É complicado explicar! escrita por Mrs Choi


Capítulo 5
Capítulo 5




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Quando estava quase no horário do almoço eu fui para o estacionamento esperar pela Jhenna, peguei meu celular e vi que tinha duas ligações do Rob, retornei para ele antes que pire.

            - Oi, Rob meu amor, como está? Sinto sua falta. Estava em reunião.

            - Ah! Oi meu amor, também sinto sua falta, estou numa correria danada aqui. Estamos com uma obra atrasada e temo que tenhamos que traçar uma estratégia se o pessoal não conseguir colocar a obra em dia com a meta. Pra ajudar, o Alan ficou doente e me deixou sozinho aqui. O telefone não para, eu não paro, além disso, liguei porque a Andy me ligou pedindo para se encontrar com ela no almoço, mas eu não vou conseguir fazer nada durante essa semana. Ela disse algo a ver com lembranças e cores e mais um monte de coisas que não entendi e não pude ouvir muito bem. Teria a bondade de ligar para ela, por favor? Eu já a avisei que essa semana não terá como resolver nada.

            - Olha, tudo bem, vou tentar ligar para ela. Agora vou me encontrar com Jhenna para entregar mais um convite, se possível dois.

            - Obrigado minha linda. Tenho que desligar. Eu te amo muito.

            - Eu também meu amor.

Felizmente Jhenna chegou quando colocava o celular na bolsa e foi longo cantando pneu.

            - Jhenna, você bebeu? – Quando entro sinto o cheiro de álcool - Uhrg! Você bebeu! Sai daí, eu vou dirigir.    

            - Bebi só um pouco Sam, larga de ser chata. Eu sabia que você iria pegar a direção e aí não ia parar para tomarmos algum drinks, então passei num bar antes.

            - Põe o cinto. E vou passar numa lanchonete pra pegar um café pra você pra cortar esse álcool.

Na lanchonete, pedi para que Jhenna buscasse algo pra comer e beber enquanto olho na lista quem seria o próximo a ser convidado: Drake. Tudo que lembro era que morava no subúrbio não muito afastado. Sei que é o lado oposto da escola de dança. Ele me acompanha depois da aula para ele ir para casa e eu dançar e nos separávamos quando chegava na pracinha.

Jhenna chega com os lanches e entra no carro já reclamando.

            - Ai que dor de cabeça Sam, o efeito do álcool está passando.

            - Isso é que dá por beber logo cedo. Comprou um café?

            - Comprei, mas não estou muito a fim de beber, o gosto fica estranho depois do álcool.

            - Pode tomar tudinho!  Vamos passar na casa do Drake.

            - Acho que vou ficar aqui no banco de trás e descansar um pouquinho.

            - Ah não! Não vai me deixar na mão logo agora. Temos que ir e você vai dormir? Como eu te levo de volta pra casa? Tenho que trabalhar depois.

            - Relaxa Sam, eu pego um taxi e você vai de carro pro trabalho.

            - Droga! Não acredito que isso está acontecendo comigo.

Dirigi uns dez minutos passando pela cidade e indo em direção ao subúrbio, olhei pra trás e Jhenna já estava apagada. Vi a escola de dança e tomei nota de dar uma passada lá pra ver se a professora ainda está dando aula. A essa altura deve ter deixado de dançar e ficado na recepção ou deixado pra outra pessoa tomar conta para ela. Passei por mais duas ruas, virei à esquina e logo vi a pracinha, subi outra rua à direita, paro no sinal e me questiono: Pra onde eu vou? Não lembro se é pra esquerda ou direita. Droga! Tenho menos de um minuto pra pensar antes do sinal abrir. Tudo que sei é que Drake mora na mesma rua de uma loja de doces antiga. Ele sempre comprava um chiclete de menta que eu adorava. O sinal abriu. Virei à esquerda e ainda bem que encontrei a loja de doces, agora tenho que achar a casa dele. Bom, parei em frente à loja e resolvi parar para perguntar, se ele era cliente frequente é provável que os donos o conheçam. Olhei pra trás e Jhenna estava ainda adormecida e provavelmente num sono muito pesado, nem se mexeu quando o carro parou. Vou deixá-la aqui, acho que nada vai acontecer com ela. Quando entrei na loja o cheiro doce impregnou minhas narinas, imediatamente tive uma sensação de infância novamente. Olhei em volta e vi tudo tão doce e tão colorido, me acabaria ali se estivesse em outras épocas. Vi no balcão uma moça jovem e aparentemente recém-saída do ensino médio, é provável que não esteja aqui há muito tempo, de qualquer forma resolvi arriscar. A moça abriu um sorriso para mim e me atendeu como se fosse um dos dias mais felizes.

            - Boa tarde, bem vinda a loja da Vovó Doçura. Em que posso ajudá-la?

            - Boa tarde, bom, eu gostaria de uma informação.

            - Se eu puder ajudá-la.

            - Procuro por uma pessoa que mora por aqui perto, o nome dele é Drake. Não sei se o conhece, mas ele tem a minha idade mais ou menos e há alguns anos atrás ele tinha o hábito de passar por aqui todos os dias para comprar doces e ainda não sei se ele tem o mesmo hábito.

            - Bom, não tenho muita certeza, mas é melhor eu falar com a vovó, ela é a dona da loja, e pela idade, ela não tem ficado muito tempo mais na loja. – E foi para uma sala nos fundos da loja. Deu pra ver que tinha um sofá de costas e uma televisão que estava passando desenhos. A moça conversa com a vovó que vem a passos lentos com um sorriso no rosto.

            - Olá, sou a dona da loja, está procurando por Drake? Drake Blackwhell?

            - Sim, ele mesmo. – Vi minhas esperanças aumentarem. – Sabe onde ele mora? Eu era colega de escola no ensino médio, e queria vir visitá-lo. Há alguns anos que não o vejo e só lembro que ele passava por aqui antes de ir para a escola levar uns doces pra mim e minhas amigas.

O rosto dela ficou sério e ficou calada como se esperasse que eu falasse mais algo, até que por fim ela me disse.

            - Segue até o final da rua, tem uma casa de dois andares com uma escada externa na esquina. Ele morava no andar de cima com a mãe e o irmão mais velho, lá poderá procurar por Carmem, é a mãe dele, ela mora em cima.

Voltei para o carro e vi Jhenna ainda apagada, liguei o carro e segui as instruções dela, quando cheguei procurei pela mãe dele no andar de cima. Quem me atendeu parecia um esqueleto andando, só consegui identificar que era mulher por estar de vestido, que por sinal estava muito largo. Estava tão magra que deduzi que estivesse doente, não é possível que uma pessoa seja tão magra assim. Usava um lenço na cabeça e não tinha cor, estava muito pálida e andava como se fosse por obrigação e não por vontade.

            - Pois não? – Mulher me atendeu na porta.

            - A senhora é a Carmem, mãe do Drake?

            - Sim, a senhora procurar pelo meu filho? Infelizmente não poderá mais ter contato com ele.

            - O que houve senhora?

            - Entre, desculpe pela casa, não tenho tido forças para cuidar, e o meu filho mais novo é um inútil para higiene da casa.

Sentei-me à mesa da cozinha, ela me ofereceu um café e recusei, achei melhor não arriscar, pra uma pessoa que mal consegue andar, talvez não tenha forças pra fazer um café. Ela se sentou do outro lado da mesa com as mãos tão finas a mostra e começou a contar:

            - Quando o viu pela ultima vez?

            - Bom, na verdade foi há uns dois anos ou três. Estava a passeio na casa dos meus pais e o encontrei num bar com uns amigos. Peguei seu numero e telefone e na volta pra casa eu perdi minha agenda então nunca mais tivemos contato.

            - Que bom minha filha, o Drake sempre foi muito de sair e cheio de amigos, todos eles gostavam do Drake. Sempre muito prestativo e na escola sempre passava na loja de doces para comprar pra suas amigas da escola.

            - É verdade, ele me enchia de doces e nem podia comer. – Era uma época que estava emagrecendo.

            - Naquela época o pai dele ganhava bem e sempre dava uns trocados para ele gastar na escola. Quando terminou o ensino médio, ele ia para faculdade de Nealle, na mesma época eu descobri que meu marido me traía e iria morar com outra família. Guardei esse segredo dos meus filhos o quanto pude, até que quando o Drake perguntou pelo pai num feriado prolongado que ele passou aqui conosco então eu contei tudo a ele, mas ele desconfiava, viu que eu não era mais a mesma, vivia triste e deprimida. Depois que os contei, me senti mais a vontade pra chorar e expor minha tristeza, isso preocupou demais o Drake. O irmão mais velho se envolveu com drogas e sumiu sem deixar notícias e o mais novo se sentiu muito abandonado. Ele decidiu trancar a faculdade e voltar, ficou seis meses comigo, cuidou do irmão mais novo e tomou conta da casa até e estar bem de novo aí voltou a estudar e se formou em administração.

            - Sim, eu soube que ele se formou, uma vez ele me ligou.

- Ele tinha um emprego bom em Vineyard quando soubemos da morte do irmão. Não pagou a dívida para os traficantes. Pode achar estranho ouvir uma mãe falar isso, mas foi bom assim. O mais novo não seria influenciado e não nos deu mais trabalho. Estava enganada. Há três anos descobri um câncer que nos consumiu todo o dinheiro. Já não podia mais trabalhar, o mais novo, Brandon, se envolveu o mesmo traficante e também passou usar drogas. Todo dinheiro que seria para o meu tratamento foi para o tratamento dele. Ele se safou dessa a tempo, mas Drake, bem, na penúltima tentativa de levar Brandon para casa de uma festa que foi escondido, Drake foi atropelado num racha que tem na rodovia onde o pessoal faz as festas. O coitado ficou três meses hospitalizado, entrou em coma depois de dois meses deram morte cerebral. Fará um ano daqui a dois meses que ele se foi. Desde então parei com o tratamento, sem dinheiro, sobrevivo da ajuda dos vizinhos e quando o pai se lembra do Brandon, ele envia algo para dizer que ainda existe ou algo assim. Brandon é um pouco rebelde, mas é um bom filho, não faz o mesmo que Drake fazia, mas trabalha às vezes.

- Não sabia que isso tinha acontecido com ele. Sinto muito, muito mesmo pela senhora.

- É triste, eu sei, mas tudo o que quero agora é esperar pela morte e poder encontrar meu filho lá. Quando isso acontecer Brandon já estará maior de idade e poderá tomar conta de si facilmente. Avisei ao pai dele para vir buscá-lo depois, mas duvido que ele se ofereça a isso, Brandon mal se lembra do rosto dele.

- Olha, me desculpe por tudo. Agora tenho que ir. Preciso voltar ao trabalho.

- Tudo bem, obrigada pela visita. Você deve ter sido muito amiga do Drake né? A propósito, qual o seu nome?

- Ah, me desculpe, eu sou a Sam, Samantha Cooper.

            - Samantha Cooper? Esse nome não me é estranho. Ah sim, lembro agora. Drake era seu namorado na escola.

            - Namorado? Não, nós nunca namoramos, ele era só meu amigo.

            - Ah, me desculpe então. Ele falava tanto de você e que iria te pedir em casamento, que imaginei que já estivesse namorando. Pelo visto então você era o amor platônico dele.

            - É, talvez eu seja. Me desculpa mesmo, agora tenho que ir.

No carro Jhenna estava ouvindo um som, sentada no banco da frente com os cabelos emaranhados e com a cara inchada com um rapaz em pé do lado de fora do carro.

            - E aí moça, vai também um teco?

            - Não obrigada, to de boa.

            - Fala sério gata, essa é da boa! – Vira pra Jenna – Vai também gatinha?

            - Brigadão mesmo, mas tô já na moral. Deixa pra próxima.

            - Heim, acho que sei quem você é. É o irmão do Drake!

Devo tê-lo assustando, ele saiu correndo e virou a rua. Não entendi o porquê, só pode ter pesado a consciência.

            - E aí? Entregou o convite ao Drake? – Jhenna ajeita o cabelo.

            - Nem te conto. – Digo pegando a chave do carro.

No caminho de volta contei a ela sobre o Drake e inclusive do amor platônico que nutria por mim. Jhenna como sempre, parecia mais indiferente do que surpresa.

            - Sam, você é uma anta mesmo.

            - Ah, valeu por me elogiar logo. O que perdi?

            - Drake sempre gostou de você. Todos percebiam isso. Porque acha que ele te levava doces todos os dias?

            - Ele não me levava doces, você também ganhava com sua irmã.

            - Você é patética mesmo. Nós ganhávamos porque estávamos por perto, ele queria ter uma desculpa para estar por perto. O objetivo dele sempre foi você. Todos nós sabíamos disso. Só não comentamos por achar que você sabia e que estava só sendo educada com ele. Agora me leva pra casa, quero me preparar para noite e você vem também.

            - Pra onde? Não vou sair. Tenho que trabalhar amanhã cedo. Mark e eu vamos conferir uma pilha de papéis juntos essa semana.

            - Que programa a dois sem graça heim? Vão tomar um drinque como as pessoas normais fazem juntos.

            - Jhenna, esqueceu que vim para trabalhar...

            -... E entregar os convites também. – ela finaliza minha frase.

            - Olha, vou começar agora depois do almoço, se eu não sair tarde, eu vou sim.

            - Beleza! Vou pegar mais um pouco de sol.

            - Sua pele não estava cansada de sol?

            - Sim, mas quero estar com cara de que passei férias no Havaí ou Espanha quando voltar.

Depois dela me deixa na empresa, volto ao trabalho e quando chego à minha sala fico pensando sobre o que a mãe do Drake havia me dito. Não creio que passei tanto tempo sem perceber que ele me amava. E se eu tivesse ficado com ele, será que ele não teria morrido? E se estivéssemos namorando, talvez eu tivesse ajudado seu irmão. São tantos e se. Ligo o computador e abro meus e-mails e vejo um monte do Jim, Kurt e alguns do Rob pra dizer que tirou um tempinho pra dizer que me ama. Andy também mandou. Ih caramba, a Andy, me esqueci dela completamente. Tem uns cinco dela pedindo confirmação de uns serviços e para ligar pra ela urgente. Logo peguei o telefone e liguei pro seu escritório, a secretária encaminha para sala dela de imediato.

            - Oi Andy, sou eu Sam.

            - Sam, estava louca a sua procura, Robert me disse que essa semana estaria indisponível me atender e me pediu para te procurar. Necessito que aprove o que te mandei por e-mail.

Fiquei mais de vinte minutos com ela no telefone conversando sobre o casamento, nem acredito que por um dia havia me esquecido dele.  Fiquei analisando: Não tenho pensado muito nele e pouco tenho me preocupado com os preparativos. Será não estou tão empolgada em aprovar esses serviços? Não estou com paciência para escolher esse monte de coisas.

Comecei a olhar para as fotos e vi tudo tão igual, nada que pudesse ser o meu estilo não gostei das decorações, das flores, dos enfeites... nada! Não estou no meu dia bom de escolha. Fechei o e-mail e decidi escolher mais tarde. Levantei da cadeira e comecei a andar pela sala pensando sobre trabalhar com Mark. Ficar ao lado dele o dia todo não é bom, mas que escolha eu tive? Greg não é a pessoa apropriada a isso, não tenho mais ninguém que conheça os relatórios que eu confio. Não confio no Mark de qualquer forma, mas ele junto comigo vai ser melhor para verificar que eu não estou mentindo. Céus, como sofri por ele na adolescência. Ele foi o meu primeiro amor. Tínhamos tantos planos. Bom, eu tinha planos com ele, ele me usou, fez de mim um brinquedo. Tudo que quero agora é terminar logo com isso e ir embora e voltar aos braços do meu querido Robert e me casar com ele sentir seu cheiro de Pacco Rabani... Droga, droga, droga! Robert não usa perfume, ele é alérgico! Porque estou pensando nisso? No seu cheiro, seu corpo perfeito no terno, no seu sorriso, aquele olhar...

            - Estou interrompendo alguma coisa? – Mark coloca a mão no bolso e vem á minha direção.

            - Ãhm? Não, nada, eu só... Bom, vamos começar então. Poderia trazer as pastas até minha sala? – Me afasto dele. Ai, como ele cheira bem.

            - Porque não fazemos isso na minha sala? Temos mais espaço e... – Se aproxima mais de mim. - ...conforto.

Concentra, concentra. – Nã, não é preciso. Estou bem instalada aqui. – Ele tá querendo jogar na minha cara a diferença de salas? Se ele soubesse como é realmente a minha...

            - Sabe que lá não precisamos fazer pausas para ir ao banheiro ou beber alguma coisa. Também tenho alguns lanchinhos se preferir. Solta seu sorriso malicioso e se aproxima ainda mais, consigo sentir a sua respiração no meu rosto.

            - Porque..., porque você está sendo assim? – Me afasto dele pra reorganizar meus pensamentos. Ele é bem alto. Como seria seu abraço no meu corpo? Será que me cobriria toda e...

            - Assim como? – Diz enrugando a testa. Ele só pode fingir não saber.

            - Assim, bem, ah! Esquece! Vamos até a sua sala. – Saio em disparada pela porta andando firmemente, mas ainda sentindo seu cheiro atrás. Preferi sair logo antes que meus pensamentos ficassem confusos.

Assim que cheguei a sua sala, a caixa com todos os documentos estava posta em sua estante de livros. Imaginei que estivesse ali desde a última vez que vim. É claro que ele não pegou sequer nos relatórios para dar uma lida. Acredito que deve ter esperado por mim para começar. Imediatamente peguei a pesada caixa e a levei para cima da mesa. Com um baque fiz a mesa estremecer e comecei retirando tudo de dentro da caixa começando pelo relatório dos fluxos de caixa e sentei-me na sua confortável cadeira.

            -Toma – Entreguei o segundo relatório. Leia este aqui.

Ele deu a volta na mesa pegou o relatório e ficou me olhando com ele na mão. Logo baixei a cabeça e fingi começar a ler até conseguir me concentrar para que não iniciar a conversa e mostrar que eu estava ali para trabalhar. Felizmente ele entendeu a minha intenção e suspirando sentou-se em sua cadeira enorme e começou a passar os olhos pelas folhas como se tentasse encontrar uma forma de saber por onde começar.

Finalmente passamos o restante da tarde lendo em silêncio e concentrados. Ele pouco parou de ler, somente para beber água me oferecendo educadamente e atendendo algumas ligações.

            - Nossa, estou quebrado! – Diz enquanto se alongava na cadeira. – Não aguento mais olhar para esses números. Consegui terminar esta pasta e não encontrei nada. Estou morrendo de fome. Vamos parar para comer alguma coisa. Estou com as vistas doendo e não consigo mais ler as coisas na mesma linha. Toda hora imagino que está errado e forço as vistas e vejo que não estou lendo alinhado.

            - Tudo bem, vamos parar por hoje. – Olho para o relógio e vejo que já havia acabado o expediente. Quando olho para fora, vejo o sol ao longe e a sala ficando bem escura. – Amanhã a gente continua lendo o restante. Preciso fazer alguns cálculos nesta pasta. Começo amanhã bem cedo. – Fui me levantando e alongando. Peguei meus sapatos que estavam debaixo da cadeira e comecei a calçá-los. Enquanto afivelava-os nos pés, olhei para cima e o vi me observando.

            - O que foi?

            - Não, nada. Só estou te olhando.

            - E contemplando a moça que a fez sofrer na adolescência?

            - Olha Sam...

            - Não, olha você. Já esqueci, superei. Era adolescente e frágil. Não precisa vir com aquelas conversas de que era jovem, inconsequente e imaturo. Já sei de tudo isso. Cansei! Cresci, me formei, estou noiva e mudei. Amadureci e estou aqui para trabalhar. Bom, já vou indo. – Peguei a minha bolsa e levantei da cadeira em direção a porta. Porém algo de errado aconteceu. Não sei o que houve exatamente. Só sei que por um momento estava em pé e no outro, estava bambeando e indo em direção ao chão. Tropecei nos meus próprios pés e já estava pronta a dar de cara no chão quando ele me pegou pela cintura e girando o meu corpo e com o meu desequilíbrio fez com que eu caísse em cima dele amortecendo a minha queda. Ficamos cara a cara podendo sentir a respiração e a pulsação dos nossos corações. Nossa, ele é tão quente, firme, e forte. Realmente tem um corpo atlético. Deu pra sentir que ainda está em boa forma, não senti saliência em sua barriga. Mas de perto vi que o cabelo é mais sedoso que aparentava e sua barba estava tão bem feita, senti o cheiro da loção pós-barba. Seu rosto se tornou másculo com o passar do tempo e todo aquele traço de adolescente ficou para trás, inclusive sendo mais bonito que antigamente. Senti minhas pernas nas dele duras e definidas sob a calça social. Nem posso acreditar que ficava a aula de educação física admirando as pernas dele naquela época, imagino que devem estar bem mais bonitas agora.

            - Me desculpa. Eu não sei o que houve pra cair desse jeito.

            - Pra dizer a verdade, era isso que estava querendo dizer. Você calçou os sapatos com pés trocados. Por isso você caiu.

Ai caramba! Não acredito que dei todo aquele sermão nele pensando que iria se desculpar e me dizer que estava arrependido. Senti que fiquei muito vermelha, as bochechas queimaram de vergonha. Ai, agora que morrer e me enterrar!

            - Por essa eu não esperava. – Foi tudo o que consegui dizer ajeitando meus óculos.

            - Sam?

            - Que foi?

            - Você ainda está em cima de mim.

            - Ai. Perdão. Nossa. – Me levantei o mais rápido que pude. Sem querer me apoiei segurando em seus braços e senti seus músculos do bíceps contraídos sob minhas mãos. Como deveria ser a sua pegada? Creio que deve segurar muito bem e facilmente uma mulher no colo.

Mark me ajudou a me sentar na cadeira novamente e desta vez pegou o meu pé delicadamente e foi desafivelando os meus calçados.

            - Você faz isso sempre?

            - Sempre o que?

            - Calçar os sapatos com os pés trocados?

            - Na verdade não, eu estava... estava com pressa de ir embora.

            - Não aparentava estar apressada. – Delicadamente colocou o meu pé no chão e pegou o outro.

            - Não demonstro.

            - Tudo bem. Você é bem esperta. Não é o tipo de pessoa que trocaria os pares.

            - Já disse que estava com pressa.

            - Então não está mais.

            - Ainda estou.

            - Até agora pouco você estava bem focada ao trabalho e não parecia querer ir embora logo.

            - Bom, não tinha percebido a hora. Além disso, Jhenna e eu vamos sair. – Acredito que a essa altura, não deve ter aguentado me esperar e foi sozinha.

            - Okay. Agora está livre para ir. – E colocou o outro pé no chão.

            - Certo. Vou indo então. – Me levantei e desta vez tomei o cuidado de andar firmemente para ter certeza que não cairia novamente. Fui em direção a porta, coloquei a mão na maçaneta e Mark me chamou.

            - Samantha.

            - Sim? – Virei pensando que talvez ele chegasse mais perto de mim. Ele continuou onde estava e apontou para o lado da cadeira no chão.

            - A sua bolsa.

            - Ah sim. É mesmo. – Voltei mais vermelha ainda deixando os cabelos caírem para cobrir o meu rosto, peguei a minha bolsa e saí o mais rápido que pude.

Fui andando pela empresa e estavam apagando quase todas as luzes, caminhando pelo corredor e vi que havia algumas pessoas da manutenção e limpeza na empresa ainda. Todos do escritório devem ter ido embora. Melhor assim. Não gostaria que alguém criasse coisas na cabeça. Fui em direção a área externa da empresa e quando estava quase chegando a portaria, avistei uma figura pequena andando a passos apressados nas suas pernas curtas na mesma direção que eu estava. Sua silhueta estava começando a ficar visível e me dei conta que era aquela baixinha falante como um rádio vindo em minha direção. Qual era o nome dela mesmo? Mona, Tônia, Donna... Dona! Isso mesmo! Donna Stevens. Pronto! Lá vem o falatório. Como me esconder dela? Olhei para os lados e vi que não tinha muito para onde me esconder, de qualquer forma não teria mais jeito, já que ela deve ter me visto há muito tempo. Fiquei parada esperando ela chegar e não me pergunte por que eu parei, só sei que esperava que ela viesse me dizer alguma coisa já que o que não falta nela é assunto.

            - Oi senhorita Cooper! Por aqui a esta hora. Trabalhou até tarde?

            - Sim, preciso terminar de averiguar o relatório o quanto antes para voltar pra matriz, se necessário, terei de ficar até tarde para não passar de uma semana.

            - Ahm sim, é mesmo. – Diz como se estivesse pensando – Bem, como está o andamento do trabalho?

            - Indo.

            - Acha que conseguirá para esta semana? Não é muita coisa?

            - Bom, é sim, mas eu tenho ajuda.

            - Entendo, acredito que é a do Mark, né?

            - Sim, mas como sabe?

            - Bom, não é difícil saber. Ele é o gerente além de ser o responsável por aqui. E, bom... você é bonita.

            - O que isso tem a ver com minha beleza?

            - Sabe, Mark é bonitão, cheiroso, sarado... – Acha que eu não sei disso? Tive a oportunidade de comprovar hoje - e todas as garotas vão atrás dele. Ele nem faz tanto esforço assim, mas você foi a que não correu atrás dele e acredito que está aproveitando para se testar.

            - Me testar... sei, e como seria isso?

            - Ah, pra ele, você é um desafio.

            - Mas ele sabe que estou para me casar.

            - Acha que ele se importa com isso? Senhorita Cooper, você é a caça para ele, ele é o caçador. Enquanto você não virar presa, ele estará fazendo de tudo para tê-la. Ainda mais que você ficará uma semana, com diz, o desafio será maior para ele.

            - Entendo...

            - De qualquer forma, tome cuidado. Caso contrário, seu futuro casamento estará comprometido.

            - Vou me lembrar disso. Obrigada.

            - De nada. – De novo ela me dá um daqueles sorrisos de propaganda de pasta de dente. Ela é feliz demais para ser verdade.

            - Bom, eu já vou indo. Tenho um gato para alimentar. Eu te disse que tenho um gato agora? Bom esse gato agora é muito preguiçoso, não quer saber de andar, e isso significa que pelo menos eu não ficarei mais sozinha, lembra que te contei que o meu gato me deixou? Bom, não importa. O meu gato agora se chama Charles. Charles é o nome do meu personagem favorito do melhor livro que já li. Você se lembra do livro “A chave Mágica”?

            - Eu é...

            - Esse livro é maravilhoso. Precisa ler. Então, o meu gato é muito gordo e um dia eu estava vendo televisão e no meu momento de choradeira me lembrando do dia que meu ex-marido me deixou, ele apareceu. Como a chave mágica do livro. Foi por isso que eu pus o nome dele de Charles. E aí ele está comigo desde ontem e agora sei que este vai me fazer companhia por um bom tempo. – Finalmente ela pausa e olha para o relógio. – Minha nossa, eu tenho que ir, o Charles está me esperando, está na hora de alimentá-lo. Ele está ficando tão gordinho, tá uma gracinha. Eu já vou indo. Até mais senhorita Cooper, te vejo amanhã.

            - Até logo. – Foi tudo o que disse para não dar mais assunto.

Deixei a pequena silhueta sumir de novo e me dei conta que não tinha ligado para Jhenna me buscar. Não vim de carro e deixei a doida levá-lo. Depois de ter cochilado no carro o efeito do álcool deve ter passado. Peguei meu celular pra alguém em casa vir me pegar e o encontrei desligado, tentei ligá-lo, mas desligou de novo. Acabou a bateria. Droga! Decidi voltar pra empresa pra usar o telefone. Quando retornei, estava tudo escuro, iluminado somente pelas luzes de emergência, provavelmente o pessoal da manutenção e limpeza saíram. Com a iluminação fraca ficou mais difícil encontrar um telefone mais próximo. Se minha sala não fosse tão longe eu ligaria em dois tempos. Passei pela entrada e virei para ir até a recepção passei a mão sobre a mesa e senti o grampeador, mas não senti o telefone. Minhas vistas estavam começando a se adaptar a pouca luz e então avistei uma mesa com telefone. Apressei os passos até lá e quando estava chegando alguém sai do corredor e recebo uma trombada na minha lateral e caio em cima da mesa.

            - Ui! Droga! Será que não olha por onde anda?

            - Me desculpe, mas não esperava encontrar você por aqui. Você não disse que estava com pressa?

            - E estou sim.

            - Não parece. A propósito, você está linda sentada na mesa.

            - Eu já estou indo, tá bom? – E desço imediatamente indo em direção à saída. – Hoje tenho uma farra para ir. – Bom, é tomar uns drinks com a Jhenna, mas ele precisa saber?

Andei até a portaria novamente e percebi que vou ter que andar e até um ponto de táxi mais próximo. Passei pelo porteiro e cheguei na calçada e olhei para os dois lados. Deserto. Comecei a andar e decidi apressar os passos, não queria correr o risco de ser assaltada. Dobrei a esquina e a rua também estava deserta. Todas as casas estavam com as luzes acesas, mas ninguém estava na rua. Senti umas luzes em minha direção e percebi que estavam chegando mais perto. Gelei. Ouvi o barulho do motor e o meu coração começou a disparar. Fiquei doida e sabia que não queria parecer uma neurótica correndo quando seria somente um carro passando, mas não queria correr o risco de ficar andando tranquilamente e correr o risco de ser sequestrada. Decidi continuar a andar e fui apertando os passos. O carro foi chegando e ouvi que a velocidade estava diminuindo, foi aí que pensei que a morte estava chegando, meu corpo sentiu o tal frio na espinha que todos dizem e o sangue esfriou. Aumentei a velocidade dos meus passos, mas senti o carro se preparando para ficar ao meu lado. Corro ou não corro. Corro ou não corro.

            - Ei!

Eu vou correr.

            - Samantha!

Olhei para trás, o vidro estava descendo e olhei quem estava no carro. Mark. Acredite, fiquei paralisada. Na verdade foi mais por saber que não ia morrer mais.

            - Não é bom uma moça andar sozinha na rua. Entra aí, te levo pra casa.

Jesus! Que alívio! Quero dizer, o Mark não é a opção que esperava, porém não quero correr o risco de morrer logo tenho tantas coisas a fazer, fiquei feliz por saber que estava segura. Aí me lembrei do que a Donna falante disse.

            - Não, obrigada. Vou pra casa sozinha.

            - Samantha. Não vai bancar a durona agora. Entra que eu te levo.

            - Não. Prefiro ficar sozinha.

            - Nessa rua? Sabe que todo o seu trajeto não terá companhia a não ser da sua sombra. Quer correr o risco de sequestro ou roubo? Acha que vou fazer alguma coisa?

            - Bem...

            - Ah tá.  Eu sou aquele cafajeste que você me disse mais cedo, é, eu me lembro disso.

            - Eu... estive com a Donna e...

            - Donna? – Ele gargalha tanto que tenho a impressão que ele ter visto um programa de comédia. Nunca o vi com uma risada tão profunda, gostosa e sacárstica. – Samantha, Donna é uma pessoa abandonada pelo marido, é claro que ela vai fantasiar coisas sobre mim, ela é doida por mim.

            - Não é não. Ela é bem segura de si e...

            - Acredite em mim, ela e está com ciúmes de você. Ela acha que você é concorrência.

            - Concorrência?

            - Claro todas aquelas mulheres da empresa estão na fila por mim. Não que eu não me ache...

            - Sei, nem um pouco.

            - Mas é sério. Não sei o que elas têm na cabeça, eu não dou bola para elas. Bom, se quiser acreditar ou não, fique a vontade. Não vou discutir com você, além do mais você é noiva e eu sou solteiro. Não preciso dar satisfação a ninguém.


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