Winter In London escrita por Luh Moon


Capítulo 2
Capítulo 2 - Mildred Arnet


Notas iniciais do capítulo

Voltando um pouco no tempo pra entendermos como o detetive foi parar no sofá da irmã (?)



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Seis meses antes...

Por mais que o tempo passasse, John não se habituava a nova rotina. Sra. Hudson havia concordado com que ele permanecesse no apartamento, mesmo sem poder pagar por ele. Depois Mycroft se ofereceu para pagar o mesmo valor que ela recebia antes de tudo acontecer. Ele achou que não conseguiria voltar a Baker Streer, 221b... Mas na verdade ele não conseguia imaginar viver em outro lugar, mesmo que o lugar estivesse repleto de lembranças.

O maior problema era que todos estavam sendo excessivamente gentis com ele nos últimos meses. Gostava de ficar ali, naquela sala, sentado, olhando pela janela, sozinho. Às vezes apanhava o laptop e ia até o blog apenas para reler suas próprias narrativas. Ainda tinha esperanças de que tudo fosse um grande engano, mesmo contra todas as probabilidades. Bolas para as probabilidades! Era o que ele diria, aquele Sherlock! As regras estavam erradas!

Estava em um desses dias meditativos em que a saudade e a esperança eram suas duas maiores companhia, quando ouviu passos na escada.  Jamais prestaria atenção a isso em outros tempos, antes de conhecê-lo. Empertigou-se na poltrona e esperou a batida na porta. Ela veio, leve, delicada... Uma mulher? Levantou-se agitado pela curiosidade.

- Olá... – disse aquela jovem que não parecia ter mais que dezoito anos, em pé em frente a ele. – Posso entrar?

O doutor ficou sem saber direito o que dizer. Não recebia visitas. Às vezes Lestrade aparecia para tomar um café e reclamar de como as coisas andavam monótonas. Uma vez um antigo cliente veio e chorou por quinze minutos em pé, embaixo dos caixilhos da porta sem dizer uma palavra. Mas nenhum estranho! Muito menos uma jovem de aparência tão distinta e tão bonita. Quando voltou a si, ela estava em pé, no meio da sala, com os olhos fixos no violino que descansava no canto.

- Suponho que seja John Watson, não é assim? – ela disse voltando-se antes que ele abrisse a boca.

- Sim. E você? – a postura, o modo como ela andava e até o modo de falar eram tão familiares que John sentiu um frio no estômago.

- Mildred Hol.. Arnet. – sorrindo sem jeito. John ergueu uma sobrancelha.

- Em que lhe posso ser útil senhorita Arnet? – apontando a poltrona onde estivera sentado.

- Mildred, por favor! – sentando-se. – Importa-se que eu fume?

- Absolutamente! – importava-se, mas percebera que pelo tremor em suas mãos que além de nervosa, fazia algum tempo que ela não fumava. Já tinha visto aquilo antes.

- Quero que me conte, em detalhes o que aconteceu...

- O que aconteceu? – confuso. – Ao que se refere.

- Pela coroa! – ela disparou. – Achei que já tivesse compreendido! Especialmente por que quase troquei meu próprio sobrenome!

- Não entendo do que está falando...

- Sherlock Holmes! É dele que estou falando!

A menção daquele nome fez Watson sobressaltar-se. Quem era aquela mulher? O que ela sabia sobre Sherlock? O que ela queria ali? De repente, as palavras que ela dissera ressoaram em sua mente. O que ela quis dizer com errar o próprio sobrenome? Voltou alguns minutos e relembrou o momento em que ela se apresentara. Era isso o que ela diria? Holmes? Por quê?

- Qual sua ligação com ele? – perguntou com um nó esquisito na garganta.

- Oh! Não! Não! John! – ela riu. – Irmã é o vinculo que procura, embora não sejamos irmãos de modo algum.

- Então? – ainda mais confuso.

- Fui encontrada nas ruas de Londres quando não tinha mais de três anos. Fui levada para os Holmes. E fiquei entre Mycroft e Sherlock pela primeira vez. E eles brigavam o tempo todo. – divertida com as lembranças.

- Mycroft! – disparou John.

- Ele adorava provocar Sherlock! Dizer o quanto era mais esperto, mais inteligente, mais capaz, que eu era sua irmã preferida e ele o meu irmão preferido. O que não era de nenhuma forma verdade! Sherlock era o meu preferido!

- Sim? – ele podia ver que era verdade.

-Ele era mais esperto, mais interessante, mas engraçado e... Bem, muito mais bonito também. – baixando a cabeça e suspirando.

- Por que Mycroft ou Sherlock nunca mencionaram você?

- Devem ter mencionado... – murmurou. – O caso que eles, especialmente Sher, sempre se referem a mim como “a criança”... – John ergueu a sobrancelha ao ouvir o apelido que jamais esperava, mas fingiu que não havia escutado.

- Uma ou duas vezes eu ouvi... – lembrou-se vagamente. – Mas eles mudavam de assunto quando alguém se aproximava.

- Eu estive em um colégio interno até os dezoito anos. – esfregando as mãos. – Sai de lá direto para Atlanta, nos Estados Unidos. Eu estava fazendo faculdade, quando soube que... Quando eu soube... – gaguejando.

- Está tudo bem? – preocupado.

- É tudo mentira! – ela gritou de repente – Você sabe? Não sabe? Ele jamais mentiria! Ele não precisava mentir! É um gênio! Ele... – a garota começou a soluçar preocupando ainda mais o médico.

- Está se sentindo bem? Quer um copo d’água?

- Não... – passando a mão pelo rosto. – Tem que haver algo errado! Estou a três semanas investigando isso... Agora cheguei até você. Precisa me dizer John... – saltando da poltrona e agarrando as mãos dele.

- Investigando? – franzindo a testa.

- Óbvio! – ela gritou em resposta. – Ah! John! Cresci com Sherlock e ele sempre foi o que ele sempre foi... Ele me ensinou, ele... – suspirando.

- Abandonou a faculdade? – questionou John percebendo que o detalhe havia escapado.

- Queria que eu tivesse permanecido lá? Depois de ler todo o lixo que li da imprensa britânica? – encarando-o. – Idiotas! Néscios! Estúpidos! Incapazes de entender a genialidade, prontos a destruí-la... – os olhos dela tremeram. – Diga-me que ele está vivo!

- Ah! Mildred! Eu adoraria poder dizer isso! – com um nó na garganta.

A jovem desfez-se em lágrimas no minuto seguinte e John ficou sem ação. Ainda estava assimilando todas as novidades que ela tinha lhe contado nos últimos minutos. Mesmo assim o modo como ela chorava, o tremor de suas mãos e de seus joelhos. Era muito mais do que esperaria de uma irmã distante. Levantou-se, a fim de consolá-la, e afagou suas costas.

- Se eu soubesse... – ela soluçou. – Se eu pudesse imaginar que algo assim aconteceria... Jamais teria deixado Mycroft me enfiar naquela maldita escola!

- Por que um internato? – perguntou John tentando distraí-la daquele pranto convulsivo.

- Mycroft tinha preocupações... – enxugando os olhos com as mangas do casaco. – E tinha razão!

- Preocupações?

- O que se passa com a sua mente, meu caro? Com relação a mim e Sherlock! – controlando a respiração. – Eu vivia me enfiando em qualquer lugar em que Sherlock estivesse e isso incluía o quarto dele.

- Alguma coisa... natural, eu imagino...

- Natural sim, inocente... Talvez não! Sherlock não percebia, Mycroft percebeu! – John ergueu as sobrancelhas surpreso. – Ele me apanhou uma noite me esgueirando pelos corredores.

A cena era tão clara na mente de Mildred como se estivesse acontecendo naquele exato momento. Andando de meias pelo corredor, no meio da noite, apalpando as paredes. Ele tinha chegado tarde, entrado pelos fundos e ela simplesmente precisava vê-lo, falar com ele. Quando alcançou a porta de seu quarto, porém viu um braço atravessar-se em sua frente.

“O que estamos fazendo fora da cama tão tarde?”

“Eu ia ver...”

“Sei quem você ia ver... O que faremos a respeito?”

- Fui eu quem escolheu ir embora. Era melhor assim!

- Mas você era uma criança!

- Madura demais para a idade... – olhando para as mãos que repousavam sobre as pernas. – E ele estava prestes a completar vinte anos... Alguma coisa ruim ia acabar acontecendo.

- E nunca mais se encontraram?

- Algumas vezes... Raramente. Mycroft acreditava que eu devia voltar. Preocupava-se com Sherlock e as brigas entre eles tinham se tornados intoleráveis ao ponto de ele ter saído de casa... Ele queria que eu o espionasse!

- Reconheço a proposta! – interrompeu o médico sorrindo.

- Mas era inviável! – suspirou. – Todas as vezes que nos encontramos eu acabava sendo tão implicante e arrogante quanto ele, o que obviamente o tornava ainda mais irritante e arrogante... – rindo do que acabava de dizer. – Somos definitivamente incompatíveis, desde que ele seja frio feito uma barra de gelo... – torcendo os lábios.

- Eu não diria... – John não terminou a frase e foi fulminado pelo olhar de Mildred.

- Adler? – rosnou. – Está brincando comigo, não é?

- Na verdade pareceu bastante sério... – retrucou franzindo a testa.

- Irene Adler... – rosnou mais uma vez, como se o nome lhe causasse desgosto. – A mulher! Tão limitada quando um cão treinado. Esperta, admito e bonita... Mas você não quer insinuar que Sher... – percebeu que tinha usado aquele apelido de novo pelo modo como o médico a olhou. – Sher... Ele odeia que eu o chame assim... Mas eu gosto.

- Sher... – resmungou John. – Soa... intimo...

- Mas é para soar intimo! – ficando em pé. – Sou a coisa mais intima na vida daquela máquina pensante fria e sem sentimentos! – voltando a chorar compulsivamente. – Eu...

- Ah... – assentiu Watson. – Compreendi.

- E ainda não havia compreendido? – fungando. Acendendo outro cigarro.

- Mas ele dizia que era casado com o trabalho... – ponderou olhando para os olhos dela, vermelhos de chorar.

- Uma ova! – retrucou. – Sentimentos são supérfluos, só atrapalham... – resmungou. – Quantas vezes pensa que ouvi essas palavras? – John apenas baixou a cabeça e desviou o olhar. – Por que acha que me esforcei em seguir os passos dele? – voltando a soluçar. – Eu queria ser uma perfeita máquina de raciocínio, fria e bem calibrada... Como ele... Mas eu tenho sentimentos.

- Eu vejo!

De repente Mildred levantou-se e enxugou os olhos com as mangas do casaco. Respirou fundo e estendeu a mão para John que ficou sem ação no primeiro instante, apertando a mão que se oferecia a ele logo em seguida.

- Foi um prazer John Watson. – disse apertando firmemente a mão dele. – Por enquanto esqueça que estive aqui. Talvez nos encontremos de novo... – andando na direção da porta.

- Vai continuar investigando?

- Mas é claro!  - ela garantiu sem se voltar.

John deixou o corpo cair outra vez sobre a poltrona, tentou voltar a suas lembranças e devaneios, mas agora estava tudo contaminado por uma estranha visão de Sherlock adolescente andando por aí com uma garotinha as suas costas. Olhou para a porta que permanecia aberta. Quem diabos era aquela garota? Pouco importava. Uma coisa eles tinham em comum, se importavam demais com alguém que, ao menos aparentemente, nunca dera importância a ninguém.

Sacudiu a cabeça. Precisava que Mildred saísse de seus pensamentos, mas não parecia que ia acontecer. Voltou a ter uma visão esquisita de Sherlock em um confortável quarto de dormir vestindo pijamas – o que já seria no mínimo incomum – com uma garota bastante mais jovem aos seus pés, de olhos brilhantes e com as mãos sob o queixo. Levantou de um salto. Não era possível que Sherlock nunca tivesse percebido que a garota era  apaixonada por ele! Caminhou depressa até o telefone. Mycroft tinha que ter alguma resposta...


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