Nicolas estava lendo e relendo o pequeno texto que sua sobrinha escrevera. Estava maravilhado com tamanho talento que aquela garota tinha para a escrita. Nunca imaginara que um dia aquela pequena Angelina cresceria, e se tornaria aquele poço de inteligência e transbordaria romantismo em suas palavras.

Manoela também estava surpresa. Afinal, viu grande parte da infância e agora a adolescência de Angelina, viu-a aprender a escrever sozinha, e a vira ler os mais variados livros, dos quais ela nunca nem sequer ouvira falar. Mas vê-la escrevendo algo tão poético, fez cair a ficha de que a pequena já não era mais pequena, e o mais incrível: fora a única que percebera a diferença nos olhos de Angelina, o quão platônica ela andava, mesmo sem conviverem mais juntas, notou que ela estava apaixonada.

— E então? O que acharam? — perguntou-lhes Núbia, com um sorriso estampado em seu rosto, com um orgulho sem medidas de tal proeza de sua filha.

— Incrível. Nunca vi ninguém escrever dessa maneira, ainda mais aos quinze anos! Hoje em dia, os adolescentes não estão mais buscando essa essência apaixonada, essa prática tão enriquecedora que é a escrita. Mas minha sobrinha me surpreendeu. Que vocabulário, que coisa mais magnífica. Faltam-me palavras para descrever o que senti ao ler e ao saber que veio da minha eterna pequena. — disse Nicolas, em pose de homem culto.

— Ah amor, tu sabes muito bem como usar as palavras quando quer... por que não usa-as sempre? — brincou Manoela.

— Engraçadinha...

— O importante é que minha filha nos deu o maior orgulho de todos até o dia de hoje. Quem diria que aquele monte de livros que ela me pedia a levaria a esse nível? Minha filha é uma escritora!

Núbia continuava cheia de orgulho de sua filha amada. Angelina não podia ouvir nada do que a família conversava entre si, mas permanecia ali, pois sentia que estavam falando muitíssimo bem de suas linhas cheias de amor. Dom é dom, afinal.

[…]

Alguns dias se passaram, e Angelina continuou escrevendo:

“Hoje se completa um mês que você não aparece. Sinto sua falta mais do que o deserto sente falta da água. Não sufoques mais meu coração desta maneira, estou sempre a sua procura, e nunca te encontro. Mas me alegro por saber que existes, e que não és fruto de minha imaginação, apesar de que ela já se fez confundir com minha realidade dura e cruel sem você.

Apareça, paixão minha; para que meus dias possam ser coloridos outra vez com a magia de um arco-íris após uma tempestade. Ver-te já me faz muito feliz, pois não conheço outro tipo de amor, que não seja esse que sinto por ti. E mesmo de longe te amo, mesmo tão distante, meu coração resolveu que o motivo de cada batida seria você. A ti, dedico hoje meu coração descompassado, que sofre com vontade de rever esses olhos castanhos que tanto me hipnotizaram, quando se cruzaram com os meus.

Amar-te tem sido doce e gentil. Mas a parte amarga é que você some, sem deixar-me outra alternativa a não ser manter sua imagem em meus sonhos, e em meus pensamentos.”

De repente parou. Sentiu forte alegria em seu coração, e inexplicavelmente, deparou-se com o impulso de escrever as seguintes palavras, no verso da folha:

“Vida é o que é gerada de um verdadeiro amor. Quando dois corações se amam, geralmente aparece um terceiro que os une para sempre.”

Suas palavras, de início, pareceram-lhe estranhas. Leu-as muitas vezes, mas não conseguia entender o que havia escrito. Não se encaixava com nada do que sentia no momento. Então recordou-se do desenho que havia feito de seus pais. Será que tinha a ver com aquilo?