A noite caiu fria e rápida. Nem parecia que já eram quase três da madrugada. Minha respiração contra batia com a dele rapidamente, naquele silencio torturante. Minhas pernas agarraram o cobertor forte, em um habitual movimento de tentar me manter mais aquecido, o frio me consumia.

“Está dormindo?” Eu sussurrei com as pontas dos lábios, ele me lançou um olhar terno, respondendo minha pergunta. Sorri de canto, naturalmente. O silencio voltou a nos dominar e me irritar. Queria dizer que seu cheiro me embriagava, sua risada me alegrava, seus olhos me encantavam. Sua barriga fazia movimentos sob minha cabeça cansada na mesma, apenas apreciando a temperatura corporal que ele transmitia. Em um movimento inesperado ele deslizou até mim na cama, ficando frente a frente comigo. Seu cheiro me invadia como um veneno. Não sabia o que fazer, apenas o analisava delicadamente, cada parte daquele rosto perfeito.

“Que foi?” Perguntei, rindo soprado.
“Nada...” Ele respondeu, imitando minha reação. Mais silencio. Suas mãos macias e ligeiras apanharam os fios do meu cabelo, os puxando pra fora, fazendo aquele cafuné que só ele sabia. Eu poderia dormir com aquele simples movimento. Dormir pra sempre e nunca mais acordar.

“Eu te amo, sabia?” De repente. Não pude deixar de sentir felicidade. Meus olhos se arregalaram rapidamente, meus lábios formaram um fio de alegria. Não pensava em mais nada. Como podia ser tão perfeito? Meu coração começou a bater descompassado, minha barriga embrulhava e eu sentia vontade de sair gritando. Mas tudo aquilo se acabou em segundos, minha consciência, talvez, falou mais alto, falou mais rápido. Não, ele não me amava. Heechul hyung não me amava. Amava ele.

“Mentira!” Repeli, segurando o riso sarcástico. Segurando meus sentimentos. E cada vez mais eu me cobria com a coberta, em uma tentativa de me esconder daquele sorriso encantador, de seus olhos... Do seu amor.
“É verdade” Ele disse rindo, como se fosse obvio. Não era obvio. Era doloroso. Não estava disposto a chorar na sua frente, não estava disposto a me dar assim por vencido. No momento em que meus olhos se encontraram com os deles, tudo havia se perdido, meu coração falhou uma batida, minha boca ficou seca, meus olhos entre abertos. Eu precisava senti-lo. Seu movimento foi apenas de alguns centímetros até que alcançasse meus lábios gélidos. Uma corrente elétrica me ligou a ele, cada vez mais eu sentia calor, cada vez mais eu sentia uma necessidade imensa de possuí-lo, cada vez mais eu o amava. Seus lábios iam de encontro com os meus em uma dança suave, experimentávamos cada canto, cada lugar escondido e implorando para ser descoberto. Puxei seu lábio inferior para mais perto de mim, arrancando um sorriso malicioso de sua boca, logo em seguida dando espaço para que sua língua me desse “boas vindas”. Era tão bom, me sentia no céu. Era um sonho. Todos os problemas foram esquecidos, depositados na gaveta trancada com sete chaves. Gostaria que esse momento fosse eterno, eu agarrava os fios da nuca alheira, puxando com força em uma urgência inexplicável. Vários selinhos provocantes foram deixados antes de eu cortar o beijo, antes de eu acabar com o meu delírio.

“Não pode!” Disse constrangido. Não podíamos fazer isso, ele não me amava de verdade, certo? Ou amava? Não o entendo... Como alguém pode amar duas pessoas ao mesmo tempo? Ou até mesmo dizer que sempre serei o seu primeiro amor de verdade depois de anos. Mas eu tenho certeza que ele ainda faz parte do passado, um passado que não quer ser esquecido. Vive nos rodeando como assombração, sempre o fazendo chorar, lembrar dos momentos bons, ruins... Não importa o que, ele sempre fará parte da sua vida, mesmo que eu tente mudar. É tão errado. Mas é tão certo. O silencio voltou a nos rodear, minha respiração estava pesada. Ele apenas me observava, sorrindo doce. O olhei de relance, por cima do cobertor, parar encarar aqueles olhos de gatos mais uma vez. Pela ultima vez.

“Aish” Ele virou na cama, irritado. “Sou tão idiota!” bufou antes de tatear a testa, em uma frustração.
“É mesmo...” Disse receoso, pedindo intriga. Ele me olhou de lado, indignado, seguindo por viradas de órbitas incessíveis. “Eu sei...” ele conclui.

“Você o ama ainda” Meu choro insistia em querer sair, pronunciava cada palavra com dor. Cuspia as silabas, atropelando todas as regras gramaticais.
“Infelizmente” Seus olhos já não estavam mais ali, haviam se dirigido para outro lugar. Provavelmente para as lembranças distantes.
“Mas e eu?” Tomei coragem para encarar seu perfil pensativo.
“Aish, Donghae! Você sabe que quando estou com você, eu o esqueço”. Suas palavras soavam como musica, sua voz em um aveludado cansado pelo tardar da noite o deixava tão sexy, tão irresistível. Ainda mais falando essas coisas. Por pouco não avancei em seus lábios. Ah, aqueles lábios tão rosados e inchados pelas mordidas dadas minutos atrás.

“Mas machuca” Finalmente, minhas lágrimas espirraram da minha face, arranhando minha bochecha sensível pelo frio, denunciando meus sentimentos.
“Desculpa...” Sua única palavra. Como pode surtir tanto efeito assim em mim? Sou algum tipo de trouxa? Heechul hyung sempre foi como um irmão. Sempre cuidou de mim e me mimou. Parece que foi ontem que nos conhecemos, aquela sensação de estar protegido por alguém nunca me abandonou. É com ele que dou risadas verdadeiras, que encontrei um porto seguro, alguém para bater quando estiver com raiva, um ombro pra chorar quando estiver triste e um ouvido pra quando precisava desabafar. Estava vivendo uma vida de príncipe ao seu lado. Nunca cansava de seu sorriso. Ele me tratava como se fosse o único em seu mundo, o mundo em que poucos entravam... O mundo que um dia fora aberto para um outro poder se servir das suas qualidades. Ele e aquele seu sorriso brilhante. Heechul hyung se apegou a ele muito fácil. Mas fácil do que comigo. Em pouco tempo já eram chamados de melhores amigos, de marido e mulher. Mas toda aquela magia chinesa um dia se foi, deixando seus vestígios pra trás, restos de relações inseparáveis e um amor proibido. Nunca odiei Hangeng hyung, mas eu às vezes queria que ele nunca tivesse entrado nas nossas vidas. Pouparia nossos sofrimentos. O meu sofrimento de agora. Meu sofrimento por anos.

Meus devaneios foram interrompidos por um estalar ardido na minha bochecha esquerda. Assustei com sua reação, ele apenas me retribuía um sorriso meia boca, típico seu. Não pude deixar de sorrir, de apreciar toda aquela perfeição em minha frente. Meu coração doía muito. Eu sabia que não passaríamos disso. Meu amor por ele ultrapassava o dele próprio. Ele nunca poderia me amar como eu o amo. Seu coração já tem um dono. Um dono cruel. Apenas me contento com seus sorrisos e carinhos... Isso já é o bastante.

“Eu vou revolver isso!” Ele disse decidido, já ouvira isso antes, ri divertido levando tapinhas do mais alto, frustrado. Seus cabelos bagunçados e negros davam um contraste mais atraente á luz da lua. Ah, eu havia me perdido em pensamentos novamente. Mordi os lábios, reprimindo as falas. Queria poder contar tudo a ele, contar como realmente me sinto. Mas não receberei nada além do que seu silencio.

“Vai mesmo. Afinal, somos HeeHae, certo?” sorri como uma criança, inocente.
“Claro!” seus braços me envolveram em um abraço verdadeiro. Senti seu cheiro novamente, desejando todo aquele corpo pra mim. Desejando seu coração. Mas enquando não o tenho, apenas aproveitarei nossa amizade. Que é mais importante do que qualquer coisa.