Capítulo VI

Labirinto

Já reunidos no quarto de Alex, cada um com uma das peças na mão, começamos a discutir sobre onde estaria o 8º portão, já que teríamos de abri-lo.

- Abaixo do chão. – Disse Giulia, como se fosse óbvio.

- Claro! Vamos cavar até o núcleo da Terra! – Ironizou Jimmy, o que não agradou Giulia. Eles estavam em um... “rolo”. Beetee me disse que eles iriam começar a namorar, logo que saíssem do Circuito. Eu sorri, estava torcendo para que algo de bom acontecesse caso algum de nós não fosse o vencedor.

- Acho que está ficando tarde... Talvez amanhã eles deem alguma pista, mas temos que dormir. – E olhando para o relógio me surpreendi – Já é quase meia noite! Vou para o meu quarto, se descobrir alguma coisa, venho avisá-los. Antes disso Beetee me puxou para um canto e sussurrou junto ao meu ouvido.

- Quando sairmos daqui, não quero perder sua amizade, seja qualquer um o vencedor. – Sorri e assenti.

Voltei para o meu quarto e me joguei na cama, com o pedaço de metal na mão comecei a girá-lo e pensar no enigma: “Separe as chaves para abrir o 8º portão”... Nesse momento derrubei o metal no chão e suspirei.

Deitei-me na cama e pendurei minha cabeça para a beirada, esticando o braço “Como ele podia ter ido para baixo da cama?”, pensei. Olhei para baixo e quando estiquei o braço para puxá-lo percebi que estava grudado em algo metálico, um imã.

Levantei-me e engatinhei no chão, colocando a cabeça para de baixo da cama e analisando a superfície. Era metálica, sem dúvida alguma, tinha alguns desenhos encravados, mas que por conta da cama e da escuridão do quarto não conseguia enxergar. Resolvi deixar para o dia seguinte, assim poderia chamar Beetee, Alex, Giulia e Jimmy para ver do que se tratava e tiraria a dúvida de uma vez por todas.

Tomei banho, me troquei, assisti a um filme, mas nada me tirava aquela placa metálica da mente. Deitei-me e me cobri até o nariz, tinha que dormir para acordar bem disposta na manhã seguinte. Rolei, girei, fiz tudo que era possível, mas o sono não vinha. Decidi usar um método infalível e antiguíssimo: relaxar pouco a pouco. Minha avó sempre fazia isso quando eu não conseguia dormir, ela passava a mão pelo meu pé e ficava falando: “Seus dedinhos estão começando a dormir”, então ela ia subindo e parava as mãos nos meus joelhos, mas sua voz continuava “Seus bracinhos estão dormindo, sua barriguinha está dormindo” e assim eu pegava no sono.

****

Eu corria, mas não adiantava. Ele sempre estava a minha frente. Corria mais rápido que eu. Eu suava feito um porco, mas não conseguia ultrapassá-lo, o corredor começou a ficar cada vez mais apertado, até que chegou um ponto onde tínhamos que engatinhar. Até engatinhando o desgraçado era mais rápido que eu!

Quando vi o espaço já se abria para o ar livre, e ele já passava pela faixa de chegada. Sentei-me sobre os calcanhares ali mesmo e comecei a chorar. Tanto trabalho para nada!

Alex olhou para mim e sorriu malicioso, como se dissesse: “Você achou mesmo que tinha chances?”

Então eu comecei a cair, e acordei.

****

Acordei ofegante, ainda estava escuro, provavelmente três ou quatro da manhã. Sentei-me na cama, e se aquilo fosse um aviso? Eu achei a entrada para o 9º portão, não achei? Não merecia o mérito? Algum de nós teria que vencer, então que fosse eu.

Levantei da cama e me dirigi ao armário, peguei uma mochila bem grande e coloquei comida, lanternas, eletrônicos e baterias. Não me esqueci da água e de tomar mais um banho e colocar a roupa oferecida pelo Governo no primeiro portão. Olhei-me no espelho, dessa vez achei necessário me maquiar, ao menos um pouco. Não sei por que, mas tive a sensação de que seria bom pelo menos parecer apresentável enquanto estivesse correndo. Fui ao banheiro e passei o lápis branco, para entrar em contraste com minha pele e destacar a cor dos meus olhos, e esfumacei a sombra verde como minha avó havia me ensinado.

Quando dei conta de que meus olhos estavam bem marcados amarrei meu cabelo em um rabo de cavalo alto, para que não me distraísse e prendi num coque frouxo, quando sentisse necessidade iria soltá-lo.

Peguei a mochila e coloquei mais algumas coisas então mandei uma mensagem para o meu irmão, já que não sabia se teria sinal embaixo da terra dizendo que havia achado o 8º portão e estava passando para o 9º, codifiquei-a para que não fosse interceptada por algum espertinho que estivesse postando em seu blog tudo sobre o Circuito, mas também mandei um e-mail a alguns de meus blogs favoritos, como o survivors.com.faa, dizendo que estava passando pelo 8º portão e que iria completar o 9º em breve, sendo assim a mais próxima do final. Programei para que os e-mails só fossem entregues as 8 da manhã, mas que mostrassem a hora em que foram escritos, também programei uma postagem em um blog que havia criado a algum tempo atrás, mas que depois que entrei para o Circuito estava com o contador de visitas estourando.

Peguei uma das lanternas, arrastei a cama para o lado, torcendo para não estar fazendo muito barulho e apontei a luz para onde tinha visto o metal, ali estava. Uma placa de metal grudada no chão tinha em sua superfície o desenho de um 8, onde, no centro, podia se ver um furo. Puxei com força a “chave” e ela se desgrudou, com calma e dificuldade encaixei-a no buraco. Suspirei e pela parte torta do metal girei a placa. O rangido foi audível, mas não muito alto. Quando a superfície se virou 90º, formando o símbolo do infinito a porta se deslocou para cima com um som baixo. Abri com um pouco de força e pude ver uma escada inclinada que descia até tão fundo que era impossível de se enxergar.

Apontei a lanterna para o fundo e suspirei, tarde de mais para desistir.

****

Antes de descer tomei algumas precauções, tranquei a porta e prendi várias cadeiras para fazer com que ninguém entrasse e arrastei a cama de volta ao lugar. Arrumei os cobertores como se ninguém tivesse sequer dormido ali, deixei a janela aberta, para dar a impressão de que eu tinha pulado dali e organizei tudo nas prateleiras como se não tivesse pegado nada. No banheiro, fiz uma faxina geral e o resto do quarto deixei como havia encontrado quando entrei lá pela primeira vez.

Na hora de entrar pela porta tive que fazer algumas coisas que nem mesmo sabia que era possível se fazer tendo ossos no corpo, para abrir a tampa do buraco, principalmente.

Quando finalmente consegui passar para dentro do próximo desafio fechei a porta e, com a mochila nas costas e as pálpebras pesando, fui descendo o mais rápido que pude.

Quanto mais descia, mais largo parecia ser o túnel, já que antes eu podia sentir a mochila raspando no metal e depois de algumas horas de descida mal consegui tocar meus dedos na parede. Então, quando mesmo se me deitasse encostando a cabeça em um dos lados não iria tocar nem mesmo a ponta dos pés, o chão apareceu. Resolvi montar acampamento ali mesmo.

Peguei um saco de dormir e estiquei-o sobre o chão, arrumei a mochila como travesseiro e coloquei um dos eletrônicos que tinha levado para despertar dali a três horas, quando seriam entregues todos os e-mails, a postagem seria feita e a mensagem ao meu irmão, provavelmente, respondida.

Logo que deitei já peguei no sono, dessa vez sem sonhos ou pesadelos.

****

Quando acordei imediatamente peguei um dos micro-computadores que apitava no meu ouvido. Abri-o e logo minha caixa de e-mails estava apitando: Meu irmão havia mandado várias mensagens, assim como Beetee, Alex, Giulia e Jimmy. Os blogs para quem eu mandei os e-mails também haviam me respondido pedindo entrevistas e coisas do tipo.

Abri os do meu irmão primeiro, quase todos eram “me ligue” ou “me responda agora!”, mandei um para ele falando que poderíamos falar mais tarde. Os dos meus colegas de equipe resolvi deixar por último, seria difícil explicar porque tomei essa decisão. Abri os e-mails do survivors.com.faa, grande parte deles era assim:

De: Survivors – Sobrevivendo desde sempre!

Para: Deena Fraga

Assunto: RE: Passei pelo 8º Portão

Mensagem: Olá, Deena!

Todos da equipe Survivors lhe damos parabéns!

Estamos muito interessados em sua ajuda para nos dar informações sobre o que acontece aí dentro, espero que nos possa responder algumas perguntas.

Como foram os portões anteriores? Quais foram os desafios que vocês tiveram que passar?

Quem são os competidores mais fortes em sua opinião? Você acredita que tem chances de vencer?

Como foi que conseguiu ultrapassar todos, e ser a primeira a passar pelo 8º portão, tendo a pontuação mais alta na competição e vencido três portões em primeiro lugar?

Poderia nos dizer o que espera depois que sair da competição? Quais são seus planos e sonhos?

E fechando, gostaríamos de lhe fazer um convite, sendo os seus patrocinadores oficiais e, nessa reta final, termos total exclusividade quanto ao que acontece aí dentro.

Agradecemos desde já.

Mya Carter,

Presidente da Equipe Survivors

A única coisa que pude pensar foi: Nossa!

Eu sempre apreciei muito a Mya, que dedicava totalmente seu tempo ao blog, sempre tentei entrar em contato com ela, mas quem me respondia era sempre um de seus subordinados, dizendo que ela estava ocupada ou que era necessário ser parceiro do blog ou marcar uma hora para contatá-la.

Respondi com superioridade. É claro.

De: Deena Fraga

Para: Survivors

Assunto: RE: RE: Passei Pelo 8º Portão.

Mensagem: Olá, Mya.

Muito prazer em falar com você.

Infelizmente, o e-mail que mandei a você enviei a muitos outros blogs, você deve ter percebido.

Isso me pareceu uma entrevista, não “algumas perguntinhas” ;) .

Mas eu vou respondê-las, da maneira que puder, já que não sei se é permitido dar tantas informações.

Como foram os portões anteriores? Quais foram os desafios que vocês tiveram que passar?

R: Acho que você deve ter assistido as provas, mas se não sabe, então é porque não passaram elas totalmente. A primeira foi uma corrida com escalada, que foi permitido ao público que visse ao vivo. A segunda e a terceira foram feitas em sequência, a segunda foi resolver a caixa que Giulia ganhou, ela conseguiu abri-la e ali dentro encontramos um pedaço de papel com um enigma, que ao que tudo indicava, levava ao meu “presente”. Logo depois resolvemos o Quadrado Perfeito, e não foi o esperado, mesmo tendo sido os primeiros a resolver. Esses foram os primeiros três portões. O quarto foi a “Maratona”, como costumamos chamá-la aqui. Nela tivemos que resolver 5 enigmas na maior velocidade possível, onde Gabriela ganhou. O quinto portão foi feito em uma cabine, e era muito parecido com o último enigma do 4º. O 6º portão foi resolver o cubo mágico, que Alex havia ganhado. Logo depois resolvemos o Enigma do Palhaço (7º portão), que Jimmy tinha e então o Puzzle Metálico de Beetee (8º portão). O 9º portão ainda não foi resolvido, mas acredito que seja a mais próxima disso, sendo que ainda não tive notícias do paradeiros dos outros competidores.

Quem são os competidores mais fortes em sua opinião? Você acredita que tem chances de vencer?

R: Acredito que os da minha equipe, Alex, Beetee, Jimmy e Giulia além de Gabriela e Samantha.

Como foi que conseguiu ultrapassar todos, e ser a primeira a passar pelo 8º portão, tendo a pontuação mais alta na competição e vencido três portões em primeiro lugar?

R: Acredito que revelar onde se encontra o 8º portão ou mesmo falar como foi que conseguimos a dica não é muito sensato, mas posso confirmar que não foi fácil, e sim uma questão de sorte, no meu caso, muita sorte. Já que ele literalmente “grudou” em mim, feito um imã.

Poderia nos dizer o que espera depois que sair da competição? Quais são seus planos e sonhos?

R: Nossa, acho que o que mais espero é vencer. Só isso por enquanto, meu maior sempre foi participar da Legião, acho que nada seria melhor que isso.

E fechando, gostaríamos de lhe fazer um convite, sendo os seus patrocinadores oficiais e, nessa reta final, termos total exclusividade quanto ao que acontece aí dentro.

R: Aceito o convite, mas saibam que só poderei dar informações que eu tenha certeza que não causarão problemas junto ao Governo e também não irão ajudar os outros competidores.

Eu que agradeço, agora, vou demorar um pouco para responder aos seus e-mails, já que estou ainda dentro de uma competição onde tempo é a chave.

Abri os e-mails dos outros blogs, mas todos falavam a mesma coisa. Como meu blog favorito sempre foi e sempre será o Survivors, não dei atenção, somente falei coisas como: “Estou em uma parceria com o blog survivors.com.faa, se quiserem alguma informação, terão que entrar em contato com o blog e pedir permissão. Desculpe.”

Com coragem abri os e-mails dos meus parceiros, primeiro o de Beetee.

De: Beetee Santana

Para: Deena Fraga

Assunto: Oi!

Mensagem: Sabia que você ia conseguir! Eu tinha descoberto como abrir, mas quando cheguei no fim do 9º portão, não fazia a mínima ideia do que fazer! Tudo bem, você vai conseguir, só quero mesmo é que me mande um exemplar da Bíblia, dizem que era o livro mais conhecido no mundo há alguns séculos atrás, e eu só estava nessa competição por causa dela... Mas sei que se você vencer, vamos ter muito mais história para contar.

Sorri, era a cara de Beetee aquele e-mail, respondi carinhosamente agradecendo e dizendo que eu já tinha um exemplar da Bíblia e que se ela tivesse pedido eu iria dizer ao meu irmão que mandasse para o seu e-mail.

O próximo que escolhi foi de Giulia.

De: Giulia Serra

Para: Deena Fraga, Alex Ramiro, Jimmy Okoshi, Beetee Santana

Assunto: Aliança Desfeita.

Mensagem: Creio que agora chegou um ponto na competição onde não podemos mais nos ajudar. Deena já provou que não está mais dentro de uma equipe, e quero avisar que eu também não. Todos já sabíamos que isso aconteceria uma hora ou outra, melhor que tenha sido agora, já que não teremos assim motivo para ficarmos de mal. Aqui fica o meu e-mail para que continuemos em contato depois de sairmos daqui, seja quem for que vença.

Gostaria de dizer algo, quero muito que um de vocês vença.

O meu interesse principal na Legião era nos planos para o futuro, aqueles que o Governo esconde da população em geral, e se um de vocês vencer agradeceria se me dessem uma visão resumida desse conhecimento.

Beijos, sentirei muita saudade de vocês, tanto porque perdi. Estou fora da competição.

Eles mandaram mensagens individuais aos competidores que foram eliminados para manter o resto em confusão, mas eu já estou fora, o que eles poderiam fazer se eu contasse? Matar-me? Se bem que não duvido... Se isso acontecer, saibam que foi o Governo.

E estou em uma parceria com o blog Survivors.Com.Faa, se puderem fazer parceria com eles, estou cumprindo minha parte do acordo, haha.

Sorri, mesmo chorando. Giulia foi eliminada... Mandei um e-mail para ela, retirando o nome dos outros participantes me desculpando, dizendo que não foi minha intenção prejudicá-los, e que também estava em uma parceria com o Survivors, também disse que iria fazer de tudo para vencer e jurei que iria deixá-la a par de tudo se entrasse para a Legião.

Em seguida abri o de Jimmy, de quem eu também não tinha medo da resposta a minha ação inesperada.

De: Jimmy Okoshi

Para: Deena Fraga, Giulia Serra, Alex Ramiro, Beetee Santana

Assunto: RE: Aliança Desfeita

Mensagem: Belas palavra, Lia.

Tudo bem, Deena, o que você fez foi bem inteligente, nos dar uma rasteira, parabéns!

Não vou mentir, eu ri.

Estava apostando tudo que Alex seria o primeiro a fazer isso!

Nada contra você Alex, você é só meio esquisito, meio sombrio, chato, quieto, “emo”, babaca, posso dizer que é até mesmo um pouco morto... Mas eu não digo, porque gosto de você, gosto mesmo, você é um grande amigo!

Já que a Aliança está desfeita, Beetee, você é maluca.

Sério, garota, se interna... Eu não entendo uma palavra do que você diz (se é que alguém entende)...

E acho que só falta você, não é Lia?

Bem, você sabe o que eu penso de você, e saiba que não vou mudar nunca.

Ah, eu não vou falar coisas desse estilo na frente de todo mundo, mas tudo bem.

Deena, minhas últimas palavra são pra você: Você é o cara. Ou a mulher, tanto faz.

PS:. Também fui eliminado, fazer o que... Acho que quem está ainda na competição são Alex, Deena, Samantha, e o número 11, um cara de 23 anos. Grupinho estranho vocês, não?

Jimmy, Jimmy... Será que ele não muda nunca?

Respondi primeiro falando que não foi bem assim, que decidi do nada, não estava planejando dar “a rasteira” neles.

Agradeci, mesmo não sabendo se as últimas palavras dele eram um elogio ou não, e disse que sentia muito por ele ter sido eliminado, e agradeci pela informação de quem eram meus concorrentes.

Decidi que leria o e-mail de Alex depois, não estava com cabeça para responder mais alguém.

Voltei à minha caminhada por entre um labirinto de metal no subterrâneo, abaixo, ou no fundo do Rio Amazonas, onde a qualquer momento poderia esbarrar com um concorrente que daria a vida para vencer de mim.

Até eu fiquei com medo do resumo da competição, mas era a realidade, eu estava encurralada, de um lado a cruz, do outro a espada, e nem mesmo sabia de onde esse ditado foi inventado!