Na manhã seguinte, Tuana levantou com uma dor de cabeça chatinha. Ela tinha passado boa parte da noite acordada, e agora ia pra escola fazer uma prova de matemática. Não sabia como iria realizar essa façanha, mas não tinha outra opção.

 Ela se arrumou e foi para a cozinha. Sua mãe estava sozinha lá preparando uma torrada. Tuana viu um copo de suco em cima da mesa, pegou e bebeu.

- Era meu, sabia? – Dona Ana disse.

- Uhum. – Tuana indagou ainda com suco na boca.

- Não vai comer nada?

 Tuana balançou a cabeça em negativa.

- Aproveitando que seu pai não está aqui hoje né.

- Graças a Deus. Uma folga pra mim. – Tuana disse e saiu em direção a porta.

 Caminhando para a escola, ela só conseguia pensar no dia anterior. Queria ver se aqueles dois teriam a cara de pau de falar com ela. Tuana tinha tentado entender o motivo de estar tão chateada. E resolveu que era porque Brenda não podia ter ficado com Victor, porque ele era ex de Tuana. Isso era uma traição grande. Amigas não ficam com ex das outras amigas. Era tipo uma regra do mundo. Não era?

 Nem percebeu que tinha chegado a escola, quando se deparou com Victor parado na frente dela. Tuana o encarou durante alguns segundos e passou por ele em direção à sala. Victor foi atrás. Puxou a bolsa de Tuana e a fez virar pra ele. Quando ia falar, uma voz falou por trás deles:

- Acho que você puxou a bolsa da minha namorada. Sem querer, claro. – Felipe disse encarando Victor.

 Victor virou e olhou pra ele. Depois olhou novamente na direção de Tuana.

- Claro. Sem querer. – Ele disse e caminhou para a sala de aula.

 Felipe já ia perguntar o que tinha sido aquilo, mas Tuana não tava com cabeça pra explicar nada naquele momento. Principalmente sobre aquele assunto.

- Ele só veio perguntar se eu estava pronta pra prova. – Ela disse puxou Felipe para sala.

 Assim que entrou, viu suas amigas e foi sentar junto delas. Mas percebeu que Brenda estava lá, e assim que viu Tuana, ela se virou pronta pra falar alguma coisa. Então Tuana resolveu sentar na frente, longe das amigas e ao lado de Felipe.

- Resolveu mudar de lugar hoje? – Felipe perguntou e sorriu. Tuana deu um leve sorriso em retribuição.

 Gabriel e Jéssica estranharam o comportamento de Tuana.

- A gente fez alguma coisa? – Jéssica perguntou, estranhando Tuana ter sentado lá na frente sem nem falar com elas.

 Camila já estava um pouco tensa porque sabia o que estava acontecendo. Ela olhou pra Brenda e percebeu que a menina também estava tensa. As duas não tinham falado sobre o que tinha acontecido no dia anterior. Camila não sabia o que responder para Jéssica, então se esquivou.

- Eu vou ao banheiro, volto já. – Ela disse e saiu.

 Tuana viu Camila sair da sala. Ficou olhando por um minuto e pensando. Então foi atrás dela. As duas se encontraram no banheiro.

- Como você ainda pode falar com ela? – Tuana perguntou.

 Camila entendeu que ela falava de Brenda.

- Tuana...  – Camila não sabia o que dizer. Não queria brigar com nenhuma de suas amigas.

- Tudo bem. – Tuana disse.  – Isso não tem nada a ver com você.

 Camila ficou calada só olhando pra amiga.

- Eu passei a noite toda acordada pensando naquilo que a gente viu ontem. Eu ainda to confusa.

- Confusa... como? – Camila franziu a testa.

- Como assim como? – Tuana disse fazendo cara de óbvio. – Brenda + Victor = O que danado eles pensam que estão fazendo?! Totalmente errado! Aqueles dois não pensaram nas consequências. Sem noção!

 Camila começou a estranhar a reação de Tuana. Não parecia que ela estava apenas chateada, parecia que ela estava...

- Tuana. – Camila falou cautelosa. – Sabe, o que Brenda ficar com o Victor, tipo, sem contar a você... Tudo bem, foi errado, ela é sua amiga e ele seu ex-namorado... Mas você não está exagerando um pouco?

- Exagerando? Como assim? Eles não podiam ter ficado. Isso é contra as regras!

- Regras? – Camila perguntou sem entender.

- É! Você sabe...

- Tuana, eu acho que você está com ciúmes.

 Tuana olhou pra Camila com uma expressão de quem viu um fantasma.

- Você está louca, Camila. – Ela disse.

- Olha sua reação! Isso não é normal. – Camila disse. - Victor é solteiro. E Brenda também. Realmente não lá o fim do mundo eles se curtirem.

- Você está contra mim?

- O quê? – Camila indagou.

 Tuana fechou os olhos e respirou fundo. Talvez ela estivesse mesmo exagerando. Talvez Camila estivesse com razão. Aqueles dois são livres, podem fazer o que quiserem. Mas não mudava o fato de terem traído Tuana de alguma forma. Ela ainda não conseguia aceitar isso. Abriu os olhos quando ouviu o sinal tocar. A aula ia começar. Camila ainda olhava pra amiga.

- Tudo bem. – Tuana disse. – Eu ainda não aceito. Mas também não posso fazer nada, né!

- Tuana, você não tem que aceitar nada. Mas isso é ciúme, você precisa admitir.

- Admitir o que? Eu não estou com ciúmes e acabou.

 As duas saíram do banheiro e deram de cara com Felipe no corredor. Ele tinha uma expressão desconfiada no rosto.

- Ciúme de quem? – Ele perguntou.

 Um longo silêncio, até que Camila pensou rápido.

- De mim. – Ela disse.

 Felipe olhou dela para Tuana e franziu a testa. Camila praguejou baixinho e voltou a falar.

- É que eu tava contando a ela que eu conheci um carinha. Aí ela ficou toda contra, e eu tava dizendo que isso era ciúme porque ela fica pensando que eu vou deixar todos vocês de lado.

 Felipe ainda não tinha se convencido, mas acenou com a cabeça. Os três foram para a sala. Quando entram, todos já estavam arrumando as cadeiras para fazer a tão temida prova de matemática. Cada um foi pro seu lugar. E prova começou.

 Tuana olhava para as questões a sua frente e conseguia resolver. Foi assim a prova inteira. Ela não queria admitir, mas graças a Victor ela tinha esperança de tirar uma boa nota. Terminou de fazer a prova e passou tudo a limpo. Foi a primeira terminar a prova e saiu da sala.

 Ela foi sentar num banquinho em baixo de algumas árvores. Como não sabia quanto tempo ia esperar até alguém mais sair, colocou um fone de ouvido e ficou lá ouvindo suas músicas. Já tinham se passado quase 1 hora quando alguém sentou ao lado dela e puxou seu fone.

- Como foi a prova? – Victor perguntou.

 Tuana olhou pra ele com raiva por ele ter puxado seu fone. Depois virou o rosto sem responder a pergunta dele. Victor era um cara paciente, então só ficou sentado lá, esperando até que ela desistisse de ignorá-lo. Isso não aconteceu. Tuana recolocou o fone e continuou calada, com se ele nem estivesse ali. Ela queria que ele fosse embora e a deixasse sozinha. Se Felipe aparecesse ali, provavelmente ia fazer intriga. Então ela pegou sua bolsa e começou a se levantar pra ir a outro lugar. Mas Victor perdeu a paciência e a puxou de volta para o banco.

- Você já pode me dizer o que está acontecendo. – Ele falou com a voz séria.

 Tuana o encarou um pouco chocada. Mas dessa vez não ficou calada.

- Ah, você não sabe? – Ela disse ironicamente. – Por que não pergunta pra sua namorada?

- Eu não tenho namorada. – Victor falou ainda sério. Ele não ia mais entrar nos joguinhos de Tuana, seja qual fosse.

- Não foi isso que vi ontem. Ah, e Camila também pode dizer.

- Tuana! – Victor agarrou o pulso dela. – Para de brincadeira e fala o motivo real de você estar agindo assim.

- Me solta Victor. – Tuana falou baixo, mas com raiva na voz.

- Não enquanto você não falar comigo.

- Eu não tenho nada pra falar. Você está louco. Você é que sabe da sua vida.

- Ah, agora eu que sei da minha vida? – Victor indagou. – Porque parece que você está se intrometendo nela.

- Que eu me lembre foi você quem queria fazer parte da minha vida, não eu da sua.

- Realmente. E você aceitou que eu fizesse. Como amigo, lembra?

 Tuana se irritou e não conseguiu deixar de falar:

- Isso não implicava em ficar com as minhas amigas! – Ela não gritava, mas falava alto.

Victor franziu a testa.

- Desculpa esfarrapada! – Ele disse. – Por que você não fala a verdade?

- Essa é a verdade , seu idiota!

- Você está com ciúmes! – Victor falou.

- Você ficou louco. – Tuana estava agitada. Ela queria sair dali, mas Victor ainda segurava seus pulsos e ela não conseguia soltar.

- É claro que está. Eu poderia até ficar feliz com isso, mas você está agindo como uma egoísta.

- Eu não estou com ciúmes, você está enxergando coisa onde não tem. Me solta!

- Vamos ver se eu entendi: Você seguiu com a sua vida, mas não pode me ver seguindo com a minha? É isso, Tuana?

 Tuana queria gritar pra ele deixar ela em paz, mas não podia fazer isso ali na escola. Ela tentava puxar as mãos, mas Victor não largava. E o pior era que aquilo que ele estava dizendo dela, ela achava que era verdade. Camila tinha dito que ela estava com ciúmes, e agora ele dizia a mesma coisa. E ela começou a pensar que realmente estava sendo egoísta. Mas não iria ceder tão facilmente.

- Pode dizer o que quiser, Victor. Mas o que vocês fizeram foi errado. Totalmente errado!

- Errado? Errado só na sua cabecinha. – Ele disse enquanto soltava as mãos dela e tocava um dedo na testa dela.

 Tuana recuou afastando a mão dele. Ela massageou seus pulsos. Victor tinha apertado com força, tinha ficado marca.

- Brenda é uma garota legal, uma boa amiga. E é solteira, como eu. Se eu estou afim dela ou não, é problema meu. Ok, não era pra você ter visto aquilo ontem. A gente ia falar com você depois. Mas também não era pra pedir sua permissão, creio eu. Era por um questão de respeito a nós três. Por nossas relações.

Tuana pegou sua bolsa novamente e levantou-se. Encarou Victor de pé.

- Respeito? Sério?  – Ela disse. – Vocês mal se conhecem e já estão se pegando. Desde quando? Desde o primeiro dia? Vai saber, né.

 Ela caminhou para ir embora. Victor se levantou do banco e foi atrás dela. Tuana acelerou o passo, mas ele passou na frente dela e a parou.

- Tuana. Eu não queria, mas eu preciso seguir com minha vida. Sem você. – Victor falou quase num sussurro, olhando bem nos olhos da garota.

 Tuana queria desviar o olhar, mas não conseguia. Seu coração acelerou com a proximidade dele. Ela estava confusa com tudo o que estava acontecendo. Não sabia por que estava sentindo aquilo, ciúmes. Não deveria. Estava preocupada no que isso poderia dar. Ela acabaria brigando com Felipe de novo. E não queria de jeito nenhum que isso acontecesse.

- Eu sei que já disse isso, mas realmente é difícil deixar você seguir sua vida com outro cara.

 Tuana não conseguia processar tudo. Estava com... pena de Vitor. Ela via naquelas palavras como ele realmente sofria. E isso fazia o coração dela doer.

- O que sinto por você... – Victor falou. – Parece que nunca vai acabar.

 Tuana não ia aguentar ouvir mais nada. Ela fechou os olhos por uns segundos e se afastou dele.

- Eu não quero fazer você sofrer. – Ela disse sem olhar pra ele. – Como você fez comigo.

 Depois disso ela saiu dali deixando-o sozinho. Victor fechou os olhos e chutou uma lata de lixo que estava ali perto. Depois voltou, sentou-se no banco e ficou lá.

 Tuana passou e pelo portão da escola e começou a correr em direção a sua casa. Não quis mais esperar por ninguém. Sua cabeça doía e ela estava confusa demais. Ela praguejava, resmungava e rezava ao mesmo tempo, pedindo para que sua vida deixasse de ser tão complicada. Pedindo pra conseguir viver em paz com seu namorado. Sem nada nem ninguém para atrapalhar.

 Ela chegou em casa e foi logo para o quarto. Deitou na cama e ficou olhando para o teto. Passaram-se vários e vários minutos. Tuana sentiu o celular vibrar. Era Felipe. Ela respirou fundo, suspirou e atendeu.

- Amor. – Felipe disse. – Você já está em casa?

- Sim.

- Por que não esperou?

 A cabeça de Tuana latejava. Ela passou as mãos na têmpora.

- Eu estava com dor de cabeça. Queria deitar.

 Silêncio.

- Ah, entendi. – Felipe falou.

- É.

- Escuta, Gabriel tava falando aqui com a gente sobre uma coisa legal. O pai dele ganhou um final de semana em um chalé. Mas ele não pode ir. Então ele disse que Gabriel podia chamar alguns amigos e ficar lá no lugar dele.

- Ah. – Tuana não ficou animada.

- Sabe, ele chamou a gente, claro. – Felipe disse o óbvio.  – É nesse fim de semana.

- Ah, legal.

 Felipe ficou calado um minuto. Estava estranhando a reação da namorada.

- Você está bem? – Ele perguntou.

- Sim. Só a dor de cabeça mesmo.

- Ok. Eu vou deixar você descansar. Ah, como foi a prova?

- Boa.

Mais alguns segundos de silêncio

- Fala com a sua mãe sobre o chalé. Depois eu passo aí... Ou te ligo pra explicar melhor.

- Certo.

- Tuana. Vai ser bom esse fim de semana. Podemos relaxar. Ficar juntos...

 Tuana absorveu aquelas palavras, tentando imaginar como seria bom. Sim, seria. Mas ela ainda não conseguia ficar animada.

- É, vai ser bom. – Ela disse.

- Tudo bem. – Felipe disse. – Eu te amo, Tuana.

- Eu sei. Eu também te amo.

 E desligou.