A Fênix escrita por Julibella


Capítulo 2
Berlin, 1933. /Parte 2




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- Você também poderia ter vários outros apelidos, Della, como a chata, insuportável, metida, arrogante... amiga. - dizia Jacob, dando um sorriso.

- Nossa, muito obrigado pelo elogio, rapaz. Jonahan, você acha isso também? - perguntou a ruiva, dando um soquinho no braço do rapaz louro que estava do seu lado.

- Só sei que faltou o linda e violenta no meio dos adjetivos.

- Ah sim, eu vou ficar muito elogiada. Mari, olha o que eles acham de mim, você concorda?

 Marietta assentiu com a cabeça, rindo. Della deu um suspiro alto e abaixou a cabeça, pensativa. Ela poderia ou não ser tudo aquilo, mas embora seus amigos sempre brincassem com isso, era algo de se pensar.

- Ér... eu sou isso mesmo é?

- Claro que não, Fênix. Estamos apenas te irritando. Não existe ninguém na rua mais humilde e rica do que você.

- Existe sim, o pai de Jacob. - corrigiu Della, apontando sutilmente para o moreno da turma, que ria, sem jeito. 

- Meu pai não é rico. Meu pai não chega a ter nem metade da grana dos Manford, Della.

- Não acho... seu pai é rico.

- Olha, faremos assim... o mais pobre da turma é eu, Jonahan, pronto, resolvido!

 Marietta cutucou Della no ombro e olhou-a fixamente, fazendo alguns sinais com a mão. Della tapou uma gargalhada e disse em voz alta:

- Mari está dizendo que ela é a pobre da questão, pois nem dinheiro ela tem. E é uma grande mentira, pois a Raven cuida de tudo e pelo que sei... está montada na grana.

 A Muda soltou outra risada, desta vez mais animada do que a anterior. Sabia disso, mas preferia se fazer de mais pobre, já que aparentemente Jonahan era o mais humilde da turma, e vê-lo ser inferiorizado pela condição social não era algo que lhe passava pela cabeça. E, percebendo isso, Della mudou o assunto:

- Bem, vamos ir jogar no meu quarto?

- Ah não sei... eu tenho lição para a faculdade. Vou ficar devendo essa, Della.

- Okay Jonahan... e você Marietta? Jacob?

- Eu posso, Della, mas pelo visto Marietta não. - disse, apontando para Marietta que negava com a cabeça.

- Muito bem, então, um jogo com duas pessoas, que legal.

- Eu valho por duas, Della... por duas.

- Humildade a flor da pele, ein Jacob?

- Muito bem, estou indo. Acompanha-me, Mari? - e com o aceno positivo de Marietta, eles se despediram dos amigos e foram descendo as escadas, enquanto Della pegava Jacob pela mão e subia até seu quarto.

- Olha, podemos jogar alguma coisa criativa... hum... jogo de dados? - sugeriu, sentando na cama. Não percebeu o quanto Jacob ficou sem jeito de estar em seu quarto. Antigamente era diferente, eles eram crianças e não eram adolescentes. Alguém poderia pensar algo demais, ou até mesmo, começar a espalhar boatos.

- Della... não é meio estranho um rapaz de 20 anos estar no quarto de uma menina de 16?

- Porque acha isso? Todos sabem que somos melhores amigos, Jacob.

- Não sei... mas se você nunca percebeu... você é uma linda moça.

 Della sorriu acanhada, coçando a nuca com o dedo indicador. Jacob poderia ser brincalhão, mas tinha certa razão. Mas ela não se importava, apenas queria ficar com ele ali.

- Esquece isso, Jacob, essa gente, por alguma razão, tem medo de mim.

- Deve ser porque suas indústrias são responsáveis por boa parte dos empregos daqui...

- É, isso até me favorece. Então creio eu que posso ficar em paz com meu amigo jogando algo até de madrugada.

- Está bem, o que pensa em jogar?

- Hum... perguntas e respostas. Se você não quiser responder, você tem que pagar um castigo, que tal?

- Xiii, toda vez que jogo algo contigo, você trapaceia.

- Trapaceio nada. Você que é ruim. Prova disso é que eu quero que você comece. Venha, sente aqui na minha frente e pergunte algo.

- AHÁ, obrigada pela fidelidade. - ironizou, sentando na frente da amiga, encima de sua cama. Ficaram frente a frente, se encarando por alguns minutos, até que Jacob começou: - Ér... você possui algum preconceito por eu ser judeu?

- Mas de onde tirou essa loucura, Jacob, claro que não, porque?

- É que... ah, esquece, é loucura.

- Me conte Jacob!

- Outro dia, enquanto eu voltava da lanchonete, eu tive a impressão que um grupo de alemães começou a... tipo tirar sarro de mim. Sei lá, mas pude ouvir algo como se eu fosse sujo...

- Que ridículo, Jacob, você não é sujo apenas por ser judeu. Isso é coisa de nazista, esqueça.

- Mas e se todos começarem a pensar assim? O Nazismo está... ou melhor, já se espalhou pela Alemanha, e Hitler é austríaco, pode espalhar isso pelos países vizinhos...

- Mas isso não significa que irão descriminar os judeus... creio eu.

- Prefiro não pensar se isso ocorrer... mas algo não me cheira bem a nosso favor.

- Não vamos pensar. Deus irá nos ajudar.- e tentando cortar o clima pesado, sorriu: - Bem, creio que é minha vez de perguntar, não é?

- À vontade...

- Jacob Schneider, você nunca quis me responder isso... mas você é apaixonado por quem?

 Jacob deu uma tossida nervosa, enquanto toda sua face corava. Ele não poderia falar uma coisa que não tinha certeza.

- Na verdade, eu não sei, Della. Eu estou com o coração vazio.

- Pare de ser mentiroso, porque eu te conheço!

- Ah, sei lá... eu gosto muito da Sophia da lanchonete, mas soube que seu pai é um dos aliados de Hitler.

- Hum...

- E você ein, sua pirralha, não vai com a cara de ninguém?

- Não, pretendo nunca gostar de ninguém. Vejo que fim papai levou por amar demais uma... ér... a tal de minha mãe.

- Nem todos os casos são iguais... sabe?

- Eu tenho uma idéia de minha vida: quero apenas aproveitar a minha liberdade e pronto.

- Como assim, curtir?

- Ué, nada de sério com ninguém.

- É impressão minha, ou Jonahan tem uma queda pela Marietta?

- Impressão? Eu tenho é a certeza absoluta! Eu consigo ler o que a Marietta pensa... e sei que os dois se gostam de uma forma especial, mas são tímidos demais para confessar.

- Jonahan, tímido?

- Que você quer dizer com isto, Jacob?

- Você sabe que o Jonahan tem a fama de pior galinha de Berlin!

- Claro que sei, aquele pivete é conquistador barato. Mas com Marietta é diferente, ela é tímida e não é de se entregar para qualquer um.

- Pura?

- Mas claro! Marietta não mantém muitos contatos, por causa de sua fobia. Mas... não sei, eu ainda acho Jonahan ideal para ela. Mas enfim... é minha vez, não é?

- Acho que sim.

- Bem, Jacob Schneider...

- Disse meu nome todo foi? Vai vir encrenca para meu lado...

- O que acha de mim? - disse na lata, sorrindo.

- DE VOCÊ? Que pergunta... boba, faça outra.

- Mas eu quero que responda essa. O que você acha de mim?

- Mas qual o fundamento para esse assunto, não entendo...

- É que... hum... - começou, com um tom sonhador - eu estava me olhando ao espelho hoje de manhã, de roupas de baixo... e me perguntei se eu seria tão bela quanto Marietta.

- Marietta?

- Sim... lindos cabelos longos e negros... pele macia, cintura definida pelo espartilho e um quadril que deixava suas formas certas no vestido.

- Vocês são novas ainda, não dá para saber se tem formas ou não. É um tanto desnecessário... e equivocado.

- Será que alguém irá um dia me amar?

- Você é linda, Della, pode ter certeza disso. - sorriu meigo, mas notando que dera um momento de vacilo, balançou a cabeça, forçando uma risada. - Ér... está respondida a pergunta?

- Também me pergunto se algum homem, um dia quem sabe, irá me desejar como sua mulher, pelo menos por uma noite. - ignorou a pergunta do amigo, enquanto continuava a refletir.

- Mas que barbárie é essa, Della, não pega bem para uma moça de sua idade falar algo deste gênero.

- É o que eu penso, e ninguém há de mudar isso. E você?

- Eu o que?

- Você já teve alguma moça em seus braços, uma noite que fosse?

- Que é isso, Della, porque vens perguntar justo a mim?

- Hum... você é meu irmão mais velho, esqueceu?

- Por isso, irmãos mais velhos não falam coisas tão intimas com as irmãs caçulas.

- Pare de ser bobo, Jacob, tenho a mentalidade de 20 anos e uma modernidade de 200 anos à frente.

- Moderninha demais, senhorita Manford. Enfim... sim, já tive, e não foram poucas, porém todos nós, que temos uma vida libertina, sabemos como são vistas as garotas que se entregam antes do casamento.

- E as que não querem se casar? Terão que manter-se puras para toda a vida?

- Eu também não sei de tudo, não é? - murmurou, confuso. É, existia certa lógica nas falas da amiga.

- Eu sou uma delas. Não posso ter filhos, porém tenho a mim mesma e ao Cornelius, meu companheiro.

- Não pode viver a vida toda com o Cornelius, Della, ele é apenas um cachorro, e você precisa de um rapaz, um amor que lhe complete.

- Mas não quero, oras! Embora seja jovem ainda, domino boa parte desta cidade, e se ousarem a falar mal de mim pela minha visão de vida, hei de metê-los na rua. E sabes muito bem que sou capaz, não é Jacob?

- ÓH, que medo da soberana Della!

- Não ria de mim! Tens sorte que seu pai é rico e não posso mandá-lo para longe da cidade.

- E você ousaria a expulsar seu belo amigo Jacob da cidade?

- Não sei, mas não me responsabilizo pelos meus atos. - riu para si mesma, ajeitando o vestido contra o corpo. Era um pouco abaixo do joelho, largo, e havia um cinto segurando-o pela cintura. Um casaquinho e uma blusinha por baixo eram seus trajes superiores, que deixavam bem a exposição o belo corpo que Della - embora jovem - tinha. Jacob não conseguia disfarçar suas olhadelas para a moça, hora ou outra. Era inevitável, seu lado homem respondia, mas seu lado responsável negava: ela era absurdamente atraente.

- Bem Della, já está na hora de ir dormir.

- Mas já? Você não faz nada o dia todo, fica mais um pouco...

- Você acha que é fácil fazer Medicina é?

- Eu sei que é difícil, como também sei que você odeia isso.

- Claro que odeio, se dependesse de mim eu viveria de meus desenhos, mas como dinheiro de papai pode não durar para sempre, vou ganhar o meu sustento na base da má vontade mesmo.

- Então está bem. Tenha uma boa noite. Até amanhã. - despediu-se Della, enquanto abria a janela da qual Jacob sempre saía de seu quarto.

- Até mais. - Jacob ia se afastando nos galhos da arvore que unia as duas casas quando Della surgiu no parapeito, sorrindo:

- Hey, Jacob, posso fazer mais uma pergunta? Prometo que será a ultima desta noite.

- Claro que pode Della, fala.

- E você, me teria em seus braços uma única noite?

 Jacob corou violentamente, abaixou a cabeça e coçou-a. Deu um suspiro calmo e encarou a amiga, serio:

- Meu lado irmão diria que não, pois você é uma amiga que não seria digna de uma atitude tão machista, que é tê-la apenas por uma noite. Porém, sou homem, não irei negar, então é esse lado que prevalece agora. Sim Della, eu a teria, talvez não apenas uma única noite, mas sim varias.

 Della balançou com a cabeça em sinal de positivo e acenou, voltando ao quarto. Chegando perto do espelho, deu uma risada baixa para seu reflexo, havia lhe agradado muito a resposta de Jacob. Esse era o problema: ela havia gostado.

 


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