Vale Da Escuridão escrita por Lady In Red


Capítulo 1
Última dose.


Notas iniciais do capítulo

Oi. Esse é o primeiro texto que eu escrevo, então gostaria que vocês me dessem dicas ou críticas sobre ele. Escrevam o que vocês quiserem, mas escrevam oauisdhasoirh

Aconselho a ouvirem essa música durante a leitura: Possibility - Lykke Li (http://www.youtube.com/watch?v=RvMeOllo_Vo&ob=av3n)

Espero de verdade que gostem. Boa leitura.



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Apagou o cigarro e soltou lentamente a fumaça do último Marlboro que havia levado para aquele quarto de hotel, como se fosse a última lembrança que ele não queria deixar escapar. A fumaça se misturou na penumbra do quarto e dissipou-se, mas, mesmo assim, qualquer pessoa que entrasse ali seria capaz de sentir o cheiro forte de nicotina. Sorriu. Lembrou-se de como ela gostava de encostar a cabeça em seu pescoço somente para sentir o cheiro do cigarro se misturar com o perfume levemente amadeirado. Os minutos arrastavam-se lentamente e mostravam para ele que, não importava quantas mulheres levasse para o quarto, nenhuma serviria como remédio para aquela dor insuportável que esfarelava seu coração. Nenhuma possuía os lábios tão adocicados quanto o mel. Nenhuma possuía a pele tão pálida que podia ser facilmente confundida com porcelana fina. Tão porcelana que ele sentia medo de parti-la ao meio; a segurava como se fosse tão importante quanto o último suspiro antes da morte. Apertou os olhos e, ao abri-los, sentiu seu coração palpitar forte dentro do peito, como se estivesse expulsando toda a saudade e se enchendo da alegria que há tanto tempo fazia falta. Ela estava ali, sentada na beirada da cama. Cruzou as coxas grossas e sorriu inocentemente; uma mistura de anjo e demônio. Ele já não sabia se estava vivendo a realidade ou se aquilo fazia parte de outro dos sonhos criados por sua mente cansada e abatida. Os lábios grossos estavam pintados de um vermelho intenso que criava vida no meio da luz fraca.


Lentamente, ela levantou e andou até ele. Passou as pernas nuas em volta de seus quadris e sentou-se em seu colo. Ele estremeceu; quase não se lembrava de como era boa aquela proximidade dos corpos. Sentiu os lábios carnudos encostarem levemente nos seus e abriu a boca, dando passagem para que a língua quente dela matasse a saudade que crucificava os dois. As línguas dançavam juntas na melodia que eles haviam criado. Os corpos colados trocavam calor e ele já não sentia mais o frio que antes condenava o quarto vazio. Ela cessou o beijo. Os olhares ardentes se cruzaram e ele levou uma das mãos até os cabelos dela, enrolando calmamente um dos cachos em seu dedo. Ela sorriu e ele pôde observar de perto os traços finos que compunham aquele rosto perfeito. Observou como se aquela fosse a última vez em que teria acesso à uma coisa tão bonita. E ele sabia que era. Ele estava provando do seu próprio veneno, sabia disso. Sabia que ela iria embora e somente iria procura-lo quando a saudade e a carência se tornassem insuportáveis, mas ele não ligava. Os poucos momentos com ela já o faziam esquecer-se de toda a humilhação e decepção que ela lhe causava. As dores eram sanadas e a saudade já não existia mais. O relacionamento frívolo e incompleto era, ao mesmo tempo, acolhedor e benévolo; como a nicotina que o acalmava, mas transformava seus pulmões em nuvens negras. Os minutos, os mesmos que antes passavam lentamente, agora andavam mais rápidos e isso fazia o peito dele se contorcer em agonia e desespero. E então, tão rápida e surpreendente quanto apareceu, ela se foi. Levantou-se de seu colo e ele sentiu seu coração ser esmagado enquanto ela andava até a cama e pegava sua pequena bolsa. Pensou em palavras que pudessem convencê-la a ficar, mas ele sabia que não seria tão fácil assim. Ela não era boba o suficiente para ficar, e ele não era forte o suficiente para jurar amar somente a ela.


A porta fechou e ele viu-se novamente sozinho. Passou a mão pela baixa mesa de cabeceira e lembrou-se de estar sem cigarros. Suspirou pesadamente. Havia acontecido mais uma vez; ela havia aparecido e ido embora sem dialogar. Ainda podia sentir o gosto dela em seus lábios e isso só ajudava a torturar ainda mais aquele homem que há tanto tempo não se lembrava de viver. Ele apenas existia. Seus dedos já não eram tão ágeis na guitarra. Sua voz estava mais fraca e por isso ele não fazia mais questão de ser a segunda voz nas músicas. Seu pensamento viajava até ela e o impossibilitava de compor. E assim, no meio do mar de tortura que ele havia imergido, a porta abriu. Ele não percebeu; estava absorto em seus pensamentos melancólicos e autoflageladores. Ela aproximou-se ao perceber o descaso e sentou novamente na cama. Observou o rosto másculo e as linhas de expressão que começavam a surgir vagarosamente. Os cabelos negros fora de corte e a barba rala indicavam a falta de zelo consigo mesmo. Ela abriu a pequena bolsa e tirou um maço de cigarros que havia acabado de comprar. Colocou cuidadosamente em cima da mesa de cabeceira e torceu os lábios. As frases se formavam instantaneamente em sua cabeça, mas ela não tinha coragem suficiente para pronunciá-las. Tinha medo que as palavras soassem cínicas e superficiais. Ela não queria que ele sofresse, não queria que ele se entregasse ao destino e que parasse de lutar por sua sobrevivência. Mas ela não podia arriscar; não podia se jogar sem paraquedas no abismo que era a vida dele. Ela sabia que o tombo iria machucar e seu coração já estava cansado de tantos remendos e curativos que ela teve que fazer durante o passar dos anos. Suspirou baixo para não acordá-lo de seus pensamentos; ela não sabia se iria conseguir manter sua decisão se encontrasse aqueles olhos suplicantes. Levantou da cama e seguiu até a porta.


“Pensei que não fosse voltar.”, ele falou. “Você nunca volta.” Ele terminou baixo, como se falasse mais para si mesmo do que para ela.


O coração dela sucumbiu ao tom de decepção que transbordou junto das palavras, mas ela não se virou. Olhou o corredor do hotel através da porta aberta enquanto procurava dizer alguma coisa que não parecesse leviana e falsa. Ela o ouviu se levantar da poltrona onde estava e caminhar lentamente até ela. A mão quente tocou a sua cintura, mais como um pedido do que como qualquer outra coisa. Ele pedia, implorava subliminarmente para que ela ficasse e o acolhesse em seus braços quentes. Depois de alguns segundos sem resposta, ele soltou a cintura dela e repousou sua mão ao lado de seu corpo. Seu peito subia e descia descompassadamente, como se ele tivesse passado a vida inteira em baixo da água sem acesso ao oxigênio. Finalmente, ela virou-se e pôde observar o rosto iluminado pela luz clara que entrava pela porta. As olheiras profundas e negras provavam as noites mal dormidas e ela não precisava perder seu tempo perguntando o motivo delas. Os olhos castanhos não possuíam mais o brilho encantador e a curiosidade invasiva que ela lembrava-se de ter visto na primeira vez em que se encontraram. A aflição e a mágoa eram refletidas na feição cansada e entregue ao acaso, da mesma forma que um corpo sem vida é entregue aos parasitas.


Ele caiu de joelhos aos seus pés. Ela não sabia se era um sinal de fraqueza ou de súplica. Ele abaixou a cabeça e ela pôde ouvir os soluços que tentavam ser embargados pelo orgulho. Pela primeira vez, esqueceu-se de dar ouvidos à sua razão e ajoelhou-se na frente dele, pousando delicadamente a mão fina no queixo másculo e erguendo o seu rosto. Os olhos caídos estavam marejados e as lágrimas em seu rosto refletiam a luz, como se fossem pequenos pedaços de diamante cravados na pele morena. Ela secou as finas lágrimas com as costas da mão e acariciou as bochechas dele com o polegar. Ele podia sentir seus pelos se arrepiarem com o contato da pele fria com a sua pele quente. Fechou os olhos e com dificuldade conseguiu cessar as lágrimas que insistiam em cair. Ele desejou, ainda de olhos fechados, ouvir a voz doce dizendo seu nome e sobrestando o tormento que havia se instalado. Mas seu pedido não foi atendido, como sempre. Abriu os olhos e a viu com a mesma feição de quem pede perdão. Ele a perdoou mentalmente; sabia que carregar a raiva seria pior do que carregar a falsa-esperança de tê-la para si. Ela levantou, mas ele não tinha forças para fazer o mesmo. Continuou no chão enquanto ela saía pela porta e a fechava com cuidado. A luz clara já não podia mais entrar e somente a meia-luz voltou a subjugar o quarto. O cômodo, antes cheio de esperança, agora estava vazio. Exatamente como o coração do homem que permanecia de joelhos.


Vazio.

Frio.

Doentio.


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Notas finais do capítulo

Merece review?