Bento.

Fiquei sentado na cerca e vi quando um automóvel passou pela estrada da fazenda. O infeliz do Reanto estava lá dentro com o pai. Ele nunca mais iria ser tão ousado.

Se ele fosse esperto.

Nunca mais.

Tinha que aliviar um pouco minha mente e resolvi caminhar. Depois da m-mor... do que havia acontecido com Maria eu não conseguia mais andar à cavalo.

Caminhei durante uma hora, mais ou menos, e me deitei debaixo do pé de cajá-manga. Acabei cochilando.

Quando acordei o sol já estava se pondo e eu sabia que deveria falar com Kátia. Nessa altura, ela já estaria sabendo do "acidente".

Ela estava penteando o cabelo.

_Boa noite... - eu disse.

Ela pulou da cadeira.

_Você é louco? Bento, eu pedi que você não fizesse nada! Você o machucou, cara! Ele podeia... Sei lá! Ter morrido!

_Meu amor...

_Não vem com essa história de "meu amor" pra cima de mim não! Aquilo foi cruel! V-você m-me dá... m-medo!

Suas palavras doeram. Cada palavra parecia uma pedra sendo jogada na minha cara.

Parecia que eu também havia sido ferido.

Eu não estava certo. Não estava certo mesmo. Mas quando estamos com raiva e, principalmente, apaixonados, somos capazes de qualquer loucura.

_Desculpe... Fui um idiota.

Minhas mãos começaram a tremer.

_Eu te amo, Kátia. E, mesmo não sendo certo o que eu fiz, queria que aquele sujeito parace de... Ah! Eu estava com ciúmes... Eu não aguentei te imaginar nos braços dele!

_Só que você não pode... Ah, Bento! Eu não consigo sentir raiva de você por entrar no meu quarto à noite sem avisar, por machucar o Renato, por desmanchar minha trança ontem à tarde... Eu não sei sentir raiva de você!

Eu a abracei.

_Perdão, princesa... Por tudo de errado que...

Ela colou seus lábios nos meus.

Era a primeira vez que ela tomava a iniciativa de me beijar.

Quando terminamos eu não a soltei. Sentindo o coração dela batendo, a respiração ofegante.

_Eu sei que não sou perfeito, mas acho que já provei que por você eu faço qualquer coisa.

_Eu... Eu acho que tô apaixonada...

Eu a abracei com mais força.

Ela se soltou,alguns minutos depois, e se sentou novamente para continuar a pentear os cabelos.

Ficamos em silêncio por algum tempo.

Me postei atrás dela e encostei em seus ombros.

_Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaah! - ela começou a gritar.

_Que foi, princesa?

Ela olhava atônita para o espelho.

_S-seu... Reflexo!

Ouvi alguém bater na porta e uma voz de mulher chamar por Kátia.

_Boa noite, meu amor - disse, beijando sua testa.

Corri para o jardim e de lá saí da sede da fazenda.

Me pus a observar as estrelas e me permiti que as lágrimas rolassem.

"Sou um monstro!" - pensei.