'Segure-se em mim, amor.

Você sabe que não posso ficar por muito tempo

Tudo o que eu queria dizer era que amo você e eu não estou receoso'

Então fui embora em meio a tempestade que caia sem qualquer piedade, as gotas ensoparam minhas roupas em poucos segundos e eu mal podia enxergar um palmo diante meus olhos, tamanha a intensidade da chuva. Porem continuei andando e procurando por ele, que já não estava mais ao alcance de meus braços. Eu já não podia mais toca-lo como fazia, ele já não podia mais ouvir minhas palavras, nem mesmo senti-las.

'Você pode me ouvir?

Você pode sentir-me em seus braços?'

Seus olhos permaneciam fechados e aquilo me assombrava, eu falava e não recebia resposta, o desespero tomou conta do meu ser. Eu já não podia mais agüentar, então deixei que as lágrimas rolassem e se misturassem com a chuva que me lavava de toda a imundice que eu acabara de presenciar. Como alguém pode ser capaz de tirar outra vida, assim com tanta facilidade?

'Segurando meu último suspiro

A salvo dentro de mim

Estão todos os meus sentimentos por você'

Despedir-me dele não foi a pior parte. O que mais doeu foi saber que ele morreu por minha causa, eu era a única culpada por aquela vida ter se perdido, ele me salvou e com isso tirou a própria vida! O que mais doía em mim era saber que ele havia partido para um lugar que jamais teria volta.

'Doce luz extasiada

Que termina aqui esta noite'

Naquela noite não consegui pregar os olhos, sempre que os fechava, aquela cena se repetia novamente em minha mente, me fazendo lembrar da noite mais terrível de minha vida. À noite em que perdi o homem que eu mais amei no mundo todo. O grande amor de minha vida!

'Eu vou sentir falta do inverno

Um mundo de coisas frágeis'

O inverno acabou e as chuvas se foram, o sol brilhava alto quase todas as manhas, a noite leves brisas brincavam com meus cabelos, enquanto eu ficava debruçada sobre a janela de meu quarto, vagando meus pensamentos, relembrando cada sorriso dele. O som de sua voz era um eco eterno em minha cabeça.

'Me procure em um bosque branco

Escondido em uma árvore oca (Venha me encontrar)'

Porem quando me deitava para dormir era sempre o mesmo sonho. Sempre tinha alguém me chamando e eu nunca via seu rosto. Apesar de reconhecer a voz, eu não tinha certeza de quem se tratava, era uma voz meio distorcida, então acordava gritando e chorando.

'Eu sei que você me ouve

Posso provar isso nas suas lágrimas'

Eu chorava com tamanha intensidade que chegava a soluçar alto, e durante um bom tempo eu não conseguia parar, minha cabeça doía, e as lagrimas continuavam a jorrar pelos meus olhos. O rosto dele estava sempre presente no final do sonho.

'Fechando os olhos para desaparecer

Você reza para seus sonhos te deixarem aqui'

Eu queria encontrá-lo, mas não sabia como, nem se poderia. Pensamentos desprazíveis começaram a inundar minha mente, coisas insanas, coisas das quais eu jamais deveria pensar agora eram possibilidades quase aceitáveis. Eu sabia o que tinha que fazer, sabia onde teria que ir para que pudesse te-lo em meus braços novamente.

'Mas você ainda está acordada e sabe a verdade

Ninguém está lá'

Então à noite voltei novamente à cena do crime. A leve brisa me fez gelar a espinha e arrepiar o corpo todo, eu tremi, levei as mãos na altura dos braços e esfreguei-os abraçando meu próprio corpo. Não estava frio, mais eu ainda tremia, talvez por estar naquele lugar, rever a mesma estrada em que o perdi, meus olhos novamente se encheram de lagrimas, quando então ouvi sua voz. Eu sabia que era impossível, ele havia morrido. Mas sim, era ele.

'Diga boa noite

Não tenha medo'

Corri em sua direção, e quanto mais eu corria para ele, mais longe ele parecia estar, a escuridão o estava engolindo. A distancia entre nos aumentava rapidamente e ele ainda me chamava: 'Querida, venha ate mim!' Dizia ele. Eu chorava e gritava por seu nome, porem ele repetia sempre à mesma coisa.

'Me chamando, me chamando até você se anular na escuridão'

Finalmente a escuridão venceu e me roubou o meu bem mais precioso, continuei vagando por mais algum tempo naquele lugar que havia se tornado tão estranho para mim. Como eu havia ido parar num lugar como aquele? Só haviam arvores e escuridão por todos os lados. De repente a chuva caiu de uma só vez e me deixou completamente paralisada. Era exatamente como naquele dia. Então eu o vi novamente entre as arvores e caminhei ate ele desta vez.

'Diga boa noite

Segurando meu último suspiro'

_ Não tenha medo!

_ Não estou com medo... Só quero estar com você!

_ Então venha... Segure minha mão - disse ele estendendo-me sua mão.

Segurei sua mão em pensar e parti com ele para o mundo para o qual ele fora mandado sem nenhuma compaixão: o mundo dos mortos...

'A salvo dentro de mim

(Me chamando, me chamando)

Estão todos os meus sentimentos por você

Doce luz extasiada

Que termina aqui esta noite'