- Formem duplas – a professora disse – Esse trabalho vale metade da nota final.

         Aquelas eram as frases que Joey mais detestava. Primeiro, porque trabalhos assim sempre exigiam demais, segundo, porque escolher duplas era quase tão difícil quanto escolher alguém pra casar.

        Joey parecia ter um imã para parceiros ruins. O que não fazia nada, o que faz de qualquer jeito, o que não saia do telefone.

        Resultado: nota baixa.

        Dessa vez, Joey prometeu para si mesmo que iria escolher um bom parceiro, mas três segundos depois que a professora os liberou para que formassem as duplas, a sala toda já havia de dividido.

        Joseph olhou para os lados, mas só conseguiu encontrar uma pessoa que ainda estava sozinha: Elizabeth Rogers, a garota ruiva do outro dia.

        Ela Fe um sinal para ele, pedindo para fazerem o trabalho juntos.

        Vendo que era sua única alternativa, ele balança a cabeça em confirmação.

        Beth ficou de almoçar na casa dele, e fariam o trabalho naquela mesma tarde.

        Durante todo o trajeto da escola até a casa dos Anderson, a garota ficou tagarelando coisas sobre algoritmos e aritmética. Joey não entendia nada, mas concordava com tudo o que ela dizia, afinal, não queria parecer burro.

        Chegando em casa, eles entraram pela cozinha, onde sua mãe os aguardavam.

        - Bom dia, fil... – ela começou, mas se interrompeu quando viu Beth – Wandinha? Tá diferente!

        - Não, mãe, essa aqui é a Beth, lá da escola. Ela veio fazer um trabalho.

        - Nossa Joseph, desculpa. É que é estranho te ver com gente que não sejam os vizinhos. Você sabe, não tem muitos amigos...

- Manhê! Não liga não Beth, minha mãe é meio zureta.

        - Não fale assim, moleque! – ela esbravejou, apontando-lhe a faca, suja de pedacinhos de cenoura. – Enfim, foi um prazer conhecê-la, querida.

        - O prazer é meu, s-senhora Anderson – disse Beth, um pouco assustada com a faca.

        Depois do almoço, eles subiram para o quarto de Joey, onde fariam o trabalho.

        - Nossa que maneiro! – ela disse, maravilhada – Ei, o que é aquilo na parede?

        - Coleção de flechas. É assim que eu falo com a minha vizinha. Longa história, depois eu te conto. Agora, vamos começar, que eu to vendo que ainda tem muito trabalho pela frente.

        Após três horas e meia encarando páginas e páginas de livros e cadernos, eles finalmente acabaram o trabalho.

        - Ufa! Achei que isso não tinha mais fim!

        - É verdad...

        - Cuidado, Beth, se abaixa! – disse Joseph, abaixando a cabeça dela com as mãos, levando-a por pouco de uma flechada na cabeça.

        - Nossa! O que foi aquilo?

        - Te disse, deve ser a Wandinha querendo alguma coisa.

        Ele se aproximou da flecha, e tirou o papel, deixando-a ali, fincada com as outras.

        Venha logo, porque tá demorando tanto?

        É que a Beth tá aqui em casa.

        Beth? Quem é essa? Pensei que você não tinha amigos.

        Tá falando igual a minha mãe de novo. Ela só veio fazer um trabalho.

        Ah, tá... Bem, mas vem logo senão eu explodo os dois!

        - Nossa, preocupada ela com a sua vida, né?

        - É. Cá entre nós, eu acho que ela gosta de mim – ele sussurrou.

        - Ah... É mesmo? – ela disse, levemente incomodada.

        - É. Eu acho... Acho que gosto dela também, mas sei lá, é estranho. Mas jura que não vai contar para ninguém, hein! Muito menos para ela! Jura?

        - Tudo bem, Joey. Pode confiar em mim.

        Mas não estava tudo bem. Beth ficou a encarar as flechas com ódio, quando foi interrompida por Joey.

        - Melhor a gente ir logo antes que ela mande outra flecha.

        Chegando à casa dos Addams, assim que Wandinha abriu a porta, Beth começou a agir de um modo... Estranho. Se pendurou no ombro de Joey, a fim de “marcar território”. Joey ficou confuso, e Wandinha apenas levantou a sobrancelha.

        - Hã... Wandinha, essa é a Beth.

        - Prazer – disse a ruiva.

        Wandinha fez sinal para que eles entrassem, e Beth foi na frente.

        - Por favor, tente não matar ela – ele cochichou, ao passar por Wandinha.

        - Isso eu já não posso prometer.

        Wandinha os levou para o quarto, onde Feioso esperava, amarrado na cama.

        - Pô, Wandinha, demorou! Quem é essa? Joey, você nunca falou que tinha outra irmã.

        - E não tenho! Meu Deus, será que é tão difícil assim acreditar que eu tenho amigos?! – ele esbravejou.

        Silêncio geral.

        - Tanto faz – disse Wandinha, por fim, quebrando o silêncio – Enfim, chamei vocês aqui porque a gente acabou de construir uma máquina nova, e eu quero cortar alguém ao meio com ela. Voluntários?

        Silêncio novamente.

        - Tudo bem. Feioso, sobe aí.

        Ele, como boa cobaia, obedeceu.

        Wandinha se preparava para soltar a corda, quando olhou ara o lado, e viu Beth escondendo o rosto no ombro de Joey, para não ver a cena, ela estava bem perto dele.

        Wandinha pôde perceber que ela não estava realmente com medo. Era hora de interferir. Ela já tinha agüentado bastante das provocações de Beth, porque Joey pediu, mas tudo tem limite, até a sua paciência.

        - Feioso, agüenta ai, segura isso – ela lhe entregou a corda – Vem comigo, Beth, quero conversar um pouco com você. Lá fora.

        Beth a seguiu. Joey ia acompanhá-las, mas Wandinha o impediu.

        - Você fica aí, garoto dos biscoitos. Nem ouse espiar – ela disse, e saiu.

        Joey e Feioso ficaram parados, olhando para a porta.

        - Se alguma das duas gritar, a gente interfere. – sugeriu Joey.

        - E sabemos quem vais ser.

        Wandinhalevou Beth até o fim do corredor.

        - Então, você e Joey são bem amigos, não é? – perguntou Beth.

        - Sim.

        - Ah, mas só amigos, né?

        - Sim.

        - Ótimo.

        - Mas por pouco tempo. – disse Wandinha, conseguindo fazer Beth se calar. – Sabe, assim que entrou aqui, saquei qual é a sua.Também, você deixou na cara! Só mesmo o idiota do Joseph pra não perceber.

        -Ei! Não fala assim do meu...

        - Seu? Seu o que? Olha, eu não gosto de desafios, não gosto de obstáculos. E agora você é um deles.

        - Ah, é? E o que você vai fazer? – ela disse, cruzando os braços.

        Wandinha não disse nada, apenas abriu uma das portas do corredor, revelando um cômodo cheio de armas, bombas e engenhocas.

        - Vamos jogar um jogo. Quem sobreviver ganha.

        Beth pensou por um instante.

        - Fechado.

        Wandinha sorriu malignamente enquanto entrava no cômodo, seguida de Beth.

        - Valendo.

        Wandinha pegou uma faca e jogou na direção de Beth, que desviou com precisão. Ela jogou mais cinco em seguida, e nenhuma acertou a ruiva.

        - Esse é o melhor que pode fazer? – ela perguntou, ainda desviando das lâminas, que perfuraram a parede – De quantas bolas de queimada você acha que eu já desviei na minha vida?

        Wandinha sorriu. “Ela é boa. Mas não é impossível”. Pegou uma bomba e jogou na direção dela.

        Beth virou uma mesa e se escondeu atrás dela, se protegendo de uma explosão.

        Beth olhou para o lado e viu um armário, cheio de vidros, com líquidos dentro, igual aos do laboratório de química. Se protegendo atrás de móveis e armas de tortura, ela chegou até o armário e começou a misturar algumas fórmulas. Se o fizesse corretamente, conseguiria causar explosões muito maiores que as de Wandinha.

        - Nitroglicerina... Perfeito! – ela disse, para si mesma. Agarrou o pote todo e o atirou contra Wandinha, causando uma explosão que a fez voar contra a parede.

        “Droga, isso vai ser mais difícil do que eu pensei. Será que eu finalmente encontrei uma adversária a altura? Não. É sorte de principiante”, Wandinha pensou.

        Beth já estava preparando mais uma bomba, mas Wandinha já havia bolado um novo plano. E quanto mais bombas ela jogasse, melhor.

        “Mas cadê ela?”, perguntou-se Beth, pouco  antes de ser empurrada contra a parede, seu pescoço sendo pressionado pelo braço de Wandinha.

        - Te peguei. Parece que já temos uma vencedora, não é? Mas como eu disse, quem sobreviver ganha. E eu não estou a fim de perder.

        Wandinha amarrou a garota no alto, e estava prestes a mandá-la para uma melhor, quando alguém abriu a porta.

        - Wandinh... – começou Joey, entrando no cômodo. Assim que ele viu Beth, suspensa pela corda, e Wandinha próxima a ela, ele entendeu o que estava acontecendo. Sentiu-se estúpido por ter obedecido Wandinha e ficado no quarto. Joey olhou em volta, a destruição, e os rostos das duas, sujos e arranhados, e imaginou o q havia ocorrido ali antes de ele chegar.

        - Joseph, que bom que chegou. Estávamos prestes a testar uma máquina nova. Venha, assista comigo.

        - W... Wandinha, sua psicopata! Tira ela dali agora!

        - E perder toda a diversão? Não, obrigada.

        A raiva então tomou conta dele.

        - Wandinha, é serio, não tem graça. Tira ela de lá. Agora – ele disse, sério, olhando nos olhos dela.

        Joey nunca havia falado assim com Wandinha antes. Ela soltou a corda, levemente contrariada, fazendo com que Beth caísse no chão.

        Joey correu na direção de Beth e a abraçou com força.

        - Beth, que bom que você tá viva! – ela a soltou e olhou para ela – Tá tudo be... – ele foi interrompido quando ela o beijou.

        Joey ficou completamente sem reação.

        - Beth... Não... Você... Você entendeu tudo errado. Lembra do que eu te falei lá em casa?

        A garota parou por um instante e pensou. Olhou para Wandinha, depois para os olhos de Joey, e saiu correndo para fora da casa dos Addams, morta de vergonha.

        - É, parece que eu ganhei essa, rata de biblioteca – Wandinha disse, enquanto encostava na parede, de braços cruzados.

        “Ganhou? Mas ganhou o que? Caramba, o que foi que aconteceu aqui?”, Joey se perguntava, confuso.