Respirei fundo novamente. Uma mecha rebelde escapou do meu rabo de cavalo, apesar de este não estar lá essas coisas. Vasculhei por entre meus pertences no chalé, procurando por alguma roupa boa. Por fim coloquei o uniforme do acampamento, uma calça legging preta, tênis de corrida, e uma jaqueta fina cinza claro.

Antes de fazer o que pretendia, precisava de um breve treino, uma certeza de que eu conseguiria fazê-lo. Fechei os olhos e respirei fundo, me concentrando. Estiquei o braço para a escuridão e fui sentindo aquela coisa repuxando dentro de mim, uma força grande o bastante para me deixar levemente desnorteada. Abri os olhos e pude ver uma certa movimentação por entre as sombras, como se fossem vultos. Sussurravam coisas para mim, e logo entendi que conseguiria. Concentrei-me então em desfazê-las e com um certo esforço consegui.

Eu vinha treinando esta habilidade há umas semanas, mesmo antes de chegar ao Acampamento Meio-Sangue. Antes se eu fizesse apenas a primeira etapa, corria o risco de desmaiar. É uma habilidade um tanto trabalhosa e cansativa. Não eram muitos os filhos de Nix que podiam executá-la, e isso significava algo bom, significava que eu era forte... Era?

Abri a porta do chalé e pulei para o lado de fora. Em um certo trote, fui passando por entre os chalés e fui seguindo em frente. Passei pela arena, e continuando o trote, logo estava na parte sul das florestas. Respirei fundo. Minha respiração estava ofegante pela leve corrida. Meus joelhos dobraram-se um pouco e pousei as mãos na base da coxa, com o corpo abaixado para frente. Uma outra mecha escapou do rabo e passei-a para atrás da orelha.

Levantei-me e tomei fôlego. Fechei os olhos. O trabalho seria difícil. Havia já uns dias que eu vinha à floresta logo cedo para estabelecer um perímetro. Ele já estava quase pronto. Agora eu estava dando o toque final.

Abri os braços levemente e inspirei... Expirei... Inspirei... Expirei, bem profundamente. Podia sentir a energia passando por entre meus dedos, dançando em volta deles. Agora eu podia sentir a linha sendo traçada em volta dos limites da floresta, fechando-se enfim. Estava quase feito.

Dei um passo para o lado de dentro da linha traçada. Respirei fundo uma última vez. Agora eu liberaria tudo de dentro de mim, e isso era mais do que desgastante. Um puxão em todo o meu corpo, e eu podia sentir tudo saindo.

Abri os olhos.

Vários vultos e sombras estavam saindo de mim e percorrendo por entre as árvores. Podia quase ouvi-las se movendo. Senti uma pressão na cabeça, meu rosto esquentando. Quando percebi estava gritando, mas pelo menos estava longe o bastante de onde outras pessoas poderiam estar, portanto, não me ouviriam. Aquilo estava muito doloroso, porém, poderoso. Podia enfim perceber a força que eu tinha dentro de mim, todo o poder que herdara da personificação da noite.

E enfim, tudo saiu.

Cambaleei, tropeçando em mim mesma e caindo para trás. O mundo girava em volta de mim, e uma dor de cabeça forte me atingiu. Mas eu não podia ficar aqui...

Forcei-me a me levantar e fui fazendo todo o caminho de volta. Eu caía para os lados, tropeçava em mim mesma, mas precisava continuar. O trajeto parecia mil vezes maior agora, e depois do que me pareceu uma eternidade, cheguei até meu chalé. Abri a porta quase caindo sobre ela e chutei-a para se fechar novamente. Arrastei-me até a cama e desmaiei.