Leah escrita por Jane Viesseli


Capítulo 8
Verdades em Meio ao Delírio




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Sozinha em casa, com um lobisomem desacordado em sua cama, e Leah não fazia ideia do que deveria ser feito. Pensou em examiná-lo e dar-lhe algum remédio, mas nunca havia cuidado de alguém doente de verdade, como poderia saber o que ele tinha? Lucian tosse algumas vezes e começa a se mover, parecia recobrar a consciência.

― Está queimando – balbucia, num tom inaudível a humanos comuns –, está muito quente…

― O que você tem? Diga-me, o que está sentindo?

― Calor, muito calor, está me queimando por dentro, por favor, faça parar…

Leah sente seu coração se apertar diante dos clamores do cherokee e logo se lembra de um filme que assistira uma vez, não fazia ideia do nome, mas lembrava-se perfeitamente da cena em que uma mulher esfregava gentilmente a pessoa febril com toalhas úmidas, e, sem pestanejar, a quileute se apodera de uma toalha e de uma bacia com água.

― Vamos lá, me ajude – pede ela, enquanto tentava retirar a camisa de manga comprida do rapaz.

Lucian fervia em febre. Leah sentiu a parte ácida de sua mente elaborar uma piada sobre ser possível preparar ovos com bacon para o café da manhã em cima dele, mas nenhuma palavra saiu de sua boca, pois a parte sensata de seu cérebro reconhecia que febre alta nunca era um bom sinal e que devia ser levado a sério. Ela podia sentir, mesmo sem tocá-lo, o calor excessivo que emanava de seu corpo e ver claramente o quanto ele tremia.

A toalha é mergulhada na bacia d’água, torcida e passada com movimentos suaves pelo rosto de Lucian, que podia sentir o delicioso frescor vindo da toalha, que agora descia pelo seu pescoço em direção aos ombros. O tecido é mergulhado novamente e agora passado sobre o tronco do paciente, permitindo a Leah um contato lento e minucioso sobre toda a sua musculatura…

A porta da sala se abre ruidosamente, fazendo com que Leah parasse imediatamente com o que fazia. Ela ouve a voz de Hana e corre ao seu encontro, não conseguindo controlar o semblante preocupado e permitindo que ela enxergasse em seu rosto, que havia algo errado.

― Esta tensa, ansiosa, – arrisca um palpite –, parece que está preocupada com alguém.

― Alguém não… Seu irmão. – Pausa. – Ele está muito mal.

Hana corre atrás de Leah, em direção ao quarto, onde encontra Lucian num estado lastimável e a toalha molhada largada displicentemente sobre o criado-mudo. Ela se ajoelha ao lado da cama, próximo à cabeça de Lucian e acaricia o seu rosto com as mãos, medindo sua temperatura.

― Lucian, o que foi que você fez?

― Hana – murmura, tossindo em seguida e mal conseguindo abrir os olhos –, me desculpe…

― Você tomou chuva quantas vezes?

― Duas… E pulei no mar gelado uma vez, para salvar um homem…

― Por que você tem que ser tão descuidado? Agora está queimando em febre.

― Lobisomens não ficam doentes! – afirma Seth incrédulo.

― Os quileutes não ficam, mas nós ficamos. – Pausa. – Nossa pele quente nos impede de adoecermos, mas quando tomamos muita chuva, a água fria abaixa nossa temperatura corpórea e nosso sistema imunológico volta a ser igual a quando éramos humanos... Lucian sempre foi um adolescente de saúde frágil, sempre ficou doente com facilidade, é por isso que precisa estar sempre atento às chuvas, mas ele não o faz. Sou eu que sempre banco a chata e pego tanto no pé dele…

― Como ele pode estar com febre? Ele treme, mas não reclama de frio, reclama de calor, de muito calor – indaga Leah.

― A temperatura dele quer se estabilizar e acaba entrando em conflito com a doença humana, dando estes efeitos colaterais. – Vira-se para o irmão, abrindo levemente o seu olho direito e percebendo que ele não se focava nela, apesar de continuar acordado. – Lucian, quem era o seu melhor amigo?

― Piatã…

― No que isso é relevante? – pergunta Seth, confuso.

― Ele não gosta de falar do passado e se está respondendo tão facilmente, é porque já entrou em estado de delírio e as dores tendem a piorar a partir daqui. – Se levanta. – Nenhum remédio humano vai curá-lo, vou precisar comprar algumas ervas para fazer um xarope caseiro, especial da minha tribo. Seth irá comigo e você, Leah, continue mantendo a temperatura dele baixa, por favor, isso diminuirá as dores…

― Eu levarei suas compras à hospedaria e voltarei logo para ajudá-la – afirma Sue, saindo em seguida para cumprir sua missão o mais rápido possível.

Hana parte com Seth, deixando Leah sozinha novamente. Entretanto, desta vez, ela possuía uma informação valiosa, a de que Lucian estava suscetível a responder tudo o que lhe fosse questionado. A quileute se aproxima do rapaz doente, sentando-se à beira da cama e respirando profundamente, teria ela coragem de se aproveitar de seu estado, para arrancar-lhe informações? De romper com o trato que fizera com ele e ter todas as respostas que queria sem dar nenhuma resposta em troca?

― Me desculpe por trapacear, mas somente assim saberei se me diz a verdade: o imprinting foi real?

― Sim, mais real do que minha própria existência – responde ele entre gemidos, murmurando algumas outras coisas que Leah não conseguiu compreender.

― Eu não tive um imprinting por você, não sinto nada por você. O que me diz disso?

― Eu posso conquistá-la, sei que posso, eu… – Tosse, não retornando à resposta depois disso.

― Eu odeio minha vida, não sou feliz, as feridas e lembranças me atormentam todos os dias, como, exatamente, serei conquistada por você? – pergunta frustrada.

― Eu cuidarei de você – geme num sussurro – de cada ferida, uma a uma, substituirei suas más lembranças até que só exista a mim, em seus pensamentos… Está queimando – reclama, subindo o tom de voz em sofrimento.

Leah deixa uma lágrima solitária escapar de seu olho esquerdo, emocionada por cada uma daquelas palavras. É possível curá-la? É possível que aquele recém-chegado tenha poder para substituir as lembranças de Sam, dando um novo sentido para a sua vida? Isso era o que ela mais desejava: desprender-se do passado, voltar a viver…

Leah abandona seus próprios pensamentos, focando sua atenção em Lucian e umedecendo novamente a toalha, para novamente aliviar as suas dores com o frescor do tecido.

― Você pode mesmo me curar? – questiona, depositando a toalha sobre o pescoço do paciente e se aproximando de seu rosto para ouvir a resposta, que veio num sussurro:

― Posso, se você deixar…

― Eu deixo – sussurra de volta, próximo ao seu ouvido, sentindo-se satisfeita por tudo o que tinha acabado de descobrir. A loba agora tinha certeza do interesse de Lucian, de suas intenções, e estava disposta a dar-lhe uma chance.

Um breve silêncio se instala no quarto, algo incômodo e fúnebre, que Leah não hesitou em romper com mais perguntas, desta vez, por pura curiosidade.

― Tem mais alguma coisa a me dizer, sobre nossa conversa de hoje?

― Me desculpe por parecer presunçoso – diz ele, abrindo levemente os olhos, mas não se focando em nada, demonstrando ainda responder por puro delírio. – Não quis debochar de seus problemas, só queria que confiasse em mim…

― Tudo bem. – Suspira. – O que você gosta em mim?

― Gosto da sua boca, dos seus olhos – Tosse, fazendo uma careta em seguida. Por um momento Lucian se calou e Leah teve de repetir a pergunta para que ele voltasse a dizer: – Gosto das suas pernas e do seu cheiro de canela, e como o seu coração acelera quanto estou por perto…

― Ah, nossa, que constrangedor, você percebeu?

― Sim…

― Ah, que vergonha, você também tem audição aguçada, que droga! – Soca a cama tentando se controlar, sentindo o rosto arder de constrangimento. – Muito bem… O que vou perguntar agora? – Respira fundo. – Sim, claro, fale-me sobre como chegou a La Push.

― Volturis…

Leah sente a cor de seu rosto desaparecer diante da palavra, sentindo toda a força e o significado daquele único nome golpear-lhe a boca do estômago. Ela sabia que o trio cherokee estava se refugiando em La Push, mas nunca, nem em seus mais estranhos sonhos, cogitaria que estavam sendo perseguidos pelo clã de sanguessugas mais perigoso do mundo. E se eles descobrissem onde estavam escondidos? Provavelmente seriam atraídos para a reserva… Sam e Jacob não gostariam nada desta revelação e, com certeza, os expulsariam.

― Por que eles o perseguem?

― Extermínio!

Seus olhos se arregalam levemente, pasma. Seu dever como integrante do bando era reportar tudo o que havia descoberto ao seu alfa, Jacob – que consequentemente compartilharia com Sam –, mas Leah sabia que não conseguiria, sentia em cada pedacinho de seu corpo que não teria coragem de contar a ninguém sobre os perseguidores, pois a simples ideia de vê-los partir incomodava seu coração de uma forma estranha. Não era algo que a definisse como “apaixonada”, no entanto, era o suficiente para fazê-la correr o risco de guardar aquele importante segredo!

Um barulho na sala anuncia o retorno de Hana, que rapidamente prepara o xarope cherokee e força o irmão a engolir cada gota. Os olhos de Leah observam a cena sem demonstrar a turbulência em seu interior, entretanto, seu polegar direito era mordiscado insistentemente por seus dentes, enquanto seus pensamentos trabalhavam nas novas informações que arrancara de Lucian. De acordo com a irmã, ele ficaria bem em um ou dois dias, contanto que tomasse os remédios adequadamente e repousasse muito bem.

― Ele pode ficar aqui se quiser – sugere Sue ao retornar para casa –, Leah dorme no quarto de Seth e ele pode dormir na sala…

― Eu durmo no sofá – retruca a loba, cruzando os braços –, Seth não caberia nele de qualquer forma.

Lucian dormiu profundamente durante todo o aquele dia e, ao que tudo indicava, parecia que seu sono perduraria por toda a noite. A casa já estava escura quando Leah olhou para o relógio, irritada por não conseguir dormir, eram duas da manhã. Ela se levanta do sofá e caminha silenciosamente até seu quarto sem medo de ser flagrada, Seth podia ter uma boa audição, mas ela era habilidosa e sabia ser silenciosa quando queria.

Leah adentra o quarto devagar e se aproxima da cama onde Lucian dormia tranquilamente, ela não sabia exatamente o que fazia ali, o que pensar ou o que fazer a seguir, apenas seguia seus instintos. E foi seguindo estes mesmos instintos que Leah pegou-se a admirar a fisionomia de Lucian: o rosto harmonioso; os lábios relaxados, porém, sedutores; os ombros largos e o tronco de músculos bem definidos; a respiração suave de quem estava usufruindo um sono tranquilo… A quileute logo repara em sua altura, que era um pouco maior que a dela própria e em seu cheiro amadeirado; ela se aproxima do pescoço de Lucian sutilmente, aspirando profundamente o seu delicioso cheiro, sentindo os pulmões formigarem e seu instinto ser atiçado por aquele aroma, como não tinha reparado neste cheiro tão gostoso antes?

A loba se afasta da cama bruscamente, sobressaltada. O que estava pensando em fazer? A ideia de beijá-lo realmente lhe passou pela cabeça? Precisava urgentemente sair para a noite fria e resfriar a cabeça. E foi isso o que fez, forçando-se a dormir logo em seguida.


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Notas finais do capítulo

Agora que Leah está disposta a dar uma chance ao lobo cherokee, muitas opiniões desaprovadoras serão acarretadas, mas o novo casal não se intimida e sai em seu primeiro encontro... Será que finalmente teremos nosso primeiro beijo?