Yesterday: O Passado de Finnick Odair escrita por Callisto


Capítulo 2
Capítulo II ─ Não me deixe afundar


Notas iniciais do capítulo

2º cap. (:
Fiz algumas mudanças (bem sutis meeesmo), nada que tenha modificado o desenrolar da história.
Obrigada e boa leitura!



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I've been told when a boy kiss a girl

Take a trip around the world

Hey, hey

yeah, she say ya do

My girl says when I kiss her lips

Gets a thrill through her fingertips

Disseram-me quando um garoto beija uma garota

Faz uma viagem ao redor do mundo

Hey, hey

é, ela disse que faz isso

Minha garota diz que quando eu beijo sua boca

Sente uma emoção através de seus dedos

The Beatles - Boys




3º verão



– Ei, Finn!

Finnick olha para trás e sorri. Annie está lá - o cabelo escuro e embaraçado preso em um rabo-de-cavalo mal feito, as maçãs do rosto avermelhadas e descascando, o habitual vestido branco sujo de areia e uma pequena cesta coberta por um pano branco balançando nas mãos pequeninas. Desde o momento em que a conheceu, jamais deixou de encontrá-la diariamente na margem para conversar, brincar, pegar conchas... ou, simplesmente, observar o sol nascer. Seu pai, Kian, gosta muito de Annie, assim como sua mãe Ellie; eles acham a menina esperta e amável, e, em segredo, torcem para que ela tenha um futuro ao lado de Finnick.

(Eles ainda tem nove anos, sim, mas isso não significa que não possam traçar um destino juntos... ou talvez os pais de Finnick estejam sendo precipitados e precoces demais)

O garoto vai até Annie e pergunta, curioso, o que ela traz na cesta.

– Eu imaginei que estivesse com fome, então fiz esses bolinhos - Annie tira o pano branco de cima do objeto, o conteúdo fica exposto e o ar perfuma-se com o cheiro da comida. Depois, ela sai andando em direção ao leste da praia - Venha, Finn! Eu sei de um lugar tranquilo para comermos sem sermos atrapalhados pelas gaivotas.

– Onde fica? - pergunta ele, a voz dois tons mais alta para que ela escutasse.

– Só me siga - responde.

O garoto hesita, mas acaba acompanhando a menina. Alguns metros adiante, Annie para e senta na areia fofa, colocando a porção de bolinhos no pano e gritando "Vamos, Finnick, seu lerdo". Ele logo alcança a amiga e senta-se junto à ela. O céu está tingido com bonitos tons rósios e a brisa que vem do mar tem um cheiro salgado de paz. Aquela parte da praia é realmente mais tranquila: nenhum pássaro ou pescador à vista, nenhum ruído irritante de barco, nenhum Pacificador tentando acabar com a diversão. Ótimo.

– Os bolinhos estão ótimos - comenta Finnick, já no terceiro ou quarto bolo - Foi você mesma que fez?

– O quê? Você duvida que eu saiba cozinhar bem assim? - diz ela, pasma - Saiba que sou uma ótima cozinheira.

– Sei.

– É verdade, seu idiota - replica ela - E coma logo isso para podermos nadar um pouco. Estou cansada de ficar aqui na areia e está muito calor.

Finnick ri.

– Como você é chata! - ele engole o último bolinho e levanta-se com um pulo - Vamos logo então, Annie Cozinheira. Aposto que você não consegue chegar antes do que eu na água.

– Quer apostar, Menino do Peixe? - provoca ela, sorrindo.

– Sim. - responde.

– E o que você quer apostar?

Finnick pensa por alguns segundos.

– Eu aposto um beijo seu.

Os olhos de Annie arregalam-se de descrença.

– O... o quê?

– Isso mesmo. Se eu conseguir chegar na água antes de você, ganharei um beijo. Se você conseguir chegar antes de mim, bem, poderá escolher sua recompensa.

O rosto da garota assume uma expressão de desafio.

– Qualquer recompensa?

– Qualquer uma.

– Qualquer uma mesmo?

– Sim. Qualquer. Uma - Finnick profere as palavras bem lentamente, deixando a proposta bem mais sedutora do que de fato é.

– Eu aceito a aposta, então - diz Annie. Eles estendem seus respectivos dedos mindinhos e selam a promessa, como as boas e honestas crianças que são. Logo em seguida, colocam-se em posição e começam a correr loucamente até a água. Annie é a primeira a largar, mas Finnick é mais rápido e alcança a beira do mar bem antes dela.

(É, parece que é hora do beijo...)

– Não é justo! - bufa ela - Não, não é justo mesmo. Meu pé está doendo muito, por isso não corri tão bem. E a areia daqui é muito fofa, os pés afundam quando corremos.

– A gente apostou - lembra Finnick - E é lógico que você quer me beijar. Só está dando uma de difícil.

Annie cruza os braços.

– Não, eu...

– Não tem desculpa, aposta é aposta. Se você tivesse vencido, com certeza teria ganhado uma recompensa - replica ele.

Annie suspira.

– Está bem, está bem - diz - mas não pode ser um beijo demorado.

– Ninguém disse que ia ser demorado - Finnick sorri - Prometemos um beijo, só isso.

"E se ele tivesse pedido um beijo diferente?", pondera, corando imediatamente com o pensamento.

– Certo. Vamos contar até três, está bem?

– Sim, mas pra que você...

– Cala a boca e conta comigo - interrompe ela, pousando as mãos nos ombros do garoto.

(Uau, os ombros dele são fortes)

(Nossa, ela tem os cabelos brilhantes)

(...não há nenhum mal em pensar isso de um amigo, há?)

– Um - começa ela, dando um passo para frente.

– Dois - emenda ele, aproximando-se ainda mais.

– Três! - gritam os dois em uníssono.

Finnick encurta o espaço entre eles com um puxão no braço de Annie. Os lábios dele se tocam,

(aquela era a primeira vez, a primeira vez dos dois)

e ficam unidos por aproximadamente dez segundos. Finnick nunca havia estado tão próximo dela antes, portanto nunca tinha se dado conta do quão bom era seu perfume. É um aroma bem melhor do que o daqueles perfumes baratos feitos de sabe-se-lá-o-quê que os ambulantes vendem nas ruas. Seu cabelo cheira a uma mistura de flores e areia, e seus lábios são tão quentes e macios quanto aqueles bolinhos. A comparação é ridícula, sim, mas foi a primeira coisa que lhe passou pela cabeça. Annie, assim como ele, jamais havia chegado tão perto de um menino antes, então não fazia ideia do que esperar. Todavia, ela surpreendeu-se gostando. Gostou de segurar firme nos seus ombros, gostou da sensação de segurança que sua presença trouxe, gostou da espressão de "isso foi interessante" de Finnick ao terminar de beijá-lo, gostou muito. Foram apenas dez segundos de beijo - um beijo sem língua, sem movimento, um beijo infantil -, mas ainda assim aquela foi a melhor sensação do mundo para eles. Foi como nadar sob o pôr do sol, só que algumas milhares de vezes mais especial.

Afastam-se de repente, apesar disso ser contra a vontade dos dois, e ficam olhando um para o rosto do outro. Finnick é o primeiro a rir. Pouco tempo depois, os dois estão gargalhando.

– Você estava nervosa, não é? - indaga o garoto, depois de se recuperar da crise de riso.

– Estava. Eu nunca tinha... você sabe.

– Nem eu - confessa, dando de ombros.

– Verdade?

– Aham. - ele abre um meio-sorriso - Mas até que não foi tão ruim, né?

Ela faz que sim com a cabeça, ainda um pouco extasiada. E agora? Agora que eles tinham se beijado, o que devem fazer? Abraçar um ao outro? Falar sobre o quanto formam um lindo casal? Trocar alianças? Finnick nota a expressão de desespero de Annie e quase começa a rir novamente. Ela é tão insegura, tão neurótica.

(É aí que ele descobre que gosta até dos seus defeitos)

Como Finnick não quer fazê-la sentir nervosismo nem nada do gênero, resolve mudar de assunto.

– Vem, Annie Cozinheira - chama o garoto de súbito, entrando no mar - Vamos nadar.


────────────────────────────────────────────────────────────

O tempo está ótimo - calor, mas sem o costumeiro sol forte - e o mar nunca esteve tão translúcido e bonito. A água morna lambe o abdômen de Annie e as pernas de Finnick. Ambos estão tentando agir como se aquilo - o beijo - não tivesse acontecido. E estão conseguindo. Eles mergulham, espirram água um no outro e riem, na esperança de que esse descaso forme uma sombra e oculte a memória do beijo, a qual ainda está fresca demais na memória. Fresca demais...

– Vamos mais para o fundo? - pergunta o garoto de repente.

Annie congela. A verdade é que não sabe nadar muito bem e sempre alimentou o medo de ser surpreendida por uma onda, em especial depois de um episódio traumatizante na sua infância. Além do mais, já está ficando tarde e os ventos estão bem mais fortes (tanto que as copas dos coqueiros estão dançando no topo dos caules). Isso significa, obviamente, que o mar está mais violento. E se uma daquelas ondas imensas aparecer de repente e pegá-los enquanto estão tranquilos, nadando e se divertindo? Annie sabe que Finnick, como o nadador exímio que é, com certeza a driblaria e sairia ileso. Mas e ela? Será que teria a capacidade de ter o mesmo final que ele? Será que conseguiria impedir aquela água salgada e límpida de encher seus pulmões e provocar uma das piores mortes conhecidas?

(Ela sabe a resposta, sim ela sabe)

– Está ótimo aqui onde estamos - responde Annie, tentando ao máximo controlar o tom de voz para não parecer assustada. Porém, o pavor é tanto que a fala sai esganiçada e esquisita, como quando alguém coloca um CD arranhado para tocar.

– Não está não. Eu quero mergulhar e aqui é muito raso.

– Então vai você. Eu fico aqui e espero.

Finnick ergue uma sobrancelha, confuso.

– Ei - diz ele docemente, enquanto aproxima-se dela - Você não está com medo, está?

– Não. É que...

(não admita, ele vai rir de você, não admita)

– ...eu não quero, só isso.

– Você não sabe nadar? - ele pergunta, a voz doce.

Ela confirma com a cabeça, claramente envergonhada. Como alguém do Distrito 4, o Distrito das Águas, o Paraíso das Ondas, o litoral de Panem - como alguém que nasceu nesse lugar não sabe nadar? Annie abaixa a cabeça, já esperando os risos e brincadeiras (com as quais já está acostumada graças à escola, aquele maldito campo de treinamento para imbecis).

É então que Finnick faz algo totalmente inusitado para Annie; o garoto coloca um braço em torno do seu corpo magro e quente e diz:

– Eu te ensino.

Depois, conduz a menina gentilmente até uma parte mais distante do mar, onde a água bate no tórax do garoto e um pouco mais acima em Annie. Ela sinceramente não sabe porque diabos está deixando ele levá-la até lá; é como se um balde de confiança mútua tivesse sido derramado sobre dois depois daquele... depois daquele beijo.

– Deite - ordena Finnick.

– Hã?

– Deite a cabeça na água. Assim - o garoto faz uma demonstração do que quis dizer. Parece que o nível da água é um lençol e que Finnick está deitado por cima - Você precisa aprender a boiar, antes de qualquer coisa.

– Está bem - diz, a insegurança pesando em sua voz. Ela consegue logo na primeira vez que tenta. Então exclama, feliz com o próprio triunfo: - Foi fácil!

Um sorriso brota nos lábios grossos do garoto.

– Eu já vi você mergulhando. Você sabe. O único problema é que ainda não consegue boiar direito, mas isso é muito simples. Todos sabemos boiar naturalmente, é só saber ficar na posição certa. Agora deite de frente, com o tórax para baixo.

Annie faz o que ele disse, mas engole de água e começa a tossir como quem tenta cuspir os pulmões.

– Calma aí - Finnick ri.

– Não... ria de mim!

– Você precisa ir com calma, Annie - instrui ele, colocando uma mão de apoio em baixo do tronco dela - Deixa eu te ajudar.

– Espere, Finn - interrompe ela - Só uma coisa.

– O quê?

– Finn, não me deixe afundar. Por favor.

Ele assente e sorri.

– Nunca deixarei.

(Será?)

(Será que conseguiria manter essa promessa por muito tempo?)

– O-obrigada - ela também está sorrindo agora.

Finnick segura sua cintura com uma das mãos e ergue seu tórax com a outra. Uma vez que Annie está na posição certa, ele pousa ambas as mãos em seu abdômen, como se estivesse tentando levantá-la, e diz:

– Mexa as pernas e estenda os braços um pouquinho. Lembre-se de deixar a cabeça acima da água, sempre.

Ela o faz. Finnick tira as mãos do abdômen e agarra os antebraços estendidos de Annie.

– Quando eu soltar, mexa os braços assim - ele faz uma breve demonstração e ela assente fraquinho. Ela confia nele, ele acredita nela.

Após algumas tentativas falhas, consegue mexer os braços em uma versão um pouco mais atrapalhada e frenética do que a de Finnick. Alguns jatos de água vão diretamente na cara do garoto, mas ele ignora.

– Isso aí - diz ele, depois que ela finalmente para - Você conseguiu, agora é só treinar mais um pouco.

– Sério? - pergunta ela, alegre, ainda sem acreditar.

– Claro que é sério.

– Que fácil! - afirma ela, sorrindo. Em seguida, joga os braços em torno de Finnick. Este fica um tanto surpreso com o abraço, mas é claro que corresponde. - Obrigada, Finn.

– De nada, Annie.



(FIM DO CAPÍTULO II)


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Notas finais do capítulo

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