Chovia naquela melancólica tarde de domingo e a densa neblina, que cobria todo o Distrito 12, encaixava-se perfeitamente em toda a depressão que o lugar emanava. Em uma pequena casa na Costura quatro pessoas mantinham os olhos fixos na pequena televisão, incapazes de desviar o olhar, incapazes de respirar. Cada segundo se assemelha a uma lenta e dolorosa tortura e essas miseráveis pessoas, testemunhas escravas de desgraças brutais, eram condenadas a apenas observar.

As horas se arrastavam, perdendo-se na imensidão do tempo e o rapaz já não era mais capaz de suportar. Ele levanta-se abruptamente e caminha para fora da casa, ignorando a tempestade, cada vez mais forte, por completo. Mas apesar do gesto ser extremamente violento e repentino há apenas uma pessoa que o percebe verdadeiramente. As outras duas mulheres permanecem encarando a televisão estáticas, a bela garota loira, contudo, não pode ignorar o rapaz; não conseguiria nem se tentasse.

Ela, então, se levanta delicadamente do canto no qual permaneceu encolhida durante toda a tarde e segue para fora da pequena casa. A jovem o encontra não muito longe dali, encarando obstinadamente algumas árvores. Ela suspira cansada. A chuva a encharca, mas ela não se importa com a chuva, ela só se importa com ele...

_ Gale...? – ela chama delicadamente.

O jovem fecha os punhos irritado, mas permanece em silêncio. Passam-se minutos mudos nos quais o único som que se ouve é o dos trovões.

_ Gale...? – a loira chama novamente.

_ O que você quer Madge? – ele pergunta irritado, enquanto se vira para ela.

Ela hesita por um instante, o coração disparado em seu peito.

_ Você está bem? – pergunta enquanto encara o chão.

_ Ótimo. – ele diz seco.

Ela morde o lábio inferior, tentando se manter em silêncio, mas as palavras lhe escapam pela boca.

_ Você está assim por causa da Katniss e do Peeta, não é?

Gale estreita os olhos, a encarando com raiva e ela sente seu coração se contrair dolorosamente pelo repúdio que recebe do rapaz. Mas ela sabe que está certa, sabe que ele ama Katniss e que vê-la como um tributo dos malditos Jogos Vorazes lhe dói imensamente, mas vê-la nos braços de outro homem também o faz sangrar. Ela entende aquela dor.

_ Vá embora, Madge! – ele pede, tentando se controlar.

_ Não. – a loira diz em um ímpeto de coragem, enquanto caminha em direção a ele, diminuindo a distância que os separa a cada passo.

_ Vá Madge, eu não quero conversar com você.

_ Você a ama. – não é uma pergunta e saber disso machuca tanto que Madge se esforça para conter as lágrimas que já começam a se formar em seus olhos.

O rapaz fecha os olhos enquanto suspira.

_ Por favor... –ele pede.

_ Você ama a Katniss, Gale. Admita! – a garota insiste, eles estão muito próximos agora. – Você a ama e vê-la com outro te destrói por dentro. Vê-la com outro é como ser atingido por mil adagas...

Gale abre os olhos lentamente e Madge sente-se naufragar naquela imensidão cinzenta. A chuva frígida continua a cair sobre eles.

_ É,eu a amo! – ele admite e lágrimas gélidas e silenciosas começam a rolar pelo rosto da menina. - E dói sim se você quer saber.

_ Eu já sei. – ela diz. Um vazio cresce em seu coração.

_Não seja tola, você apenas acha que sabe. – ele diz se irritando e a garota sorri melancolicamente. Por que ele sempre menospreza seus sentimentos?

_ Infelizmente, eu sei, Gale. Eu sei como é amar alguém que nunca vai te pertencer, alguém que nem mesmo enxerga todos os seus sentimentos por ele. Eu sei como é ser condenada a permanecer sozinha, limitada a observar de longe o seu amado. – as lágrimas caem copiosas dos belos olhos azuis da jovem.

_ Madge... – ele não sabe o que dizer e mais uma vez o silêncio se instaura entre eles.

“Você me prendeu em toda essa confusão

Acho que nós podemos culpar a chuva

Minha dor é saber que eu não posso ter você”

_ Gale... – ela chama depois de alguns segundos e o rapaz a encara com má vontade. – Você me odeia?

A pergunta o pega de surpresa, não é como se ele odiasse a garota, ele apenas não sabe ao certo o que sente pela filha do prefeito.

_ Não. – ele responde confuso e um breve sorriso brinca nos lábios da menina.

_ Promete que não vai me odiar? – ela pergunta docemente.

_ Por que eu te odiaria? – Gale questiona confuso.

_ Promete, por favor... – ele percebe o desespero nos lindos olhos azuis da garota. E naquele momento ela parece tão frágil e inocente que ele se pergunta como pode ser sempre tão rude com aquela doce criaturinha.

_ Hum... eu prometo.

Ela sorri.

_ Então, me desculpe por isso.

Gale não tem nem a chance de questionar porque deveria perdoá-la, porque sendo tomada por uma coragem totalmente nova Madge se aproxima ainda mais do rapaz e sela delicadamente seus lábios aos dele.

Ele é pego de surpresa, no entanto, sentir os delicados lábios de Madge junto aos seus mexe com algo dentro de Gale. A tempestade parece se intensificar e as lágrimas da menina se misturam à chuva. Ela se sente totalmente entorpecida apenas por estar tocando o rapaz. Ele demora alguns segundos para se recuperar do choque inicial, os lábios ainda colados aos dela, mas contrariando o que a razão lhe diz, puxa a loira para mais perto de si, intensificando o beijo.O adorável perfume floral da menina o inebria e ela se sente em êxtase presa naquela beijo com que tanto sonhou.

Madge não quer que aquele momento acabe, não quer acordar daquele sonho e ter que encarar a realidade, porque ela sabe que no instante em que seus lábios se separarem Gale perceberá que aquilo é errado e que ele ama Katniss.

Aquilo é tão injusto. Por que Madge sabe que Katniss não o ama da forma como ela ama. Katniss não o olha da forma como ela olha e não tenta decifrar cada palavra dita por ele como ela faz. Katniss não sente toda a sua sanidade se esvair perto dele ou sonha com ele todas as noites. Ela não precisa dele muito mais do que de oxigênio ou o ama acima de tudo. Katniss simplesmente não sente todo esse amor dilacerante, indefinível e infinito que Madge sente por Gale. Ainda assim, é Katniss quem ele ama.

“Me diga, ela te olha do jeito que eu olho?

Tenta entender as palavras que você diz e o modo como você age?

Ela tem a mesma emoção, quando você a abraça

E tuas bochechas ficam vermelhas?”

E Madge sente que está enlouquecendo, porque é amor demais e dor demais para o seu frágil coração. Ela sente estar enlouquecendo, porque nunca se sentiu nada sequer parecido antes.

“Me diga, eu estou louca? Eu estou louca?”

E então a magia se acaba e o beijo chega ao fim. Madge tenta recuperar o fôlego, o coração batendo acelerado em seu peito. Gale a encara mudo incapaz de formular uma frase coerente. Mas a loira sabe que o sonho chegou ao fim, sabe que Gale sempre amará Katniss e isso destrói sua alma.

“Recupero meu fôlego, aquele que você levou

Meu coração, ele se quebra,

Só de pensar nela te abraçando”

_ Madge, isso... – Gale começa incerto.

Ela sorri.

_ Eu sei. Desculpe-me. – ela diz melancólica. – Nós podemos simplesmente ignorar e fingir que nada aconteceu. Nós podemos simplesmente culpar a chuva...

Ela estava certa, era culpa da chuva. Culpa daquela tempestade que havia dentro de si, daquele sentimento que atingira como um raio e que era mais forte que um furacão. Aquele beijo fora de fato fruto da chuva que caia insistentemente dentro de Madge, com suas lágrimas constantes e gélidas e seus soluços que escapavam como trovões no silêncio da madrugada. Era culpa da chuva...

_ É, talvez nós possamos simplesmente culpar a chuva. – Gale diz, ainda confuso, enquanto dá as costas para a menina.

E Madge permanece parada ali,sozinha, deixando que as lágrimas caiam e o temporal a encharque ainda mais. Ela permanece ali, devastada por dentro.

E é tudo culpa da chuva...

“Acho que nós podemos culpar a chuva

Minha dor é saber que eu não posso ter você.”