Sob a Luz do Sol escrita por Tatiana Mareto


Capítulo 23
Capítulo 22 - Redenção




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*tema: Westlife’s Butterfly Kisses*

Era a terceira noite que eu passava no covil, desde o meu retorno ao ‘lar’. As coisas não estavam saindo como eu esperava, e talvez a dignidade que eu pretendia não me fosse garantida. Blasfemei contra Rudolph por me tirar o direito a uma das poucas coisas que eu parecia ter condições de fazer. Agir corretamente. Entrar no covil me deu uma sensação de claustrofobia. Eu já havia me adaptado plenamente ao sol, e meus olhos quase não conseguiram enxergar nada até chegar à iluminação artificial. A temperatura úmida me causou asco, e tudo ali me causava irritação. Eu estava sensível além das possibilidades, e ninguém percebia aquilo. Estar na presença de pessoas que não me compreendiam, que não podiam simplesmente ler-me…

Eu estava plenamente adaptada a Edward e aos Cullen. Qualquer mudança me consumiria muito esforço e tempo.

A primeira noite foi de agonia. A segunda também. A terceira seria inútil, pois eu parecia não ter a menor intenção de adormecer. O bebê chutava, e com toda força que ele tinha. Ele se mexia sem parar, e deixava claro que ele também estava insatisfeito. Eu sentia tantas dores a cada vez que ele me acertava um órgão; mais de uma vez eu expeli sangue por minha boca. Ele estava me causando mal, então. Por um lado era vantajoso que Edward não me pudesse ver naquele estado… ele ficaria aborrecido. Eu não contava a ninguém sobre as dores, eu simplesmente não falava com ninguém desde a minha chegada. Rudolph me isolou em alguma área privada, que eu supus ser a quarentena, e somente Felicia tinha acesso a mim. Além dela, dois outros híbridos… Jasmine e Ferdinand. Ora, ele seria meu futuro companheiro. Rudolph ainda idealizava que aquilo pudesse acontecer.

Sentada na cama que me era destinada, eu tentava me concentrar na leitura mórbida de Shakespeare. Todos sempre morriam… principalmente os amantes. Por que Shakespeare tinha tanta predileção em matar os amantes de forma tão trágica! Virava as páginas de Otelo com desalento e sem o menor interesse na leitura da mesma coisa que já lera tantas vezes atrás. Eu sabia que a noite passava e eu não conseguia adormecer. Os híbridos não contabilizavam noites e dias; era tudo sempre escuro demais.
_Bea… – Felicia entrou nos meus aposentos e eu acuei-me no canto da cama. Eu estava irritadiça e não me sentia segura na presença de ninguém. – Ainda acordada? Precisa de alguma coisa?
_Tenho fome. – Eu disse, pretendendo relaxar. Felicia se aproximou querendo examinar-me. Ela me examinava constantemente para saber a hora certa do nascimento do bebê, pois segundo ela seria em breve. Felicia cuidava das híbridas prenhes, praticamente de todas elas. Ela sabia o que estava fazendo, eu devia confiar.
_Quer que eu busque um copo de sangue? Você…
_Estou com fome, Felicia. – Emburrei. Teimosia era uma qualidade tão interessante… Edward sempre me dizia que eu era teimosa. Eu não sabia direito, não entendia a característica. Precisei aprender o que era ser teimosa. E ele tinha razão, eu o era. – Quero comida, alimento humano. Aprendi a me satisfazer com isso… e o bebê me consome muitas energias. O sangue daqui é desagradável demais para me abrir o apetite.
_Seu vocabulário está incompreensível. – Felicia ponderou, tocando meu ventre. Qualquer toque que não fosse o de Edward me deixava ainda mais aborrecida. – E não temos comida aqui.
_Eu sei. E meu vocabulário não está incompreensível, é que vocês são obtusos demais. – Puxei a vestimenta a fim de cobrir meu corpo, deixando claro que não queria mais ser tocada. – Então não preciso de nada, obrigada.
_Seu bebê é para logo. – Ela sorriu, mas eu não parecia feliz. Ela nem tinha entendido que eu a estava ofendendo. Tentando, ao menos. – Talvez amanhã…
_Quanto antes ele nascer, antes eu desapareço.
_Vai mesmo desafiar Rudolph? – Felicia se sentou, e eu pude notar que ela não estava zangada pela minha insolência. Ela estava curiosa, talvez muito curiosa sobre como eu teria conseguido encontrar tanta coragem dentro de mim. Eu detestava desapontá-la, mas nem mesmo eu sabia como.
_Não vou desafiá-lo. Felicia, você sabe o que é estar apaixonada? Você já sentiu isso? Você sabe como o organismo responde a esse sentimento? – Ela nada respondeu. Eu imaginei que a resposta fosse positiva, porque ela pareceu demonstrar empatia ao meu discurso. – Eu estou cansada de afirmar a mesma coisa uma vez atrás da outra, sem parar. Sinceramente? Estou cansada. – Fechei o livro, fazendo um ruído abafado. – Eu não quero mais conversar.

Felicia não pareceu tentada a deixar-me, mas ela percebeu que eu não me demoveria da minha decisão quando deitei de lado e virei-me de costas para ela. Respirando com muita dificuldade, permaneci naquela posição até que ela levantou-se e caminhou até a porta. Mas a sorte não estava exatamente do meu lado, e uma música sonora e bastante estridente preencheu o quarto antes que Felicia saísse. E então ela não mais sairia, até saber de onde vinha a música. Sentei-me na cama, contrariada, lábios retorcidos, blasfemando entre os dentes. Remexi a bolsa que estava ao chão, próxima da cama, e retirei um pequeno artefato eletrônico. A música ficou mais alta até que eu a fiz cessar.
_Alice. – Eu suspirei entre os dentes, imaginando o que levaria a minha irmã vampira a ligar-me.
_Bea, como você está? Diga que está bem, eu estou vendo tudo tão confuso…
_Eu estou bem, Alice… por que ligou-me? O combinado não era que eu ligaria todo dia?
_Mas Bea, eu vi… o bebê, ele nasce amanhã. Cedo.
_Felicia examinou-me e disse a mesma coisa – E quando Alice falava, tudo se tornava verdade. Real, palpável. E eu estava então mais ansiosa do que era permitido estar. – Mas ligou-me só para dizer-me que meu filho está para nascer?
_Sim… quero dizer, não. Estão todos irritados comigo, mas eu preciso falar! Edward… ele deixou a casa.
_O que? – Meus dedos comprimiram o pequeno aparelho quase a ponto de quebrá-lo. Se eu não ouvisse um estalo em minha mão, o equipamento teria se tornado pó. – O que quer dizer com ele deixou a casa?
_Ele saiu… na verdade, ele nos reuniu hoje à tarde para compartilhar sua idéia. Afinal…
_Não existem segredos entre os Cullen. – Eu completei a frase.
_Isso! – Alice parecia vivaz, e eu podia vê-la batendo palmas em euforia com nossa conversa. Como sempre, ela deveria estar radiante. – Então, ele nos contou… que pretendia encontrar-se com você. No covil.
_Edward está vindo para o covil? – Falei aquilo alto demais, e Felicia arregalou os olhos em surpresa. Ela fechou imediatamente a porta atrás de si, e se aproximou de mim para ouvir melhor a conversa. – Ele só pode ter perdido o juízo.
_Também acho, porque eu disse a ele tudo que vai acontecer… mas ele passou um dia deitado do lado de fora… depois decidiu levantar-se e trancou-se em seu quarto… hoje, que pensamos que ele sairia para caçar, trouxe essa idéia absurda. Ele nem saiu para caçar, espero que encontre algum animal pelo caminho. Bea, você precisa recebê-lo aí… você sabe como Edward é rápido… e ele está de carro.
_Agora, Alice? – Desespero fez meus dedos pressionarem ainda mais fortemente o aparelho.
_Não, com o amanhecer. Bea, você vai ficar bem, viu? Felicia sabe o que fazer… confie nela. Vou desligar agora, tente dormir.

Alice desligou o telefone, e eu encarei Felicia com alguma culpa nos olhos. Claro que eu me sentia ligeiramente culpada, afinal eu também estava trapaceando. Quando Alice nos trouxe para o covil, ela sorrateiramente entregou-me um telefone. “Fique com ele. Nossos números estão na agenda. Ligue, ligue todo dia. Por favor, mantenha contato.” foram as palavras da pequena Cullen, antes de desaparecer com o Volvo prateado de Edward. Eu guardei o artefato metálico eletrônico comigo, e fiz uso dele por duas vezes. Meus dedos quiseram ligar para Edward, mas eu acabei por ligar para Alice. Eu não tinha coragem de falar com Edward, porque ouvir a sua voz poderia colocar em risco todos os meus planos. Eu não queria arriscar-me a me deixar seduzir por sua voz, e pedir que ele me viesse buscar. E aquilo fatalmente ocorreria, então decidi ser mais preservativa.

_O que houve? – Felicia me encarou, a porta aberta. – Edward… ele está vindo buscar-te?
_Não. – Era verdade. Eu achava que sim, eu esperava que ele estivesse apenas fora de si, não louco por completo. – Ele vem me ver.
_Beatrice…
_Felicia, por favor. Você não vai contar isso a ninguém…
_Não pretendo. Só causaria mais confusão, e o bebê está para nascer. Tenho outras prioridades. – Ela virou-se novamente para a porta, e saiu do quarto apagando a luz. Escuridão total, então. – Durma, Bea.

Meus olhos não estavam mais acostumados à escuridão total. Eu nunca apagava as luzes, mas eu não queria levantar-me para acendê-las novamente. Edward… eu só pensava no que Alice dizia. Ele viria para o covil, ele estava mais perto a cada instante. Eu me senti agoniada, como se o ar me faltasse. Como eu faria para sair dali e encontrá-lo? O que ele faria ao chegar ao covil? Poderia ele ser insano o suficiente para desafiar Rudolph contra a minha vontade? Eram tantas perguntas sem resposta… pensar em Edward me fez relaxar, e meu organismo lentamente foi sucumbindo ao cansaço de duas noites sem dormir. Fechei os olhos – apesar de aquilo ser completamente inútil – e deixei que o lado inconsciente dominasse o restante.

Os sonhos eram violentos. Eu sonhava com sangue, e o cheiro me nauseava. Sonhava com Rudolph suspendendo Edward do solo, sonhava com o sorriso angelical de Ferdinand, com Emmett desmembrando Connor, com os Cullen, com Felicia. Eu sonhava com tudo de bom e ruim na minha existência, ao mesmo tempo. E todos os acontecimentos tinham menos de um ano de vida. Era como se eu não tivesse existido por tantas décadas; como se tudo que eu fora se tivesse apagado pela luz do que eu era naquele momento. A nova Beatrice era alguém; a antiga Beatrice era uma sombra. Uma sombra fria e escura em um passado que eu queria apagar. Tornar sem efeito, nulificar. A minha existência não significava nada antes da minha chegada à superfície, e a minha vida só fazia sentido desde que eu conhecera o sol.

E então tudo ficou colorido novamente. O breu do covil desapareceu, instantaneamente, sob o toque das mãos firmes de Edward. Seus longos dedos acariciaram minha face lentamente, e tudo voltou a florir. O sol brilhava forte no céu, mesmo encoberto por nuvens, mesmo pálido, de um amarelo fosco. Havia cores e aromas, e eu me sentia viva. Pela primeira vez, o lado inconsciente do cérebro parecia me trazer sensações melhores do que as do lado consciente. Eu sorri… e deixei-me deleitar naquele toque aveludado da palma de sua mão, até sentir seus braços me acolherem. A cabeça recostada em seu peito, o seu cheiro suave e floral. Meus lábios procuraram contato com a sua pele, um beijo de reconhecimento.
_Durma bem, meu amor. – A sua voz ainda era a mesma, como se ele estivesse sussurrando em meus ouvidos. Como se não fizesse três dias que eu não o via. Como se três dias significassem uma eternidade suficiente para me matar de desespero, mas nem um instante para me apagar a sua memória. Eu estava sonhando, e daquele sonho eu não queria acordar nunca. Se precisasse morrer para estar em seus braços, eu morreria feliz. Se aquilo fosse possível.

Senti uma forte pontada no ventre, e a dor agoniante me fez contorcer. Levei a mão instintivamente até onde meu filho chutava, ansioso para livrar-se daquele espaço pequeno e desconfortável, e senti algo que já estava lá. Uma sensação de assombro me dominou, e recolhi-me ao canto superior da cama, fugindo do que estivesse ali me tocando. Abri os olhos assustada, e minha visão me pregou uma peça cruel.
_Bea, sou eu… – Meus olhos me enganavam, mais ainda meus ouvidos. A figura de Edward, camisa aberta, calças jeans, meias, cabelos pouco arrumados, ficava cada vez mais nítida. E sua voz… era a mesma do sonho. – Sou eu, meu amor… desculpe, não queria assustar-te.
_Eu ainda estou sonhando? – A pergunta era tola o suficiente para ter sido feita por mim.
_Não… – Ele sorriu, e eu tive certeza que era ele. – Eu estou aqui… cheguei ontem à noite, você estava adormecida. Desculpe, não pretendia causar essa reação em você.
_Edward… – Estendi a mão para tocá-lo na face. – Como você… o que você…
_Eu sei que Alice ligou… mas eu cheguei antes do previsto por ela. Eu peguei um atalho que ela não esperava…
_Como entrou aqui? – Eu me arrastei lentamente para ele, deixando-me repousar em seu peito mais uma vez, abraçando-o com toda força que ainda me restava, meus braços envolvendo sua cintura sem a menor pretensão de soltá-la. – São tantas dificuldades que…
_Eu tive ajuda. – Ele sorriu, eu podia sentir. Seus lábios me beijaram os cabelos, e eu senti tanto conforto que poderia adormecer novamente. – Tem uma pessoa aqui dentro que tem algum senso… por incrível que isso possa parecer.
_Quem? – Eu levantei uma sobrancelha, curiosa. Ansiosa, talvez, porque a hora que Alice e Felicia previam se aproximava… e Edward estava ali, tão proibido.
_Ferdinand. Ele… nós tivemos uma conversa, e ele compreendeu. Ele me ajudou a entrar, me trouxe até seu quarto… e está montando guarda na porta. Ele é puro, Bea… você lhe fez um bom trabalho.
_Cuidei dele por dois anos, apenas. – Eu ainda digeria o que Edward me dizia. – Sempre soube que era bom… e bem… ele é meu irmão, certo? Biologicamente…
_Sim, ele é. Ele compreende isso, e deseja o seu bem. Isso me colocou em vantagem. Aparentemente, ele compreende que o seu bem se resume a mim.
_Ele é perceptivo, então. – Escalei Edward, alcançando seus lábios. – Eu senti tanto a sua falta…
_Não tanto quanto eu senti a sua.

E então o que eu esperava por semanas estava por acontecer. O beijo pelo qual eu ansiei por alguns dias foi interrompido por uma onda insuportável de dor, e a constatação de que algo estava muito errado. Convulsionei nos braços de Edward, e ele assustou-se. Seus olhos assombrados me seguravam enquanto eu tentava me ajeitar na cama, sentindo uma dor não antes experimentada. Meu ventre se tingia de manchas roxas, e o sangue vertia em meus lábios. Tentei respirar, mas o sangue me fazia engasgar. Os ruídos fizeram a porta do quarto se abrir, e Ferdinand entrou, assustado como Edward. A cena que ocorria não era para ser vista. Eu me retorcia na cama, os lençóis já bastante encharcados em sangue; meu sangue, o sangue que circulava em mim; e meu ventre se movia de um lado para o outro. A dor era tanta que eu sentia que a qualquer momento perderia os sentidos. Por mais que meu organismo tentasse, ele não conseguia se regenerar imediatamente de tantas agressões.

Edward disse qualquer coisa, e Ferdinand deixou o quarto, retornando em segundos com Felicia. Ela olhou para Edward com total reprovação, e chamou outra híbrida, pelo nome. Eu não estava ouvindo tudo, nem meus olhos conseguiam se concentrar em imagem alguma. O olhar aterrorizado de Edward foi a última coisa que tive consciência plena.
_Ferdinand, leve Edward daqui. Vão! – Felicia dizia, enquanto colocava compressas em minha testa e começava a despir-me.
_Eu não vou deixá-la! – Edward protestava, o tom de voz completamente alterado.
_Edward, o que vai acontecer aqui, agora, não é para ser visto. Se você é tão perceptivo quanto ela diz, você sabe que não pode ficar aqui. Vá com Ferdinand, vocês não devem ficar aqui. Os machos não acompanham os nascimentos, vocês só atrapalham. Vá, eu preciso concentrar-me somente em Beatrice.

Tolos, brigando por uma imbecilidade enquanto eu me esvaía em sangue e meu bebê agonizava querendo sair de mim. Bati os punhos no colchão, irritada, e Edward finalmente se deixou arrastar por Ferdinand. A porta se fechou, e eu já não estava muito consciente do mundo exterior. A dor me dominou por completo quando mais sangue jorrou por minha boca, e tudo ficou completamente escuro. Mais do que a noite, mais do que a ausência de luz do covil.

 

***** Edward POV *****

Ferdinand, meu novo aliado, me arrastou para fora do quarto de Beatrice e me carregou para fora do covil. Em poucos instantes, estávamos na área externa do covil, o sol brilhando timidamente por sobre as árvores espessas da floresta. Eu não desejava ter saído, mas a confiança que depositava em Ferdinand me fez segui-lo. Sim, eu confiava nele, então. A minha excursão até o covil foi uma idéia súbita, mas da qual eu não desistiria. Depois de passar outro dia lamentando e me sentir um ser desprezível, eu cheguei à conclusão que era o momento de ir buscar minha noiva e meu filho. Ou o momento de ficar com eles por lá, o que fosse mais simples.

Reuni os Cullen porque não era possível tomar nenhuma decisão sem que Alice estragasse a surpresa. Eu não podia sair sem que ela soubesse, e fazê-lo com ela sabendo era inútil. Eu não os queria me seguindo, então a melhor política era a honestidade. Informei a todos da minha decisão, deixando claro que haveria duas alternativas. Ou eu traria Beatrice comigo ou eu ficaria com ela. Eu não a deixaria, e se ficar com ela significava ficar recluso no covil, então eu o faria. Logicamente Esme achou a idéia ridícula, e tentou convencer-me a não ir. Mas ela sabia que eu era particularmente teimoso demais para mudar de idéia. Ela sabia que eu raramente me demovia de minhas decisões. De qualquer forma, havia sempre duas possibilidades. Alice lhes informaria quando a decisão fosse tomada, no covil.

Mesmo de carro, com uma pequena mala no bagageiro, eu não sabia para onde ir. Eu consegui as coordenadas de Jasper, enquanto ele tentava não pensar nisso. Meu irmão não era muito bom em esconder seus pensamentos, e acabou entregando-me tudo que eu queria. Achar o covil não era fácil, mesmo com as indicações de Jasper. E, após a minha chegada, entrar nele seria definitivamente mais difícil. Por minha sorte – se eu acreditasse em sorte – Ferdinand estava com alguns vampiros na porta do covil, a mesma imagem que eu vi em Jasper. E porque todos os deuses estavam a meu lado, Em poucos minutos os vampiros se foram floresta adentro e deixaram o jovem híbrido sozinho.

Excelente momento para o bote. Como se faz com uma presa, tive diversas idéias de como raptar Ferdinand e trocá-lo por Beatrice. Ele parecia frágil e inexperiente, uma presa bastante fácil. Nenhum desafio para mim, mesmo estando sozinho. Um contra um era justo somente se as habilidades fossem equivalentes. E Ferdinand era definitivamente um híbrido jovem e sem qualquer experiência em combate. Fácil demais, eu pensei comigo mesmo por diversas vezes. Até que a consciência novamente dominou o instinto e eu me apresentei a ele, como um cavalheiro faz. Nada de presas ou predadores, nada de rapto ou resgate. Eu me apresentaria a Ferdinand e pediria a sua compreensão.

Apesar da minha eloquência, eu jamais imaginei que Ferdinand me compreendesse tão rapidamente. Eu não precisei gastar argumentos demais, ou descrever meus sentimentos por Beatrice com muitos detalhes. Ele pareceu bastante simpático aos meus sentimentos, era verdade. Como se ele os pudesse entender facilmente. Poderia Ferdinand estar apaixonado? Ou ele era apenas um bom homem? Seus pensamentos confusos de jovem me deixaram em dúvida algumas vezes, mas eu vi que podia confiar nele, e conseguir meu passe livre para o covil.

_Você pode confiar em Felicia. – Ferdinand disse, sem me olhar, enquanto caminhávamos pela floresta. Distrai-me de meus pensamentos por um instante, visualizando o jovem híbrido de cabelos loiros e olhos marrons. – Ela sabe o que está fazendo.
_Sim, eu sei. – Mas eu não queria tê-la deixado, mesmo assim. – É que… não consigo ver Beatrice sofrendo.
_Você pretende levá-la para sua… casa? – Ferdinand parou, e encarou-me. E eu não resisti, um sorriso enorme brotou em meus lábios quando olhei dentro de seus olhos brilhantes. Todo o peso que estava sobre meus ombros imediatamente me deixou livre. Liberto.
_Sim, eu pretendo. – O sorriso não se desfazia, e eu me senti constrangido.
_Você já sabe o que eu estou pensando, certo? Bea me contou que você lê mentes… isso é incrível.
_Um pouco perturbador, também. – Confessei. – E sim, eu sei. Mas eu ainda não consegui compreender ou acreditar. Você faria mesmo isso?
_Sim, não vejo grandes dificuldades. Eu não me sinto no direito de ficar com Beatrice… ela não me pertence. Ela teve sua escolha, e a fez. Preciso fazer a minha, agora. Eu não posso ficar com ela, não é a coisa certa a se fazer.
_Custa-me acreditar que você possa ser tão altruísta, depois da demonstração de posse de seu pai…
_Somos diferentes. – Ferdinand olhou as árvores, seu semblante de menino um pouco tenso. – Eu sou um híbrido, apesar de tudo. Talvez seja uma dessas fraquezas humanas.

O mesmo discurso de Beatrice, ele tinha. Eram mesmo, irmãos… de uma genética bem próxima. Os cabelos claros, os olhos da mesma cor… provavelmente ele também teria olhos verdes, se parasse de alimentar-se de sangue. A sua mãe não era Felicia, mas Beatrice se parecia muito com Rudolph. Era curioso como ela jamais se enxergou nele… como ela jamais sentiu que seu coração não batia, no peito. Rudolph estava em um pedestal tão elevado que sua prole não o reconhecia. E Beatrice, mesmo tão curiosa, não conseguiu descobrir que seu pai era um vampiro. Mas eles tinham o mesmo discurso sobre as fraquezas humanas, as mesmas que me encantavam. E Ferdinand estava disposto a enfrentar a rigorosa lei de Rudolph para desistir de Beatrice, e dar a ela uma chance de estar comigo. Por aquilo eu não esperava.

_Acha que eu devo levar sangue para o covil? – Uma súbita idéia me ocorreu.
_Temos sangue lá… e os caçadores saíram, logo voltam com mais.
_Sim, mas sangue fresco… para Beatrice. Ela estava… havia tanto sangue saindo dela, provavelmente ela precisará repor suas reservas…
_Talvez seja uma boa idéia. Pretende caçar?
_Venha comigo. Depois… você me leva de volta até ela?
Ferdinand riu, e me seguiu pela floresta. Ele estava acostumado com aqueles caçadores híbridos sem nenhuma classe. Ele precisava ver como um vampiro caçava, de verdade.

**********

 

Em alguns instantes, a luz parecia voltar aos meus olhos lentamente. Após a dor dilacerante da carne se rasgando, eu perdi os sentidos. Não foi como o sono, eu não deixei-me dominar por um lado do cérebro para perder-me em outro. Eu simplesmente não tinha nenhum lado consciente capaz de me retirar daquele transe, então. A dor ainda me consumia, mas eu podia respirar. Havia um gosto ácido de sangue em meus lábios. Meu corpo não se movia. Eu tentei mover-me, mexer a mão, levantar-me. Mas nada se moveu. Senti agonia novamente, e pisquei os olhos desejando que aquele cacoete humano me clareasse a visão.

_Deixe-me vê-la, Felicia… – A voz de Edward pode ser percebida por meus ouvidos dormentes. Eu não ouvia nada desde que o bebê decidiu nascer, e ouvi-lo foi reconfortante. Ele ainda estava ali, apesar de tudo.
_Ela está se regenerando… não foi um parto fácil. – Felicia parecia apreensiva. O que ela pretendia dizer com ‘não foi fácil’? – Precisamos ajudar… o bebê teve dificuldades de sair porque a regeneração dela é muito rápida. Só quando ela se enfraqueceu totalmente conseguimos tirá-lo… eu temi que ele se afogasse dentro dela.
Ouch, aquele comentário me incomodou. Regeneração estúpida, pensei. Eu não podia ser uma híbrida comum, então? Precisava ser aquela aberração mais vampírica do que humana, que colocava a vida do meu filho em risco? Vida… eu sequer sabia se o que tinha nascido de mim tinha vida.
_Já escolheram um nome para ele? – Ferdinand… eu esperava que ele estivesse se comportando.
_Não… na verdade, ele é uma surpresa. Somente Alice sabia, e ela foi brilhante em esconder de mim. Felicia…
_Alimente-o primeiro, Edward. Depois você pode vê-la.

Eles conversavam longe de mim, e imaginei que não estivessem no quarto. Era bom, que Edward não me visse em pedaços sobre a cama. Eu sabia que estava em pedaços, eu podia sentir-me dilacerada. Eu não queria que ele me visse daquela forma, era verdade. Por mais que eu quisesse vê-lo, era melhor que ele tomasse conta de nosso filho. E… Ferdinand claramente disse ‘ele’. Cogitou se havíamos escolhido um nome para ‘ele’… meu filho então era um… menino? Resisti à palavra macho com todas as minhas forças, porque eu não era mais uma híbrida pertencente àquele covil. Eu pertencia à superfície, e meu vocabulário também. Comecei a ficar ansiosa, e senti mais dor. A luz retornou à minha visão com mais intensidade, e eu ouvi a porta bater. Sensível, eu estava sensível.

Felicia sentou-se ao meu lado, eu sabia que era ela, e segurou-me pela nuca. Suas mãos me fizeram erguer o corpo alguns centímetros, e ela despejou sangue em meus lábios. Imediatamente pretendi repelir o que fosse, mas aquele sangue tinha um sabor diferente. Apurei meu olfato, e o sangue era… fresco. O covil não tinha sangue fresco, então entendi que os caçadores tinham voltado. Mais agonia, porque Edward estava ali… e eu não queria que Rudolph o visse. Eu não queria Rudolph a menos de uma milha de distância de meu Edward. Minha inquietação finalmente projetou-se no corpo, e meus braços moveram-se, derrubando um pouco do sangue que Felicia tentava inutilmente me dar.
_Bea, você está sendo muito difícil. – Ela reclamou. – Edward ficará magoado ao saber que você está recusando o sangue que ele trouxe.
_Edward… – eu disse, segurando firmemente a taça com os dedos trêmulos. Meus olhos abertos focalizaram Felicia, e sua fisionomia era tensa e inconclusiva.
_Não pense que aprovo tudo isso… mas ele demonstra real preocupação com você. Ele e Ferdinand trouxeram um cervo inteiro para você… vamos, beba. Quanto mais sangue beber, mais facilmente vai se regenerar.
Deixei que o sangue escorresse por minha garganta, engolindo toda gota que pudesse estar naquela taça. Não eram os caçadores, era meu Edward. A dor ainda era nauseante, e minha visão ainda não era clara. Mas eu podia sentir que melhorava, aos poucos. Mais devagar do que eu estava acostumada, talvez.
_Felicia… como estou?
_Horrível. – Ela limpou-me o sangue da face e do pescoço. – Como toda híbrida que acabou de parir.
_Cubra-me. – Pedi, exigente. – Não me deixe… não quero que ninguém veja…
_Cobrir-te para que, Bea? Seu ventre ainda está em pedaços… ainda verte sangue de suas entranhas… de que adianta cobrir-te com um lençol que em segundos estará embebido em sangue?
_Como vocês resistem ao nosso sangue? Não é… humano demais?
_O cheiro é diferente. – Felicia levantou-se, e pude vê-la pegar algo. – Bem diferente… os humanos tem um aroma completamente diferente. E fomos bem treinados… não sei quanto ao seu vampiro lá fora. – Gentilmente, Felicia depositou sobre mim um lençol. Aquela era a mesma Felicia de sempre… repreendia-me mas sempre fazia tudo que eu desejava. Repreendia-me mas me permitia tudo que eu quisesse. – Vou chamá-lo… tente não ficar muito ansiosa.

Era impossível atendê-la, então. Eu estava ansiosa, mas não era por Edward. Eu sabia como era Edward, quem era Edward, o que esperar de Edward. Ele estava lá, e eu o amava tanto quanto ele me amava. Ele não era um enigma para mim, era o vampiro que eu amava. Mas ele tinha consigo algo que me era totalmente desconhecido, e o desconhecido assustava. O desconhecido me causava a ansiedade que Felicia desejava que eu repelisse. Edward tinha consigo, em seus braços, o meu filho. Por mais que eu amasse meu filho – e eu amava, considerando todas as formas de amor que aprendi – eu não podia deixar de imaginar o que ele era, afinal. Um menino, sim. Um macho. Mas… ele era um híbrido? Era um vampiro? Havia calor em sua pele? Seu coração batia? Ele precisava respirar? Depois de tanta mutação genética, o que era o meu filho? Eu não sabia o que esperar, até porque eu nunca havia visto um bebê, então. Livros e filmes não contavam; eu nunca tivera um bebê em meus braços.

Meu corpo tremia, nervoso, quando Edward caminhou para dentro do quarto. Eu não conseguia mover-me para ajeitar-me, e só pensava que ele me veria horrível daquela forma. Seus olhos caramelo me encararam, e eu pude ver que ele também havia se alimentado. Os olhos da manhã eram turvos e as olheiras muito perceptíveis. Aqueles olhos eram olhos serenos… talvez ele também temesse que meu sangue derramado daquela forma lhe despertasse desejos não conhecidos. Edward se aproximou, o semblante rígido como se ele fosse feito de matéria inanimada. Havia algo consigo, enrolado em tecido flanelado. Meus olhos estavam agitados, urgentes. Eu queria ver tudo, eu queria ver o que ele trazia para mim. Mas Edward livrou uma das mãos e passou por minha face, causando um choque estranho. Minha temperatura estava alta, então. Ele sorriu, um sorriso de canto de boca, e pegou a compressa de Felicia, colocando sobre minha testa. Retirou cabelo de minha face, delineou os contornos de meu queixo, acariciou meu pescoço… eu estava muito quente.
_Você tem febre. – Ele disse, quase incrédulo. – Humana demais, não? – Eu apenas pisquei, assentindo. Meus olhos novamente pousaram no que ele carregava. – Você quer vê-lo? – Edward sentou-se, ainda ao meu lado. Com a mão livre, ele elevou meu corpo, colocando-o por cima de si, apoiado em sua perna. Eu estava então recostada em seu corpo, e a dor já não era mais tão angustiante.
_O que faz? – Perguntei.
_Tento te deixar confortável. – Ele sorriu, descobrindo-me um pouco. O lençol estava realmente embebido em sangue, como Felicia previa. – Pode mover os braços, meu amor?
Assenti novamente, retirando os braços de baixo dos lençóis e posicionando-os por sobre mim. Eu podia mover-me, mas estava insuportavelmente fraca. Mal sustentava o peso de meu próprio corpo. A regeneração trabalhando em velocidade máxima, e consumindo todas as minhas poucas reservas de energia. Talvez eu precisasse de mais sangue… mas escondi aquele desejo para que Edward não fizesse nada antes de me mostrar o meu filho. E ele não me faria esperar mais. Com uma gentileza que lhe era peculiar, Edward entregou-me o pequeno ser que estava com ele, descobrindo sua pequena face para que eu pudesse enxergá-lo. Colocou-o em meus braços trêmulos, ajudando-me a sustentar o peso insignificante do que eu segurava. Meus olhos se perderam na imagem mais linda que eu já vira em toda a minha existência – tanto no covil quanto fora dele. Nenhuma cor poderia se comparar à cor de sua pele… nenhum aroma poderia se comparar ao aroma que ele exalava… nada poderia comparar-se à sua beleza.
_Ele é exatamente como você. – Edward sorriu novamente, beijando-me os cabelos. – Seu coração bate tão forte…
_Então ele… é um híbrido? – Perguntei, ainda vidrada na pequena criatura que eu segurava, recusando-me a acreditar que aquele ser havia simplesmente cavado seu caminho para fora de mim, e que havia sido gerado por semanas dentro de meu ventre inóspito.
_Sim, Bea. – A voz de Edward continha humor; ele parecia desejar rir do meu comentário. – Claro que ele é um híbrido… afinal, ele é seu filho. Como eu disse, ele é exatamente como você.
Fechei meus olhos instintivamente, sentindo que eles se tornavam úmidos e turvos. Lágrimas… eu não podia chorar!! Que humanidade era aquela, que me dominou totalmente durante aquela gravidez! Que humanidade era aquela que o pequeno ser dentro de mim despertava! Mas as lágrimas rolaram por minha face, todas morrendo nos dedos frios de Edward.
_Você está chorando… – Ele parecia surpreso e ao mesmo tempo preocupado.
_Não é nada… – Tentei pensar em alguma coisa que o distraísse, algo que o fizesse concentrar em outro fato que não minhas lágrimas. A sede… o desejo por sangue, por minha reconstrução total. O desejo por estar inteira novamente e poder sair daquele estado catatônico pós parto. O meu pensamento ficou vermelho, tanto quanto o lençol que me cobria. Edward me beijou os cabelos novamente, e, sustentando-me com extrema facilidade, apoiou meu corpo em travesseiros para poder levantar-se.
_Vou buscar sangue para você. – Ele disse, com toda suavidade possível. – Acha que pode ficar sozinha com ele?
Assenti sem palavras mais uma vez, enquanto meu vampiro deixava o quarto. Eu não tive tempo de sentir a sua falta, nem de ficar um momento sozinha. Edward retornou em alguns segundos, agitado, apressado. Eu devia parecer péssima, para ele estar tão cuidadoso comigo. Ele era cuidadoso, mas eu era geralmente bastante durável. Ele não precisava preocupar-se tanto… talvez a reação fosse normal à minha sombria imagem. Eu ainda observava o pequeno híbrido em meus braços, enquanto ele parecia observar-me. Não, eu não entendia nada de bebês. Eu nunca tivera um em meus braços. E nunca, nada pareceu tão natural quanto segurá-lo comigo, naquele momento. Ele tinha poucas horas de vida. E esticou uma de suas mãozinhas em minha direção. Mãozinha tão pequena que não parecia pertencer a um… imortal.

Edward aproximou-se, com o sangue em uma taça. Ele retorcia o nariz, claramente nauseado pela aparência desagradável do alimento… sim, era terrivelmente desagradável, mas eu me alimentei daquilo por um século. Eu me alimentava exclusivamente de sangue morto, guardado em garrafas de metal, com um sabor completamente diferente do sangue fresco. E aquilo me faria forte de qualquer jeito, então fosse o sangue que fosse, eu desejava bebê-lo. Cuidadosamente mais uma vez, ele pegou o bebê de meus braços e me entregou a taça. Apesar do protesto por ele ter-me tomado o bebê, eu desejava demais o sangue para argumentar qualquer coisa. Sentia sede como nunca, e bebi tudo que me foi ofertado sem muito raciocinar.
_Mais? – Ele pareceu surpreso, uma vez que minha sede ainda não estava saciada.
_Gostaria do cervo inteiro, se possível.
_Ferdinand? – Edward chamou, tom de voz tão baixo que eu duvidei que o híbrido lhe tivesse ouvido. Mas Ferdinand estava espreitando na porta tão logo meu vampiro o chamou.
_Sim, Edward?
_Você poderia pegar mais sangue para Beatrice? – Edward estendeu-lhe a taça, gentilmente, com um sorriso. – Ela está sedenta… – O híbrido deixou o quarto com urgência, sem esperar por Edward terminar a frase, aparentando uma animação nada condizente com a situação real. Fechou a porta e desapareceu. Edward sorriu, e sentou-se novamente ao meu lado. Depois, depositou meu filho novamente em meus braços, olhando para ele com as sobrancelhas franzidas. Depois olhou para mim, também os olhos confusos. – Muitas perguntas ao mesmo tempo. – Ele riu. – Ferdinand desenvolveu uma admiração não muito natural por mim. Devo confessar que estou me aproveitando da situação. – Edward baixou o olhar, encarando o pequeno híbrido nos meus braços. – E ele parece bastante ansioso por estar com você… então, melhor deixá-lo em seus braços.
_Ele pensou isso? – Eu estava maravilhada, olhando para Edward, e para o bebê, e para Edward novamente.
_Ele ainda é inconclusivo. Mas sim, ele queria voltar para perto de você. Ele… ele é seu filho, é normal que ele deseje estar com a mãe. Aliás… você precisa escolher um nome para ele.

Edward tinha o cenho franzido, e olhava para mim e para o bebê com total adoração. Eu podia sentir adoração em seu semblante rígido, mas suave. Ele respirou algumas vezes, e levou as mãos até o lençol embebido em sangue. O sangue coagulado já exalava um aroma ultrajante, mas eu não queria que ele me visse. Mesmo assim, ele se moveu para descobrir-me; um movimento muito rápido. Eu não poderia impedi-lo, porque o bebê em meus braços não me permitia fazê-lo. Edward puxou os lençóis no mesmo instante em que a música estridente do aparelho celular se fez ouvir. Ele torceu os lábios, mas terminou a sua tarefa. Seus dedos tocaram toda a minha região do ventre; eu pude senti-lo, mas não via nada. A minha posição não era privilegiada. O telefone continuava tocando, mas Edward não parecia preocupado em atendê-lo.
_Não se incomode, é Alice. – Ele disse, respondendo-me. – E ela não vai desistir. Isso está… está muito bom. – Seus dedos pressionavam minha pele, e eu sentia um pequeno incômodo. Sem dor, só um pequeno desconforto. – Você já pode pensar em vestir alguma coisa… posso?
_Atenda sua irmã primeiro. – Eu disse, já irritada com a música vibrante do telefone. Tentei retomar o controle de meu corpo, sem temor de ferir-me mais do que já estava, sentindo que meus órgãos internos já estavam recompostos o suficiente. Ajeitei-me na cama, recostando-me mais comodamente na cabeceira da cama, tomando maior consciência do espaço necessário para acomodar o bebê em meus braços. Edward pegou o telefone para atender Alice, enquanto eu considerava sua última frase. Nosso filho precisava de um nome.

_Charles. – Eu disse, não prestando a menor atenção na conversa entre Edward e Alice. Meus olhos vidrados na pequena figura perfeita do meu filho, que continuava com as mãozinhas estendidas em minha direção. Encolhi as pernas e apoiei-o em meus joelhos, fazendo-o ficar de frente para mim. Ele tinha cabelos fartos, e eram loiros… Edward tinha cabelos de fogo, como que fossem ruivos; eu tinha cabelos claros, mas não conseguia vê-los de cor definida. Mas nosso bebê tinha cabelos loiros pálidos, como os de tantos outros híbridos que eu conhecia. Talvez ser loiro fosse uma característica dos híbridos… principalmente dos geneticamente modificados. – Charles Henry. – Falei, passando os dedos pela pele lisa e quase transparente do bebê.
_Alice, estamos todos bem… eu sei, eu lidarei com isso no momento certo. Avise a Esme que ela é… avó? Avó de um menino. Isso tudo é tão estranho… totalmente anormal. – Edward conversava com a irmã, e apesar das palavras duras seu tom de voz era suave e zombeteiro. Como se os comentários sobre a surrealidade da situação fossem um divertimento. – Vou dar atenção à minha nova família agora, se me permite. Voltaremos logo. – Edward desligou o telefone e me encarou, o semblante concentrado, cenho franzido, lábios levemente contraídos. – Charles Henry Cullen?
_Sim… – Eu sorri. Ele estava prestando atenção, então. – Mas você não parece ter gostado… – minha empolgação durou frações de segundos.
_Eu gostei. Considero apenas que você precisa conhecer a família real britânica…
_Família real? – Como uma híbrida tola que eu era, as perguntas estúpidas nunca acabavam.
_Sim. – Edward sentou-se ao nosso lado, abraçando-me e puxando-me para mais perto. Seus dedos acariciaram os cabelos descoloridos de nosso filho, enquanto ele concluía seus pensamentos. – Charles é o nome de um príncipe…
_Oh. – Eu me surpreendi com a coincidência. – Mas que seja… meu filho é um príncipe. O príncipe do meu conto de fadas fora do normal.
_Nosso filho, Bea. – Edward beijou meus cabelos.


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