Abri os olhos tentando fugir do pesadelo que ocorria de dentro de mim, que se passava pela minha mente, para encontrar apenas mais um pesadelo do qual eu tinha de enfrentar, para encontrar apenas mais escuridão, para encontrar seus gritos cada vez mais altos.

Eu corria em meu limite, minhas garras se enroscavam cada vez mais nos troncos das arvores ao meu redor. Tudo girava, eu poderia estar desnorteado, eu poderia perder a direção em um segundo de distração mas seu perfume deixava seu rastro e eu continuava a segui-lo.

Meu coração acelerava, sentia os galhos arranhando minha pele para, segundos depois, já estar perfeitamente normal, essa era a vantagem de ser quem eu era, grande vantagem, me impedia do suicídio. O rugido que eu tentava segurar parecia que iria escapar a qualquer momento, os gritos dela pareciam ainda mais desesperados e eu me joguei para frente em um impulso, precisava chegar até ela rápido, ou se não seria tarde demais.

As árvores ao meu redor pareciam cada vez maiores e mais juntas uma das outras, o que me atrasava e me dava uma sensação de impotência, e se eu não conseguisse?

– Me larga! - escutei sua voz mais perto, bem mais perto. Eu iria conseguir, tinha que conseguir.

– Ela me mordeu! - escutei também a voz abafada de um dos monstros que estavam com a garota, não monstros iguais á mim, monstros piores, muito piores, eles eram humanos.

Apressei ainda mais meus passos, faltava poucos metros, o rugido em minha garganta não poderia mais ser contido, então o soltei ao mesmo tempo em que pulei em direção a um deles, o que estava segurando ela.

Ele gritou, ela também. Eu o empurrei ao chão e ele soltou a garota em um ato reflexivo, era apenas o que eu precisava para poder acabar com a vida dele, agora não poderia machucá-la por descuido.

Minhas garras afiadas em contato com sua pele, que mais parecia uma folha de papel, fizeram estragos consideráveis, ele gritava desesperadamente e eu não poderia mentir, estava adorando escutar seus gritos.

– Me ajude! - ele tentou gritar para o companheiro, mas este parecia mais preocupado em fugir que ajudá-lo, não adiantaria, eu era mais rápido de qualquer modo.

Em um movimento rápido, dei um fim aos seus gritos, torcendo seu pescoço e me lançando em direção ao outro.

Não olhei para a garota, não poderia olhá-la agora e ver o horror em seus olhos, ver o monstro que ela enxergava em mim, o que eu era de fato.

– O que você é? - o segundo homem perguntou enquanto eu o jogava em uma árvore.

– Sou a sua morte - grunhi enquanto arrancava seu pescoço e ele dava seu último grito.

Voltei em direção à garota, que se encolhia em uma das arvores, parecia assustada. Permaneci parado alguns instantes, meu rugido ainda parecia ecoar pelas árvores, e então, o silêncio absoluto apareceu onde eu conseguia ouvir apenas sua respiração.

– Você está bem? - eu perguntei cautelosamente, com medo de chegar perto demais e ela recomeçasse a gritar.

– Cato? Cato Stroke? - ela perguntou assustada. Droga, como ela havia reconhecido minha voz? - É você? O que está fazendo aqui?

– Eu mudei muito Clove - murmurei sombriamente, e me aproximei inconscientemente, precisava ver se ela estava bem, se eles haviam a machucado embora estivesse escuro, o breu inundava tudo - Eles a machucaram?

– Não, eu estou bem - ela murmurou, se encolhendo ainda mais contra a árvore.

Bom, eu não a culpava, por que ela não ficaria com medo? Eu era uma fera. A fera. Não é bem lobo ou urso, gorila ou um cão, mas uma nova criatura horrível que anda na vertical, uma criatura com presas e garras e pêlo saltando por todos os poros. Eu sou um monstro. Você acha que eu estou falando de contos de fadas? De jeito nenhum. O lugar é Panem. A hora é agora.

Não é nenhuma deformidade, nenhuma doença. E eu vou ficar assim para sempre, a menos que eu possa quebrar o feitiço. Sim, a magia, a magia que a garota estranha de cabelos cor de fogo da minha aula de Inglês jogou em mim. Por que ela me transformou em um monstro que se esconde pelo dia e anda pela noite? Eu vou te dizer. Eu vou te dizer como eu costumava ser Cato Stroke, o cara, com dinheiro, e uma vida perfeita. E então, eu vou te dizer como eu me tornei... A fera.