Há muito não trago aqui algo que valha a pena contar.

Creia, leitor, se tivesse algo interessante, e que não a seus olhos parecesse entediante, eu contaria.

Embora novidades tenha, nada faz minha mente juntar palavras em uma bela construção, criando uma miragem, uma fantasia vã para lhe divertir.

Nada chega ao que merece, logo, não tenho porque perder meu tempo nem gastar o seu.

Enfim, essas poucas linhas que aqui transcrevo, são apenas para dizer que logo mais escreverei algo que mate o anseio que no momento possui.

Algo descente, bem escrito, ideal para tirá-lo do mórbido e monótono dia-a-dia.

Dramático, sei bem, mas nesse momento de compartilhamento de nada, eis que a verdade me aparece docemente:

Não tenho competência, nem estou inclinada ao maravilhoso ato da escrita. Essa farsa bem armada, esse fingir sensual do correr pelo papel a mísera tinta em nada me satisfaz por inteira.

A prova disso é o que faço agora, à noite, em meio a monotonia, olhando a cama arrumada e os papeis organizados sobre a mesa.

O que faço?

Entretenho-lhe com um desabafo que nunca saberá se verdadeiro. Sadicamente gosto disso, pois é o único momento em que a verdade me pertence e só a mim.

Pergunte-me um dia e talvez eu lhe responda o que muitos não entendem.

Ah! Agora eis que me vejo na obrigação de contar-lhe... Perdão, despertar a curiosidade alheia me enriquece a alma. Porém muito enrolei e pouco esclareci.

Deixe-me logo revelar-lhe o segredo da leitura.

Ele não está em compreender o que o autor quisera um dia fazer que você imaginasse! Não! Creio que seja até um ultraje e muita prepotência sua, leitor, pensar que escrevemos por e para você.

A verdade muito se ausenta desse contexto, pois entenda que a história é palavras unidas, em um contexto único para o narrador que sim, sente, chora, grita e ama!

Nenhuma ligação se faz aqui com o autor que não passa de um recipiente próprio para o ser narrante!

Entenda, caro e tolo leitor, nada do escrito é parte do autor, entretanto é o tudo do narrador que há muito pedia permissão para ser liberto e contar sua tragédia ao mundo através dos mais belos versos.

Se não mais me entende, olhe para o que lê. Sou um narrador entediado, tentando explicar-lhe a magia da poesia, e nada disso é mentira!

Mas, curvo-me, pois sei que depois do último ponto final que aqui ponho, meu pobre recipiente nada mais terá de minha personalidade... De minha pessoa.. Irá me esquecer, assim como já muitos outros esqueceu.

E assim, despeço-me, por todo o sempre.

Tentando lhe lembrar que não mais me verá, lerá ou ouvirá, apenas saberá, olhando minha casca vazia, que um dia ali habitei.