15th Hunger Games escrita por Primrosers


Capítulo 12
Campo de Flores


Notas iniciais do capítulo

Desculpem a demora, mas aqui está um capítulo novinho. Boa leitura!



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Acordo no meio da noite, ainda com os braços de Alex envoltos em meu corpo. Tento fechar os olhos, mas percebo que não adianta. Não vou conseguir voltar a dormir. Tentando não acorda-lo, levanto devagar e caminho para fora do quarto. Atravessando a sala de jantar há uma varanda. Pequena, fechada com vidro do chão ao teto, mas possui uma vista deslumbrante da Capital. De lá podemos observar tudo. Alex e eu nunca fomos até lá, não sei exatamente o porquê. Acho que tudo o que queríamos era nos manter afastados o máximo possível dessa grandiosa cidade iluminada.

Com passos curtos e silenciosos, avanço o corredor tentando não fazer nenhum barulho. É inútil. Dois atendentes da Capital estão plantados na sala de jantar, como se nunca tivessem dormido. Assustados, eles fazem um gesto perguntando se quero alguma coisa, mas eu apenas balanço a cabeça em negativa. Não é preciso dizer mais nada. 

Assim que passo pela sala de jantar, não resisto e pego um bolinho de morango que está em cima de uma mesa repleta de sobremesas. Abro a porta que leva até a varanda, e me assusto com a visão panorâmica daquele lugar. Sento no chão, perto de uma das janelas de vidro, e abro-a. Sinto a brisa fria batendo em meu corpo. É bem provável que eu possa estar morta amanhã. Quem sabe quantos segundos, minutos ou horas ficarei viva naquela arena? Haverão vinte e três pessoas querendo meu sangue. Vinte e uma, se eu não contar com Alex e Melissa. O que eu vou fazer? A pergunta que me encomodou tanto a uns dias atrás parece voltar à minha cabeça. Sinto meu corpo um pouco dolorido ainda devido ao treinamento, eu acho. Mas pareço muito melhor do que eu era em meu destrito. Desnutrida, magra e inocente. Agora estou sendo obrigada a me tornar uma assassina cruel, para poder sobreviver e manter aqueles que eu amo vivos. Meus dedos percorrem o desenho do carpete rosa de veludo. 

Aqui seria um bom lugar para morrer, penso.

Mesmo sendo cerca de duas ou três horas da manhã, as ruas parecem movimentadas. Há cinco ou seis pessoas circulando lá embaixo, andando como máquinas. Penso em como todas as pessoas dessa cidade devem estar ansiosas para me ver morrer.

 Ainda olhando pela janela, sinto uma presença atrás de mim. Quando me viro, levo um susto ao ver Alex em pé na entrada da varanda.

- Ei! - digo. - Você me assustou!

Alex apenas ri e senta ao meu lado.

- Não consegue dormir? - pergunta ele.

- Não. - digo.

- Sabe, - começa ele - você devia parar de se preocupar. Não fique pensando nisso, em tudo o que vai acontecer amanhã. Você precisa descansar. - Alex me puxa pelo braço, tentando me levantar.

- Não! - digo. - Me deixe aqui! - Alex para por um momento, me observando. - Eu não posso deixar de pensar nisso. Se eu fazer isso, amanhã estarei despreparada. Não posso bolar um plano amanhã, bem na hora e... - Paro por um instante.  É como se eu tivesse perdido as palavras. Alex está me olhando de uma maneira que... Eu já vi esse olhar antes, há cerca de cinco anos atrás. O dia mais frio e doloroso que eu posso recordar. Lembro de meu pai deitado em um colchão na sala, Milly havia acabado de nascer e estava no quarto com Katie. Minha mãe tentava nos afastar do papai, para não pegarmos a doença. Lembro de como eu chorava e ofendia ela, acusando-a de me manter longe do meu pai. Até que, naquela amanhã, ele parou de respirar. Saí correndo de casa, sem rumo, mas alguma coisa inexplicavel me levou para casa de Alex. Cai na varanda dele, chorando, em prantos e perplexa. Alex escutou o barulho vindo de fora e se assustou ao me ver lá, com os joelhos dobrados e as duas mãos sobre o rosto. Por conta de um corte no braço esquerdo, devido a minha inconsciência, sangue escorria pelas pontas de meus dedos. ''O que aconteceu?'' Ele me perguntava freneticamente, sacudindo meu corpo, mas algo me dizia que ele já sabia de tudo. Aquele olhar, o jeito que ele me olhou naquele dia. Não foi como um olhar de pena, e sim de ajuda. Ele queria me ajudar, ele só estava tentando me ajudar...

Não consigo resistir ao impulso de abraça-lo. Coloco meu rosto em seu ombro e deixo as lágrimas cairem. Tudo que estava preso dentro de mim, todos esses dias aqui na Capital. Choro até não ter mais lágrimas.

- Está tudo bem. - sussura Alex. - Estou aqui, estou aqui com você agora.

Só então percebo o quanto vou sentir falta disso. O quanto vou sentir falta do abraço confortante de Alex na arena. Será que vamos conseguir ficar juntos? Como vou passar a noite? Será que estarei viva até a hora de dormir? Não sei. Mas, como ele mesmo disse, é melhor não pensar nisso agora.

Me deixo ser carregada por Alex de volta à cama, trêmula dos pés a cabeça. Não me lembro de mais nada. Só recordo que Alex sussurrou alguma coisa em meu ouvido, enquanto me levava de volta à cama. Mas acho que jamais irei descobrir o que era.

A manhã surge, gélida como a noite. O tempo lá fora está tão feio como no dia em que meu pai morreu. Uma brisa gelada entra pela janela do quarto, batendo em meu corpo com um impacto doloroso. Me forço a se sentar, e olho para o lado em busca de um rosto amigo. Ele está lá, ainda dormindo, mas está lá. Tento captar essa imagem, pois talvez será essa a minha última memória, minha última recordação de alguma sensação de alegria. A que me protegerá na arena enquanto eu permanecer viva, e a que irei carregar quando eu estiver morta.

Alex parece ainda mais novo dormindo, não consigo evitar um sorriso. Ele abre os olhos bem na hora que estou parada fixando-o. Tento desfarçar, mas pela expressão de seu rosto sei que ele percebeu.

- Bom dia, Abbie. - diz ele.

- Bom dia, Alex. - digo, tentando imitar sua voz. Nós dois rimos um pouco.

Antes que possamos dar mais uma palavra, a porta se abre trazendo Elise, Betie e David para dentro do quarto. Só tenho tempo de abraçar Alex uma última vez, antes de ser levada por David até uma sala vazia.

- Nos vemos em breve. - diz Alex.

A sala está tão gelada como a brisa que vem lá de fora. Dentro dela estão minha bizarra equipe de preparação e uma mesa com uma refeição reforçada. Primeiro passo pelas etapas simples de preparação, depois me deixam comer um pouco.  A medida que os minutos vão passando, o tremor e o medo vão percorrendo todo o meu corpo. Agarro o medalhão com a rosa em meu pescoço, o que me traz um pouco de esperança. Toda a etapa de preparação  leva em torno de trinta minutos, até Albert aparecer perguntando se já está tudo pronto. David faz que sim com a cabeça, então Albert entra e senta-se na minha frente, em um dos sofás de veludo.

- Muito bem, queridinha. - diz ele.

- Onde está Alex? - pergunto.

- Com Betie. Já passei lá para ver como ele está, e também já tive uma conversa com ele.

- Que conversa?

- Veja bem... Quero saber, afinal, qual é a sua estretégia?

Um calafrio percorre todo o meu corpo. Afinal, nem eu mesma sei.

- Eu... Eu vou...

- Você não sabe o que tem de ser feito, não é mesmo? - diz Albert.  Faço que sim com a cabeça. - Escuta aqui, todos nós assistimos a sua entrevista na televisão. Não somos tão burros ao ponto de ignorar seus pensamentos. Sabemos o que você vai fazer.

Engulo em seco, meus olhos fixos nos de Albert.

- A quem você está se referindo, quando diz 'nós'? - pergunto.

- Talvez... Panem inteira! - exclama ele.

Olho para o chão agora, tentando evitar qualquer troca de olhares com meu mentor. Antes que eu possa desviar, ele coloca uma das mãos sobre meu queixo e faz com que eu olhe para ele novamente.

- Só estou pedindo para que você seja você mesma, faça o que o seu coração mandar. Vou cuidar para que vocês dois tenham patrocinadores, mas não posso fazer tudo sozinho, muito menos mudar sua cabeça. Você é quem sabe o que deve ser feito. - Albert sai da sala, sem dar mais uma palavra. Tudo isso que ele acabou de dizer fica ecoando em minha cabeça, enquanto minha equipe de preparação termina os ajustes finais do meu traje. Albert parecia uma pessoa diferente dizendo esse tipo de coisa, me fez lembrar alguém...

David faz um gesto para que eu me levante, e só então percebo que tipo de traje estou vestindo quando me deparo de frente ao espelho. Uma calça preta resistente e lisa, uma blusa branca simples e um casaco vermelho com capuz. O casaco não é feito de um material que proteja do frio, mas é feito de algo que possa me proteger de um forte calor. Olho para David, e ele parece entender automaticamente o que estou querendo saber.

- Eu estava estudando o material um pouco antes de você acordar. - começa ele. - Recebemos hoje de manhã, então não posso ser muito preciso em relação ao que você vai encontrar lá. A calça parece ser resistente tanto ao calor do sol, quanto a úmidade da água. Mas o casaco é feito de um material que irá te proteger de um forte calor.

- Um deserto? - pergunto.

- Acredito que não, se não a calça seria revestida por um outro material mais forte. Mas, contudo, não posso afirmar nada.

Me despeço da minha equipe de preparação, que parecem tão acostumados com despedidas que mal ligam para mim. Belos animais de estimação vocês foram, penso.

Enquanto David me conduz até o elevador, tento procurar Alex através da sala. Sem sucesso.  Aceito a ideia de que só irei ve-lo novamente na arena.

Ao invés de descermos, dessa vez o elevador nos cunduz a três andares à cima. Olho para David em busca de alguma resposta.

- Porque estamos subindo?

- O aerodeslizador está nos esperando, lá em cima.

Assim que o elevador se abre, a luz branca brinca com a minha vista. Consigo ver apenas três, quatro ou talvez cinco aerodeslizadores. Entramos em um que está parado bem próximo de nós. Não é daquele tipo que costumamos ver pela televisão, recolhendo os corpos dos tributos mortos na arena. É de um porte bem menor, porém cheio de painéis de controle por dentro. Assim que coloco os pés no  primeiro degrau, uma corrente me congela e me transporta para dentro dele. David vem logo atrás de mim.

- Está tudo bem. - diz ele, baixinho.

Assim que sentamos em nossos lugares, dois atendentes da Capital aparecem para nos prender a nossos cintos. E nquanto voamos, fazemos mais uma refeição. Como tudo o que consigo e bebo bastante água, pois não sei o que estará me esperando de agora em diante. A viagem demora cerca de uma hora, e a cada minuto que passa a ansiedade aumenta. E o medo também.

Sinto o aerodeslizador descendo, cada vez mais. Por um momento penso que estamos caindo, mas vejo que ficou tudo escuro lá fora.

- Estamos dentro de um túnel. - diz David. - Faço um sinal de concordância com a cabeça, como se eu já soubesse disso. Depois de uma longa viagem, o aerodeslizador finalmente para e saímos dele em uma gigantesca plataforma. Somos conduzidos por diversos corredores até uma pequena e iluminada sala, com um tubo de vidro em uma de suas extremidades. É por ali que serei transportada até a arena.

Assim que somos deixados a sós, tudo que consigo fazer é abraçar David e ignorar a cesta de pãezinhos que está sobre uma mesa. Eu poderia até chorar, mas parece que não tenho mais lágrimas. 

- Ei, - diz ele - está tudo bem, tente ficar calma.

Estou ofegante, tonta, perplexa.

- Onde... onde é que estamos? - digo, com uma voz trêmula.

- A vários metros em baixo da terra. - diz ele.

É como se eu tivesse levado um soco no estômago. Agora sei exatamento como é se sentir enterrada, sem esperanças de um dia voltar a ver a luz do sol. Me sinto completamente enjoada e me forço a tomar um copo de água, enquanto David tenta me acalmar segurando uma de minhas mãos.  É inútil. Só Alex parece ter o poder de me acalmar.

Uma voz indica que temos exatamente dez minutos. David me abraça mais uma vez, ajeita o capuz de meu casaco e fecha o ziper até o pescoço. Me oferece outro par de sapatos, esses parecem ser resistentes a água e também ao sol. David me ajuda a calça-los, e ficamos em silêncio por mais alguns segundos.

Três minutos, diz a voz. Tudo que consigo pensar é em Alex, minhas irmãs, minha mãe, minha aliada, Melissa. Vasculho a corrente em meu pescoço e me encontro segurando o medalhão firmemente com uma das mãos.

- Isso é importante pra você? - pergunta David. Faço que sim com a cabeça. - Escute. Eu estarei torcendo por você, não se esqueça disso. Em quinze anos, você foi a garota mais corajosa que já pude ter a honra de ser o estilista.

As palavras dele me fazem dar um leve sorriso. 

- Obrigada. - digo. De uma certa forma, o medalhão com a rosa tirou o medo do meu corpo, e no lugar deixou a coragem. 

Um minuto, diz a voz. Abraço David novamente, uma última vez.

- Está na hora. - diz David. - Boa sorte, garota destemida.  - Ele beija minha testa e me deixa ir.

Caminho até o tubo, com as pernas tremulas. Paro por um momento, tentando pensar nos fatos que me levaram a estar ali, caminhando para a morte. Mas tudo que vem a minha cabeça são boas memórias. O sorriso de meu pai em uma manhã de primavera, minha mãe me dando um beijo na bochecha antes de dormir, Milly sorrindo para mim, Katie pintando os vasos de flores. Decido que vou me agarrar a essas memórias a partir de agora.

Estou dentro do tubo, e um vidro desceu para fecha-lo. Não posso escuta-lo, mas sei que David disse ''Você consegue''. O que ele acha que vou conseguir, afinal? Será que ele sabe do meu plano? Albert sabia e, segundo ele, Panem inteira também. Com toda a coragem que consigo, ergo a cabeça para cima enquanto o tubo me levanta. A medida que vou alcançando a superfície, uma luz branca brinca com meu campo de visão. Uma brisa bate em meu rosto, trazendo consigo um perfume doce. Estou parada na plataforma, no prato de lançamento. Estou na arena, mas ainda não posso enxerga-la. Escuto os segundos batendo. Se eu sair da plataforma antes do tempo, bombas serão acionadas e explodirei em mil pedacinhos.

Meu coração está acelerado e não consigo formar nenhum pensamento. É mais como aquele pesadelo que você torce para jamais ter. Mas isso aqui é diferente, é a realidade, e não posso controla-la. A luz branca abandona meus olhos e sou tomada por uma sensação de pânico. Meus dedos estão pinicando, minha garganta está seca, e estou com uma vontade de gritar e sair dali a qualquer custo. Ao invés disso, tampo a boca com as minhas mãos enquanto tento focar a imagem que está diante de mim agora. A arena, tudo em volta da cornucópia à minha frente, cercando os pratos de lançamento dos tributos, crescendo sobre meus pés. Rosas. Há um enorme campo de flores.


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Notas finais do capítulo

Espero que estejam gostando. Mandem reviews e recomendem a história, em breve postarei um novo capítulo :) xx



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