Lendas Do Acampamento: O Sacrifício escrita por V i n e


Capítulo 7
Kimberly tem uma irmã


Notas iniciais do capítulo

BOW DOWN, BITCHES! I'M BACK!



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Acordei arfando e suando frio. Minha camiseta estava colada no corpo e todo meu ser doía com a noite mal dormida. O chalé estava misteriosamente calmo e frio. Levantei-me e escovei os dentes, vesti uma camisa laranja limpa e calcei o All Star surrado. O céu estava azul e livre de nuvens ou pássaros. Tudo estava tão quieto e vazio que fiquei alerta na mesma hora. Obriguei meu anel a se dissolver em névoa dourada e se solidificar novamente em forma de espada em minhas mãos. Nenhum campista passou correndo carregando armas ou matérias para Artes e Ofícios, nenhuma ninfa corria entre as árvores e nenhum sátiro tocava sua flauta de bambu. Até o ar estava estático, não se movia.

Fui caminhando em direção ao Pavilhão do Refeitório e ali vozes alteradas e enérgicas começaram e ressoar. Parecia que todos os campistas estavam em meio a uma discussão calorosa demais. Assim que cheguei os primeiros garotos me viram começaram a se cutucar e apontar em minha direção. Aos poucos todos foram se calando e foram permitindo que eu passasse até o centro da algazarra. Quíron, Emma, Jake e Annie estavam no centro do refeitório. O centauro estava em sua forma natural, metade homem, metade garanhão branco. Annie estava encostada em uma mesa, completamente apática. Emma estava furiosa, gritando com uma outra garota que estava parada, imponente. Jake mantinha a mão nos ombros de Emma, impedindo-a de avançar.

Di Immortales... – sussurrei. Percebi que ainda segurava a espada quando a ergui ameaçadoramente para a garota nova. Ela tinha o rosto mais lindo que alguém poderia ter visto, os cabelos eram lisos e ondulados perfeitamente, com uma mecha vermelha ondulando pela lateral. Ela vestia uma jaqueta de couro que caia perfeitamente sobre a camiseta roxa e o short jeans com as botas de montaria. Apesar da beleza estonteante ela exibia o mesmo sorrisinho presunçoso que exibira na noite em que veio me visitar. – O que você está fazendo aqui, Kimberly?!

Emma olhou para trás, satisfeita por não ser a única com um desejo incontrolável de esmagar aquele sorrisinho. Quíron se empertigou e Jake ficou ainda mais tenso. Annie anuiu, avaliando tudo com frieza.

– Eu não sabia que ela era tão famosa desse lado do país – reclamou a garota, lançando o cabelo castanho-escuro para o lado. – Mas não, não sou Kimberly. Apesar de todos vocês terem uma opinião bem formada sobre de quem dizem que sou. Cheguei faz quinze minutos e já ouvi mais ofensas do que eu julgo apropriado.

– Não sei quem você quer enganar, queridinha, mas todos sabemos quem você é – rosnou Emma tentando, sem sucesso, escapar das mãos de Jake. – E quando eu colocar minhas mãos em você...

– Creio que estamos sendo precipitados – Quíron pairou o olhar severo pelo amontoado de gente ao redor e como se seguissem uma ordem, Hércules e Sísifo se levantaram de suas cadeiras ao mesmo tempo e dispersaram todos, mandando-os para suas atividades rotineiras. – Se a criança diz que não é Kimberly Mason devemos averiguar os fatos. Ela tem o direito de se explicar.

– Ela não tem o direito de nada! Ela nos traiu e esta manipulando todo o Acampamento Júpiter, ameaçando estourar uma guerra civil. – Abaixei a espada, apesar da irritação crescente que espreitava pelos limites do meu bom senso.

– Então vocês estão sabendo disso? Não são tão selvagens e primitivos como eu esperava – a garota sorriu ironicamente e Emma soltou mais algumas palavras nada gentis. – Pensei que filhos de Minerva eram mais educados.

– Minerva? – Annie arqueou uma sobrancelha. – Você é romana.

A garota a olhou, descrente.

– Achou que eu uso uma camiseta roxa porque aumenta os meus seios? Pelos Lares de Roma, esqueçam o que eu disse sobre vocês não serem uns completos ignorantes. – Ela cruzou os braços sobre o peso do nosso olhar e bufou. Seus olhos tinham o mesmo fulgor caleidoscópico de Kimberly. As duas eram idênticas, quase como se fossem a mesma pessoa. – Meu nome é Isabelle Hildorn, filha de Vênus. Não sou Kimberly nenhuma, mas não me surpreendo por me confundirem com ela. Kimberly Mason é na verdade minha irmã gêmea, Inna Hildorn.

Até Quíron parecia abobalhado depois dessa declaração. Emma parou de tentar escapar de Jake e meu amigo olhou para mim, lançando uma pergunta silenciosa. Kimberly não era Kimberly. Mais mentiras.

– Minha irmã trocou de nome para que os legionários não a encontrassem quando ela fugiu do Acampamento Júpiter com aquele namoradinho dela. Brius. Ele nunca se encaixou na Legião. Permaneceu em probatio até conquistar a confiança de Reyna e Octavian. Ele quase se tornou pretor, mas fugiu com ela semanas antes da votação no senado. – Isabelle olhou nos olhos de cada um de nós, desafiando-nos a acusá-la de mentirosa. – É o bastante para eu deixar de ser ameaçada por essa aí? – Ela apontou para Emma, arqueando ambas as sobrancelhas.

– Srta. Hildorn se isso que você diz for verdade, creio que deva explicar o motivo de sua visita e devo pedir que não leve a mal, mas ficará sobre vigia constante até decidirmos se acreditamos em você ou não – Quíron parecia apreensivo, ele batia o casco nervosamente no chão.

– Por que eu atravessei o país inteiro para chegar em um acampamento cheio de possíveis inimigos hostis e correndo o risco de ser achada pela Legião e executada por traição? – Algo naquele tom era tão irritante e diferente do que o que Kimberly usava quando fingia ser uma garota legal. Isabelle era irônica e atrevida. Kimberly era educada e gentil. – Quando Inna voltou para o Acampamento Júpiter eu finalmente achei que ela tinha se livrado daquele traste, mas imagine minha surpresa quando Reyna renunciou ao cargo de pretora e colocou minha adorável irmã em seu lugar. A primeira ordem daquela vaca foi me retirar do cargo de centurião e colocar Brius no cargo de pretor. Eles dominaram aquele lugar e ninguém se opôs. Reyna foi presa e Octavian perdeu todo o poder que tinha sobre a Legião. Inna usou a benção de nossa mãe para dominar todos naquele acampamento. Graecus começaram a chegar, vindos do acampamento meio-sangue e nenhum romano achou estranho. Eu sentia a magia do charme de Inna rondando suas palavras nas reuniões do senado e não demorou até que Octavian, nosso áugure, fosse dominado pelo poder dela. Eles estão formando um exército grande, mas todas às vezes que ela falou comigo... Ela parecia ter dificuldades em esquecer alguém ou algo nesse acampamento. Ela queria que eu a ajudasse a controlar aquele lugar, mas nunca fui muito boa usando o charme. De certa forma, pensei em vir aqui e pedir educadamente que a pessoa que domou aquele coração de pedra... Que essa pessoa me ajude a impedi-la de fazer uma grande burrada.

Todos olharam para mim e um brilho de compreensão atravessou o olhar de Isabelle.

– Pelos Lares de Roma! – Os olhos da garota se arregalaram. – Você é o motivo dela hesitar tanto na organização da Legião.

Sacudi a cabeça com veemência, negando o óbvio. Jake tirou as mãos dos ombros de Emma e ela andou para perto de Annie, encostando-se à mesa junto à ruiva. Quíron, que permanecera em silêncio durante a explicação de Isabelle, alisou sua barba grisalha, pensativo.

– Você fala bem, criança. – Admitiu o centauro, arrastando o casco no chão. – Percebo o mesmo poder que rodeia as palavras de sua irmã, Inna. Apesar de ter tido a educação de não usar seu charme contra nós. Se tudo o que nos contou é verdade, temo que precisaremos consultar o Oráculo e planejar uma missão para libertar Reyna e ajudá-la a retomar o controle do Acampamento Júpiter.

– Isabelle – eu chamei. – Você sabe onde eles esconderam Sophie? Ela foi raptada recentemente e parece que foi levada para o acampamento romano.

A filha de Vênus negou com a cabeça.

– Sai de lá faz três semanas – ela explicou. – Não é tão fácil atravessar o país todo sozinha, mas graças às bênçãos da minha mãe eu cheguei à Nova York sem maiores complicações.

Suspirei, sentindo mais um fiapo da minha esperança se desprender e ir embora, levado pelo vento.

– Por que você fugiu? – o tom de Emma permanecia o mesmo. Afiado como uma navalha. – Sabia que, se fugisse e viesse para cá, sua irmã mandaria os campistas romanos atrás de você. Sem falar que poderíamos ignorar suas explicações e simplesmente matá-la. Qual o real motivo de você estar aqui?

Isabelle descruzou os braços e deslizou a mão pela jaqueta de couro. Quando ela ergueu os olhos, o semblante irônico havia desaparecido.

– Eu estava com medo, ok? – ela mordeu o lábio inferior e Jake suspirou, encantado. – Não tenho medo dela, não. Mas... o poder que ela reuniu com a tentativa de ascensão de Urano é grande demais para um único semideus ou legado dos deuses. Octavian pode ser um idiota bem grande, mas ele a preveniu que se não tomasse cuidado... Ela seria dominada pelo próprio charme. Os feitos do Acampamento Meio-Sangue no Monte Otris chegou aos ouvidos dos romanos. Vênus é descendente de Urano, por isso todos nós, filhos da deusa, nos sentimos muito à vontade em pégasos pelos céus, mas minha irmã nunca faria o que aquele deus pedisse se ele não oferecesse algo em troca. Demorou até eu perceber, mas Inna pediu algo que nem mesmo os mais ambiciosos teriam a ousadia de barganhar. Ela tem o cinturão de Vênus, a arma forjada por Vulcano que faz com que minha mãe tenha poder sobre todos, controlar quais laços amorosos apertar mais e quais quebrar. Ela poderia fazer qualquer um se apaixonar por qualquer um, ou fazer com que um casal apaixonado passe a se odiar. Ela pode usa esse poder como quiser e, enquanto Vênus não tiver sua arma de volta... tudo o que é considerado belo, romântico ou amável vai perdendo a força. Sem Vênus no caminho, Inna continuará controlando as pessoas com o charme. Com esse cinto minha irmã consegue colocar uma cidade inteira sob seu comando.

– Isso é mesmo muito preocupante. Convocarei o conselho de guerra esta noite – anunciou Quíron. Seus olhos serpentearam, fazendo uma pausa afetuosa em cada um de nós, até mesmo em Isabelle. – Emma e Annie, levem o chalé de Apolo e Atena até o Lago de Canoagem para as Instruções matinais. Jacob, nós temos que conversar sobre a permanência de suas mascotes aqui no acampamento. Will, eu devo pedir que você... escolte nossa visitante. Mostre o acampamento e depois, vá ao chalé de Afrodite e ajude-a a se instalar.

Não! Passar um tempinho com uma pessoa igual a Kimberly? Não!

– Claro, Quíron. – Foi o que eu respondi.

Isabelle me seguiu sem pestanejar. Olhei por cima do ombro e vi a expressão solidária de Emma. A filha de Vênus caminhou ao meu lado, olhando para frente com um semblante determinado e divertido. Ela enrolou as mangas da jaqueta de couro até os cotovelos, exibindo várias pulseiras de ouro e prata em ambos os braços. Ela tinha o estilo despojado e boêmio que a fazia parecer mais velha e ao mesmo tempo muito mais sofisticada. Os cabelos castanhos caiam nas costas, ondulados e brilhantes. Até a mecha vermelha a deixava mais madura

Na parte interna do seu antebraço havia uma tatuagem feita a fogo em sua pele. Cinco barras, uma para cada ano de serviço na Legião, eu imaginei. As letras SPQR estavam sobre as cinco barras e o emblema que marcava sua pele era uma pomba em pleno vôo.

– Essa tatuagem... O que ela significa? – Eu sabia que os romanos marcavam seus legionários com tatuagens ao invés de usar colares com contas de barro, mas nunca parei para pensar sobre o que elas significavam de fato.

Isabelle olhou para o próprio antebraço e sua expressão divertida desapareceu, tornou-se tristonha e nostálgica.

– As barras são para cada ano de serviço prestado à Legião, sem contar o primeiro ano que ficamos em probatio. As letras são o lema do Império. Senatus Populusque Romanus. O Senado e o Povo de Roma. A pomba é o símbolo de Vênus, ou Afrodite se preferir.

– Isso deve doer – comentei, lançando-lhe um olhar cínico antes de me voltar para a trilha por entre os pinheiros da floresta. – Aqui nós usamos colares com contas de barro, uma para cada ano que passamos aqui. Não marcamos nossa pele para provar que pertencemos a este lugar.

– Colares se perdem com o tempo, barro pode rachar – disse Isabelle, dando de ombros. – Os romanos marcam os legionários como sua propriedade, sim. Mas não é uma tatuagem que define se você pertence a algum lugar ou não. E também não será um colar com contas de barro que irá segurar gregos nesse acampamento. Assim como uma tatuagem não me segurou quando fugi de lá para jurar minha lealdade à vocês, prometendo ao seu centauro que os ajudaria a devolver o poder da Legião às mãos de Reyna.

Encarei-a, furioso. Isabelle era muito diferente de Kimberly (ou Inna, que seja), ela tinha vontade própria e não parecia fingir ser o que não era. Ela não se importava com floreios para dizer o que pensava, mas continuava sendo idêntica fisicamente com a irmã gêmea e isso tornava difícil suportá-la.

– Talvez eu precise levá-la ao Arsenal – comentei, parando na bifurcação da trilha. – Não sei como os filhos de Afrodite são do lado romano, mas aqui eles raramente colocam a mão na massa. Kimberly usou seu charme como defesa por muito tempo, mas da ultima vez que a vi ela tinha aprendido a manejar uma espada.

– Filhos de Afrodite podem até ser desleixados e completamente alheios à sobrevivência no mundo mortal. Mas nós, filhos de Vênus não temos esse problema. – Ela se curvou e puxou uma faca de dentro da bota. Era feito do mais puro e reluzente ouro que eu já havia visto. – Isto é um pugio, uma adaga romana. É feita de Ouro Imperial e prata sem falar que é enfeitiçada por Vênus.

– De que adianta a mais bela arma se não sabe empunhá-la? – desdenhei e vi um lampejo de irritação passar pelo rosto de Isabelle.

A filha de Vênus se moveu com uma velocidade impressionante, mas não tanto para me pegar. Esquivei-me de sua estocada e invoquei Transfiguradora, que se dissolveu e se transformou em uma espada. Entrei no modo de batalha, pronto para derrubá-la se fosse necessário. Seu perfume exalava um odor deliciosamente tranquilizador, Ralph Lauren talvez? Senti a espada ficar pesada em minha mão e percebi que o perfume era mais um dos truques da semideusa. Apoiei-me no pé esquerdo e investi uma estocada que ela facilmente desviou com a parte achatada da adaga.

– Não é uma completa perdedora – admiti.

Ela sorriu e a lâmina do pugio derreteu. O ouro imperial alongou como uma serpente, enrolando-se no chão até se transformar em um chicote. Avaliei a transformação da arma. O chicote era longo e todo escamado, as escamas de ouro eram afiadíssimas e parecia bem resistente. Não vi quando ela se moveu, mas o chicote estalou em minha direção, enrolando-se no meu punho que segurava a espada. Isabelle abriu um sorrisinho desdenhoso e eu praguejei. Ela movimentou o antebraço só um pouco, fazendo o chicote apertar, cortando minha pele ao arrastar das escamas.

– Não posso dizer o mesmo de você, graecus. – Não ouvi o que ela sussurrou em latim, mas a ponta do seu chicote se ergueu e a cabeça de uma cobra de ouro silvou, olhando para mim com seus minúsculos olhos de rubis. – Um movimento seu e ela injetará veneno em suas veias. – Como se para provar suas palavras, a serpente se enrolou ainda mais em meu antebraço, cortando-o com suas escamas de ouro. Em sua boca havia pequenas agulhas douradas que pingavam veneno arroxeado. Soltei um palavrão, meu braço ardia com os cortes.

– Tudo bem, você venceu – resmunguei, à contra-gosto.

O sorriso de Isabelle ficou ainda maior quando soltei a espada, rendendo-me. A serpente afrouxou o aperto e ela puxou bruscamente o chicote, sem me ferir novamente. O chicote reduziu de tamanho, voltando ao formato de adaga com uma velocidade surpreendente.

– É melhor passar algo nesses cortes. – Ela zombou. Ignorando sua provocação, concentrei-me nas moléculas de água que estavam presentes no ar e formei uma fina película de água sobre os ferimentos. Ela arfou, surpresa quando minhas feridas cicatrizaram e o sangue foi lavado. – Você é um filho de Netuno.

Poseidon – eu a corrigi.

– Há um filho de Netuno no Acampamento Júpiter. – Seu olhar não se alterou quando minha espada virou névoa e se enrolou no meu dedo anelar, formando um anel de bronze celestial. – Júpiter, Plutão e Netuno não deveriam ter mais filhos, mas é claro que suas formas gregas têm que quebrar juramentos sagrados.

– Não sei se você se ouviu, mas acabou de dizer que há um filho de Poseidon no seu acampamento.

– Desculpe-me, se eu me expressei mal – seus olhos refletiam o tom dourado dos raios solares que penetravam por entre os enormes pinheiros. – Há um filho de Poseidon no Acampamento Júpiter. Tyler é um dos graecus que se uniu à Legião, servindo à minha irmã e Brius.


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Notas finais do capítulo

Espero que os amores que liam isso antes voltem a ler isso agora, obrigado de nada.



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