Blue Sunday Morning escrita por Shizumitai


Capítulo 1
Capítulo 1




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Acordara nu, sentindo os olhos grudando do sono profundo que tivera, mas, ao se dar conta de onde estava, abriu um sorriso satisfeito. Um quarto abafado devido às janelas fechadas, e num colchão ainda mais quente que o fazia suar. As cobertas o revestiam até os ombros, deixando a nudez de sua companhia – que estava deitado de bruços às mostras, coberta apenas do meio das nádegas abaixo. Pensou em cobri-lo para que não adoecesse ainda mais, porém desistiu logo da idéia ao perceber uma gota de suor escorrer em suas costas, forçadamente arqueadas, como se ele estivesse acordado, provocando Issay.

- Está acordado, querido?... – diz em um sussurro, sem resposta e confirmando que ele adormecia, provavelmente sonhando. Com certeza estava cansado, a doença o debilitou bastante, combinado com a troca de carícias e os beijos quentes que compartilharam na noite anterior. Arrependeu-se por ter deixado ser influenciado tão facilmente, realizando que dizer “não” a Atsushi era o mesmo que implorá-lo, “venha”. Era altamente dependente, e ainda mais submisso aos toques do outro vocalista.

Deslizava os dedos nas costas de Atsushi, estava úmido e quente, impregnando todo o quarto com o perfume de seus lençóis, de sua pele. Lembrava dos detalhes da noite anterior, daquele corpo morno, e de como o envolvia com o próprio para aquecê-lo ainda mais, protegê-lo. A intenção boa de fazer Atsushi se sentir melhor se corrompeu, o que era lamentável. Queria ter preparado um jantar, um banho quente, posto ele para dormir cedo, mas não, sucumbiu aos próprios desejos, à enorme paixão que acabou por embalar os dois. Sentia enorme luxúria pelo seu corpo até naquele exato momento, em que o outro se relaxava ao seu toque, com um sorriso no canto dos lábios e soltando um grunhido quase imperceptível.     

Issay sorriu, deixou de lado o sentimento de culpa da noite anterior. Contemplaria aquele momento, a pele de Atsushi que ouriçava sensivelmente ao seu toque, e o sorriso tímido que não ia embora. Achou até que estava acordado, esperando o próximo movimento. Aproximou os lábios aos seus ombros, deslizando-os quase sem encostar. Via os arrepios voltarem, mas Atsushi não abriu os olhos. “Deve estar fingindo, para que eu continue... Que ótimo ator.” Pensa Issay, se divertindo com aquilo tudo.     

Levantou-se da cama fazendo um leve esforço para não despertá-lo, e já de pé, espreguiçava e alongava todo o corpo, sem tirar os olhos do companheiro adormecido. Devia estar sonhando com algo bom, pois sorriu até Issay sair do quarto e se dirigir à cozinha; ainda não era muito tarde e decidiu preparar um café forte para ambos. Não levou muitos minutos e ele já servia o café em uma caneca somente, já que o outro ainda adormecia. Ao voltar para o quarto, encontra Atsushi ajoelhado com as pernas esparramadas na cama, bocejando e esfregando os olhos de sono. Novamente, teve de sorrir diante dessa cena.     

- Issay... Quantas horas são? – disse com a voz rouca de sono, mas sem tom de mau humor nela. Issay se aproxima da cama e estende a caneca para o outro.      

- Não se preocupe, não é tarde. São 10h15min se não me engano. Beba este café, irá te fazer sentir melhor. E cuidado, está bem quente.      

- Oh... Obrigado. – Atsushi assoprava e bebia em goles pequenos, sem tirar os olhos do sorriso do outro, que também se ajoelhava na cama de frente ao companheiro.     

- Está bom?     

- Sim sim, seu café é muito bom. Apesar daqui estar bem abafado pra tomar bebidas quentes, estou morrendo de calor.      

- Isso é bom pra você, deve estar se sentindo melhor.      

- Estou ótimo! Depois de praticamente me dopar com tantos remédios.      

- Verdade, você tomou conta de si muito bem. Não preciso pedir para não abrir as janelas, certo? – Atsushi até pensa em dar uma resposta um tanto mal educada, mas se lembrou de quem estava ali. Apenas acena com a cabeça, levando a caneca à boca. O mais velho se levanta, ainda sorrindo e se dirigindo novamente para a cozinha.      

Lá, derramava um pouco de café em outra caneca, até ser interrompido pelo susto de um braço envolvendo sua cintura e uma mão que retirava os cabelos de sua nuca, enquanto beijavam-na timidamente. O braço segurava uma caneca vazia, e o sorriso de Issay cresceu tímidos milímetros.     

- Quer mais um pouco de café? – dizia, terminando de encher a própria caneca.     

- Não. Muito obrigado, Issay.      

- Hum, quanta gratidão por um café...      

- Não agradeci pelo café, mas por tudo. – Atsushi colocou a caneca sobre a mesa logo em frente, apertando a cintura de Issay agora com os dois braços e com os lábios ao canto de seu ouvido – e principalmente por ontem. Não melhorei pelos remédios, e sim por você.

Deixou a própria caneca de lado, virando-se para o menor e fitando aquela expressão desolada, de leve culpa. Ele olhava para baixo, então levantou seu rosto e se aproximou.      

- Você é a razão da melhora de minha vida toda, Issay... Há muitos anos. – Ele já estava bem corado por dizer essas coisas tão livremente, com os olhos direcionados aos do mais velho. Já ele, sorrindo com enorme satisfação o tempo todo, se aproximou do ouvido de Atsushi.     

- E se eu disser que as coisas boas não terminam aqui?... Hoje é domingo.      

Afastou-se e os dois trocaram olhares, o menor sorria tímido da mesma forma de quando estava adormecido, sorriso que abria à medida que Issay se aproximava para selar os seus lábios possessivamente, já que um pertenceria ao outro o dia todo.

*****

Bem, Issay se lamentava um pouco durante o banho por não poder fazer tudo o que queria com Atsushi (o que se baseava em cuidados, carinhos e talvez uma comida caseira que o mais velho sabia tão bem preparar – e nada modestamente claro) mas também, tinha que ficar feliz por ele estar se sentindo finalmente bem. E, sorrindo enquanto o companheiro o aguardava no quarto do lado de fora, Issay pôs-se a ensaboar-se tranquilamente por longos instantes. A vaidade de Issay não permitia que seus banhos fossem mais curtos que 30 minutos. Além do mais, ali tinha tudo para ser um domingo agradabilíssimo. E isso fora constatado quase com bases científicas quando saiu do banheiro.

Atsushi tremia e estava completamente coberto, da cabeça aos pés. Issay nada pode fazer a não ser rir graciosamente de tal cena. Tirou a toalha que envolvia a cintura e começou a secar as madeixas longas e – depois de molhadas – mais lisas.     

- Está ótimo, não é? – ria bobamente feliz. Issay iria fazer tudo o que queria naquela tarde. Não sabia por que, mas sentiu uma súbita vontade de ser a dona de casa preocupada e dedicada ao marido. Se ele se chamasse Atsushi Sakurai, claro.     

- Issay, pelo amor... – e dessa vez Issay riu ainda mais alto por causa da voz abafada pelo travesseiro do outro, e outros fatores que não vinham ao caso. Que deliciosa vontade era aquela que possuía apenas por imaginar a si mesmo abraçado à cama o dia inteiro com Atsushi, cuidando para que sua temperatura não subisse de vez e, quem sabe até mesmo, o ajudando a comer? Adorável que seria. E Issay cada vez menos se reconhecia naqueles pensamentos. Ao achar que estava seco o suficiente, adentrou as cobertas pela parte de baixo da cama e deitou o corpo sobre o do outro de bruços. O abraçou apertado ainda quente do banho recém tomado, e sentiu Atsushi estremecer entre seus os braços.     

- Posso fazer uma sopa para você hoje então?      

- Pode... Mas por que seu tom está tão alegre? – Não havia percebido, mas estava sorrindo. – Issay, você é cruel... Deve estar mentalmente me julgando por ser tão idiota a ponto de piorar de novo.

Atsushi não colaborava, Issay pensou. Estava sendo tão adorável vê-lo com a ponta do nariz rubra, puxando corisa e com a voz levemente fanha que se tornava irresistível não... Sorrir. O que havia de errado consigo?     

- Não é culpa sua, acho que... – e se lembrou de Atsushi dormindo descoberto mais cedo. Um leve peso de culpa caiu sobre a mente de Issay. – Acho que eu deveria ter ficado mais abraçado com você enquanto dormíamos.     

- Talvez... – e finalmente Atsushi sorriu, logo antes de um estrondoso espirro que Issay teve de se esquivar para não tomar outro banho. Riu novamente. – Desculpe...     

É, talvez fosse hora de preparar a tal sopa.

E, enquanto preparava-a, Issay cantarolava igual uma dona de casa feliz. Usando agora um roupão mais confortável, via-se rodopiando e valsando pela cozinha enquanto enchia a panela de ingredientes. Atsushi haveria de amar aquela sopa, acabou por pensar. E, com o sorriso que não conseguira tirar a manhã toda (e como suas bochechas doíam agora), ele voltou para o quarto com uma bandeja e a tigela cheia sobre ela. O cheiro era magnífico, o que fez Issay gemer de prazer enquanto depositava a sopa no criado.     

- Vamos Atsushi, ambos precisamos disso. – colocou as mãos na cintura e pôs o pé a bater contra o chão freneticamente, simulando uma impaciência que não havia no maior. E viu o outro sair de seu esconderijo e se sentar endireitando-se na cama, tudo isso em tempo geológico. Colocou a bandeja sobre as pernas e se sentou na beirada, e pôs-se a assoprar a primeira colherada da sopa. Até se assustou com própria a ansiedade de se fazer aquilo.    

- O cheiro está ótimo, creio eu que me superei. Ainda mais com a dispensa lotada que você mantém em casa.      

- Eu não sinto cheiro... – e Atsushi fungou nesse meio tempo. – de nada.     

Issay tentou lutar uma batalha já perdida que era não sorrir do sofrimento do outro. Em vão. Decidiu levar a colher à sua boca e aguardou uma resposta.     

- De que é? Me diga porque só assim eu vou saber o que estou comendo. – e Atsushi recebeu outra colherada.     

- Essa sopa é feita de carinho, dedicação, xaropes infantis para gripe e... – riu ao ver o menor esboçar uma pequena feição de desgosto. – Sinceramente Atsushi, não consegue mesmo sentir o gosto? Nem um pouco?     

Teve de suspirar ao ouvir um não de resposta. Que pena, havia experimentado da sopa e estava deliciosa, e a pessoa que mais queria que lhe desse elogios estava temporariamente incapacitada de distinguir seu paladar, e até olfato.     

- Não há nada demais nela, legumes e batatas e um tempero de carne que consegui achar. Mas vai te dar forças, e depois posso fazer um chá com limão.      

- Irá para o paraíso por isso... – dar comida na boca de Atsushi estava distraindo Issay, e só podia rir de si mesmo diante aquela situação tão peculiarmente prazerosa. Aquele aos poucos se tornava o paraíso de Issay.     

Comida a sopa e tomado o chá – o qual Atsushi precisou fazer enorme esforço para sequer engolir (Issay pensou seriamente em fazê-lo tomar o maldito chá por intravenoso) -, hora de... Ficar na cama. E a idéia de somente ficar na cama era um pouco... Tediosa. E Atsushi nenhum esforço sequer fazia para ficar sentado, vendo a programação da TV com Issay. Desligou-a, os programas de domingo eram maçantes.      

- Por que desligou? – não sabia que Atsushi estava desperto. Sorriu com a descoberta.     

- Nunca na história televisiva se passou programas que valessem a pena em domingos.     

- Mas Issay... – e Atsushi virou o rosto para seu lado, com a feição de quem estava chateado até por Issay. – Se estiver entediado, pode ir para casa.      

- De maneira alguma! Estou me divertindo horrores. – riu ironicamente, se deitando de lado.     

- Não quero causar trabalho... E te passar uma gripe.     

- Oras, o que acha que devo fazer então? – e Issay riu, bufando fraco. – Abandoná-lo ao semi-léu correndo o risco de você tentar fazer alguma comida e por fogo na casa por estar mentalmente prejudicado pelo torpor da gripe? Ou se estressar com a própria situação e começar a se dopar com remédios tarja preta? Não quero sua morte ou injúrias sobre minhas costas, muito obrigado. – e Issay fitou o rosto assustado e confuso de Atsushi. Bufou de novo. – Está bem que a chance de você queimar a sua língua com a comida é muito maior do que qualquer alguma tragédia doméstica, mas ainda assim. Eu não poderia me perdoar!      

E Atsushi balançou a cabeça em reprovação, sorrindo. O que era aquilo? Issay queria ficar, queria cuidar do menor e ele tornaria aquela tarefa prazerosa para ambos.     

- Não é o tipo de coisa que um namorado faria. Não acha? – terminou assim, sorrindo vitorioso internamente (talvez o sorriso tenha se tornado um pouco externo) ao achar que o rosto do companheiro tinha enrubescido um pouco mais. Atsushi concordou, e Issay finalmente estava certo de que era querido ali. Digo, certeza ele sempre teve, porém ouvir aquilo era ainda mais... Especial, digamos assim, ainda mais para seu ego nada inflado.

*****

- Vamos Atsushi, um ar fresco te fará bem! – Issay perdia aos poucos a paciência enquanto esperava Atsushi surgir das profundezas de seu apartamento usando uma blusa de lã de gola alta e calças djeans. Acabou por reparar que ele estava uma graça, a gola alta mais as mechas curtas faziam suas bochechas se tornarem um pouco maiores – e Issay adorava aquela característica em Atsushi, seu rosto arredondado e parcialmente escondido pela parte da frente do cabelo. Fechou a porta e se fitaram.      

- Você quer me ver pior, isso sim...      

- Jamais! Está fazendo calor e o sol está lindo lá fora. Tentei te mostrar abrindo a janela do quarto, mas você disse que...     

- Você quase me cegou!     

- Oras vamos Atsushi, apenas um passeio no jardim.     

- Que jardim?     

- ...No jardim do prédio? – agora caminhavam pelo corredor em direção ao elevador.     

- Esse prédio tem jardim? – Atsushi perguntou ingenuamente, e Issay teve a impressão que Atsushi iria espirrar. Não, foi um engano. Mas a feição de “quase espirro” de Atsushi foi impagável de tão adorável.      

- Eu que não moro nele e sei... – riu graciosamente, adentrando o elevador com o companheiro. Enlaçou sua cintura e ouviu-o grunhir, pensou que pudesse estar dolorido demais. Afrouxou o enlace e começou a acariciá-lo ao invés. – Você vai melhorar Atsushi. Eu andei passeando por aquele jardim antes e tem algumas ervas, camomila, cidreira, cravos... Para eu lhe preparar um chá melhor, mais forte. Tenha paciência.     

- Imagino quem tenha plantado isso tudo lá... – olhou para Issay de canto, cabisbaixo e abalado.      

- Não me surpreenderia se encontrasse algum tipo de erva “especial” por lá. – riu bobo, notando que recebia um olhar pesado, julgando Issay. – O que? Ninguém vai naquele jardim! Nem mesmo você, que é morador! – e riu novamente, junto com a tentativa do menor fazer o mesmo.     

Havia mesmo muitas plantas medicinais, além de arbustos enormes com flores lindas e até mesmo um pequeno quiosque artesanal no centro do jardim. Era um lugar não muito grande, mas o espaço fora muito bem aproveitado e se tornou visivelmente mais amplo do que realmente é. E, enquanto Issay colhia ervas e algumas flores distraidamente, Atsushi ficava no quiosque sentado na curta escadaria de acesso, na sombra, tentando inspirar o ar puro e sentir o perfume que pairava no ar. Era o início do verão e quase tudo ali estava florido, as cores eram tantas que deixava o vocalista tonto. Pensou em pedir a Issay para que pudesse voltar ao apartamento quando ele retornou com algumas plantas dentro de um lenço, porém fora interrompido primeiro.

- Está um dia muito bonito... – e Issay, ajoelhado entre as pernas e diante de Atsushi, deu aquele sorriso largo, cheio de dentes, tão bonito que só ele sabia dar. E encantar. E fazer Atsushi esquecer que se sentia incomodado.      

- Uhum, está mesmo. – tentou sorrir de volta, mas a tosse não o deixou. Desviou o olhar e encontrou algumas flores ao lado do lenço amarrado como uma pequena trouxa; eram margaridas. Amarelas, tão pequenas e delicadas. Nunca fora muito atraído a margaridas, nunca chamaram a atenção de Atsushi. Exceto em um certo momento de sua vida...     

- Lindas, não são? – Issay quebrou o silêncio repentino, chamando a atenção de Atsushi. Um sorriso humilde pendia em seus lábios enquanto ele pegava uma das flores e colocava no cabelo de Atsushi. – Fazia muito tempo que não via dessas...     

- Sim, faz algum tempo... – e pôde finalmente dar a Issay o sorriso que ele tanto merecia. 

*****

Issay praguejava os sete mares – e principalmente a Hikaru – por terem feito-o ir àquele programa de TV que, além de ridiculamente sem fama e descartável, os entrevistadores fizeram de tudo para minimizar o que Issay dizia. Ah, mas um homem como ele não fica quieto na frente das câmeras. Muito menos diante um desafio que era lidar com pessoas tão grosseiras e mal sabidas.      

- “Versão japonesa de Stardust”, “É muito inovador ter tal tipo de musica circulando nas rádios nacionais com letras japonesas mas”, mas por que a senhorita faz questão de manter esse dogma maldito de que todo rockstar precisa ser um excluído da sociedade? Tenho certeza de que criaria outro tipo de visão se tivesse a boceta fodida por um deles. – bufou e, quando avistou sua próxima vítima, o gritou com a voz estrondosa e rouca que tinha. Estavam no camarim, outras bandas estavam ali e Issay simplesmente estava se fodendo quanto a isso. – HIKARU, SEU DESGRAÇADO!     

O moreno tremeu, e tremeu ainda mais enquanto era xingado e esquartejado verbalmente pelo vocalista. Pelo menos, após ter gritado seu nome, Issay manteve a afobação num tom mais baixo.     

- Issay, o que eu poderia fazer? Estamos precisando de certo ibope. E esse programa é bem polêmico.      

- Polêmico? Ah, você verá o quão polêmico será quando eu “chamar os punks do submundo e trazer todos para uma entrevista conjunta e decadente”! Podemos até tomar o chá das cinco juntos, o que acha?!      

Hikaru teria uma enorme dor de cabeça aquela noite. E ela estava apenas no começo, Issay pensou. Porém, enquanto jorrava toda a sua fúria antes encubada sobre o guitarrista, o olhar de Issay fora atraído por uma das figuras naquele camarim minúsculo para o número de pessoas que havia ali. Estava lá, isolado, um loiro que hora ou outra desviava o olhar para Issay. E ele mesmo podia jurar que a criatura estava envergonhada sob aquele tanto de maquiagem. Tanta que Issay não compreendia pra que aquilo tudo.     

- Hikaru, quem são esses caras? – estavam ali Hikaru, Issay e todo o restante de outra banda que Issay desconhecia. Bem, pelo menos achou um absurdo que a banda tivesse mais do que 5 integrantes.      

- O que? Issay, você não lê o noticiário? É a banda BUCK-TICK! 

- Quem?     

Ver Hikaru descrente, estressado e jorrando inúmeras informações – em sua maioria inúteis, pois a única que lhe interessaria era o nome do belo loiro que simplesmente não tirava os olhos pra cima de Issay – acabou por fazer o vocalista rir. E riu tão alto que chamou a atenção de todos ali. A sala estava silenciosa antes, por acaso? Viu ainda alguns cochichando, poucos, provavelmente sobre si. Mas não demorou muito até que um par da banda viesse cumprimentá-lo.      

- Prazer Issay-san, somos da banda BUCK-TICK! Eu sou Toll, e todos nós respeitamos muito seu trabalho no Der Zibet. – E ouviu a apresentação do dito baterista e baixista, o qual era uma gracinha também. Mas a atenção de Issay ainda estava em outro homem.     

- Creio eu que a banda não é formada apenas por vocês dois... – e Issay olhou em volta da sala, enquanto todos se agruparam em torno dele para cumprimentá-lo. O mais distante, obviamente, haveria de ser o loiro bonitão. Mas ele teria de se apresentar eventualmente...     

- Sou Atsushi Sakurai, o vocalista. – e Issay dera o primeiro sorriso da noite enquanto se apresentava. Tão largo e bonito que teve a leve impressão de que o loiro havia perdido o ar. -  E-eu já fui em um de seus shows. – e aí Issay já teve certeza de que ele estava mesmo um pouco conturbado.      

O que era fato, pois estava ali seu ídolo, a inspiração de Atsushi e que até mesmo teve os movimentos miseravelmente copiados – miseravelmente, já que Atsushi nunca teria a presença de palco tão impactante e até mesmo sensual (as mulheres não paravam de gritar o nome de Issay no tal show então... E não que Atsushi não achasse ele atraente, mas esse tipo de pensamento não era apropriado para o momento. Não para aquele) de Issay. Espere, estava há quanto tempo com a mão erguida depois do aperto de mãos mesmo?

Conversa vai, conversa vem. Atsushi era fechado, fechadíssimo, praticamente um cadeado. Mas não havia segredo nenhum que a chave de Issay não decifrasse – e essa metáfora fez com que ele risse aleatoriamente durante a conversa, enquanto ocorria o milagre do loiro falar alguma coisa. E, pelo jeito, ele falava sobre algo sério, pois perdeu completamente a linha da fala, talvez até do pensamento e se encolheu, retraindo os ombros com as mãos por entre as coxas (e, por Deus, que coxas eram aquelas por baixo de todo aquele cetim? Queria muito descobrir) as quais Issay teve que, por fim, invejar.      

- Me desculpe, estou te entediando...     

- De maneira alguma! Estava começando a ficar intrigado com seus empecilhos e tentativas de superá-los logo antes de uma apresentação ao vivo. Álcool é bem efetivo, porém... – e viu um sorriso tímido aparecer no rosto de Atsushi. Issay havia acertado sobre o que o menor estava falando, afinal de contas. Porém, aquele sorriso fez Issay esquecer a linha de pensamento e sorriu de volta como quase automático, ainda mais largo que o outro. E, em resposta, o loiro riu (exatamente, ele riu a ponto de mostrar os dentes. Issay teve de ver isso como outro milagre após cerca de meia hora conversando com ele) e, santo Deus. Que sorriso era aquele? Issay se viu ainda mais intrigado e atraído. Cruzou as pernas envoltas de couro para o lado de Atsushi – o qual não poderia escapar, pois estava na extremidade do sofá e nem se encolher, pois aquele era seu limite – e se aproximou sorrateiramente, nada insinuador. Não demais.      

Atsushi não conseguia parar de sorrir pelo motivo mais idiota do mundo, o de que Issay estava mesmo prestando atenção. Em si. Porém, havia um escudo de ouro em frente àquele sorriso, escudo o qual Issay ousou quebra-lo, tira-lo de seu caminho. Olhou para o maior, ele estava próximo e seus dedos enquanto penteavam as mechas de Atsushi, o faziam estremecer sob aquele toque tão gentil e até mesmo íntimo. Já haviam chegado mesmo naquele estágio da amizade?     

- Pobrezinho, o que fizeram com você... – Issay proferiu enquanto conseguia ver melhor o rosto de Atsushi. Seu cabelo era macio, macio demais para o vocalista querer tirar a mão dele. Droga, passaria dos limites daquele jeito. – Quem foi que te maquiou? Não pode deixar qualquer um fazer tal coisa em seu rosto. – e riu graciosamente.

Atsushi riu. Riu envergonhado, abaixando o olhar. Issay sentiu o estômago revirar ao ouvi-lo dizer que ele mesmo havia se maquiado, com a voz tão baixa e tão, mas tão sem graça que Issay perdeu até a capacidade de se movimentar por alguns segundos. O primeiro fora que dera com ele foi o mais epicamente horrível de toda a sua vida. E justo com ele...     

- Me desculpe, eu não...      

- Tudo bem, eu não devo saber me maquiar mesmo. Não tão bem quanto você. – e ele riu novamente. Lânguido, como a ultima vez. Issay quis se matar, se afogar na primeira privada que visse. O que poderia fazer diante daquele deslize?     

- Inaceitável. Você é tão capaz quanto eu. – forçou-se a rir enquanto se levantava e coloca as mãos na cintura. – Vamos, vou lhe maquiar e assim você poderá imitar pro resto de sua vida.     

Ele se levantou e foi. Envergonhado, se sentindo altamente ridículo depois da crítica recebida de Issay. Justo dele... Parou de frente ao espelho e se sentiu puxado, e foi rodado pelo maior. Pelo menos estavam sozinhos no camarim. Corou por estar tão próximo dele, arrepiou-se ao sentir as mechas sendo penteadas para trás por seus dedos, desviava o olhar enquanto Issay passava um pedaço de algodão com removedor em sua pele, mas ele foi trazido de volta quando o ídolo pegou o rosto de Atsushi e pôs-se a analisá-lo. Esperava outra crítica em relação a sua pele ser áspera, aos seus traços nada tradicionalmente japoneses ou à falta de cuidado e paciência que tinha em se maquiar. Não que Issay fosse grosseiro, não pensava nisso. Jamais. Ele era apenas sincero, muito sincero. E isso também merecia a admiração de Atsushi. E então, à espera do tal veredicto...     

- É, não adiantará muito. – Atsushi sentiu o nervosismo crescer dentro de si, junto com um apertão no peito. Ele não tinha esperanças para Issay. Suspirou, abaixando o olhar e se contentando com aquela... – Nenhuma maquiagem nesse mundo te fará mais belo do que já é.     

O coração de Atsushi parou por um segundo. Ou talvez dois. E depois disso, acelerou a ponto de se tornar ensurdecedor. Não conseguia olhar para Issay, tinha medo de ter ouvido errado, ter se enganado, ou pior: estar certo sobre o que ouviu e aquele sorriso vitorioso, tão largo, atrevido a ponto de levantar as bochechas de Issay de uma maneira adoravelmente única... Droga, a imagem daquele sorriso já estava ocupando toda sua mente. Ousou levantar o olhar, e adivinhem só.     

- Desculpe o comentário, mas você chega a parecer frágil de tão adorável... – e Issay riu, vendo finalmente o outro vocalista enrubescer como uma rosa. E aquilo só piorava sua situação. Pôde então se focar nas maquiagens e passar uma base não muito diferente do tom da pele de Atsushi (pois ela natural já era linda e, para a sorte de ambos, parecida com a de Issay), algo para os olhos não muito chamativo em cores, mas sim na negritude e opacidade que provinham daquelas órbitas, mais pareciam dois buracos negros a engolir Issay. E como Issay adorava ser devorado por eles enquanto estava ali, tão próximo de Atsushi... Por fim, os lábios carnudos e agora avermelhados. Issay não resistiu à tentação de mentir e dizer que não havia um pincel para os lábios. O que Atsushi poderia fazer? Negar?     

Issay pintou aqueles lábios com a ponta dos dedos como um quadro, uma obra de arte a ser aprimorada. Como se estivesse lapidando, tirando toda a sujeira de uma pedra já valiosa e a transformando num rubi, tão atraente aos olhos de qualquer um. Mas ali, naquele momento, eles pertenciam somente à contemplação de Issay. Ele pensou que seria impactante, mas não foi. Apenas viu a beleza real de Atsushi sendo mascarada, oculta pela maquiagem de um palhaço melancólico. E, mascarado ou não, ele era lindo...     

- Você... Não me contou o que achou do meu show. – sorriu, ainda passando o batom nos lábios de Atsushi. Passava a segunda camada, e certamente passaria mais outras e procrastinaria os dedos ali em seus lábios. Não conseguia tirar os olhos deles, e se tivesse a chance não tiraria os próprios lábios deles. Ah, borrou um pouco. Foco, Issay, foco...

- Bem, foi... Incrível. – riu baixinho, podendo contar enquanto o maior afastou a mão. Estava arrepiado até as bochechas, causado pelo toque nos próprios lábios. Pensou seriamente em comer os dedos de Issay enquanto estavam próximos, pareciam doces com aquele tom avermelhado. – Issay-san é incrível, sua presença de palco, o que você veste, o que você cria e canta... Tudo. – tudo bem, não eram somente os dedos de Issay que pareciam saborosos. Mas aquilo já ia longe demais para a mente fértil de Atsushi. Pelo menos deveria.     

E aqueles pincéis que eram os dedos de Issay retornaram a desenhar os lábios de Atsushi. Lenta e ritualmente, um toque tão suave, porém presente que Atsushi não conseguia respirar direito. Não somente pelas narinas.     

Os lábios de Atsushi pendiam trêmulos quando Issay afastava-se. Somente quando eram tocados de novo eles se acalmavam, amansavam. Aquilo estava enlouquecendo a mente e o corpo de Issay, apenas se via beijando-os com força, os espremendo contra os próprios. Eles estavam úmidos, escorregadios e aquilo tornaria o beijo ainda mais suave, saboroso. E, por fim, descobriria o que havia por trás deles, o gosto de Atsushi. Queria conhecer seu sabor, queria muito.     

Tanto que ele começou a se aproximar demais, hipnotizado pela respiração ofegante do menor, quente e constante. Se entregaria àquele pedaço de Atsushi, depois se perderia em seu mundo de sabores, mixando os paladares para criar um novo gosto, uma nova sensação. Era aquilo que Issay mais adorava nos primeiros beijos. Ele também gostava de beijos em geral, porém a descoberta de um novo gosto era sempre excitante, e o resultado dessa união, desse laço entre Atsushi e Issay não poderia deixar a desejar. Não mesmo.     

Issay estava muito próximo, e as batidas do coração de Atsushi pareciam tomar conta do silêncio da sala. Teve a sensação de que os dedos de Issay em seus lábios era a única certeza que tinha de que ele não o beijaria e... Atsushi odiava aquela certeza. Os olhos começaram a se fechar para focarem-se nos do maior e nada mais, haveria ali Issay apenas. Estava perdido, entorpecido e atraído pelo seu perfume tão forte, impregnando as narinas do vocalista.  Não sabia se esperara aquilo durante os poucos minutos que mais pareceram horas conversando ou desde que o vira no palco anos atrás, inspirado, imponente, incrível. “Issay...”     

Jurou ter ouvido o próprio nome se esconder por detrás daqueles lábios e chamá-lo para entrar. Era ali que Issay pertencia, então. Afastou os dedos de perto de Atsushi e aos poucos foi se aproximando até encostar a ponta do nariz no dele, e deslizar um contra o outro de encontro ao seu rosto, e à bochecha tão macia do menor enquanto ambos fechavam os olhos, e os lábios de Issay se preparavam para invadir os do outro...     

- Atsushi, você está aí dentro?! Ande logo, estamos perdendo a paciência! – e Atsushi despertou de seu sonho mais bonito para descobrir que aquilo fora tudo real. Issay estava ali, trocando olhares consigo e ele parecia... Sem graça? Abriu um pequeno sorriso e riu tímido.     

Issay perdera o juízo certamente. Conversou com o garoto por alguns minutos e seu coração já acelerava, sua mente se dispersava nele, em sua beleza, em sua timidez, em seu... Naquele sorriso. Viu-se confuso, atraído, eufórico e perdido naquele sorriso.     

- Eu preciso ir... – mas não queria. Queria ficar ali, com Issay, finalmente beijá-lo. Maldito seja a pessoa quem estava batendo na porta freneticamente atrás de Atsushi, justo agora? É sério isso?      

- Claro que precisa. – decidiu deixar o garoto ir, arranhando a garganta e saindo de seu caminho. Olhou para ele, a maquiagem ficara perfeita. Sorriu e gesticulou, girando o dedo para indicar que ele deveria se virar. Estava maravilhoso, concluiu.      

E quando Atsushi se foi para a entrevista, Issay haveria de ir embora. Claro, depois de tamanha confusão estava sim um pouco sem graça. Mas tinha certeza que não foi o único a se sentir fatalmente atraído naquela sala. Sorriu para si, caminhando no corredor em direção à saída daquele lugar. Hikaru o esperava dentro de um carro estacionado bem à frente. Entretanto, Issay precisava ter certeza de que conquistara ao menos o interesse de Atsushi, para ele lhe procurar no futuro. E não sabia como selar aquele dia, marcar a si mesmo na mente do vocalista.      

Enquanto isso, uma senhorita na floricultura a duas casas ao lado de onde Issay estava gritava aos ares quais tipos de flores estavam em promoção.

Atsushi estava estressado, aqueles entrevistadores eram mesmo rudes. Não acreditou em suas perguntas e indiretas quanto a basicamente toda a vida pessoal do vocalista. Suspirou fundo, sentado no sofá camarim sozinho, pra variar. Foi quando levou um susto ao ouvir a porta sendo aberta e uma moça entrando com um buquê em mãos.     

- Com licença, senhor Atsushi Sakurai? – ela disse, sorrindo então quando Atsushi confirmou que era ele quem ela procurava, se levantando e indo em direção à porta. – Entrega para o senhor.

Pegou o buquê de margaridas amarelas descrente, iria até mesmo parar a moça e dizer que seria impossível aquilo ser para ele quando viu que tinha um cartão. E que ele estava perfumado. E acreditou menos ainda quando reconheceu o perfume de Issay. Havia um recado curto nele, e esse recado fez a velha sensação de arritmia voltar à Atsushi. Nele dizia algo como:

“Elas me lembraram você – frágeis das pétalas com a cor do ouro.

Issay.”

*****

Atsushi já estava quase adormecido sob as carícias de Issay, e ele parecia bem melhor depois de tantos chás e do jantar reforçado preparado especialmente a ele. Novamente a pele dele se ouriçava, o sorriso em seu rosto não se dissipava e Issay se sentia realizado. Viu dois pontos brilhantes no rosto de Atsushi, e sorriu para eles.     

- Obrigado, Issay.     

- Oh, disponha, por favor. – e riu baixinho. Uma das margaridas estava sobre o peito de Atsushi, e Issay a deslizava sobre sua pele, seu pescoço até seu rosto, vendo-o arrepiar. Aproximou-se e ousou roubar um beijo tão saboroso que teve de passar a língua sobre os lábios depois. O gosto de Atsushi acabou se tornando inesquecível e viciante. De repente o companheiro pareceu cabisbaixo, levemente desapontado. – O que houve querido? Eu beijo tão mal assim?     

- N-não! Não Issay, é que... – e Atsushi suspirou. E lançou aquele olhar lânguido que matava Issay. Ah, mesmo depois de tantos anos... – Amanhã já é segunda. Parece idiota, mas... Queria que fosse domingo de novo.     

Issay teve de sorrir. Foi o que ele mais fez o dia inteiro, afinal de contas! Ele então se aconchegou para mais perto, suspirou fundo e fitou o companheiro.      

- Sim, é uma pena... Mas sabe de uma coisa? – e, com o sorriso atrevido que Issay sabia esboçar tão bem, ele murmurou ao ouvido de Atsushi. – Depois disso é terça, quarta... E, eventualmente, um domingo terá de vir. E eu sempre virei com eles, Atsushi.      

E ele sorriu. Aquele sorriso de deixar Issay confuso, atraído, eufórico e perdido. Mas tudo bem, agora ele poderia se encontrar nos braços de Atsushi, então...     

- Venha sempre. – e Issay sorriu da melhor maneira possível de volta, como se aquilo fosse a resposta dele. E Atsushi gostou tanto daquela resposta, que decidiu beijá-la.      

E sim, eles sempre teriam os domingos.


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Notas finais do capítulo

Fic bem grande, mas como já acabei ela nem vou separar em capítulos bjs. Aliás ESTRESSEI PORQUE NÃO TEM TAG DO DER ZIBET u_u e nem vem xingar porque shippam ImaixAtsushi porque irc.



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