F R A G I L E escrita por Scorpion


Capítulo 2
02. São Valentin.


Notas iniciais do capítulo

Vocês não acharam mesmo que eu iria postar só aqui por hoje? Acharam!? :o
Mas estavam totalmente equivocados u_u
HGASIUHDIUASDHI
Viram como sou boa? ç-ç



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02.               São Valentin.

Pontual como sempre. O despertador deixa soar seu som terrível, me ordenando abrir os olhos começar com meu ritual.

Com a lerdeza natural estiro meu braço e consigo desligar o aparelho endemoniado. Com um bocejo mais me coloco de pé.

São oito da manhã e a rotina começa.

Entro no chuveiro. A água está fria, para “variar”.

Me visto. Minha roupa é preta, para “variar”.

Preparo o café e como biscoitos, para “variar”.

Perco o tempo e desta vez vou trabalhar as dez da manha, ao invés de ir as duas da tarde, como normalmente faço, mas Mikey me pediu para que o cobrisse já que tinha um encontro com sua namorada, o que me faz lembrar do maldito dia dos namorados. Fodido São Valentin e todas as baboseiras que acontecem dia 14 de fevereiro.

O frio consegue se infiltrar entre meu casaco preto e só posso abraçar mais a mim mesmo enquanto solto outro suspiro, me deixando uma enorme nuvem de névoa em frente a mim. O mundo continua girando apesar de ser 14 de fevereiro. As pessoas continuam se empurrando para conseguir um taxi. Os miseráveis continuam pedindo dinheiro e eu continuo deixando moendas em suas mãos. Mas minha rotina foi quebrada, e eu me assusto porque não gosto do novo. Me aterroriza a ideia de perder a segurança que minha vida rotineira me brinda.

* * *

Chego ao estabelecimento que pertence a minha família. Meu lindo e rotineiro emprego na livraria “Lûminis”, que significa Luz em latim. Uma bela forma de iluminar nossas vidas, segundo as palavras de minha mãe.

Abro a porta e acendo as luzes. Ligo o aquecedor e começo a limpar as prateleiras e arrumar os livros que foram esquecidos ou que ficaram perdidos.

Meus olhos repassaram cada uma das palavras que se escondem debaixo dessas capas grossas, finas, ou com ilustrações. A leitura é outra forma de entrar em um mundo onde tudo pode acontecer, onde o incrível se faz possível, e onde o amor verdadeiro pode chegar a existir.

Estou soando como uma adolescente deprimido. E é assim como me sinto na maioria do tempo. Deprimido. Sem motivos para quebrar a rotina, com muito medo para sorrir. Só. Seguro, mas sem surpresas. Como um adolescente deprimido, mas eu deixei de ser um adolescente a muitos anos atrás. Com trinta anos e contando a vida não em tratou bem.

Nunca fiz algo importante, nem consegui conquistar meu sonhos infantis.

Não esperava algo de mim. Eu só esperava sobreviver.

O único ser que havia me apoiado morreu, e com ele a estúpida Idea de querer ser artista. Mas, como meu pai um dia me disse, “Não se vive de sonhos”. E o odiei. O odiei muito, e acredito que no fundo continuou tendo rancor por aquela frase. Mas ele tem razão, as ilusões não pagam o aluguel, nem os sonhos dão o que comer. É melhor ter algo certo e só deixar a vida passar. Sendo invisível e frio, para que não nos façam mal.

Suspiro. Meu queixo descansa sobre minha mão e meu cotovelo repousa no balcão e estou olhando para a rua pela grande janela do lugar. Uma mulher com cabelos brancos e armados havia ficado em frente a livraria sustentando flores de coloridas em suas mãos. Em seus pés descansavam vários baldes com mais ramos de flores amarelas.

Sorriu com ironia e meus olhos reviram sem que eu possa evitar.

“Estúpido São Valentin”

Será que não veem que é só um truque para vender flores?

Um casal para em frente a mulher. Ele segura um buquê com flores brancas e vermelhas e a entrega para a garota de cabelo escuro que sorri e lhe dá um beijo nos lábios.

‘Patético comportamento de apaixonados...’

Lost in the arms of destiny
Break this bittersweet spell on me... (*)


Cheguei ao meio dia e a livraria continuava vazia.

Decidi me aventurar pelos corredores novamente. Minhas pernas paralisavam naquela cadeira de madeira.

Acariciava os contornos dourados enquanto corria as estantes com o olhar, de cima para baixo. Fieis companheiros de aventuras. Meus salvadores. Meus verdadeiros amigos. Os livros...

Suspiro. Certamente já quebrei minha próprio marca no numero de suspiros por dia. Talvez este dia esteja me afetando também, trazendo para mim recordações tristes, me tornando em uma ser melancolicamente patético.

Mas é inevitável para mim... Suspiro de novo...

Ao tentar dar a volta umas mãos cobrem meus olhos. Faço uma careta ao que abro um sorriso.

-Feliz dia dos namorados, querido.

Agora que escutou sua voz estou mais consciente de quem se trata.

-Ray, já te disse que me avise antes de entrar...

-E estragar a surpresa? –Suas mãos liberam meu rosto e meus olhos piscam para se acostumar com a luz novamente. –Isso nunca Gerard Way!

Viro meu corpo e ali está. Meu melhor amigo desde que consigo me lembrar.

Nos conhecemos com a idade de 13 anos em um show de uma banda de rock. Me lembro que a banda era muito ruim e o show terminou com vaias e garrafas de plástico sendo jogada no palco. Tentando escapar daquele desastre cai e Ray me ajudou a levantar antes de ser pisoteado. Depois disse ele se tornou meu salvador, em todo o aspecto da apalavra.

-Olá Ray, como está?

-Bem. Tirei um tempo do trabalho e decidi vir te visitar. Imaginei que Mikey havia saído com Brit. E aqui estou eu. –Sorriu. Ray Toro. Um metro e oitenta e cinco centímetros de ossos e músculos em desenvolvimento (segundo ele) e 30 centímetros de cabelos crespos.

Me é totalmente espontâneo e agradável lhe brindar com um pequeno sorriso quando ele está no mesmo local.

-Ge, te trouxe isso... –Seu olhar desceu até o balcão, me obrigando a dirigir meu olhar até o mesmo ponto. Ali descansava uma rosa vermelha solitária. Sorri.

-Obrigado.

-Bom, eu também trouxe uma para Mikey. –De suas costas tirou outra rosa. –E uma para Brittany. –E outra rosa saiu. Brittany é a noiva de meu irmão. Uma garota que gosta de se vestir de preto e arrumar o cabelos escuro com mechas rosas. Eu continuou pensando que se enganaram com o nome que lhe escolheram... –E outra para a senhora Donna, e outra para Helena. –Desta vez ele beijou a rosa. –Então te peço que faça elas chegarem a seus respectivos donos, esta bem?

Assenti comovido pelo gesto com a minha avó. Ray lhe conheceu e foi minha prancha salva-vidas quando ela teve que partir. Ambos vamos ao cemitério as vezes e levamos rosas vermelhas. Suas preferidas...

-Se lembre que este dia também se celebra a amizade, concorda?

-Um brinde a amizade. –Sorri para depois abraça-lo. –Obrigado Ray.

-Espera, falta mais alguma coisa. –Se separou de mim e me deixou ver outra rosa. –Esta eu dou a você para que, quando encontre quem te ame e te faça feliz, a dê como presente de São Valentin... –Me sorriu docilmente.

-Ray, você sabe que eu...

-Você encontrara Gerard. Encontrara essa pessoa e quando a fizer será o ser mais sortudo do universo por te ter. –Me entregou a rosa.

Eu estava emocionado demais com suas palavras, então apertei a flor entre meus dedos sem deixar de olhar em seus olhos. Os seus, que são de cor marrom, não deixavam de brilhar, enquanto os meus mel, ligeiramente verdes, ou vice-versa, nublaram-se pelas lagrimas. Não consigo ser imune ou invencível diante dele. Ray quebra minhas barreiras e deixa sair para a luz o Gerard assustado e sentimental. Libera o Gerard que chora quando lhe entregam uma rosa pelo dia dos namorados.

-Tenho que ir, ainda tenho meia dúzia de rosas para entregar. –Me sorri mais animado. –Mas se comprasse a dezena a senhora me faria um desconto. –Consegui responder o gesto de ânimo muito mais rápido do que pensei. O surpreendi e surpreendi a mim mesmo. –Então Gerard, eu já vou. Tenho muitas garotas a visitar.

Me deu um rápido abraço e, assim como chegou, em completo silencio, foi embora do lugar.

Meus dedos continuaram apertando o talo da rosa até que pude notar um liquido espesso manchando o piso claro. Deixei a flor com cuidado sobre o balcão e descobri meus dedos feridos por causa dos espinhos. As rosas possuem uma beleza tão extrema que sempre termino me esquecendo que ferem com seus espinhos.

“São como os humanos”, me disse uma vez minha avó, “são bonitas, mas ferem”.

A primeira vez que disse me assustou. Sempre fui um garoto escondido em meu próprio entretenimento. Sem amigos. Sem sair para fora.

“Mas Gerard, se não pegamos essas rosas não poderíamos desfrutar de suas belezas. Para ter algo tão bonito é preciso se arriscar.
A vida é bonita, filho, não tenha medo de se furar”.

Sempre fui um bom neto. Fiz, durante toda a vida de minha avó, o que ela quis que eu fizesse. Nunca desobedeci, nem questionei seus sábios conselhos. Mas aquele pedido continuo sem poder cumprir. Porque eu não sou como os outros.

Uma ferida por um espinho, como o de agora, me faz mais mal do que aos outros.

Tenho outro motivo para ser infeliz. Ou “especial” como me disse minha mãe quando tentava me explicar porque eu não poderia sair para brincar.

“Você não pode Gerard. Não é como os outros garotos”

Não, nunca fui. Nem nunca serei.

Uma alma perdida. Uma alma “especial”. Um desperdício de oxigênio, e nada mais. Esse sou eu.

O sangue continua caindo. Não pode parar.

Gota a gota. Quente. Vermelha. Espessa.

Eu, Gerard Way, tenho hemofilia.


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Notas finais do capítulo

Agora sim é até amanha ç-ç