Tudo está frio e escuro, mas mesmo assim consigo ver perfeitamente minha figura projetada nas sombras. Uma imensa sensação de vazio, de desespero, de infelicidade paira no ar e eu me sinto em casa. Estaria eu morto? Uma imensa figura começa a tremular na minha frente e logo reconheço pelo elmo das sombras que está portando: É meu pai, Hades. Todas as suas feições estão embaçadas e já sei o por que. Essa é sua forma divina, que se qualquer mortal ou semideus fitar diretamente, é imediatamente queimado pela essência divina, por isso estava embaçado, para que eu não começar a queimar e me debater no chão como quando você taca fogo em uma das almas nos campos da punição (Era bem rotineiro da minha parte fazer isso... Era divertido! Bons tempos...)

– Vejo que conseguiu encontrar sua irmã... - Ele diz não em tom áspero ou sarcástico e sim como algo afetuoso... Não é muito comum vê-lo falar desse jeito.

– Sim, a encontrei. E agora o quê quer que eu faça “papai”?- Uso o tom mais petulante e irônico que consigo.

– Essa missão é tão importante para você quanto para mim, Gabriel- Diz ele em tom ríspido... Ele odeia ser desafiado- Além disso você é forte, tem o casaco das sombras e Dákyafos. Essa missão é fácil para você.

– Deixe-me checar minha lista... - Continuo desafiando-o... Bem lá no fundo, há uma pontada de medo, mas não consigo evitar! Puxei isso do meu pai- Andar pela rua por duas semanas seguidas, ser atropelado por “carros” ou sei lá o que, ser mandado por motoristas tomar um suco estranho chamado cu...

– Isso é um xingamento- Interrompe ele, com ar de riso- Eles te xingaram.

– QUE SEJA ENTÃO!- Berro com raiva na voz- Continuando... Ser xingado então por todos os motoristas, procurar uma pessoa que não fazia a mínima ideia de quem era ser atacado por dois ciclopes, provavelmente estar sendo procurado pela polícia local, enfrentar duas benevolentes, sair ferido e estar morto... Tudo confere na lista, papai!

– Você não está morto garoto, pare de drama! Esse é seu subconsciente! – A voz dele ressoa agora como um trovão, ecoando na escuridão e me dando calafrios- Essa missão é tão importante para mim quanto para você, já lhe disse! Sua vida depende dessa garota, a sua irmã.

– Se é tão importante, por que você não me revelou nada hein?- Acho que estou passando dos limites... Não! Estou bem- Se você é tão bom e isso é tão importante, por que o senhor não me deu a localização da garota? E porque não me fala por que ela é tão importante? E porque o SENHOR MESMO NÃO A PROCURA?

Silencio-me. ARGH! Sinto algo como uma explosão dentro de mim... Minha pele parece queimar, caio de joelhos enquanto sinto meu coração bater mais rápido e minha cabeça dói muito! Ótimo, morrerei aqui nas mãos do meu próprio pai por causa da minha personalidade!

– É isso- Diz ele calmo- É isso que vai sentir se aquela garota morrer. É daí para pior. O nome dela é Monique e esta é sua irmã. Sempre a protegi, tanto quanto seus dois irmãos, Nico e Bianca! Só que Monique e você têm algo... Algo que não posso revelar agora, pois pode interferir no futuro dos dois! Mantenha-a viva, pois ela é sua vida também. Leve-a para o acampamento meio sangue, em Long Island. Em segredo, fale com um semideus chamado Percy Jackson- Senti um pequeno grande desdém quando pronunciou o último nome- Ele saberá o que fazer.

A dor parou. Não respondo nada, pois ainda estou com raiva dessa missão-suicida em que fui colocado. Eu sou forte, tsc, papo dele... Nico poderia muito bem completar essa missão com mais rapidez e melhor do que eu. A figura embaçada começou a diminuir e de três metros passou a ter o tamanho de uma pessoa normal e seus traços começam a ficar claros para mim. A barba negra, os cabelos longos e negros cobertos por seu elmo e os olhos com aquele ardor desesperador aproximavam-se de mim. Ele ergue os braços e... E me abraça. Não sei como reagir. Não estou acostumado com esse tipo de coisa chamado de afeto pelos mortais! Mas isso me parece bom, pois me sinto mais seguro e encorajado de alguma forma.

– Eu confio em você, meu filho- Sussurra ele em meu ouvido- Você vai conseguir.

Quero falar, mas nada sai da minha boca. Nenhuma palavra me parece ser boa o suficiente para tal ato, minha mente está a mil, cheia de dúvidas, perguntas e algo que pela primeira vez estou sentindo realmente na minha vida... Medo. Porque estaria ele, o senhor da escuridão, agindo de tal forma, tão carinhoso e compreensivo? Coisas boas que não devem ser. Não vejo motivos ou razões e antes que possa entender algo, a figura de meu pai some no ar e a escuridão se dissipa, até que posso enxergar um vulto em cima de mim. Não é meu subconsciente, sou eu acordando aos poucos para a realidade. A visão clareia aos poucos e consigo ver os traços daquele ser que me observava aparecerem: Os cabelos ondulados surgindo num tom castanho quase preto, uma pele morena clara colorindo-se diante de meus olhos e os olhos castanhos bem escuros iluminarem-se numa expressão um tanto quanto assustada. Monique, a filha de Hades, minha irmã. Devo protegê-la, leva-la a salvo para o acampamento meio sangue. Levanto-me rapidamente e bato minha testa na testa dela, fazendo um pequeno estrondo.

– Ai! Mais cuidado, cabeça dura!- Diz ela irritada colocando a mão no local que houve a colisão- Estava tudo bem até você aparecer e me atrapalhar desmaiando no meio da luta! Tive de te arrastar até aqui e você pesa e muito, sabia? Precisa emagrecer! Quem sabe uma dieta ou algo assim não ajude!

Essa garota é mais chata que os gemidos dos condenados no mundo inferior! Não tenho tempo nem paciência pra isso, então agarro no braço dela, levanto-me e forço-a a levantar-se enquanto se debate na minha mão. Percebo que estamos debaixo de um viaduto ou algo assim, pois escuto os barulhos dos “carros” passarem por cima de nossas cabeças.

– QUEM VOCÊ PENSA QUE É PRA ME SEGURAR ASSIM? ME LARGA, ME SOLTA, ME DEIXA!- Grita ela em tom raivoso e se debatendo mais enquanto a puxo. Ela se joga no chão e eu continuo por arrasta-la pelo concreto. Paciência: -150%- ESTÁ ME MACHUCANDO... Me solta por favorzinho que eu te sigo, moço sombrio das trevas estranho e assustador! Eu confio muito em pessoas assim, eu juro!

É eu também confio em pessoas assim, elas normalmente são simpáticas com exceção daquele moço ciclopes! Vou soltá-la que ela com certeza me seguirá. Ela se afasta um pouco e... Está pegando um pedaço de madeira? Com certeza deve estar com fome e deve estar levando isso para lanchar pelo caminho! Esses semideuses com hábitos mortais, tão estranhos! AI! Ela me acertou aquilo na minha cabeça e começou a correr! Que desgraçada infeliz do fundo do tártaro! QUE ÓDIO! Essa semideusasinha que se acha esperta vai ver! Levanto-me e corro atrás dela... Não demoro a alcança-la, pois apesar dessa rata ser rápida, eu tenho perna mais longas e sabe como diz o ditado de lebres, coelhos, tartarugas ou bichos da florestas que tem haver com pernas e correr... Enfim, acho que não sou bom em ditados.

– O que você quer de mim? Me assassinar, me sequestrar, me matar?- Diz ela, chorando- Se que dinheiro, eu não tenho! Anda me mata logo!

– Cala a boca mulher! Cala a boca!- Explodo, já no limite- Se eu quisesse sua morte, teria deixado você para aquelas benevolentes naquele beco!

– Então o que você quer? Se não me mata, não me sequestra, o que pode ser?- Ela fala bem rápido e é dramática... Definitivamente é minha irmã- Fale logo, Homi!

– EU SOU SEU IRMÃO, SEMIDEUS FILHO DE HADES ASSIM COMO VOCÊ E ESTOU AQUI PARA TE SALVAR, MULHER CHATA!- Explodi e ops... Acho que foi alto demais.

Só deu tempo de sacar Dákyafos e desviar do golpe junto com ela. Uma sombra enorme projetava-se na nossa frente... Uma não três.