– Temos todo tempo do mundo! - eu disse para Percy assim que ele me mandou andar logo.

Já tinha entrado no carro e lhe disse que estava com vontade de comer comida chinesa. Ele me encarou sério pois sabia que era tudo mentira, eu só não queria ir para a festa dos Stoll com ele. Pensei em arranjar uma desculpa mais razoável, mas não pensei em nenhuma.

– Annie... você prometeu! - ele disse com um ar de criança birrenta.

Revirei os olhos e prendi meu cabelo. Estávamos prestes a invadir uma propriedade, eu não podia ir com uma roupa normal.

Coloquei uma calça de malha preta e uma bota especial, ela não tinha nenhum desenho na sola, ou seja, não deixava pegadas. Na verdade ela deixava sim, mas não deixava o desenho da sola como os tênis comuns. Percy tinha uma também, mas a dele era mais um coturno. Vesti uma blusa preta de gola alta, afinal estava um tanto frio. Percy havia vestido o mesmo.

– Acho melhor usar isto - ele disse me entregando um gorro preto - Não queremos cabelos pela propriedade dos Olimpius.

Eu ri e coloquei o gorro. Estava mais parecendo uma assaltante de banco. Dei uma olhada para Percy e vi que ele me encarava.

– O que? - perguntei.

Ele pareceu recuperar a consciência, corou um pouco e depois disse:

– Nada. É melhor nós nos apressarmos, afinal temos uma casa para invadir.

Dei risada e Percy ligou o carro. Fiquei pensando como nós éramos malucos, estávamos prestes a invadir a casa de um empresário. Devia ter milhares de seguranças, e câmeras. Como entraríamos? Não faço a mínima ideia. Olhei novamente para Percy e notei que ele estava prestando atenção na estrada. Seus olhos não se desviaram uma vez sequer.

Continuamos o caminho em silêncio. Eu já não estava com tanto sono, passei a tarde toda dormindo. E ainda tinha a tal festa. Eu não estava com a mínima vontade de ir, mas não por mim que estava fazendo isso, era por Percy. Não demorou muito, nós chegamos na propriedade dos Olimpius.

– Pronta? - Percy perguntou arrumando o gorro.

– Pronta. - eu disse abrindo a porta do carro.

Tínhamos parado umas duas quadras antes, para que não desconfiássem. Escondi o cabelo embaixo de meu gorro e caminhei até a mansão com os braços cruzados. Acho que ninguém quis se meter com nós dois.

Passamos pela frente do portão e vimos um segurança andando pelo jardim. "Merda!" pensei.

– Annie, vamos dar a volta. Em toda mansão, existe um ponto cego, ele fica atrás, provavelmente em alguma parte do quintal. - Percy disse quase sussurrando.

Assenti e nós continuamos caminhando. Demos a volta em torno da casa. Percy contou vinte passos da câmera de segurança. Apesar de serem excelêntes vigias, todas tem um ponto cego. E nunca se pode colocar duas câmera muito próximas, senão elas começam a interferir no trabalho uma da outra. Vinte passos, essa era mais ou menos a distância. E como não haviam mais câmeras, aquele era o lugar ideal para pular.

– Trouxe tudo? - Percy perguntou me ajudando a subir no muro.

– Sim. - eu disse enquanto arrumava a mochila em minhas costas.

Peguei impulso e me sentei no muro, esperando Percy pular também. Ele logo o fez e estava sentado ao meu lado. De cima do muro, era possível se ter uma boa visão da propriedade toda. Corri os olhos por todo quintal. Tinha uma piscina enorme aos fundos e uma pequena casinha perto. Achei estranho, pois a casa não estava nas mesmas condições da mansão, ela parecia um tanto abandonada.

Olhei para Percy e notei que ele estava observando a mesma coisa que eu. Assentimos e pulamos de cima do muro. Não era muito alto, mas mesmo assim foi uma queda e tanto.

Corremos para casinha e ela estava destrancada. Achei aquilo muito estranho. Apesar de parecer não haver muita coisa de valor, qualquer ser humano normal trancaria aquele lugar.

Era mesmo uma casa muito antiga. Era bem menor do que a mansão, mas tinha o mesmo nível em sofisticação. Parecia ser intocada a anos. Móveis antigos, louças de porcelana, detalhes divinamente trabalhados em volta das lâmpadas... Era uma casa muito linda. Fora bem arquitetada. A sala era muito grande, o que queria dizer que uma grande família morara aqui. Poderia ser a antiga casa de Zeus e Hera, era bem a cara deles.

– Annie, corra aqui. - a voz de Percy interrompeu meus pensamentos.

Segui sua voz e o encontrei dentro de um banheiro. Ele examinava uma banheira com luvas descartáveis. Neste trabalho, não se pode fazer absolutamente nada sem usar luvas.

– Parece que esta banheira foi removida a pouco tempo. - ele disse a balançando. Ela estava um tanto solta.

Entendi o que ele quis dizer.

– Perfeita para transportar um corpo. - eu disse enquanto colocava minha mochila no chão.

Tirei de dentro dela mais um par de luvas e as coloquei. Peguei um pequeno cotonete esterelizado e caminhei até a banheira, passei o pequeno cotonete em seu ralo e esperei Percy pegar o luminol. Se qualquer tipo de sangue tivesse passado por aquele ralo, nós saberíamos.

Ele pegou o pequeno frasco e eu estendi o cotonete para que ele pingasse. Mas nesse momento, escutamos um barulho. Era como um apito, muito alto e agudo. Mas então me lembrei, aquele poderia ser o alarme da mansão! Percy pingou o luminol mas eu não iria ficar esperando que ele reagisse. O guardei em meu bolso e saímos correndo da casa.

O engraçado é que não havia ninguém por perto. Porém achei melhor não arriscar. Pulamos o muro e quase me esborrachei no chão do outro lado. Acho que nunca corri tanto em minha vida.

Assim que entramos no carro, puxei o cotonete de meu bolso. Minha surpresa? Ele continuava branquinho. Não havia nenhum resíduo de sangue naquele ralo. O que poderia significar duas coisas: primeira, Thalia não havia sido morta, pelo menos não ali por perto. E segunda: talvez, só talvez, Zeus não estivesse envolvido em seu sumisso.

Percy parou o carro na frente de minha casa.

– Tem encontro lá as 11h? - eu disse saindo do carro.

– Errado, já trouxe a minha roupa, só falta você se trocar. - ele disse com um ar vitorioso pois sabia o que eu pretendia.

Revirei os olhos e entramos em minha casa. Ela pequena, mas era perfeita para mim. Tinha uma sala que funcionava como cozinha também, um quarto e um banheiro. Pequena e prática, assim como eu.

Percy foi para o banheiro se trocar e eu corri para meu quarto. O problema? Eu não tinha roupa. Não como um "Não tenho roupa" vindo de uma patricinha, eu realmente não tinha roupa, não para aquela ocasião.

Peguei uma calça escura, afinal não estava afim de sair por ai mostrando demais. Depois peguei uma camiseta branca, um tanto justa, que marcava meus quadris. Ela não era muito decotada, e isso era bom. Coloquei meu All Star e passei uma maquiagem leve. Não demorou muito, Percy já estava na porta do meu quarto. Ele me olhava com um olhar reprovador.

– Tênis, sério, Annabeth? - ele perguntou.

Não pude deixar de reparar que ele estava muito bonito. Qualquer homem fica bem de camisa xadrez, principalmente Percy.

Ele caminhou por meu quarto e abriu uma das portas. Percy já conhecia meu quarto, então sabia qual gaveta poderia abrir qual não. Ele tirou de lá de dentro um sapato preto, de salto, que eu usara uma vez, no casamento da minha tia. Olhei para como quem dizer "Por favor, deixe-me ir de tênis", mas ele entregou os saltos na minha mão e sorriu irônicamente. Revirei os olhos e os coloquei.

Devo admitir que me favoreceram ainda mais. Não que eu não gostasse se saltos, é só que eu prefiro usar tênis.

Dei uma arrumada em meus cachos e passei um gloss, logo estava pronta. Me virei para Percy e disse:

– Satisfeito?

Ele sorriu maliciosamente e disse:

– Muito.

Senti meu rosto corar e o fiquei encarando séria. Quando Percy finalmente se deu conto do que havia acabado de falar, corou e apenas saiu do meu quarto.

"Homens" pensei.

O caminho até o Olimpo foi silêncioso, não conversamos sobre nada. Eu apenas encarava as ruas escuras e Percy mantia os olhos no volante.

Chegamos. Para a minha não surpresa, Travis e Connor estavam na frente recepcionando os convidados. Eu não havia comprado presente nenhum, e não iria comprar de qualquer jeito. Saímos do carro, e assim que Connor me viu ao lado de Percy, fez questão de cutucar Travis. Me senti envergonhada ao notar que eles me analisaram de cima àbaixo.

– Ei, Percy, pode ir entrando a festa está uma delícia. - Travis disse indo nos comprimentar.

– Aliás, não só a festa. - Connor disse olhando para mim.

Lhe dei um sorriso falso e caminhei na frente. Por que raios eu havia aceitado vir? Sim, eu estava fazendo aquilo por Percy. Mas mesmo assim, eu os odiava e odiava mais ainda baladas. Dei uma pequena espiada lá dentro e vi um monte de gente, provavelmente bêbada e se esfregando umas nas outras.

– Annabeth? - uma voz me chamou.

Quando me virei, fiquei surpresa com quem encontrei.

Ele não mudara nada nesses anos todos. Seus cabelos cor de areia, seus olhos azuis penetrantes, seu sorrisinho torto... Ele fora meu primeiro, e único, namorado. O único homem que realmente mexeu comigo. Eu estava muito apaixonada, mas então ele terminou comigo. Simplesmente porque não conseguia viver sua vida com uma garota só. Ele saia muito, e eu saia pouco. Sempre soube que ele tinha outras, mas nunca que importei. Estava cega demais. Eu tinha 15 anos. Tudo isso aconteceu mais ou menos no mesmo momento em que conheci Percy. E ele foi sem dúvidas a melhor parte desta história, pois continuava do meu lado até hoje.

Este fora um dos motivos pelos quais eu não havia arranjado um namorado posteriormente. Ainda tenho medo. Pessoas são fúteis e egoístas, todas elas. Não que eu seja perfeita, pelo contrário, sou a pessoa mais errada do mundo. Mas acho que "amor" é um sentimento que só nos dá dor. Por um tempo, ele parece ser bom, mas depois começa a te matar por dentro, da forma mais dolorosa.

– Luke? - eu disse.

Ele então abriu um sorriso magnífico e ficou me analisando.