O Rapaz Das Covinhas escrita por Julieta Antunes
- Não, pai. Não – respondi para o celular -, eu, a Sara e a Margarida vamos ficar num hotel. Não vale a pena insistir… Nós vamos ter consigo amanhã à tarde. Sim, também tenho muitas saudades suas. Beijinhos. A Margarida também está a mandar beijinhos.
- Beijinhos, vovô! – Gritou a Mimi do meu colo para o celular.
Atirei o celular para cima da cama do hotel, fazendo-o saltitar até à almofada do lado.
- Vamos tomar banho, Mimi? – Perguntei, pousando-a no chão.
Ela assentiu e correu para o banheiro. Preparei o seu pijama e segui-a, levando comigo tudo o que era necessário para ela tomar banho.
Fiquei a vê-la tentar tirar a trança que eu lhe tinha feito. Ela tinha puxado à minha mãe no que toca ao cabelo pois, tal como ela, possui longos cachos louros, mas os olhos… Os olhos ela tinha puxado ao pai dela, seja ele quem for. O que até é engraçado pois, para além das covinhas, a única coisa de que eu me lembrava do misterioso rapaz eram os olhos.
Apressei-me a desfazer-lhe a trança e dei-lhe banho. Ela atirava-me espuma e, no final, quem parecia ter tomado banho era eu e não ela.
- A madrinha, mamãe? – perguntou-me, sentindo falta da minha melhor amiga.
- Sabes que a titi Sara é como um gato. Ela só volta quando tiver fome.
Deliciei-me com a sua gargalhada e, enrolando-a na toalha, transportei-a até ao quarto. Vesti-lhe o seu pijama cinzento com o Snoopy e umas pantufinhas super fofas.
Da porta irrompeu um tufo de caracóis ruivos e eu segui a minha ruivinha favorita com o olhar, enquanto ela se refastelava na minha cama. Trazia consigo um saco da chico e eu presumi que fosse para a minha menina.
- Ainda bem que acertei no quarto – ergui uma sobrancelha-, o que foi? É o terceiro quarto em que eu entro. Sabes que aqui a ruivinha depois de umas margaritas já não se lembra bem dos números!
- Andaste a beber? – perguntei, abismada.
- O que foi? Hoje é bar aberto aqui no hotel! Tinha de aproveitar!
Suspirei resignada. Há coisas que nunca mudam!
- Quem é que é a madrinha mais querida do mundo? – perguntou à Mimi que respondeu um És tu muito desconfiada. Sara entregou-lhe o saco da chico que Mimi rasgou prontamente, tirando de lá um lindo vestido vermelho às bolinhas brancas.
- É lindo, madrinha! – e começaram a discutir assuntos de moda.
- Às vezes penso que és uma má influência para a minha menina – murmurei.
- Nada disso. Se não fosse eu, tu até eras capaz de lhe vestir um saco de batatas! – replicou Sara.
- Já não está cá quem falou!
O meu telemóvel começou a vibrar muito antes dos Green Day começarem a tocar. Saquei do telemóvel e atendi:
- Oi?
- Lisa? O teu pai contou-me que tu estavas em Londres! – Fogo pai! Não sabes estar calado?
- Pois. Estou aqui para o casamente, Sophie.
A Sophie é uma daquelas primas chatas que ninguém quer aturar mas mesmo assim consegue infiltrar-se nos planos e estar sempre presente. É o que dá ter uma família muito grande!
- Amanhã vamos comer fora! Pago eu. No Nandos!
E desligou antes de eu responder ou perguntar-lhe onde raios é o Nandos.
- Quem era? – perguntaram Sara e Mimi ao mesmo tempo.
- A Sophie – e ambas reviraram os olhos.
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Acordei com o sol a incidir-me diretamente nos olhos.
A Mimi dormia tranquilamente ao meu lado e a Sara ressonava na outra cama. Sim, ela RESSONAVA.
Despertei a minha menina e com um berro acordei a Sara, que, por aquela altura, já tinha a perna fora da cama.
- Me deixa dormir! – me gritou.
- Ou te levantas agora a bem, ou eu vou buscar um copo de água e tu sabes o que é que acontece depois…
- Eu grito, tu gritas, a Mimi chora, chateamo-nos, EU vou beber uns shots e apareço bêbada, tu cuidas de mim e tudo volta ao normal – resumiu e a Mimi gargalhou.
- Exatamente.
Vesti um vestido rosa de babados e calcei um salto agulha branco que tinha sacado à Sara. Fiz uma make suave em tons de pastel. Ajudei a minha menina a vestir um vestido branco pelo joelho e umas sandálias brancas. Sara optou por um tipo de roupa mais… atrevido. Uns jeans justinhas e uma túnica vermelha. Pintou os lábios de vermelho, que contrastavam com a sua pele branca e pintou os olhos.
Peguei no carro e percorremos as ruas à procurar do tal Nandos. Parámos algumas vezes para perguntar o caminho. Isso é tão à turista. Por fim, lá demos com a maldita lanchonete.
Tirei a Mimi da cadeirinha e levei-a ao colo. O meu olhar varreu o local, procurando por aquela chata que dá pelo nome de Sophie. Fui a encontrar numa mesa junto à janela.
Nos sentámos junto a ela.
- Custou dar com o sítio? – Nos perguntou a Sophie mal nos sentámos.
Senti os olhos verdes da Sara a revirarem-se e a Mimi a bufar.
- Foi fácil – lhe disse.
- Mamãe! Olha o senhor dos gelados a vender lá fora! – Gritou a Mimi.
- Margarida, há gelados aqui – a informei.
- Mas os lá de fora são melhores! – Choramingou.
- O que eu não faço por ti… Meninas, fiquem aqui, nós já voltamos. – avisei e peguei a Mimi pela mão, arrastando-a até o exterior.
- Desculpe, são dois gelados. Um de morango e um de baunilha.
- Desculpe menina mas já não temos de baunilha. O último foi vendido aquele moço – disse, apontando para um rapaz que nos olhava fixamente e que estava junto com uma data de rapazes.
Peguei a Mimi ao colo e murmurei:
- Desculpa amor, mas já não há. Comes do meu tá bem?
- Não! – gritou e começou a fazer uma birrinha no meio do parque - Eu quero o de baunilha! Eu quero o de baunilha! Eu quero o de baunilha! Eu quero o de baunilha! Eu quero o de baunilha!
- Margarida! Vamos nos chatear a sério! Para com isso ou vamos já para a casa! E não me faltes ao respeito, estás a ouvir?
- Estou… - murmurou, com a lágrima ao canto do olho.
Paguei o meu gelado até que o rapaz do ultimo gelado de baunilha me surgiu à frente. Estendendo o gelado para a Mimi, disse:
- Tome o meu gelado. Eu ainda nem lhe toquei, juro!
Ergui uma sobrancelha e ele sorriu-me, fazendo umas covinhas tão fofas!
- Este é o menino que canta na banda que a titi Gabriela – que é a minha irmã – está sempre a ouvir! – Me gritou ao ouvido, já toda suja de gelado – E aquele que está no poster que ela tá sempre a beijar!
Meu deus, ainda bem que ela estava a falar em português. A minha Mimi fala um inglês fluente visto que o meu pai teima sempre a dedicar duas horas com ela, só para lhe aperfeiçoar o inglês.
- O meu nome é Harry – se apresentou.
- O meu nome é Lisa e esta é a Mimi.
O seu grupo de amigos rodeou-me e eu apertei a Mimi contra ao peito.
- O meu nome é Lisa e esta é a Mimi.
- A sua irmã é muito fofa – murmurou um loirinho.
Corei.
- Ela não é minha irmã – respondi.
- Então é o quê? – perguntou um rapaz com uma camisola às riscas azuis e brancas.
- Mummy, tens algum guardanapo?
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