Guardiã escrita por Natizilda


Capítulo 4
Sorte ou Revés


Notas iniciais do capítulo

Este capítulo demorou um bocado para sair, por motivos variados. O primeiro é que eu não consigo escrever em casa, simplesmente me dá um bloqueio cretino. Então eu chegava no serviço, metia o pendrive no PC e escrevia enquanto ninguém mais me ligava (sim, eu trabalho num SAC). Outra coisa que houve foi que, por mais que eu escrevesse, nunca estava bom como eu queria. Cheguei a apagar tudo o que eu tinha escrito e começar tudo de novo. Mas finalmente ele saiu, e saiu decentemente. Espero que gostem.



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Sorte ou Revés

Você é azarada.”

 

O ônibus sacolejava de um lado para o outro, fazendo um estrondo ensurdecedor. As pessoas gritavam desesperadamente. O homem que estava ao lado dela gritava todo tipo de palavrão conhecido e desconhecido pela língua humana. Anne, porém, estava mais ocupada entre segurar o livro no colo e se segurar para não ser jogada para o outro extremo do ônibus.

Ela havia cogitado, por alguns segundos, chamar Mégara para orientá-la, porém achou que seria no mínimo constrangedor colocar um dragão vermelho gigante dentro de um ônibus atacado por uma trepadeira. Ela folheava o livro procurando desesperadamente por uma luz.

“Você não tem escolha.”

“O que eu preciso” – ela pensava, enquanto passava página por página febrilmente – “é de algo que não chame mais atenção do que já está chamando.”

Ela parou num capítulo aleatório – intitulado “Tempo” – e passou os olhos pelas palavras, procurando algo que a ajudasse de alguma forma.

“Não pode ignorar seu destino, Anne.”

Ela pousou os olhos no que parecia ser algo útil.

“A arte de ganhar tempo”, leu Anne em voz baixa, parecendo se esquecer da situação bizarra em que se encontrava. Não foi uma boa idéia: num chacoalhão mais forte, a garota foi jogada para o outro lado do ônibus, amassando todas as folhas já frágeis do livro.

- Ô meu pai... – Com dificuldade, Anne se levantou e voltou-se para o livro, tonta.

“Pare o tempo.”

- Claro, gênio, como vou fazer isso? – Ela olhava para as letras, incrédula, se perguntando quando tudo aquilo havia começado.

- “A arte de ganhar tempo é uma das magias mais práticas blablablabla, é usada tanto para sair de situações penosas quanto para cumprir prazos blablablablabla” AHHH SOME DAQUI! – Anne parou de ler momentaneamente para bater com o livro num galho atrevido que se enroscava em seu tornozelo. A planta retraiu o caule rapidamente, preferindo atacar algo menos ofensivo como a perna do banco do ônibus. – Minha nossa senhora, eu não vou durar dois segundos como guardiã...

Mesmo no desespero do momento, Anne voltou-se para o livro, procurando mais informações.

- “Para ganhar tempo, escreva o horário atual na linha a seguir.” – Anne franziu o cenho, confusa e desconfiada, mas de qualquer forma escreveu o horário no espaço indicado.

“Agora, escreva a data limite na linha a seguir.”

- O que é isso, um formulário de e-mail?

Escreveu um adiantamento de vinte minutos. Quando registrou o último número no papel amarelado, sentiu um solavanco no estômago e olhou à sua volta, maravilhada.

Absolutamente tudo estava estático. Uma criança havia paralisado no meio do choro, as lágrimas suspensas no ar. Várias pessoas estavam encolhidas no chão, porém dois homens estavam suspensos pelos galhos fortes da trepadeira. Algumas folhas paralisaram em meio à queda. Era uma cena impressionante. Enquanto Anne observava o ônibus completamente congelado, sentiu algo roçar em sua perna e pulou de susto: Mégara havia surgido silenciosamente atrás de si, olhando a cena calmamente.

- Que susto!

- Pelo jeito você e o livro estão se dando muito bem.

Anne estreitou os olhos, aborrecida.

- Que tipo de mágica idiota é essa?

- Ninguém mandou ser terráquea – comentou o dragão, se enroscando no meio dos bancos vazios do ônibus. – Tivemos que dar um jeito para que você tivesse acesso a certos movimentos mágicos mesmo sem ter um pingo de magia no corpo. É um método rude e retardado, mas é melhor do que ser esmagada por uma trepadeira gigante, não acha?

- Hunf- bufou Anne, desviando os olhos da criatura. Olhou para os sapatos sujos de terra e murmurou – Se toda magia for desse jeito, dois segundos é muito pra mim...

- Oi? – Perguntou Mégara de maneira displicente, cutucando uma folha suspensa no ar.

- Nada...

- Antes que se desespere, devo avisá-la de que não vai ser sempre assim. Você vai ter contato com várias criaturas mágicas, logo vai acabar absorvendo a magia em seu próprio corpo.

- Não vou ter contato com ninguém. Só com a minha casa, estou morrendo de sono.

Mégara encarou Anne por alguns longos segundos antes de responder:

- Você acabou de ser atacada por uma trepadeira gigante e ainda acha que não é da sua conta?

- Vendo por esse lado parece uma escolha meio negligente, mas bem... É, é isso sim.

O dragão apenas balançou a cabeça, resignado.

- Vocês humanos são todos iguais. A propósito, quantos minutos temos ainda?

- Eu coloquei pra voltar ao normal daqui a uns 20 minutos.

- Então temos de ser rápidas.

Em apenas alguns minutos, Mégara rasgou a trepadeira em pedacinhos e jogou no bueiro de onde ela havia saído, com a ajuda meio atrapalhada de Anne. Faltando cinco minutos para a magia acabar, as duas já haviam recolhido todos os galhos e limpado o ônibus sem deixar vestígios.

- Missão cumprida. Vamos sair daqui antes que o tempo acabe.

- Ou continue...

Ambas se afastaram rapidamente, viraram a esquina e pararam para olhar. Mégara diminuiu até caber na palma da mão de Anne e pousou em seu ombro, olhando. Logo as pessoas que observavam o caos na rua voltaram a se mexer e olhavam em volta, confusas, procurando a trepadeira por toda parte. Anne olhou para o dragão em seu ombro, com as sobrancelhas erguidas, então ambas começaram a rir da situação.

- Devo admitir, a sua espécie é hilária – comentou Mégara, observando as pessoas confusas ligando para seus parentes e informando o ocorrido. Um jovem chegou a tirar algumas fotos do ônibus todo avariado.

- Me sinto lisonjeada, eu acho.

As duas ficaram ali paradas por mais algum tempo, até que Anne balançou a cabeça e murmurou:

- Agora terei que voltar a pé...

- Ora, anime-se – disse Mégara alegremente, enroscando a cauda de leve em seu pescoço para não cair do ombro da garota. – Está mesmo precisando de algum exercício.

Anne abriu a boca para responder, mas pensou melhor – afinal, Mégara tinha razão. Deixando o caos anterior para trás, ela virou-se e começou a andar, sentindo-se estranhamente bem, apesar da confusão que havia tomado seu dia-a-dia.

 

- Eu estou bem, mamãe.

Quando Anne chegou em casa, exausta de tanto andar, quase morreu sufocada: sua mãe havia visto a matéria sobre o ataque da trepadeira na TV e ficara louca de preocupação.

- Eu estava louca de preocupação! – Choramingava Jessica, desesperada e redundante. – Imagina se tivesse acontecido alguma coisa com você...

A filha não sabia o que dizer. Gritara com a mãe antes de sair e mesmo assim ela estava lá, abraçando a filha e dando graças a Deus pela mesma estar inteira.

- Não se preocupe... Só estou chateada por ter que vir a pé depois do acidente, na verdade.

Jessica riu ao perceber que o bom humor de sua filha havia voltado.

- Que bom que está bem – disse a mãe, mais firme, e Anne gostou de ver a mãe decidida que era voltar de seu ataque superprotetor. Jessica normalmente era muito calma e sempre tinha um pensamento positivo na mente, porém às vezes se tornava insegura quanto à maneira que educava seus filhos – mas era por brevíssimos momentos. – Vá tomar um banho que já estou terminando de fazer o almoço.

“Ok”, assentiu Anne, arrastando-se até as escadas. Quando adentrou o quarto, sentiu um repentino aperto no pescoço e então algo deslizando por ele – quase se esquecera de Mégara enrolada ali.

- Acho que você pode assumir daqui. A propósito... Vai nos ajudar ou não? Não posso ignorar o fato de que você se deu muito bem contra a trepadeira, apesar de ser um pouco desajeitada.

Anne olhou para o dragão, agora em sua forma natural. Por mais rude e antipática que fosse Mégara, ela era muito sincera – gostava disso. Pensou em toda a loucura que passou aquele dia – pensou principalmente em ter que voltar a pé para casa depois que sua condução foi destruída. Deu um sorriso meio louco, meio desesperado.

- Vou pensar. – Disse, por fim, assentindo para a criatura.

 

Anne simplesmente adorava quando sua mãe estava de folga. A casa ficava cheia e barulhenta: seu irmão tagarelando sobre o dia na escola, seu pai fazendo algum trocadilho a cada gíria que o filho soltava. Sua mãe rindo discretamente da cena. Peri latindo a cada cinco minutos, implorando por um pedaço de carne.

Enquanto a garota terminava de secar a louça do almoço, ouviu a campainha disparar. Como ninguém mais estava na sala (a mãe tinha ido ler um livro no quintal junto com o pai e o irmão estava jogando videogame no quarto), Anne secou as mãos e foi até a porta.

Daví e Ellie estavam parados à frente de sua casa, falando rápido e muito alto um com o outro. Anne demorou um pouco para entender do que falavam, até ouvir as expressões “busão” e “uma puta duma trepadeira”.

- Ei... Galera... EI! – Ela gritou, e os dois olharam para ela, repentinamente silenciosos. – Não, eu não fui esmagada por uma trepadeira gigante, sim, eu estou bem.

Os dois permaneceram quietos, olhando para ela por um tempo.

- E você nem liga pra contar como foi ser atacada por uma “plantona”? – Disse por fim Davi, olhando para ela, maravilhado.

- Eu não fui atacada, saí do ônibus antes que a coisa me pegasse.

- Podia ter filmado o ataque, pelo menos – comentou Ellie, roendo as unhas, distraída.

- Não foi algo que me passou pela cabeça na hora, seriously.

- Você e essa mania de gringo – Daví revirou os olhos. – Venha, vamos tomar um sorvete.

- Não posso tomar sorvete. Estou de dieta, lembra?

- Você sempre está de dieta, Anne – retrucou Ellie. – Qualé, uma escapadinha não faz mal nenhum.

Anne suspirou, mas aceitou o convite. Logo, os três amigos estavam na maior sorveteria da cidade, pedindo suas sobremesas preferidas.

- Uma banana split com calda extra, por favor. – Disse Davi para a garçonete, esganado, enquanto Anne voltava da geladeira da Kibon com um picolé de fruta e Ellie esperava o garoto fazer seu pedido.

- Vai logo, seu esfomeado – dizia ela, entediada, girando um ioiô.

- Sou um garoto em crescimento e preciso de “sustância”.

- Entendo. – Retrucou a amiga, equilibrando o ioiô nas costas da mão.

- Então, Anne – Voltou-se Davi após algum tempo para a garota, fazendo cara de entrevistador de TV. – Você recentemente foi atacada por uma trepadeira gigante, sofreu perigos e emoções inimagináveis e saiu com vida. Como se sente? Emocionada? Nervosa? Orgulhosa? – E colocou a colher do sorvete que acabara de chegar em frente ao seu rosto, como um microfone.

- Gorda – disse ela, olhando desejosa para o sorvete do amigo.

Ele contraiu as sobrancelhas, incrédulo.

- PARE DE PENSAR EM REGIME, MULHER! – Exclamou o amigo de repente, assustando-a. Ellie não esboçou nenhuma reação: continuou fazendo manobras com o brinquedinho.

- Ahhhh, me deixa.

- Meh – ele resmungou – Você é muito encanada.

- Sabe – Começou Ellie, agora balançando o ioiô como a um pêndulo por dentro da corda suspensa pelos próprios dedos – deve ser legal.

- O que deve ser legal? – Perguntou Anne, sem entender.

- Sei lá – ela continuou jogando o objeto de um lado para o outro, com uma precisão incrível. – Uma trepadeira gigante, é um negócio bem louco.

Ela permaneceu em silêncio enquanto brincava agora com o próprio sorvete, ligeiramente derretido pelo calor que fazia. Davi e Anne olharam um para o outro, confusos, então deram de ombros e continuaram a comer. Ellie sempre fora assim: algumas vezes era muito esperta e sempre tinha uma resposta na ponta da língua, outras simplesmente divagava, distraída com qualquer outro objeto que estivesse em suas mãos, sem dizer coisa com coisa. Apesar do silêncio momentâneo, o assunto da planta gigante parecia não ter acabado, para desgosto de Anne:

- Mas me diz... De onde diabos veio aquilo? – Perguntou Davi.

- Do esgoto? – A ruiva parecia mais esperta agora, participando da conversa com atenção. – Sei lá, deve ter todo tipo de lixo lá, vai que aconteceu algum vazamento radioativo e gerou uma mutação doida...

- A cidade não tem nenhuma fábrica...

- A cidade de Laranjeiras aqui do lado tem, pode ter vindo de lá...

- Tenso, vir de uma cidade até a outra...

- Pode acontecer, ué...

- Sei não... O que acha, Anne?

Ambos olharam para ela, esperando por uma resposta. A garota permaneceu estática, surpresa pela abordagem repentina dos amigos. Não sabia o que responder a eles. Lembrou-se da reação agressiva de Mégara quando mencionou a amiga. “Prometa que vai manter isso em sigilo, Anne!”, ela dissera.

- Ah, sei lá... Até agora estou duvidando se isso realmente aconteceu.

E ela realmente duvidava.

 

Já passava das nove da noite quando Anne voltou para casa. Depois de tomarem sorvete, os três amigos decidiram dar um passeio sem rumo pela cidade, conversando e rindo. A garota só notou que estava “tarde” quando recebeu um SMS de seu pai perguntando onde estava. Ao contrário de sua mãe, Paul era muito protetor e estava sempre de olho em qualquer problema relacionado aos seus filhos. Assim que recebeu a mensagem do pai, despediu-se dos amigos e rumou para sua casa, aliviada por ter sobrado dinheiro para o táxi.

Quando entrou na sala, avistou seu pai sentado no sofá, de pijamas, assistindo a algum filme na TNT, os pés apoiados num banquinho baixo. Ao ouvir o som da porta, ele se virou sorrindo para a filha, acenou e voltou sua atenção novamente para a TV. Enquanto isso, Peri desceu correndo as escadas, tropeçando brevemente nos últimos degraus e correndo para dar as boas vindas.

- Olá, Peri... – Anne abaixou-se para pegar o cachorrinho no colo e jogou-o no colo de seu pai enquanto se dirigia para as escadas.

- Ai! – Paul exclamou, mirando a filha com um olhar divertido. A mesma sorriu para ele até desaparecer de vista, adentrando o andar de cima.

Antes de sossegar, Anne se dispôs a tomar um bom banho, pôr um pijama e finalmente se sentar com o Livro no colo (não sem antes executar seu ritual diário de ficar se medindo no espelho). Ficou um bom tempo admirando-o e folheando-o, lendo aqui e ali, sem realmente prestar atenção. Estava pensando.

Vai nos ajudar ou não?”

Vou pensar.”

A garota mordeu o lábio. Então, num súbito impulso, pegou uma caneta cor-de-rosa de ponta felpuda que estava em seu criado-mudo e escreveu na primeira página em branco do livro, numa letra redondinha. Duas palavras.

Estou dentro.

 

 

- Psiu. Acorde.

Anne viu, em seus doces sonhos, Peri falando com ela, usando a voz do dragão Mégara. Ele usava um chapéu pontudo de festas infantis e segurava um pão com carne-louca nas patas.

- Me deixa...

- Eu tenho lanche do aniversário do Gu, acorde.

- Mas o aniversário dele foi no mês passado...

A garota ergueu o tronco, confusa, perguntando-se porque Peri estaria oferecendo o lanche da festa de seu priminho de três anos. Foi quando seu quarto girou e o cachorrinho sumiu, substituído pelo corpo enorme, serpeante e rubro de Mégara.

- Acorde, preguiçosa.

- Mas o Peri... Ele estava aqui agora há pouco.

- Que Mané Peri, sua doida – ela soltou um chiado parecido com uma risada pelas narinas enormes. – Você estava sonhando.

Ligeiramente mais sóbria, Anne olhou para Mégara.

- Que está fazendo aqui?

- Vamos, antes que suas aulas comecem. – Ela pegou as roupas em cima da cadeira com os dentes e jogou na garota. – Vista-se.

- Mas... Pra onde vamos, meu Deus?

O dragão deu um sorriso torto, mostrando os dentes afiadíssimos.

- Digamos que você vai ter uma experiência...Diferente.

Anne engoliu em seco, mas decidiu fazer o que a criatura dizia. Trocou-se no banheiro e quando voltou ao seu quarto, Mégara estava um pouco menor que o normal, sentada em cima da cama.

- Pronta?

- Ah...

Sem esperar resposta, o dragão abriu o livro com uma das enormes garras.

- Você primeiro.

- ... O que espera que eu faça? – A garota estava começando a se apavorar contra a sua vontade.

- Entre no livro.

- É tão retardado quanto escrever a hora para parar o tempo.

- Enquanto for uma reles humana sem uma gota de magia, terá que se sentir ridícula. Entre.

Anne pensou seriamente em responder a provocação, mas pensou melhor ao olhar novamente para as garras de Mégara. Respirando fundo para se acalmar, ela se aproximou do livro, ainda duvidando que conseguiria entrar nele. Fechou os olhos, respirou mais uma vez e pisou na página aberta.

Seus pés afundaram imediatamente num buraco que ela jurava não estar ali. Tentou gritar de susto, porém não saiu som algum de seus lábios: ela continuou caindo numa escuridão sem fim, até que de repente seu corpo desacelerou para então cair pesadamente na relva verde-viva. Tonta e ligeiramente enjoada, Anne levantou cambaleando, olhando à sua volta, maravilhada.

Estava de frente para o jardim mais fantástico que já vira, algo que só existiria nos sonhos mais loucos de uma garotinha de sete anos. A grama era tão brilhante que ofuscava os olhos, as flores exibiam um colorido exuberante. Um canteiro do lado esquerdo era organizado para formar o arco-íris. As árvores eram pequenas e de aparência jovem, envoltas por orquídeas de aparência rara, uma mais diferente que a outra. Ao fundo era possível ver um enorme castelo branco, cheio de torres de tamanhos variados. Hipnotizada pela visão e pelo aroma doce das flores, Anne começou a se aproximar do jardim enorme, os olhos fixos em uma roseira negra ao lado de uma arvorezinha.

- Não se aproxime. – A garota estremeceu, parecendo acordar do estorpor, e olhou para trás. Mégara havia pousado com leveza na relva e agora olhava firmemente para Anne, sem se importar com a beleza do jardim.

- É...lindo – ela balbuciou, ainda maravilhada. – Pensei que fosse me enfiar em algum lugar estranho e sombrio, sei lá...

- Não se engane pelas aparências. Nossa amiguinha trepadeira veio daqui.

- Como... Daqui?! – Ela perguntou, atônita. – Mas aquele monstro não pode ter vindo de um lugar como esse...

- Esse é o jardim real do rei Julius – o dragão interrompeu, sem se importar com os comentários da menina. – ele é fascinado por plantas e tem a maior coleção de todo o universo. Porém ele não tem a mínima noção de quão perigosos podem ser seus “brinquedinhos”.

- Ainda é difícil de acreditar... Nossa, nunca tinha visto uma roseira ne-- - Antes que Anne pudesse completar a frase, a planta entrou em combustão, assustando a garota. Olhando para os lados, desesperada, ela viu Mégara soprando fogo em direção ao canteiro, de maneira displicente.

- Porque está fazendo isso??? – Anne perguntou, os olhos arregalados.

- Porque falar para você não mexer em nada é a mesma coisa que falar com uma porta. A roseira é venenosa e eu já falei milhares de vezes para o rei Julius NÃO cultivar essas coisas, vou queimar qualquer canteirinho que encontrar...

Anne deixou Mégara resmungando sozinha e se pôs a caminhar pelo jardim, com cuidado para não pisar em nenhuma flor, mais preocupada com a integridade dos canteiros que com a própria segurança. Sentia o olhar do dragão fixo em suas costas enquanto ela caminhava, provavelmente atenta para qualquer perigo que pudesse aparecer. A garota riu, divertindo-se com a reação da criatura. “O que as flores vão fazer”, ela pensava, “me matar de tanto perfume?”

Ela já havia se esquecido do ataque da trepadeira.

Ao dar mais um passo em direção ao enorme castelo, sentiu o chão sumir abaixo de seus pés. A sensação pareceu durar horas: Anne sentiu o pé afundar lentamente em um buraco escondido na grama e pôde ver, com o canto do olho, Mégara abrir a bocarra e gritar seu nome, surpresa. Em tão tudo ficou momentaneamente escuro e frio, e o buraco engoliu Anne por completo. Porém ela não gritou, ainda meio atordoada com o choque de pisar em falso.

Então suas costas bateram no chão úmido e estranhamente macio, abafando um pouco o eco que o baque produziu.

 

 


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Notas finais do capítulo

Tcharaaaaam.... Bem, estava na hora de deixar Anne se virar sozinha pra variar, né? Afinal até agora ela só recebeu ajuda do nosso querido dargãozão. Vocês não sabem o que vai acontecer e nem eu, então fiquem de rosca aí.



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