Me diz qual é o motivo de uma pessoa ser tão estupida a ponto de fazer uma covardia como aquela? O que aquele garoto ganhava? Vingança por ter apanhado na frente do Acampamento inteiro? Bem, se foi isso, ele vai ter que se acertar comigo… Uau, estou um pouco vingativo demais.

   - Cara o que você estava pensando? – Eu quase avancei em cima dele, mas me lembrei de Eleanor.

   - O que? – Ele indagou. – Essa vadia merecia! Eu vou pegar a bandeira!

   Não. Nós ganharíamos por que lutamos com coragem. Não ganharíamos porque ele era um covarde a ponto de ataca-la daquela maneira enquanto ela tinha um ataque.

   Eu não pensei no que fazer. Não precisei. O garoto apenas caiu no chão tendo uma convulsão e depois desmaiou. Senti uma onda de poder me invadindo e mesmo que isso soe puramente psicótico, eu torcia pra ele morrer. Já era a segunda vez que ele tocava nela, na terceira, acredite, eu ia manda-lo direto para meu pai e deixar com que ele decidisse qual seria o tempo de punição para aquele covarde.

   Me agachei ao lado de Eleanor e a peguei no colo com cuidado enquanto sangue dourado corria por sua nuca. Não era um ferimento preocupante, apenas o porquê dele estar ali me preocupava.

Flashback on

   Viajei nas sombras até o outro lado da luta principal, que ocorria perto do riacho. Aquele garoto que lutou com Eleanor mais cedo, também tinha passado por eles e nós corríamos a uns dez metros de distancia um do outro. Só de vê-lo já tinha náuseas. Procurei a bandeira feito doido. Andei de um lado para o outro, passei pelo nosso “lugar secreto” e nada. Então ouvi um zumbido e me esquivei antes que uma flecha de uma caçadora me acertasse. Virei minha mão em sua direção e fechei o punho. Ela caiu sufocada e ossos começaram a prendê-la no chão.

   - Estou perto. – Sussurrei.

   Verdade. Menos de dois minutos depois e boom! Lá estava Eleanor e uma outra Caçadora cujo nome não me importo.

   - Isso não vai ser divertido. – Murmurei.

   - Não mesmo, filho de Hades. – A outra Caçadora veio pra cima de mim e começamos a duelar. Queria guardar minhas energias pra conseguir atravessar o riacho quando pegasse a bandeira, e talvez não fosse tão difícil lutar com ela.

   Eu atacava três vezes, ela defendia com sua lança e me atacava quatro. Ganhei um corte no abdômen e um no pescoço, mas nada que me fizesse parar de lutar. Pelo canto do olho vi uma filha de Afrodite, Drew, se aproximando de Elanor e lutando com ela. Infelizmente, Eleanor era boa com qualquer arma e a semideusa caiu pra trás, desacordada.

   Me cansei de lutar e comecei a convocar pequenos esqueletos do chão que começaram a segurar a Caçadora. Ela começou a gritar apavorada e eu arranquei suas armas de suas mãos. Mas quando me virei já era tarde demais.

   Eleanor estava em um tipo de transe. Seus lindos olhos azuis estavam totalmente revirados e só o branco dos olhos estava a vista. Sua boca abria e se fechava rapidamente como se dissesse algum feitiço, ou coisa do tipo. Eu estava tão assustado que não consegui ver aquele mesmo filho de Ares de hoje cedo, chegado por trás dela, todo machucado, apenas com um pedaço de madeira na mão.

   E boom! Eleanor caiu no chão toda esparramada com um ferimento na cabeça. A boa noticia é que fosse lá o que aquilo que estava acontecendo com ela se foi quando ela caiu inerte no chão.

Flashback off

  Se fossemos mesmo ganhar, não seria por causa daquele idiota. E depois eu iria cuidar dele. Ares devia ter vergonha de ter aquilo como filho.

   Andei com Eleanor até uma sombra. Eu posso ser forte e ter um corpo melhor do que muitos garotos de dezesseis anos, mas estávamos enfurnados na floresta, não conseguiria andar tanto chão com ela no colo. Se bem que ela não devia pesar mais que cinquenta e cinco quilos…

   Fui para a Enfermaria, mas adivinha? Mal consegui entrar. Tinha gente em um estado muito pior que Eleanor. Se eu pudesse pediria uma Caçadora para tomar conta dela, mas não havia nenhuma fora da batalha. Poderia leva-la ao Chalé de Zeus, mas eu não poderia entrar sem que o Senhor dos Deuses me matasse e lá também não tinha nem cama, pelo que sei.

   - Sinto muito, Eleanor, mas você vai para o Chalé de Hades.

   {…}

   Dei a ela néctar e joguei um pouco em seu machucado. Infelizmente, isso não a fez acordar. Coloquei um travesseiro daqueles pequenininhos abaixo do seu pescoço e fiz um curativo naquele buraco que a pancada tinha provocado. Sabe, se ela fosse uma deusa isso não estaria acontecendo. Ela não seria nenhum pouco vulnerável… Mas se ela fosse uma deusa não estaria aqui. Por um momento foi com isso que me preocupei. Se ela não tivesse me salvado naquele dia nada disso teria acontecido… Eu ainda não teria mostrado esse meu lado… Como ela disse… Educado. Sim, eu não teria mostrado esse meu lado educado, gentil se ela não tivesse aparecido. Esse tipo de coisa abre demais o coração de um filho de Hades e isso nos torna fraco. E fraco, um filho de Hades não pode ser.

   Fui ao banheiro e lavei as mãos. Fiquei tentado a volta a Captura a Bandeira, mas não aguentaria mais nenhuma viagem nas sombras. Estava cansado demais. Me sentei do outro lado da cama e apoiei a cabeça na cabeceira. Ou seja, em algum crânio de caveira.

   - Não… - Eleanor começou a sussurrar e me despertou dos meus devaneios. Eram apenas sussurros angustiados, mas comecei a ficar preocupado. – Ele não… Ele não tem culpa. Não precisa fazer isso… - Sua voz morreu e ela começou a se mexer inquieta.

   Definitivamente, aquilo era um sonho e tanto. Um sonho manipulado, provavelmente, pelo estado em que ela estava. Ela agarrou a barra da camiseta e começou a puxá-la como se sua vida dependesse daquilo; começou a suar e suas mãos agarraram o edredom negro da minha cama. Ela começou a balançar a cabeça freneticamente fazendo seu cabelo balançar de um lado para o outro e ela quase se sufocava no meio daquilo, porque cá entre nós, o cabelo dessa menina devia ser quase um metro de cachos.

   - Eleanor, - murmurei pra ela. – Se acalma.

   Mas isso só piorou a situação. Com certeza no sonho ela estava sendo torturada, porque começou a gritar. Me levantei e pulei por cima dela, puxei a cadeira que estava ao lado da cama e me sentei.

   - Eleanor! – Eu a sacudi. Nada. – Eleanor, calma. É um sonho! Ei, dá pra acordar? - Supliquei.

   Ela balançava a cabeça de um lado para o outro, desesperadamente. Duvido que aquilo era um simples sonho!

   Peguei sua mão e apertei.

   - Ei, acorda, bonequinha! – Dei uns tapinhas de leve em seu rosto, mas ainda sim ficaram um pouquinho vermelhos. E então, ela parou. Respirou fundo, aliviada e senti sua mão apertando a minha.

   Logo seus cansados olhos azuis se abriram ainda atordoados.

   - Nico… - Ela chamou ainda com os olhos semicerrados. – Eles pegaram você…

   - Não, não pegaram. Eu ainda estou aqui...

   - Eles não te pegaram? Mas eu vi…

   - Era um sonho. – Sussurrei. – Quer voltar a dormir?

   - Se eles te pegarem de novo, você me acorda? – Ela disse fechando os olhos de novo.

   - Sim, eu te acordo. – Concordei embora aquilo não fizesse sentido algum pra mim. Mas fazia pra ela.

   Ela piscou algumas vezes tentando me olhar direito.

   - Você esta tão lindo com… Esse corte no pescoço.

   Se eu não tivesse assustado pelas coisas que eu vi poderia até ter ficado vermelho feito pimentão, mas isso não valeria de nada já que ela estava em estado de torpor e não sabia o que falava.

   - Você também esta linda pálida desse jeito, bonequinha. Agora durma um pouco. – Eu sorri pra ela.

   - Se vierem me pegar não se coloque entre mim e…

   Ela não terminou a frase. Virou-se e apagou na mesma hora.

   - Só posso te desejar que durma bem. – Murmurei me sentando ao seu lado e voltando a me apoiar na cabeceira.

   O cansaço me dominou de forma quase imediata. Eu fechei meus olhos e acabei dormindo ainda de mãos dadas com a garota que salvou a minha vida.