A entrevista de Caesar foi um sucesso. Ele e o avô conquistaram a
audiência juntos. As entrevistas dos outros tributos foram irrelevantes para mim. Só prestei um pouco mais de atenção na vez de Sinny e Felly em consideração à amizade que tivéramos no passado. Os dois foram bem, embora nada surpreendentes.

Voltamos ao apartamento com uma sensação de dever cumprido. Com nossas notas e nosso bom desempenho nas entrevistas, teríamos conseguido um bom número de patrocinadores. Tínhamos também a nosso favor a fama de nossos avôs, que atraía a atenção de todos para nós sem que nos esforçássemos muito.

_Nada mal para o distrito dos artigos de luxo.

Todos nos voltamos para a porta. Eu reconhecia aquela voz...

_Johanna? - indagou Katniss. - O que está fazendo aqui?

_Checando a concorrência. Você sabe que também sou mentora de algumas criancinhas mimadas da Capitol. Mas novamente, nada mal para o distrito das joias. Sem ofensas, mas joias não são o que você chamaria de ameaçadoras.

_Se não fossem as joias, os Romanov teriam morrido muito mais rápido. - protestei.

Agora era para mim que todos olhavam.

_Ro... o quê?

_Romanov. Nicolau Romanov era o comandante de um país chamado Rússia, que existiu muito antes de Panem. Houve uma revolta e Nicolau, sua esposa Alexandra, suas quatro filhas e seu filho caçula foram mantidos presos em uma casa, cercados por guardas. Antes de serem presos, Alexandra ajudou os filhos a costurarem pérolas e diamantes embaixo das roupas, para caso conseguissem fugir. Eles nunca fugiram, mas as joias adiaram por algum tempo a morte das crianças. Todos os guardas tinham ódio de Nicolau e de sua mulher, e alguns deles estavam
bêbados, então a maioria dos tiros foi dirigida aos dois. As poucas
balas que atingiram as crianças tiveram seu impacto reduzido pelas
joias que eles escondiam, funcionando como uma espécie de colete
protetor. É claro que, na situação na qual se encontravam, eles prefeririam morrer logo.

_Como assim? Eles não iam morrer de qualquer jeito? Qual a diferença?

Sorri sarcasticamente.

_Sim, eles morreriam de qualquer jeito. Mas se houvessem morrido logo, não teriam que assistir seus pais serem mortos na sua frente. O livro em que vi essa história dizia que o cômodo onde os Romanov foram executados fedia tanto a sangue e fumaça que vários guardas correram para fora da casa, passando mal e vomitando por causa do cheiro. Dizia também que Alexei, um garoto de apenas treze anos que vivia doente, estava coberto com o sangue de seu próprio pai quando morreu.

_Deixa ver se eu entendi, os guardas estavam com pena de atirar nas crianças? - interrompeu Johanna.

_Talvez com o Alexei sim. Esperem um segundo – pedi correndo até meu quarto. Voltei com um livro nas mãos, folheando-o em busca de uma página em especial.

_Aqui – mostrei a página aberta em uma foto das garotas Romanov. - Os guardas podiam até ser guardas, mas muitos eram jovens e, sobretudo, homens. As Romanov em seu tempo foram muito conhecidas por sua beleza. Especialmente Tatiana. E dizem que Maria vivia a flertar com os guardas. Olga era mais séria, e Anastasia agia como uma criança,
mas isso não tirava sua beleza.    

_Como você sabe de tudo isso? - perguntou Peeta.

_Eu sempre gostei de histórias. Meu avô costumava me dar de presente livros de história de antes de Panem. Algumas histórias eram tão boas que acabaram se fixando na minha mente. A dos Romanov foi uma
delas. 

_Ah, tá... Droga, vocês acabaram me distraindo. - Johanna sacudiu a cabeça – Eu não vim pra bater papo. Mandaram que eu avisasse para
os outros distritos uma mudança no “figurino” da arena. A roupa de todos vai ser uma espécie de macacão, mas são os próprios tributos que vão escolher a roupa que usarão por debaixo desse macacão.

_É uma espécie de faca de dois gumes, não é? - interrompeu Katniss. - Dependendo da escolha do tributo, isso pode ser uma vantagem ou uma desvantagem.

_Isso mesmo. - sorriu Johanna – Seria melhor começarem a fazer seus planos.

Ela foi embora e Henlyr saiu da sala, murmurando algo sobre ir trabalhar em nossas roupas. Grey Lyn começou a segui-lo, mas parou na minha frente, com os olhos marejados.

_Elyn...

Engoli em seco e abracei-a. Eu estava tentando manter-me distante dela, mas não estava mais aguentando. Principalmente sabendo que em breve teríamos de nos despedir, talvez para sempre.

_Está tudo bem, mãe. Vai ficar tudo bem.