Enquanto eu ia até o banheiro, percebi que a casa tinha muitos corredores e que seria assustador ir ao banheiro à noite. Eu tenho pavor do escuro e de lugares fechados, acho que sou claustrofóbica, mas nunca comentei nada disso com ninguém, já sou estranha o bastante para ainda ter essa doença.

 Lembro-me de um dia em que fiquei presa no elevador do trabalho de meus pais, estava sozinha e havia faltado luz. Eu estava completamente desesperada, minha respiração era tão rápida e tão alta que ao mesmo tempo vinha o choro gritante, eu queria sair dali, mas havia faltado luz, não havia como! Mas, quando se está com o medo que eu estava naquele instante não se pensa com clareza.

 Entrei no banheiro rapidamente, começando a pensar que a qualquer momento as paredes poderiam começar a me exprimir.

 Sim, eu sou um pouco neurótica, mas quem não é? Todos têm medos e eu particularmente tenho pavor de meus medos e tenho mais medo ainda que alguém um dia venha a virar isso contra mim, por isso nunca digo que tenho medo.

 Comecei a me despir e entrei na enorme banheira de mogno com detalhes em ouro, notei que os pais de Lara gostavam de esbanjar dinheiro.

 Fechei os olhos e fiquei longos minutos na banheira, pensando, refletindo e tentando esclarecer as coisas que vinham acontecendo.

 Por que será que Lara agiu de forma tão estranha e de um momento para o outro estava como se não se lembrasse de absolutamente nada? Estranho demais isso! – pensei.

 Pensei em perguntar a ela, mas já que Catherine tinha ficado tão histérica com aquilo achei melhor perguntar a ela. Com certeza ela teria uma resposta para me dar. Tomara que ela não seja igual a Matthew nas respostas. – pensei sorrindo.      

 Lembrei-me do sorriso de Matthew quando ele gargalhou em minha cozinha. Seu sorriso era tão bonito, tão iluminado que me fazia achar que estava tudo bem, apesar de não estar. Ele estava sendo tão carinhoso, tão cuidadoso comigo... Acho que eu estou mesmo muito carente de atenção e carinho, por que nunca tive esse tipo de pensamento por mais ninguém, nem por meus pais, afinal eles sempre me deram atenção e carinho. É horrível se sentir sozinho no mundo... Não, sozinho talvez não, tenho minha avó, mas não é a mesma coisa de ter pais, amigos de verdade e tudo mais...

 Lara, Catherine e Peter eu tinha acabado de conhecer, não podia classificá-los como amigos de verdade, mas Matthew talvez eu pudesse.

 Abri os olhos e olhei para o relógio que havia dentro do banheiro... Achei estranho haver um relógio no banheiro, mas quando me deparei com a hora pulei da banheira, me sequei rapidamente e sai correndo. Era tarde! Muito tarde! Eu tinha que ir embora, ver o que eu faria da vida, não poderia ficar ali para sempre, apesar de essa ser a minha verdadeira vontade.

 Abri a porta abruptamente e dei de cara com Matthew.

 Corei no mesmo instante, afinal eu estava com a toalha enrolada em meu corpo e minhas roupas em minhas mãos.

 -Matthew! – gritei ao vê-lo.

 Percebi que ele tentava se concentrar apenas em meu rosto, mas ele era homem! Eu sabia disso, mas ninguém gostaria de sair do banho e encontrar um amigo na porta.

 Ele corou e deu aquele famoso sorriso rasgado, ele colocava a mão na frente da boca para eu não perceber que ele estava envergonhado.

 -Catherine falou para eu vir chamá-la, mas não imaginei que já... – disse ele andando e olhando para o chão.

 Fiquei um momento observando seu andar. Era pesado, másculo e com passos rápidos, então quando notei que já estava ficando para trás, apertei o passo e em menos de três segundos já estava a um passo dele.

 O pior naquela situação é que era um corredor longo, então não tínhamos para onde correr, infelizmente.

 Ele passou rapidamente para a cozinha coçando a cabeça, envergonhado, claro! E eu saí correndo em direção ao quarto de Lara.

 *

 Lara me emprestou algumas roupas dela, pois minhas roupas estavam muito sujas, mas continuei com meu tênis e o colar de minha mãe.

 Coloquei uma calça jeans preta justa que quando pus, tive de dar algumas puxadinhas para entrar, uma blusa preta de manga comprida com gola em “V”, não gosto muito, mas era a única que ela tinha me dado e achei que não deveria pedir outra, pegaria mal... E um casaco grande azul marinho com capus, do jeito que eu gostava.

 Peguei uma escola de cabelo que ela me emprestou e parti meu cabelo ao meio, como sempre fazia. Estava sentindo falta de pentear os cabelos molhados.

 Saí de lá, deixando meu vestido na lavanderia que era trás da casa.

 Caminhei sobre o gramado bem cortado e vi a silueta de um homem vindo em minha direção. Não sabia quem era, mas Dr. Charlie não era. Ele era bem mais alto que aquele que vinha em minha direção.

 -Melany... – era Matthew, só pela voz eu o identifiquei.

 Suei frio e meu coração disparou quando ouvi sua voz. Não que eu gostasse dele! Era que ele tinha me visto quase nua e aquilo era constrangedor.

 -Fale... – disse indo ao seu encontro.

 -Volte. Lara disse para não por na lavanderia, porque a máquina de lavar está quebrada e não vai dar para lavar. – ferrou! – pensei.

 Dei meia volta e saí correndo em direção a pequena casinha que havia a diante.

 -Porque está correndo?! – perguntou ele com a voz falhada, provavelmente estava correndo atrás de mim.

 -Eu coloquei meu vestido dentro da máquina e apertei o START. – falei abrindo a porta de alumínio da lavanderia e vendo o estrago que eu havia feito.