As grandes cortinas de cetim brancas do meu quarto balançavam, enquanto o ar gélido da noite passava por elas. A luz sutil da lua iluminava o cômodo rosado, enquanto eu, deitada na cama e coberta pelo enorme cobertor macio e felpudo, observava as estrelas que brilhavam timidamente naquele enorme céu. Meus pensamentos vagam, até chagarem na minha agenda do dia seguinte, e eu suspiro, colocando o suave travesseiro de penas de ganso sobre minha cabeça.

...Tão irritante...

     Em termos materiais, eu não tinha do que reclamar. Vinha de uma família nobre e rica, morava em uma grande e luxuosa mansão cheia de móveis caros, e meus pais cobriam-me de jóias, roupas e vestidos finos. Eu gostava de todo esse mimo, mas...
...Não é tudo um mar de rosas, como todos acham que é.

     Tiro o travesseiro do rosto com relutância, encarando o rústico lustre dourado do quarto. Brinco com uma mecha de meu cabelo azul longo e sedoso, enrolando-a entre meus dedos.

     Assim como eu recebo todos esses mimos, uma maldição vem junto com ele. A maldição de todas as famílias ricas...A quase inexistente vida social. Eu sempre estou ocupada, seja com meus cursos de piano, pintura, violino, canto e dança, ou fazendo alguma social, indo há eventos onde as famílias nobres têm de comparecer (que geralmente ainda não há ninguém da minha idade). Eu nunca podia sair para me divertir, como minhas amigas faziam, e isso me frustrava. Sempre que eu pedia para meus pais para simplesmente sair e me divertir como uma adolescente normal, eles falavam que eu não podia ir á qualquer lugar.

...Maldito sobrenome ‘’Hatsune’’. Mesmo que fosse apenas uma vez na vida, eu queria ser só eu. Somente a ‘’Miku’’. Sem o peso desse sobrenome que eu carrego como um fardo nas costas.

     Viro para o lado oposto ao que eu estava na cama, e sinto algo entre as cobertas me incomodar. Vasculho o local, em busca do autor de meu desconforto, e descubro um de meus livros favoritos bem ali: Romeu e Julieta. Eu adorava esse livro, mas achava o final da história triste demais. Se ao menos a Julieta fosse tão esperta quanto a Cinderela foi...

     Encaro o livro de capa dura e envelhecida.

...Se ao menos eu pudesse fazer a fada madrinha da Cinderela aparecer, e pedir para ela que um príncipe me levasse para outro lugar...

     E enquanto eu olhava para o velho livro, quase escutei uma voz dizer:
    
‘’Cuidado com o que deseja.’’