— Mas Kanda... Não foi isso que aconteceu! — O albino se defendia, tentando convencer Kanda.

— Não foi o que aconteceu?! Vocês estavam agarrados, Allen. A-g-a-r-r-a-d-o-s! — Kanda respondeu com raiva.

— Não estávamos agarrados! Eu apen- — Foi interrompido com um forte ardor no rosto. Kanda havia lhe dado um tapa. Allen acariciou o local do tapa com sua mão e olhou para o outro. — Porque me bateu?!

— Não aja como se não soubesse. — Kanda soltou um “tsc” e trincou os dentes.

— Vou para a missão. — Se virou, com seu cabelo tampando seus olhos.

— Nunca mais volte. — Allen sentiu uma pontada no coração e Kanda se virou, entrando novamente na Ordem.

— Não voltarei. — Sussurrou o garoto, que saiu andando até os finders.

  Já haviam se passado três dias desde a briga dos dois, e nenhuma notícia de Allen. Kanda sentia muita falta dele, mas também sentia culpa. Culpa por ter de esperar tanto tempo para se desculpar com ele. Mas sempre era assim, eles brigavam, Kanda esperava até o outro dia para se desculpar e tudo se resolvia, era quase uma rotina.

O moreno andava pelos corredores da ordem pela madrugada. Era uma madrugada fria e chuvosa, só se ouviam o som dos trovões e a luz dos raios. “Allen tem medo de trovões.” Pensava ao olhar a janela. “Será que você está bem...? Tomara que não esteja ouvindo esses trovões.” Deu um pequeno sorriso e continuou a andar. Depois de algum tempo andando, ouviu passos rápidos atrás de você e se virou. Era Lenalee, que corria até ele com os olhos cheios de lágrimas.

— Kanda-kun! — Chamou ela, ofegante. — Venha comigo, rápido! — Ela puxava Kanda pela manga do manto exorcista. Logo, ele também começou a correr.

Os dois chegaram até a sala de Komui, que estava no telefone com alguém, que pelo o que falava, alguém desesperado.

— Por favor, se acalme. Isso, agora me diga o que aconteceu. — Houve um longo silêncio. — Como assim?! Um acidente?! — Gritou. — E os exorcistas?! — Outro longo e torturante silêncio. — Certo, entendi. Enviarei alguém aí o mais rápido possível. — Colocou o telefone de volta no gancho e abaixou o rosto.

— O que ouve nii-chan?! — Lenalee foi até o irmão, o abraçando. — Estão bem?! Alguma notícia?!

— Não estão bem. — Lenalee arregalou os olhos.

— Como assim...? — Dizia sem acreditar.

— Isso que você ouviu.

— Não, nii... Não...

— Allen Walker está morto. — Uma batida do coração de Kanda falhou. Sentiu uma falta de ar tremenda, seus olhos estavam espantados. “Como assim ele havia morrido...? Como...?” Pensava, confuso. Ele estava bem há três dias atrás, como poderia estar morto agora? Nada mais fazia sentido.

Uma semana se passou, e como previsto, Allen não voltou. Mesmo sabendo que o albino não voltaria, Kanda continuava a esperá-lo. A chuva não havia parado desde então, todas as noites haviam mais e mais trovões. Kanda estava deitado de bruços na cama, olhando para a parede, lembrando dos momentos que ele e Allen tinham passado. Lhe veio a mente o primeiro dia de namoro de ambos... A noite estava chuvosa e cheia de trovões, como essa. Era de madrugada e Kanda se preparava para ir deitar, até que alguém bate em sua porta.

— Kanda... — Disse o garoto, encolhido, abrindo a porta devagar. — Posso dormir com você hoje?

— Por quê? — Kanda perguntou, frio.

— É que... — Ele corou. — Eu tenho medo de trovões.

Enquanto se lembrava, sua porta se abriu devagar. O fio de esperança que ainda tinha, dizia que era Allen, mas ao ver os cabelos esverdeados, esse fio desapareceu.

— Kanda-kun, está na hora... — Lenalee disse, chamando o moreno, que se levantou indo até Lenalee. Os dois saíram do quarto, acompanhando Komui até o cemitério, de barco. Ao chegarem lá, o funeral começou. Outros exorcistas também haviam morrido. Amigos, parentes... Namorados, todos estavam lá para prestar sua última homenagem aos falecidos. Davam flores, cartões, diziam discursos, até lágrimas eram homenagens aos que se foram. Assim foi o resto da tarde, nublada e repleta de lágrimas. Kanda foi o único que não disse nada, apenas ficou quieto observando tudo. Estava começando a escurecer, as poucas estrelas surgiam do céu, não havia lua dessa vez. Também, não havia chuva. Todos já tinham ido embora, apenas Kanda ficou por lá.

Estava frio, parecia que até o clima estava triste pela morte dos exorcistas. Pelo o que Komui disse, o trem onde estavam foi atacado por akumas durante a noite, todo o trem explodiu, apenas um finder se salvou e ligou para a Ordem, avisando do que aconteceu.

Kanda suspirou e se ajoelhou na frente do túmulo, deixando uma rosa branca na frente da lápide. Doía muito saber que quem estava enterrado lá era Allen. Dóia em seu coração. Doía também saber que ele estava por culpa sua. Fora ele quem disse pra Allen nunca mais voltar. Fora ele quem o mandou embora, ele quem esperou pelo dia de “amanhã” para se desculpar. Deveria ter cuidado melhor do seu Moyashi. Agora ele estava lá, sozinho e com frio, em baixo da terra. Ele sempre dizia que tinha medo de ficar sozinho, mas agora ele está. Ele sempre disse que tinha medo de trovões, agora nem Kanda nem ninguém poderia estar lá para abraça-lo quando chovesse.  Kanda também não poderia mais sentir o seu toque, não poderia mais sentir seu carinho, não poderia mais sentir seu beijo. Ouvir sua voz dizendo “Tadaima” sempre que voltava de uma missão. Mas, principalmente... Não poderia ouvir seu “Eu te amo” sempre que se viam. Não teria mais Allen ao seu lado, agora estava sozinho. Sozinho. Era assim que estava agora. Havia perdido a pessoa mais importante para ele, seu amor, seu Moyashi. Kanda começou a chorar em silêncio se lembrando da briga que tiveram. Se lembrando dos momentos bons, se lembrando de como se conheceram, se lembrando de tudo. Dentre tantos pensamentos, sussurrou com dor:

— Eu perdi você.

“— Vou para a missão.

— Nunca mais volte.

— Não voltarei.”

  E não voltou.