Sonho

Ela estava sentada à minha frente, nessa mesma cadeira de onde escrevo essas linhas. Distraidamente via alguma coisa no computador, sem notar que toda minha atenção estava há tempos voltada apenas a ela.

Em algum momento, não mais resisti à tentação de tocar-lhe os curtos fios negros e brilhosos que graciosamente escondiam sua nuca. Ela fez algum movimento pelo susto de meu toque, mas pareceu não se importar com minha singela carícia, e continuou o que fazia, comentando algo que estava vendo no computador, embora fosse fato que seu corpo estivesse visivelmente tenso.

Eu sorri encantada e me levantei, colocando-me de pés atrás dela. Apoiei meu queixo sobre a cabeça dela, fingindo algum interesse pelo que estava na tela desse computador, quando minha atenção estava toda voltada na verdade para o doce perfume que se desprendia dos cabelos dela, um perfume tão inebriante que me tirava da realidade e gentilmente destruía minha sanidade.

Quando dei por mim, meus lábios já se encontravam no pescoço dela, sentindo o como ela era macia, sentindo a calidez da pele dela, beijando-a suavemente, repleta de devoção, como se ela fosse o mais sagrado dos ídolos e a mim fosse proibido macular-lhe de qualquer forma.

E nem a vergonha e o medo de ela tomar-me por ousada fez com que eu deixasse de beijar o alvo e frágil pescoço.

Ao notar que ela não iria definitivamente me repelir, afastei-me e a virei para mim. A encarei profundamente nos olhos, como se neles estivesse as respostas para minhas dúvidas e as soluções para minhas aflições.

Não havia nada disso nos olhos dela.

Havia apenas gentileza, havia apenas a doçura que há anos havia conquistado meu coração. E com a brandura que a tornava tão provocante aos meus olhos e sentidos, ela tocou minha face em um suave carinho, em uma leveza que apenas ela poderia ter.

Eu tremi.

Fechei meus olhos e deixei com que meus lábios tocassem os dela, pela primeira vez. Um beijo, singelo e superficial, um simples encostar de bocas, que para mim significava muito mais. Significava uma existência toda, significava uma infindável e profunda felicidade.

Significava a realização de um sonho.

Mas é após os mais doces sonhos que se fazem os mais cruéis despertares, pois é de devastar um coração repleto de amor abrir os olhos e descobrir-se sozinha em uma cama fria.