circense há pouco tempo e por isso tenho dois deles".

"Dois leões?", ela indagou sarcasticamente, pela primeira vez naquela noite. "Imaginei que o circo contemporâneo não tratasse mais de animais".

Ele junta as mãos para apoiar-se melhor sobre o colchão. O comentário de Chiara faz um sorriso adornar-lhe os lábios, um sorriso extremamente atraente.

"Não trata. Tê-los era apenas um fetiche meu".

"E onde eles estão agora?", ela quis saber. Intimamente repreendia-se por isso.

"Em casa, no Caribe".

"Não me parece um lugar apropriado para leões".

Mais um riso, e ela também ri. Os olhares que ambos trocavam eram cautelosos, mas transbordavam de desejo.

"E não é, mas leões de estimação não pensam nisso".

Ambos riram novamente, abaixando a cabeça e livrando os olhares um do outro.

"Bem, é hora de ir", ela começou a falar, um tanto desconcertada. "Obrigada por tudo, Mikhail, mas não precisa mais se preocupar comigo. Foi uma ótima noite".

Dirigiu-se até a porta, apossando-se da maçaneta, a bolsa já em mãos. Trancada. O coração bateu forte, querendo escapar pela boca, um calor inexplicável a lhe percorrer a espinha. Estava presa naquela roleta russa, era seu fim.

Mikhail aproximou-se por trás, mais uma vez enlaçando a silhueta feminina, mais uma vez tocando aquelas mãos frágeis. "Desculpe, eu sempre fecho. Ah, mas onde será que está a chave?", brincou, virando a palma de Chiara para cima e revelando que ali estava o pequeno instrumento. Chiara olhou para ele, confusa. Sentiu que os lábios provocantes dele quase tomaram os seus.

"Sou um ilusionista", ele disse, fitando fundo os olhos castanhos da moça. Sua boca aproximou-se do ouvido dela, cochichando. "Não quer ficar e ver um pouco de mágica?".

Chiara ainda tentou escapar, indagando tardiamente sobre a estrela tatuada em sua face. “É por causa do circo?”, quis saber, e acrescentou: “Não devia ser vermelha. Está próxima demais dos cabelos”.

O ruivo aproveitou que a mão feminina estava sob posse da sua e levou-a até o “pentagrama de fogo”, como revelou preferir chamá-lo. Por instantes, a mulher sentiu seus dedos queimarem. Que deleite pecaminoso era tocar aquela face.

“É que o vermelho me fascina. Aliás, você está vestindo vermelho hoje”.

Chiara engoliu em seco. “Acho que se esqueceu de levar um dos leões ao Caribe”, pensou em voz alta, divertindo o russo. A chave do quarto caiu no chão, sendo esquecida por ambos quando os lábios de Chiara finalmente completaram-se nos dele. O corpo sinuoso foi rapidamente tomado pelas mãos ágeis do ilusionista, que instigaram uma das pernas femininas a laçar o quadril de Mikhail. As mãos dela perdendo-se no ruivo dele, as mãos dele perdendo-se nas ondas dela.

Chiara não pôde ver de que maneira, mas as luzes à sua volta foram apagadas e substituídas por uma penumbra quase mística, que parecia surgir ora das paredes do cômodo, ora de uma lua que provavelmente brilharia lá fora.

Quando Mikhail deitou o corpo delicado sobre os lençóis, ela sentiu uma maciez quase indescritível tocar-lhe a pele das costas, algo que se assemelhava a pétalas de rosas. Lembrou-se do perfume do carro, o mesmo perfume do casaco dele, e confirmou que o cheiro que provinha do pescoço daquele homem era igualmente extasiante.

Os corpos de ambos permaneceram ali, entretecendo-se um no do outro, pelo restante da noite chuvosa. A chave ainda no chão, quase ultrapassando a porta, e o guarda-chuva próximo à cabeceira da cama dele, sem motivo algum.

Ao iniciar da madrugada, Mikhail tinha o corpo feminino sobre o seu, experimentando o toque cálido do busto nu, enquanto Chiara deitara a cabeça no tórax delineado, provavelmente devido às peripécias do russo no ambiente artístico. Os dedos longos do ilusionista brincavam com os cabelos dela.

“Chiara Rossi”, ele proferiu, como em um ritual. “Ao menos é seu nome verdadeiro?”.

“Uhum”, foi a simples resposta.

Caso Chiara estivesse a olhar para Mikhail, veria em seus olhos verdes um puro vazio, que fitava a chuva da madrugada com insatisfação. O homem tinha os cabelos ruivos desalinhados e já não parecia mais triunfar sobre sua conquista. Ganhara uma noite realmente voluptuosa, mas perdera ainda mais para aquela mulher. Perdera os sentidos, a razão... Mas não admitia perder o jogo. Ainda tinha cartas na manga e não se incomodava em usá-las.

Virou-se para o guarda-chuva que repousava ao lado. “Guarda-chuva bonito”, comentou desanimadamente.

“Bonito?”, ela disse, sem mover-se. “E o que há de interessante em um guarda-chuva transparente?”.

“É o vazio, minha querida Chiara, o vazio transborda”.

Chiara não entendeu, ao menos teve tempo para isso. Habilmente, o ilusionista fincou a ponta afiada do guarda-chuva sobre seu peito, tirando aos poucos consciência e vida da mulher. Ela ainda pôde ouvir, enquanto arranhava a pele do russo, como um eco em sua mente:

“Compreenda-me, eu tentei evitar isso. Não era minha intenção apaixonar-me por você”.

Mikhail voltou-se para ela, levantando a cabeça morta e tomando sua boca uma última vez. Sangravam. As cartas em suas mãos, a boca sobre seus lábios, o corpo no seu. Tudo simplesmente desfazia-se em carmim, o que não o perturbava. Era um sádico, um ilusionista, e nada mais além disso.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

¹ Larionov: nome de um famoso ilusionista russo, usado aqui propositalmente.
² Udmúrtia: região da Rússia onde há grande ocorrência de rutilismo, ou seja, de pessoas naturalmente ruivas



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Carmim" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.