De repente me vi andando pela praça principal. Estava anoitecendo, ‘’Amanhã um menino e uma menina estariam em cima de um palco para os Jogos Vorazes’’ – Pensei. – ‘’Como eu aguentaria ver alguém que amo nos Jogos? Ou como eu aguentaria lá dentro? ‘’ – Cocei os olhos e passei a mão no meu rosto. Decidi ir para casa e ver a reprise dos escolhidos nos outros distritos antes do meu. Quem seria o infeliz de juntar-se aos Jogos?

                    Assim que cheguei em casa vi minha família reunida, todos com expressões tristes. Emocionavam-se com tudo aquilo, meu irmão mais novo era o mais forte, nunca o vi chorando por besteira ou pelos jogos. E então me sentei numa cadeira e comecei a ouvir a narração dos escolhidos dos distritos 1,2,3 e 4.

                     Uma menina loira, cara de boneca e bem feita chamada Glimmer do distrito 1 e um garoto que também se voluntariou. Marvel. Do distrito 2 uma garota baixinha com cara ameaçadora, pelo que ouvi se chama Clove, do mesmo distrito um garoto que se chama Cato que se voluntariou como se fosse uma honra. Uma garota com cara esquisita do 3 e o garoto aparentando 13 anos. E do 4 uma menina com cara de peixe e o menino tinha cabelos encaracolados e ruivos. Os azarados que irão para os Jogos são eles.

                    Amanhã seria a reprise do meu distrito. Decidi que era hora de dormir, atravessei a sala e saí de lá, enfiei a cara no travesseiro e tentei dormir. Até parece.

                     Em questão de segundos, pelo menos para mim, minha mãe me acordara. Eu abri os olhos e vi-a com o rosto vermelho me chamando para colocar minha roupa. Peguei a roupa que minha mãe havia comprado há alguns anos atrás. Um vestido amarelo bem fraquinho que ia até o joelho com uma saia rodada e uma fita no pescoço, uma sapatilha que pertencia a minha avó e prendi meu cabelo num coque. Já estavam todos prontos, nesse dia é raro ouvir a voz de alguém, mas dessa vez meu pai disse:

                    – Boa sorte minha filha – Me deu um abraço e me beijou no rosto – Boa sorte meu filho – Disse para meu irmão mais velho – Vamos meu filhinho. – Disse para meu irmão mais novo, sabia que nunca participaria dos jogos por conta das pernas, porém nunca iria andar novamente. Em seguida minha mãe fez sinal para que fossemos a praça principal.

                     Enquanto eu andava via as famílias nos acompanhando, outras se despedindo e chorando. Era o dia mais triste do ano. A praça estava irreconhecível: toda arrumada com um palco enorme, dois telões á frente. Em cima do palco tinha três cadeiras e em cima delas o símbolo da capital e do distrito 5. Fui caminhando direto para as inscrições, a funcionária da Capital furou meu dedo e meu nome apareceu no dispositivo. Quatro vezes dentro da bola gigante. Depois vi meus pais e meu irmãozinho atrás da faixa que seprava os pais dos filhos. Fui para as fileiras de crianças que fica em ordem dos mais novos aos mais velhos e na penúltima fileira estava meu irmão. Com uma cara de paz.

                     E assim se inicia todo aquele ritual dos Jogos: Eles passam o filme dos dias obscuros e começam a falar, depois passa o hino da capital e assim enchem as bolas de vidro com todos os papéis. O presidente do distrito senta na cadeira do meio, do lado esquerdo fica nosso mentor, Rodney. Dizem todos que ele já foi muito inteligente, mas os jogos lhe transformou num verdadeiro agressivo e desconfiado, contam-nos que na vila dos vitoriosos os outros 3 que moram lá dopam ele para que fique dormindo a noite e a manhã toda. Uma mulher da capital, obviamente, já que é a única com uma pele dourada, cílios gigantes e um vestido verde cheios de babados e quinquilharias diversas pelo corpo começou a falar com aquele sotaque estranho da capital:

                 – Bom dia, bom dia distrito 5 – Disse ela com uma risada irritante – Vocês tem esperado um ano por esse dia tão maravilhoso, estão preparados? A 74ª edição dos Jogos vorazes está aberta. E que a sorte esteja sempre á seu favor – Disse ela com um sorriso prateado e mais uma vez com sua risada irritante – Primeiro as damas – Cantarolou e foi indo a grande bola de vidro, remexeu bem e retirou um papel foi até o microfone e disse bem alto: Meu nome...

                 Ela disse meu nome. Disse meu nome e sorriu. Eu não pude acreditar. Não era verdade. Eu não posso ir. Minhas pernas se mexeram automaticamente para o corredor de pessoas e foi andando em direção ao palco. Estava praticamente cega e tonta não conseguia ouvir ninguém tudo estava muito sem sentido. E pela primeira vez senti um medo. Não dos Jogos, ou dos tributos e suas caras ameaçadoras, não dos idealizadores dos jogos ou de Panem. Mas medo pelos meus pais, pelo meu irmãozinho, até mesmo pelo meu irmão mais velho. Que ficou me observando com uma cara que parecia que ia vomitar. A mulher da capital então repetiu :

                –Vamos, Vamos garota. Preciso anunciar seu par – Deu de novo aquela risada, tive vontade de dar um soco e ver todos aqueles dentes prateados caindo pelo palco. Fiquei de frente á multidão me encarando com um olhar triste. E então ela anunciou o tributo masculino ele subiu ao palco normalmente tentando não transparecer seu medo. Ele era pardo, cabelo preto e uma cara de carência. Estava abalado, suas tentativas de parecer corajoso falharam. E assim a mulher voltou a anunciar:

               – Palmas, palmas para eles – Ela sorriu – Nosso par de tributos desse ano – Ela olhou para nós dois e continuou – Que a sorte esteja sempre a favor de vocês dois.

                Vi todos saindo e correndo para abraçar pais, irmãos, amigos, mas dessa vez estava vendo minha família de longe. Senti mãos me segurando pelo ombro me levando á ma escadaria. Pacificadores cercavam o caminho e vi atrás de mim o garoto olhando para o chão sem saber onde estava. Entrei no edifício da justiça e me colocaram em um quarto e eu repeti para mim mesma:

                  –Sou um Tributo.