As Cem Melhores Historias Da Mitologia escrita por Allan


Capítulo 31
Frixo e Hele




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Néfele, esposa do rei Atamas, foi repudiada pelo marido em favor de outra mulher. Ela,

que até há pouco era senhora das vontades do rei, agora tinha de vê-lo sob a influência nefasta de

Ino, filha de Cadmo, a nova e perversa rainha.

Antes da separação, o casal de reis havia tido um casal de filhos, Frixo e Hele. Ora, a nova

esposa de Atamas não queria saber de herdeiros que não tivessem o seu sangue — razão

suficiente para decidir pela morte de ambos.

"Quero esses dois jovens mortos o mais breve possível" disse Ino a si mesma, ainda no

leito de núpcias, enquanto o rei percorria o seu corpo com lábios ardentes.

Na manhã do dia seguinte, a nova rainha chamou à sua presença os dois jovens e lhes deu

para comer todas as sementes que havia no reino:

— Vamos, comam tudo — disse Ino, que havia mergulhado as sementes no mel para

agradar ao paladar dos garotos.

Ao cabo de algumas horas, com os dedos e as faces lambuzadas, ambos haviam dado

conta da tarefa.

— Tem mais? — perguntaram os jovens.

— Oh, não, queridos, infelizmente se acabou... — respondeu satisfeita a rainha, pois não

havia mais semente alguma no reino.

Em conseqüência, o reino todo foi assolado por uma terrível fome. Apavorado, o rei

decidiu enviar um mensageiro ao famoso oráculo de Delfos, para saber o que deveria fazer. Mas

Ino, quando o mensageiro passou diante do seu quarto, rumo a Delfos, puxou-o para dentro,

com uma força surpreendente pari seus delicados braços, e com uma voz sensual prometeu-lhe

tudo, inclusive um saco de moedas de ouro, se ele fizesse o que ela mandava. Esses poderosos

argumentos espantaram de vez o medo do servidor.

— Diga e eu o farei — capitulou o mensageiro.

— Quero que vá ao oráculo, como determina meu marido. Mas preste atenção: quando

voltar, diga ao rei que a única solução para a fome é o sacrifício ritual de seus dois filhos.

— Entendi perfeitamente, adorável Ino! — disse o mensageiro, colando s lábios ao

ombro alvo e perfeito da rainha, que o repeliu suavemente.

— Não seja atrevido! — disse a rainha, desvencilhando-se dos seus braços. Quer a

recompensa antes de cumprida a tarefa?

O mensageiro engoliu em seco ao ver as costas nuas da rainha afastando-se resolutas. No

mesmo dia partiu, decidido. Um mês depois, o lacaio apresentou-se diante do rei e repetiu as

palavras que Ino lhe mandara dizer. O rei, profundamente abatido com a obrigação que os deuses

lhe impunham, acabou cedendo e determinou que assim se fizesse. A rainha, ao saber da decisão,

exultou. Depois, ordenai secretamente a um assassino que pusesse um fim à vida do mensageiro.

Temendo, porém, que o assassino revelasse algo, ordenou a um segundo assassino que eliminasse

o primeiro. Mas esse segundo matador tinha um ar pouco confiável, razão pela qual a própria Ino

acabou por matá-lo com seu próprio punhal.

Néfele, a ex-rainha, já havia tomado conhecimento do perigo que filhos corriam. Por isso,

recorreu ao auxílio do deus Apolo, pedindo que a ajudasse a salvar Frixo e Hele.

— Esteja tranqüila, Néfele — disse-lhe o deus. — Enviarei aos dois um de fuga.

Poucas horas antes de se cumprir o sacrifício, um grande carneiro dourado entrou voando

pela janela do quarto onde os dois jovens aguardavam, aflitos o fim dos seus dias.

— Veja, Frixo! — disse Hele, espantada ao ver o animal.

— É um carneiro! E veja que pêlo magnífico! — disse o irmão, boquiaberto.

De fato, a pelagem do animal era toda tecida com fios de ouro. Parecia que o próprio sol

havia adentrado o quarto de ambos.

— Nada temam, meus jovens — disse o carneiro do Velocino de Ouro. -Vim para leválos

para longe da ira de Ino — completou, oferecendo as suas douradas costas para que Frixo e

Hele nelas montassem.

Antes de partir, o carneiro mandou que os dois jovens se segurassem bem e não olhassem

para baixo. Num segundo, o animal lançou-se ao espaço, com sua preciosa carga. Cavalgando o

ar, foi subindo rapidamente em direção ao azul do céu. Os cabelos de Hele, da mesma cor do

pêlo do animal, esbatiam-se ao vento, enquanto Frixo fazia tudo para manter-se agarrado no

carneiro, cego para tudo o mais.

— Veja, Frixo! — dizia a jovem, que não tinha olhos bastantes para admirar as

estonteantes paisagens, que passavam num turbilhão aos seus pés.

De repente, o carneiro meteu-se no meio de um aglomerado de nuvens tempestuosas.

Raios prateados esgrimiam ao redor dos três, como se eles estivessem em meio a um terrível

duelo travado no espaço.

Atingido na cauda por uma faísca, o carneiro empinou suas patas dianteiras para cima, e

isto foi o fim da infeliz Hele. Perdendo de vez o equilíbrio, as suas mãos agarraram o vento,

enquanto as suas pernas desprendiam-se da sua condução. Frixo, no entanto, nada pôde fazer,

pois continuava agarrado com todas as forças ao pêlo do animal, esquecido até da própria irmã.

— Frixo, estou caindo! — gritou ainda Hele, num último apelo.

Mas a sua voz ecoou no vazio, e o seu corpo caiu no estreito marítimo que separa a

Europa da Ásia, afundando para sempre em suas águas profundas. O carneiro ainda passou por

várias vezes rente à superfície agitada das águas, mas não pôde resgatá-la dali. O estreito passou a

ser chamado de Helesponto, em homenagem à desditosa Hele.

Frixo, desesperado, acrescentou muitas lágrimas às salgadas e agitadas águas do mar.

Depois que viu que seu pranto era inútil, retomou, sozinho, a viagem, montado sempre no

carneiro de ouro, rumo à distante Cólquida.

— Estamos chegando — disse o carneiro, ao avistar as terras do novo país. Frixo, no

entanto, não pôde alegrar-se como esperava, pois não tinha mais com quem compartilhar a sua

felicidade. Depois de ser bem-recebido pelo rei do país, o jovem foi ao templo de Apolo,

agradecer a ajuda que obtivera. Ali receber do deus a ordem para sacrificar, ele próprio, o

carneiro de ouro.

Desse modo singular, teve o carneiro recompensados os seus serviços. Ou talvez

recebesse a punição por haver deixado perecer na fuga a infeliz Hele. O fato é que após o

sacrifício o pêlo dourado do carneiro foi arrancado cuidadosamente e colocado numa gruta, sob

os cuidados de um terrível dragão. Ali esteve durante longos anos guardado, até que um dia o

aventureiro Jasão se decidiu a ir buscá-lo, na companhia dos seus amigos argonautas, enfrentando

a ira da terrível sentinela.

Mas esta é uma outra história.


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