No More Mr. Nice Guy escrita por Hannah Arendt


Capítulo 2
02 - Reminding Myself




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Eu saí da barraca, a desarmei, e diferente de todos os outros, fui o ultimo a acordar, e o ultimo a juntar todas as minhas tralhas. Quando eu vi algo se mexer na floresta. Foi um corvo que cortou o céu, e sobrevoou minha cabeça como se eu fosse carniça.

Como se eu fosse carniça? Pensei. Você é carniça Daryl Dixon, você vive no meio dos mortos, come praticamente uma lavagem, mija no meio do mato e anda com um monte de idiotas sentimentais que passam por frustrações e dores extremamente desnecessários. Sim, você não passa de um monte de merda!

Era extremamente incomodo andar na garupa de Merle, me trazia memórias distantes, fúteis e infantis, a primeira delas foi do episódio onde Merle roubara uma garrafa de whisky do velho Kingsley, então tivemos de fugir com a primeira motocicleta que encontramos em frente ao bar.

“Os cabelos claros de Merle refletiram o sol, o cigarro em seus lábios, que acabara de ser aceso, deu uma guinada, apontado para baixo.

–Mamãe vai odiar se souber que está fumando, Merle.

–E eu vou odiar se você contar, maninho.

Merle era ironicamente baixo em seu porte temperamental. Ele pensava como uma vadia pretenciosa quando lhe convinha, disposto a sacrificar tudo e todos para qualquer uma das coisas bobas que ele queria, ele adorava chantagear as pessoas, principalmente com sua psicologia barata, herdada pelo meu pai e provinda de todos os Dixons. No resto do tempo, ele era simplesmente uma pedra, e realmente eu era o único que se importava com ele e sua personalidade de mesa de bar.

–Se segure princesa- ordenou Merle terminando a ligação direta e arrancando seu novo brinquedo.

Em breve, estávamos na fazenda dos nossos pais.

Merle enfiou suas mãos por dentro dos bolsos, e me mandou abrir as minhas, formando uma concha. Eu assenti, o fazendo. Quando vi os pacotes coloridos resplandecerem dentre os dedos grossos de Merle, meus olhos brilharam, esturricados, e os meus lábios lhe mostraram um sorriso sincero e infantil, cujo o qual eu nunca havia mostrado para ninguém.

Merle não era tão ‘mau’ quanto eu pensava, não poderia ser... Não para mim!

Merle bebeu seu whisky e eu comi todos os meus doces, ambos embaixo da sombra de uma macieira enorme do pomar em frente a nossa casa. A grama verde e fofa resguardou nossos desejos realizados e estômagos cheios. Após isso, juntos levamos a motocicleta no lugar onde ela deveria estar. E comigo nas costas, Merle voltou para casa, rindo da cara que o velho Kingsley fizera quando nos percebeu devolvendo a motocicleta, sem nada poder fazer.

–Merle, Merle! – Eu chamei em uma certa altura do caminho.

–O que foi?

Ele me tirou das suas costas, largou-me no chão e se abaixou do modo atencioso que nunca fizera.

–Quando eu crescer quero ser igual a você!

Merle riu, seus olhos, aparentemente comovidos, brilhava tanto quanto os meus. Ele me observou durante os minutos de silêncio, com a seriedade cortando seu rosto carrancudo e aparentemente bravo.

–O que foi Merle? Não quer que eu seja como você?

–Não Daryl, por incrível que pareça, o problema não é você!

–E qual é o problema?

–Você não vai querer ser assim daqui a algum tempo- Merle pegou uma pedrinha no chão e riu cabisbaixo. –Mas de qualquer forma... Volte aqui sua marica!

Eu corri de Merle, não como uma criança... Como um cervo, um cervo feliz e saltitante... Uma criança? Coisas contraditórias!

–O Merle não é de nada, só come barata assada. – Cantarolei.

–“Darlena”, você corre como uma menina!

Ambos rimos, e esta foi uma memória feliz, por tudo isso eu acreditava, e ainda acredito, que Merle não é tão ruim, pois eu sou como ele, e disso eu jamais poderei fugir, mesmo que já tentasse tê-lo feito.”

Andar na garupa de Merle já se tornara mais aceitável após esta memória, não era tão ruim considerando outras coisas que eu já havia passado. É claro que eu precisava de uma moto também, eu só precisava sobreviver a marrentisse que Merle exalava naturalmente até a interestadual.

A interestadual não demorou tanto a chegar. Não hesitei em descer da garupa de Merle e procurar um veículo basicamente utilizável. Os cadáveres estavam dentro dos carros seminovos, a maioria era econômica e atrativa, porém não era disso que eu precisava. Alguns nem tinham placas. Por mais que todo aquele luxo assolasse meu senso de consumo, eu queria uma moto que entrasse em todo e qualquer lugar – não levando tanto a risca –, como a que eu tinha antes dos tempos pré-apocalipticos começarem.

Não havia nenhuma moto, o congestionamento abrangia única e exclusivamente os carros, absolutamente nada para que eu pudesse seguir em frente.

Chegamos ao fim do congestionamento da interestadual, que não era dos piores, talvez isso explicasse o porque de não terem motocicletas ali. As brechas entre as pistas eram tão grandes que até o próprio Trailer passou.

Quando abandonava as esperanças e ultrapassava os últimos carros da rodovia a pé, eu olhei para a minha direita, e vi algo que me deixou boquiaberto. O Impala reluzente e negro estava estacionado embaixo de uma árvore. Polido e bem cuidado, seu reflexo não tinha nenhuma mancha, era tão nítida a sua reflexão que poderia ser comparada a de um espelho, o que me fez me aproximar, apenas para contemplar a beleza daquele monte de ferro empilhado. A chave estava dentro, e não havia mais nada por ali além dela, não existiam corpos, nem sangue, apenas os bancos com o revestimento aparentemente novo, como se alguém houvesse o deixado ali para mim.

Eu abri suas portas que de fato, estavam destrancadas, então acariciei o couro bege que as revestia, era perfeito, feito sob medida para mim. A chave ainda reluzia prateada na ignição, me chamando, gritando para que eu a girasse, como se soubesse, ou quisesse ser minha.

Eu me sentei nos bancos tão macios quanto nuvens, e me senti sentado sobre uma delas quando dirigi meu novo carro pela primeira vez.

Então eu soube que ali nasceria uma nova paixão.

Eu chamei Carol para ir comigo. De certo modo ela me lembrava a minha fiel amada, mas tinha uma pequena diferença entre ela e a “minha garota”, a que morava em meu coração era doce, diferente... Virtuosa. Não que Carol não fosse virtuosa, mas a que tocava meu coração era de uma forma mais forte e tocante, parecia que ela estocava virtudes dentro de si. Virtudes que até eu mesmo ajudava a manter. Eu não sabia o que ela via em mim, mas sabia muito bem o que eu via nela.

“Ela não era alta, se fosse para comparar, sua altura seria muito pouco maior que a dos meus ombros, talvez fosse por isso que ela adorava se recostar no meu peito. Seus cabelos compridos encontravam sua cintura esbelta, encaracolados miudamente, na grossura uniforme de uma caneta.

Ela exalava uma energia em seu sorriso, tão forte que chegava a ser inexplicável. Ela poderia contagiar qualquer um, até Merle, o próprio. Sua pele clara, quase translúcida. Minha estrela do dia, eu era servo do amor dela e nem sabia.

–Daryl- chamava ela com a rouquidão de sua voz. O ar abafado da voz dela corria junto com a mesma. –Daryl!- Seu sotaque estrangeiro ecoava pela floresta, na voz de uma pessoa com voz resfriada, como se tivesse frio ou calor demais.

Tão cordial... Tão bela... Tão melódica... Tão minha!”

Eu não sabia como ela conseguia ser tão marcante e ao mesmo tempo antiquada para mim. Eu era apenas uma mera pedra comparado a grandeza dela, a beleza dela... A tudo que ela era.

–Sabe, Daryl, o Ed era mais pacifico quando éramos jovens – disse Carol puxando assunto.

–Hum.

Dei de ombros.

Nada tiraria a lembrança da minha amada da minha cabeça naquele momento, e eu garantiria a morte de qualquer um que tentasse. Era real demais para me abandonar.

–E você, Daryl? Já teve alguém?

–Eu não gosto de falar sobre isso, tá legal?

Carol bufou.

Não havia sido uma boa ideia ter dado carona a Carol, não naquela hora, nem naquele carro. Essa era uma das horas, onde eu sozinho, na motocicleta de Merle, reviveria memórias, e por elas derrubaria uma lágrima, apenas para garantir que estaria sozinho, e brevemente curado de tudo que eu acreditava que jamais iria esquecer. Mas devia me lembrar que as feridas na alma estariam abertas para sempre, e nem todos os pontos que a minha mente desse nelas iria fechá-las, porque eu amava, porque eu precisava, e porque eu jamais poderia esquecer aquela que não dependia de mim, mas de qualquer forma me queria, mesmo eu sendo inferior, mesmo eu sendo... Daryl Dixon!



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