Nas semanas que se passaram tanto Sara quanto Cássia se recuperou bem. A gravidez de Sara seguia seu curso natural, sem nenhum problema, assim como seu casamento com Gil. Saber que ele tinha um filho fora do casamento não a amedrontava tanto. Afinal, ela não tinha ressentimentos com Noah, ele era uma “vítima” daquela estória toda. O problema todo sempre fora aquela outra mulher. Mas, ver o marido voltar correndo ao saber que ela precisava de ajuda deixou Sara muito animada.

Quem não compartilhava daquele sentimento todo era Betty. A senhora não conseguia acreditar que seu filho estivesse escondendo algo dela. Mas toda vez que ela o visitava sentia que ele não estava sendo tão verdadeiro com ela. Ainda mais, muitas eram as vezes que ele e Sara paravam de falar abruptamente quando ela entrava no recinto. A situação chegou a tal ponto que ela se viu pensando em interrogar sua neta para saber se havia algo de errado naquela casa.

Então, em um dia, quando servia de babá para que seu filho e nora pudessem assistir a um concerto, ela começou uma conversa com sua neta

“Cássia, o que você gosta de fazer quando seu pai está em casa?”

“Hummm...eu adoooro as panquecas dele. Sabia que ele sabe fazer panquecas do Mickey, vovó?”

“Que delícia, pequena. E o que mais você faz com o papai?”

“A gente brinca...lá no quintal. Procuramos joaninhas. Sabe que elas são meus insetos favoritos? O do papai é a borboleta, porque ele diz que eu e a mamãe somos as borboletinhas dele!”

“Ah, isso é muito bom. Então, vocês estão se dando bem, não é? O papai está sendo bom com a mamãe?”

“Sim. Eles se beijam toda hora!” ela disse isso com uma cara de nojo, igual a qualquer criança naquela idade.

Betty riu, mas ainda não estava tão aliviada. Apesar de Cássia parecer bem e dizer que a rotina da família era boa a senhora não estava convencida.

“E o papai ainda trabalha muito?”

“Muito mesmo...quando ele vai atender o telefone no quarto a mamãe diz que eu não posso ir até lá, para não atrapalhar. Mas ele vai até lá muito, vovó!”

Finalmente uma informação útil! Ela teria que falar com a nora sobre isso...

*~*~*~*CSI*~*~*~*

Gil estava deitado em sua cama com sua esposa em seus braços. Eles curtiram uma noite espetacular. Primeiro um jantar no luxuoso Le Circle, depois uma apresentação impecável da ópera “Carmem”. Agora ele acariciava sua esposa, os dois cansados demais para se levantar depois de algumas horas animadas debaixo dos lençóis.

–Temos que fazer isso mais vezes- ele comentou- Sair só os dois...estava sentindo falta de ter sua atenção só para mim.

Sara sorriu e virou o rosto para beijar o marido.

–Daqui a alguns meses vai ser quase impossível, então eu diria que teremos que acumular experiência enquanto ainda podemos.

Gil desceu a mão até a barriga ainda lisa de Sara.

–Eu não consigo imaginar o que será de nós com duas crianças abaixo de cinco em casa!

–Vai ser uma experiência interessante.

Os dois ficaram calados por um instante, cada um imaginando como seria daqui para frente. Mas, como ocorria invariavelmente esses dias, todas as vezes que ele pensava na gravidez de Sara, seus pensamentos iam até Noah. Ele lembrava como fora quando Sara estava grávida de Cássia, de como era sentir uma vida se desenvolvendo. Como ele amou cada dia daqueles nove meses, e como seus sentimentos se afloraram ainda mais quando pegou sua filha no colo pela primeira vez. E pensar que ele perdera tudo aquilo com Noah lhe apertava o coração.

Pensar que Ângela escolhera passar por tudo aquilo sozinha...como devia ter sido difícil viver aquele sonho que ela um dia compartilhou com o finado marido...viver tudo aquilo sozinha quando milhares de mulheres a sua volta tinham o apoio do parceiro. Nossa, que situação! Gil apertou Sara em seu abraço e colou seu rosto no pescoço dela.

–Eu prometo, nada, nada nesse mundo vai me separar de você... Eu estarei sempre aqui para você e para meus filhos...

–Meu bem, eu sei disso- Sara suspirou e se virou no abraço do marido para olhá-lo- está pensando neles, não é?

–Sim...

Sara teve que se controlar para não mostrar o quanto a desagradava ter aquela mulher invadindo os pensamentos de Gil naquele momento tão íntimo deles. Desde que ela reaparecera na vida do marido não havia um momento de sossego entre eles...cada momento feliz que eles passavam em família transportava Gil para sua outra “família”. Apesar de detestar quando Gil se perdia naqueles pensamentos, Sara queria ser uma esposa sensível aos problemas do marido, e sabia também que não era culpa dele isso acontecer. Então ela engoliu tudo aquilo e se virou para o marido.

–Gil...não adianta nada você ficar pensando no que poderia ter sido...no que Noah perdeu, no que você perdeu...acho que você deve se concentrar no futuro, no que você pode fazer para se aproximar dele...

Gil acariciou o rosto de sua mulher. Sara era tão compreensiva com ele, tão amorosa. Embora ele soubesse que a machucava todas as vezes que tocava nesse assunto, ela tentava sempre o ajudar. Era uma mulher incrível. E o que ela lhe disse agora...era óbvio para Grissom que era o certo a fazer, sua mente sabia disso, mas ainda assim aqueles pensamentos negros sempre conseguiam vir a tona. Mas ao olhar nos olhos de sua esposa e ver a preocupação estampada em seu rosto Gil jurou que tentaria modificar sua forma de ver aquela situação. Para o bem de sua família.

Muito preocupado para conseguir dormir, Gil disse que iria ler um pouco no escritório, mas Sara pediu para que ele colocasse um filme no dvd que ficava no quarto. Sugeriu que assistir a um filme o relaxaria. O casal então acabou adormecendo enquanto o filme passava na tv.

*~*~*~*CSI*~*~*~*

Sara chegou em casa do trabalho exausta, chamando pelos habitantes da casa. Como de costume, Hank e Cássia vieram correndo falar com ela. A CSI então se ajoelhou para poder cumprimenta-los propriamente. Depois de uma boa coçadinha na barriga do cão ela se levantou com a filha no colo. Daqui a algum tempo ela não mais poderia fazê-lo, então queria aproveitar o máximo esses momentos.

–Ai boneca, você tá ficando pesada- fazendo cócegas na barriga dela Sara comentou- quantos biscoitos seu pai te deu hoje?

Cássia caiu na gargalhada com os carinhos da mãe, e disse entre risos

–Mamãe,mamãe, para!

–Tá bom!- ela desceu a filha ao chão e pegou na mão dela.

–Cadê o seu pai que não veio dar o meu beijo?

–O papai foi trabalhar....

–Humm. Então sua avó está aqui com você?

–Aham.

–Então vamos lá dizer que eu cheguei

Antes que elas pudessem andar Beth saiu da cozinha secando as mãos no avental.

“Olá, Sara! Cássia mal ouviu sua voz e saiu correndo sem terminar o lanche.”

–Filha- Sara falou e usou a linguagem dos sinais- você tem que papar tudo, pra ficar forte.

Cássia fez um bico e abraçou as pernas da mãe, escondendo a cabeça no tecido da calça e falando ao mesmo tempo. Sara riu e pediu para ela se repetir.

–Não tô com fome....vamos brincar, mamãe?

Sara olhou para Betty e deu um sorrisinho. A senhora o retribuiu. Era difícil resistir quando Cássia fazia aquilo.

“Ela comeu metade já...acho que é o suficiente”

“Ótimo, então porque você não leva a vovó pro seu quarto pra mostrar os desenhos que você fez enquanto a mamãe toma um banho rápido”?

–Tá certo mãe!- ela correu para o lado da vó e a puxou até o seu quarto.

Quando Sara apareceu no quarto, de banho tomado, ela viu sua filha entretida com um desenho na tv. Pensou que ela ganharia uns trinta minutos de descanso antes de brincar de “chá da Barbie”. Betty estava sentada ao lado da neta lendo um livro infantil, e quando percebeu que a nora apareceu se levantou e a ofereceu uma xícara de chá.

“Deve estar cansada do trabalho. Vamos lá, ela vai ficar entretida com o desenho”

Sara aceitou a oferta, não querendo desagradar a sogra. Não era sempre que ela estava nesse humor agradável, principalmente para com ela. Apesar de Betty nunca tê-la destratado, sua relação com a sogra nunca fora das melhores. Apesar de todas as tentativas de Gil em aproximá-las Sara já aprendera a se contentar com a cordialidade entre elas.

Em meio a conversas sobre filhos, gravidez e o chá, Sara percebeu em Betty uma inquietação, como se houvesse algo na cabeça da senhora que ela não conseguia expressar. E pensar que ela achou que finalmente estava tudo bem entre elas!

–Betty?- Sara tocou de leve no braço da senhora a fim de que ela prestasse atenção- Está tudo bem, tem algo que você queira conversar?

–Ah...eu não sei se deveria. Não é da minha conta, eu sei.

Sara gelou perante a fala da sogra. Mais uma vez Betty queria se intrometer na vida deles...embora dessa vez tivesse o bom senso de se conter antes de sair falando, o que dava a nora a possibilidade de escapar de mais uma conversa constrangedora. Sara já estava para concordar que qualquer que fosse o assunto já não lhe dizia respeito, mas parou com a fala na boca ao notar a expressão no rosto da senhora. Era uma de extrema preocupação. Com o coração na mão, Sara perguntou o que Betty queria saber.

“Sara, querida...tenho notado algo de estranho em Gil. Ele me parece preocupado, com o peso do mundo nas costas...Desde aquela viagem que ele fez, meu Gil já não é mais o mesmo. Você tem notado algo de diferente nele desde então, ou isso é só coisa da minha cabeça?

Sara engoliu em seco. Sabia bem o que afligia seu marido, mas não fazia ideia de quando ele iria abordar o assunto com Betty. Por que sua sogra tinha que ser tão perceptiva em relação ao filho?! O que ela diria agora?

“Não precisa responder, querida. Seu rosto já diz tudo”

“Betty...eu realmente não sei do que está falando”

A senhora deu um sorriso triste à nora, colocou uma das mãos no rosto de Sara e disse, em uma voz rouca por falta de uso.

“Sara, não adianta virar o rosto para o outro lado nessas horas...você tem que ser forte, querida...o que quer que seja, quem quer que seja não vale a pena...você tem que relembrar isso a Gil.

Sara retirou a mão da senhora de seu rosto, muito intrigada com o que acabara de ouvir.

“Beth...eu acho que...”

Sara demorou a entender o que a sogra queria dizer, mas quando a moeda caiu, ela não pode acreditar. Como assim, Beth fora de insinuar que era ela a adúltera para rotular da mesma forma o próprio filho? Deus, Beth não possuía nenhuma fé naquele casamento. A morena se irritou com a sogra então, e já ia lhe dizer algumas coisas quando Hank começou a latir desembestado. Logo Cássia já corria para a porta gritando pelo pai. Sara então avisou a sogra que Gil acabara de chegar, e que elas continuariam aquela conversa mais tarde.

As duas então se dirigiram para a sala e encontraram Cássia e Hank muito agitados, esperando o homem da casa entrar. Não demorou muito e a porta abriu. Sara segurou Hank para que Gil pudesse falar direito com a filha. Só depois que ele segurou Cássia nos braços que ela soltou o cachorro, que logo tratou de pular nas pernas do dono.

–Nossa, mas que recepção calorosa!-ele disse olhando para sua mulher e mãe.

–Achei que fosse ficar direto no trabalho, Gil- Sara disse ao marido.

–Amanhã tenho que ir ao tribunal cedo. Fui a uma cena em um daqueles “hotéis” de beira de estrada, coletei as evidências e as deixei nas capazes mãos de Warrick e Nick. Estou morto!

Dito isso ele deixou Cássia no chão e foi dar um beijo em sua mãe e em seguida em Sara.

–Vou tomar um banho.

“ E eu vou indo”- Beth avisou aos dois-“ Preciso descansar também. Sua pequena é uma delícia, mas acaba com as energias de uma velha.”

“Acaba com as energias de qualquer um, isso sim, mamãe. Obrigado por ter ficado com ela”

“Não há de que, Gil. Sara, você me acompanha até a porta?”

“Claro, Betty. Cássia, venha se despedir da vovó”.

Mãe e filha levaram a senhora até a porta e a ajudaram a pegar um táxi. Cássia acenou até o carro fazer a curva e depois correu para a casa, a procura do pai.

Mais tarde na mesma noite, após terem colocado Cássia para dormir, o casal se encontrava na sala vendo um programa no Discovery Chanel. Gil estava fascinado com o que passava na tv, mas Sara não podia ligar menos. Sua cabeça estava na conversa que tivera mais cedo com a sogra. Ela tinha que falar com Gil.

–Gil...

–Oi querida- ele falou sem desgrudar o olho do programa.

Sara, já acostumada com esse comportamento do marido- ainda mais quando se tratava de Baseball- pegou o controle e desligou o aparelho.

–Sara!- finalmente ela conseguiu a atenção dele, mas o que quer que ele fosse dizer morreu em sua boca, vendo a seriedade estampada no rosto da esposa.

–Gil. Escuta, eu preciso falar com você!- ao olhar assustado do marido ela continuou- Não tem nada de errado comigo, nem com a Cássia.

–Mas então...

–Gil...sua mãe e eu tivemos uma conversa hoje à tarde.

Gil revirou os olhos e bagunçou os cabelos com a mão, em um gesto de nervosismo.

–Ah...o que mamãe aprontou agora? Não me diga que ela te destratou? Achei que já tínhamos passado disso!

–Não foi nada disso, Gil... é só que...você não reparou como ela tem andado diferente essa semana?

–Sim, mas um bom diferente...quero dizer, ela estava mais aberta a você,sabe...

–Sim...e você não achou isso estranho?

–Estranho? Por que eu acharia estranho? Deus, Sara, era só o que eu queria, vocês se dando bem!

–Tudo bem...mas não é esse o ponto a que eu quero chegar...

–Sara...- a voz de Gil tomava agora um tom de impaciência-

–Ok, vou direto ao ponto. Sua mãe acha que tem algo de errado acontecendo. Ela sabe que você está escondendo algo...e veio me falar sobre isso hoje à tarde.

Gil se recostou no sofá e suspirou.

–É...nunca consegui esconder muitas coisas dela. Dizem que mães tem um sexto sentido quando se trata de filhos...-ele deu um sorriso forçado para a mulher, e ela simplesmente lhe acariciou o rosto.

–Sim...é verdade. Amor, por que você ainda não contou a ela?

–Ah...realmente não sei...é só que... até eu conhecer o Noah essa situação não parecia real para mim...e depois vocês passaram mal, aí voltei para o trabalho...acho que isso realmente me fugiu da cabeça.

–Mas agora que sua rotina já voltou ao normal...

Gil balançou a cabeça, retirou os óculos e passou a mão no rosto. Era claro seu nervosismo.

–Eu não sei como dizer isso a ela, Sara... como se diz isso a sua própria mãe, uma católica fervorosa que acredita que o filho é um santo?!

Sara teve que se segurar para não lhe contar o que ouvira da boca da sogra. Santo uma ova!

–Já acabou com o drama de novela mexicana?- o marido a olhou torto- Gilbert, pelo amor de Deus! Qual o problema, não me diga que você acredita que Betty acha que você casou virgem?

–Sara!

–Desculpe, mas eu não entendo sua relutância...

Gil cruzou os braços e virou o rosto para a tv desligada.

–Realmente, eu não sei como dizer isso sem que ela leve um choque. Mamãe já tem idade,Sara...

–Tenho certeza de que ela irá adorar. Não vê como ela ama a Cássia? E quanto a aguentar...por que não fazemos o seguinte, você convida ela para almoçar com a gente no domingo, ela brinca um pouco com a Cássia e daí você conta sua novidade para ela?

Gil olhou para sua mulher e, com grande relutância, aceitou a proposta.

–Ah, meu amor, vai dar tudo certo- Sara afirmou ao ver a expressão desolada no rosto do marido, e o abraçou com força.

–Eu, sei, honey,eu sei