Monarchy Of Roses escrita por cakew


Capítulo 2
Embriaguez.




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            Os dois corriam de mãos dadas pelo exterior do castelo. Não havia a necessidade de pressa, apenas corriam por diversão. Riram e pararam ofegantes sob a sombra emitida pela macieira. Estava quase amanhecendo e o céu adquiria lentamente uma coloração alaranjada.

            - Acha que consegue subir? – perguntou William enquanto sorria, em seguida deu uma mordida na espiga de milho que carregava em sua mão esquerda.

            Snow White não o respondeu. Desprendeu-se da mão suada de William e pegou a barra de seu vestido enquanto olhava com determinação para seu galho favorito daquela macieira. Ela escalou a árvore em um tempo menor do que havia esperado, acomodou-se no galho e lançou um sorriso para William.

            - Sim, duque, acho que consigo subir. – finalmente respondeu o rapaz, que segundos depois se juntou a ela no topo da árvore, também sem maiores dificuldades.

            Ele deu outra grande mordida em sua espiga, e em seguida ofereceu um pedaço a Snow. A rainha olhou para o alimento com hesitação.

            - Não tenha medo, sou eu, William. – assegurou, e em seguida acrescentou: - E Ravenna está morta. Você a matou com a bravura que poucos teriam. Estamos todos a salvo agora.

            Um meio sorriso brotou nos lábios de Snow White, mas ela ainda assim sentia uma injustificável insegurança.

            - Todos hesitariam se passassem pelo mesmo que você, mas olhe – ele mordeu novamente a espiga – é seguro.

            Ela então cedeu e mordeu a espiga. Nada além do doce gosto e a crocante textura do milho.

            - Parece tolice insistir tanto para um ato tão pequeno assim, mas quero que confie em mim novamente. Quero poder oferecer-lhe uma maçã sem que você tema.

            Snow White riu suavemente.

            - Não temerei, desde que você de fato entregue-me a maçã. Lembra-se de quando simulava que a entregaria e depois a mordia?

            - Sim, - William riu com a lembrança – eu me lembro.

            Os ventos vindos do norte tornavam o clima frio, mas as camadas de roupas e o álcool ingerido mais cedo naquela noite deixavam os dois jovens aquecidos.

            - Veja, William, está quase amanhecendo. – notou Snow. – Acho que nunca permaneci acordada por tanto tempo.

            - Eu já. – disse William com um tom de lamentação – Mas as circunstâncias eram outras, assim como os sentimentos que passavam por mim. Espero nunca mais passar por isto novamente.

            Snow White estava intrigada e curiosa, então não pôde evitar perguntar o motivo pelo qual William manteve-se acordado da forma como havia citado.

            - Foi durante a noite em que Ravenna tomou o castelo, e não consegui lhe resgatar a tempo. Orei a noite toda para que ela não lhe causasse algum mal, e tentei ao máximo bloquear os pensamentos ruins que insistiam em me assombrar. Foi terrível, e vivi sob incertezas durante esta década que se passou. Não sabe como descansei e ganhei paz no momento em que te reconheci em meio aquela batalha que tivemos na floresta semanas atrás.

            Snow White sorriu serenamente e colocou sua mão sobre a de William, transmitindo-lhe paz. Há poucos instantes ele a assegurava de que tudo estava bem, agora era a vez dela de retribuir o favor. Os dois contemplaram o nascer do sol em silêncio, e viram aos poucos tudo ao redor se clarear. O céu estava parcialmente limpo, dando brecha para que o sol os aquecesse no topo da árvore. Os dois se entreolharam e sorriram. William sentia seu coração em um ritmo até então desconhecido, e Snow White sentia uma entorpecente e deliciosa mistura de alegria e cansaço. Ela desejava poder guardar aquele momento para o resto de sua vida. Inconscientemente, sabia que guardaria - de alguma forma.

            William parecia aproximar-se dela lentamente, mas repentinamente, Snow lembrou-se de algo, o que fez o duque congelar na posição em que estava.

            - Oh, Eric! – ela retirou sua mão que permanecia sobre a de William e desceu rapidamente da árvore.

            O duque não compreendia o que estava acontecendo, apenas a seguiu e deixou sua espiga de milho cair sobre o gramado.

            Snow White andava rápido, e dirigiu-se diretamente ao salão onde a festa havia acontecido. A música havia parado, o ambiente estava compreensivelmente sujo, e dois homens localizados próximos a um barril de vinho riam estrondosamente. Snow vislumbrou um garotinho encolhido em um canto, e quando se aproximou dos senhores, viu que um deles era Eric.

            O outro homem percebeu que a Alteza estava vindo em sua direção, então deu um soco na região do estômago de Eric para que ele endireitasse sua postura. Eric soltou uma risadinha enquanto tentava manter-se sério. O senhor tentou reverenciar a rainha, e apenas não caiu no chão pois Eric o segurou a tempo.

             - Céus! Desculpe-me, Eric! Deveria ter lhe mostrado seu aposento antes de virmos para a festa. – ela aproximou-se dele com um imenso sentimento de culpa e compaixão dentro de si. Eric estava tão embriagado quanto o homem ao seu lado. – Qual é o seu nome, senhor? – dirigiu-se ao homem.

            - Benjamin, Majestade.

            - Benjamin, sabe me dizer em qual vilarejo vive?

            - Falconworth.

            - É bem próximo. – Snow White disse virando-se para William. – William, poderia, por favor, levar este homem até sua casa? Mande que preparem uma charrete e o entregue em segurança.

            William assentiu, mas Benjamin protestou:

            - Alteza, vim até aqui com minha carroça e posso perfeitamente voltar sozinho para casa. – disse Benjamin, enquanto curvava-se para pegar o garoto que estava no chão, mas Snow White o impediu.

            - Benjamin, você não está em condições de carregar uma criança ou guiar-se sozinho para casa. Deixe que William leve esse garoto e o guie em seu caminho de volta. Prezo pela segurança de meu povo, principalmente daqueles que lutaram junto a mim.

            - Certo, certo, vosso desejo é uma ordem, Alteza. – cedeu Benjamin, tentando novamente executar uma reverência, e novamente falhando.

            William pegou a criança, – que aparentemente vivia um sono profundo no momento – e guiou Benjamin até a porta principal do castelo. Enquanto isso, Snow White passou o braço direito de Eric envolta de seus ombros, entrelaçando seus dedos nos dele para assegurar-se de que ele não cairia durante o trajeto. Era considerável a diferença de texturas entre a pele dos dois: Snow White tinha pequenos dedos, lisos e macios, já os de Eric eram grandes, robustos, ásperos e levemente calejados, porém eram quentes, o que fez a rainha sentir-se, de certa forma, confortável.

            - Olhe só para você, tão forte e mal se aguenta. – disse Snow enquanto soltava um sorriso de piedade.

            - E olhe só para você, tão pequena, mas mesmo assim consegue me carregar. – disse ele enquanto deitava sua cabeça sobre o ombro da rainha. – Eu deveria me envergonhar dessa cena?

            - Não. Não podemos controlar nossos atos quando estamos sob o efeito do álcool. Mas de qualquer forma, não se preocupe, não há ninguém olhando. Sei como os homens gostam de manter sua imagem máscula. – os membros de Snow White estremeciam, certamente por conta do peso que estava carregando. – Além do mais, pode-se atribuir a culpa disso a mim. Se tivesse mostrado o seu atual aposento, você poderia ter se recolhido mais cedo.

            - Que horas são? – perguntou Eric atordoado.

            - Não sei lhe informar com exatidão, mas o sol já nasceu.

            - Bom, então eu não poderia me recolher mais cedo do que isto.

            Snow White riu.

            - Vejo que a bebida apenas incentiva o seu bom humor. Bem como você disse a mim: “Nada como o álcool para matar as tristezas e incentivar as alegrias.” – eles chegaram ao pé da grande escadaria. – Agora subiremos as escadas, Eric, então precisarei que me ajude, ou cairemos e nos machucaremos.

            - Eu irei te proteger, Majestade.

            Snow White não compreendeu o propósito do comentário de Eric, mas ele a ajudou da forma como ela havia solicitado, e os dois se saíram bem sucedidos no maior desafio imposto pelo trajeto.

            Após vencerem a escada, andaram por um longo corredor, e entraram na última porta deste. Era um aposento simples, se comparado ao aposento real, mas não deixava de ter uma enorme cama, uma penteadeira com ouro entalhado ao redor do espelho, um guarda roupas baixo, uma cadeira posicionada em um canto e numerosos elementos decorativos.

            Snow White levou Eric até a cama, e se desequilibrou enquanto ele desprendia-se dela para deitar-se, mas rapidamente conseguiu estabilizar seus pés no chão.

            - Não durma, irei chamar Greta para que ela prepare a cama e troque os seus trajes. – Snow White se afastava da cama quando Eric prendeu sua mão no pulso dela.

            - Não, não vá. Você pode fazer isso por ela. – Snow enrubesceu com o pedido de Eric, mesmo sabendo que as palavras dele estavam fora de controle e saindo de forma quase aleatória.

            - Não se preocupe, nos veremos amanhã... Digo, hoje mais tarde. – ela desprendeu-se dele delicadamente – Caso seu inevitável mal estar após ingerir tanta bebida permita, é claro. – com um doce sorriso, ela deixou o aposento, e ele a acompanhou com o olhar até que não pudesse mais vê-la. Segundos depois, acabou adormecendo.

            Snow White não sabia onde procurar por Greta, e não sabia se a encontraria acordada. Irritou-se por também não ter mostrado a ela suas novas instalações dentro do castelo, e mentalmente notou que, de todos que convidou para morarem ali, os anões foram os únicos que tiveram a chance de conhecerem suas novas instalações antes de irem festejar. 

            Primeiramente, olhou no aposento real, e felizmente lá estava Greta, sentada em uma poltrona próxima a penteadeira. Quando viu Snow White aproximar-se, Greta se levantou.

            - Oh, Greta, ainda bem que lhe encontrei rapidamente. Desculpe-me por não ter lhe avisado acerca de seu aposento no castelo, foi um enorme erro meu. Espero não ter lhe privado muito tempo de sono.

            - Não se preocupe, Majestade. Mantive-me bem entretida enquanto permaneci aqui. Arrumei sua cama e separei suas vestes para hoje. – ela finalizou com um sorriso.

            - Obrigada, Greta. Preciso que me faça um favor, Eric está no último quarto deste corredor, quero que faça a cama dele e auxilie-o a trocar de roupa. Há vestes e roupas de cama novas nas gavetas do armário. – Snow White pensou por uns instantes para certificar-se de que não estava esquecendo-se de nada. – Caso ele esteja dormindo, apenas coloque um lençol sobre seu corpo para que não passe frio e feche as cortinas para que o sol não o incomode. – acrescentou.

            - Sim, Majestade. – assentiu Greta com um gesto de cabeça, e virou-se para ir atender Eric.

            - Ah, Greta! – chamou Snow White antes que a dama saísse do quarto. – Não é necessário que volte aqui para me ajudar a trocar de roupa. Seu aposento é o próximo a esquerda do meu, imagino o tamanho de seu cansaço, portanto estará liberada assim que auxiliar Eric. Vejo que o dia de hoje será ensolarado, então quero que me desperte antes que o sol fique a pino.

            - Sim, Majestade. – Greta assentiu novamente, e desta vez saiu.

            Snow White suspirou e procurou nas gavetas de seu guarda-roupa algo para vestir. Encontrou uma camisola branca que posicionou sobre a cama, tirou seu vestido e sentiu-se verdadeiramente leve quando vestiu a camisola. Fechou as cortinas para bloquear os feixes de luz que invadiam o local e em seguida foi deitar-se.

            Ela pensou que seu sono seria imediato, mas não conseguia parar de pensar nos pequenos erros que havia cometido durante a noite. Eram de fato coisas tolas que foram facilmente consertadas, mas ela se perguntava se de alguma forma isto não lhe era um sinal. Um sinal de que talvez ela não fosse capaz de tomar conta de algo tão grandioso como um reino.

            Era uma insegurança um tanto injustificável, levando em consideração o que ela havia conquistado na última semana que se passou. Mas inexplicavelmente ela sentia-se fraca. Não sabia se tinha conhecimentos e poder suficiente para administrar sabiamente seu povo. Não sabia se iria conseguir deixar todos satisfeitos o tempo todo, e não sabia como faria tudo funcionar bem sem a ajuda de alguém, afinal ninguém poderia ajudá-la a governar um reino, pois ela era a rainha, e consequentemente era a única responsável por tal atividade.

            Antes de ir para a grande batalha ela se preparou. Rapidamente, mas treinou antes de atacar e colocar suas táticas em prática. Além disso, ela tinha centenas de pessoas ao seu lado. É verdade que teve de confrontar Ravenna sozinha, mas haviam vários outros ao seu redor evitando que a situação se tornasse pior.

            Ela se perguntava se havia perdido muitos ensinamentos durante os anos que permaneceu isolada do mundo. Afinal, as demais princesas passavam toda sua juventude preparando-se para a grande responsabilidade que assumiriam quando seus pais não pudessem mais exercer o poder. Mas Snow White não vivenciou isto. Ela perdeu seus pais precocemente, de tal forma teve pouquíssimas chances de aprender a lidar com a monarquia. O isolamento retirou dela grandes lições que seriam extremamente valiosas agora.

            De forma alguma ela se arrependia de ter derrotado Ravenna, mas apenas desejava que as coisas fossem diferentes. Desejava que sua mãe não tivesse adoecido fatalmente tão cedo, e desejava que seu pai não tivesse sentido tanto encantamento e compaixão por Ravenna quando a viu. Isto pouparia muito a todos.

            Coberta de insegurança e incerteza, Snow White começou a chorar o mais silenciosamente que pode. Não queria que alguém a escutasse, pois assim sua fraqueza ficaria clara. No momento ela não precisava de consolos, mas precisava aprender a ser forte sozinha.

            A jovem rainha chorou silenciosamente até que pegasse no sono, e deixou que seus doces sonhos ensolarados a acalmassem e dissessem a ela que tudo daria certo e que ela seria capaz de suportar da melhor forma possível o que lhe aguardava. Os sonhos mostraram-na que ela havia sido a garota de aparência mais frágil, mas espírito mais forte que existiu nesta última década, e que o futuro não seria capaz de trazer algo que ela não pudesse aguentar de corpo firme, mente sã e cabeça erguida.


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