O Grande Caçador De Babel escrita por Jenny liih


Capítulo 1
Sem Máscaras




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O homem levou o cálice reluzente aos lábios, este por si banhado em ouro maciço e de peso consideravelmente alto para um objeto de seu tamanho, e sorveu um gole mínimo, sentindo o sabor adocicado do vinho molhar e descer por sua garganta.

Alguns raios solares invadiam o lugar espaçoso por entre as brechas do muro alto, constituído por pedras e rochedos para sustentar a base do teto com a ajuda de pilares largos que se estendiam de ambos os lados, formando um majestoso caminho da porta dupla até o trono real do imperador, onde este se encontrava degustando sua preciosa bebida sossegado.

- mestre Ninrode. um guarda jovem, fortemente protegido por uma armadura de aço adentrou em sua fortaleza pessoal sem prévio aviso.

Ninrode se limitou a mirar o outro da forma mais seca possível, mostrando que o guarda conseguira sua atenção, mas que logo receberia seu devido castigo por tê-lo tirado de um momento íntimo. O menor estremeceu diante a represália silenciosa de seu amo e curvou-se reverente em um pedido de desculpas.

- perdoe-me, meu senhor... Mas solicitamos sua presença junto aos enclausurados.

O superior revirou os olhos nada satisfeitos com a visível incompetência de seus demais guardas, que volta e meia lhe procuravam em solicitação de ajuda na área que ele procurava manter em sigilo dos cidadãos de sua cidade, a poderosa Babel. Em seguida pousou a taça de brilho dourado sobre uma bandeja estendida por um de seus criados, um homem de idade avançada e com um tufo de fios brancos na cabeça e que detinha olheiras profundas em sinal de cansaço, revelando-se apenas um dentre centenas que eram privados de seu merecido descanso após longas jornadas de trabalho excessivo naquele palácio imensuravelmente grande. Sendo que todos os criados, sem exceção, terminavam seus dias tão miseráveis como quando o iniciavam, uma vez que Ninrode sequer se preocupava em lhes compensar com um pagamento adequado, ou com qualquer tipo de pagamento.

- pois bem, que assim seja. respondeu, dispensando rapidamente o velho empregado com um gesto de mãos. leva-me até lá.

Obediente, o mais jovem guiou seu mestre até o dito local.

O menor sentiu seus poros se eriçarem quando seus pés tocaram o chão empoeirado da suposta prisão, que na realidade se tratava de um cativeiro subterrâneo que o rei Ninrode ergueu com a finalidade de manter aprisionados os homens que se rebelassem contra sua soberania, seu poder supremo de controlar as suas cidades. Ou simplesmente aqueles a quem escolhia a dedo para servi-lo dentro do palácio e que, de forma falha, tentavam escapar do tratamento desumano que recebiam.

Ninrode conquistava seus súditos através de eventos repletos de promiscuidade, onde oferecia dos melhores de seus vinhos e de suas meretrizes para satisfazer os desejos carnais e até os mais libidinosos dos homens que se faziam presentes em tais eventos. E dessa maneira seu reinado tendia apenas a crescer mais, e claro, consequentemente o numero de escravos também. Por essa razão as inúmeras celas do calabouço encontravam-se lotadas de prisioneiros. Não havia qualquer sinal de higiene no ambiente e o mau cheiro era tão forte que poderia impregnar em toda substancia que tivesse a audácia de passar por aquela área. Os dois homens levavam tochas acesas para ajudar na iluminação precária do lugar.

Caminharam mais um pouco e perceberam uma agitação maior em uma das celas gradeadas mais adiante. Pararam em frente a ela, deparando-se com os dois únicos prisioneiros do cubículo desferindo golpes violentos um no outro. Seus rostos inchados pelas pancadas começavam a sangrar incessantemente por conta de dentes soltos ou narizes quebrados, sujando ainda mais seus andrajos, e apesar de já terem notado a presença do rei de esgoela, não deram por terminada a luta. O maior deles, um homem forte de cabelos castanhos, e o que aparentava estar menos machucado, desprendeu um chute potente sobre o joelho de seu rival, que em sequencia perdeu o equilíbrio e caiu indefeso no chão, recebendo mais golpes no rosto e no dorso, já fragilizado e bastante enfraquecido.

- ele irá assassiná-lo senhor. exclamou o guarda, aflito com a cena.

- entra lá e impede-o então. ordenou o jovem rei calmamente, deixando transparecer que nada faria para faria para interferir na luta travada com garra diante de seus olhos.

- m-mas... voltou seu olhar para a cela novamente. Odiava-se por contrariar o rei mesmo que em pensamento, porém, se intrometer naquela briga resultaria em seu falecimento. eles irão matar-me.

Ninrode endureceu a mandíbula aborrecido, forçando seriamente sua memória para recordar o porquê havia de escolher, dentre uma infinidade de bravos guerreiros que lhe serviriam de defensores cruéis e sanguinários, aquela criatura covarde que não levantaria sua espada nem para ferir uma cabra manca.

Suspirando pesadamente resolveu finalizar a bagunça. Puxou a tocha da mão do guarda com brutalidade, e com a mesma velocidade a jogou por entre as barras de ferro, caindo sobre as vestimentas surradas do prisioneiro que ainda agredia sem piedade o outro, porém, logo se afastou sentindo as chamas lhe consumindo a carne, soltando um grito gutural diante da quentura em brasa. Correu paralelamente pelo espaço limitado do cubículo tentando amenizar a dor que castigava cada vez mais sua pele, o que não adiantou.

Sem demora o fogo engoliu todo o corpo do homem. Não havia mais escapatória. Sua voz foi se calando lentamente assim como seus movimentos. Por fim, ele caiu derrotado, deixando seu corpo ser cremado por inteiro levando-o rapidamente a morte.

O mais jovem de todos olhou horrorizado para seu amo, que detinha um brilho assassino nos olhos acompanhado de um sorriso igualmente cruel, e se questionou qual a razão de tanta perversidade no coração do homem a quem tanto amava.

Não fora a primeira vez que presenciara esse tipo de situação, onde Ninrode matava sem escrúpulos ou razoes satisfatórias pessoas e mais pessoas, para depois usar a desculpa de que não havia espaço para tantos criminosos em seu cativeiro. Bobagem. Ele o fazia por puro prazer, para satisfazer sua insaciável sede por dor e sofrimento alheio. Habito este que o jovem soldado reprovava sem hesitação, mas nunca exteriorizaria esse pensamento, sua posição atual não lhe dava esse direito, caso contrario seus rins seriam servidos no desjejum dos leões que o rei alimentava como animais de estimação.

- Urian.

Foi tirado de suas divagações com um susto ao ouvir seu nome escapar dos lábios de Ninrode pela primeira vez.

- majestade?

- onde está minha esposa?

De primeira, Urian estranhou a indagação do rei, já que a muito não procurava por sua dama, mas logo assumiu sua postura de guarda novamente e apontou o caminho. por favor. apanhou a tocha da mão de seu mestre e o levou aonde queria.

ooooOOOOoooo

Seus olhos quase que opacos de tão sem vida focaram-se no feixe de luz amarelada que invadiu o lugar quando a rocha enorme que bloqueava a passagem para fora dali foi removida vagarosamente, permitindo que a luz se instalasse por completo no recinto, antes sobre total escuridão. Levantou o rosto com muito esforço sentindo os músculos e seu pescoço reclamarem com o movimento. Remexeu os pulsos, presos acima de sua cabeça com correntes espessas, limitando seus movimentos assim como os dos tornozelos. Estava sentada desconfortavelmente no chão e seu estomago chegava a doer de tão vazio.

Reconheceu a silhueta do homem belo e jovem se aproximar de si. O mesmo homem que a desposara meses, ou anos atrás, nem podia se lembrar. Já havia perdido a noção do tempo, em decorrência dos intermináveis dias em que passara presa naquele lugar.

Ninrode se ajoelhou diante dela e a fitou nos olhos, suas vestes majestosas esbarravam na sujeira do chão empoeirado.

- como estás? indagou ele com doçura.

Sari indignou-se com tamanho cinismo na face daquele homem. Puxou força e coragem de onde não havia e gritou:

- és um imundo! Desgraçou minha vida, Ninrode.

A face de Ninrode se endureceu em descontentamento com o que ouvira. Ele se levantou de onde estava e virou-se de costas para a mulher.

- tu deverias presentear-me com tua gratidão eterna. Ou queres voltar para tua antiga vida de prostituta sem valor que não recebia nem um mísero siclo de prata* ao doar teu corpo?

- eu era livre, disso orgulho-me ao mencionar a vida que levei, mesmo que esta desonrasse minha família e meu sangue desprovido de nobreza. sua voz já estava embargada pelo pranto que viria a seguir. e tu me tiraste isso. Deus fará de ti um holocausto humano e pagará por tudo que fizestes a mim e a este pov um murro fora violentamente chocado contra seu queixo, fazendo-a perder os sentidos por um breve momento. Em seguida recompôs a sanidade lentamente e o olhou atordoada, enquanto o sangue morno descia de seu lábio inferior, que também fora atingido.

- teu deus nada fará a mim. Pois eu sou o verdadeiro deus deste mundo a quem todos devem idolatrar. E tu baixou drasticamente o timbre de sua voz darei a ti o prazer de ser novamente uma meretriz, como tanto desejas.

O rei puxou seu sexo túrgido para fora das vestes e aproximou-se de Sari.

ooooOOOOoooo

Urian, que esperava pacientemente por seu mestre do lado de fora da cela, desembainhou sua espada, grande e pesada demais para seu tamanho, e começou a cortar o ar, simulando golpes em um inimigo inexistente, treinando sua habilidade em batalhas já escassa de modo desajeitado. Acabou por deixar a arma ir de encontro ao solo ao ser pego de surpresa por um grito estarrecido de Sari. Alarmado, apanhou novamente em punho a espada de metal afiado e fez menção de invadir o local, caso sua presença se fizesse necessária lá. Entretanto, deteve-se antes mesmo de dar o primeiro passo.

O desespero de Sari e o silencio de Ninrode só adquiriram um significado em sua mente: ele a estava possuindo. E nesse caso nada poderia fazer.

Então sentou-se a certa distancia da entrada de onde estavam os dois e apertou as duas orelhas com a palma das mãos, com o intuito de abafar o som agudo das exclamações por misericórdia que Sari repetidamente gritava. O jovem sentiu seu coração se apertar com a situação e lutou bravamente para conter um soluço involuntário. Não tinha um laço forte para com Sari, na verdade mal a conhecia, porém não pode deixar de se sentir penalizado por ela.

Por quê? Por que Ninrode tinha de agir com tanto desprezo com todos ao seu redor? São tão humanos quanto ele, certo?

errado. Contrariou-se em pensamento, soltando um risinho sem humor. Ninrode se considerava um deus que deveria ser refém de adoração e maestria de seus súditos.

A questão era que, por mais que Urian buscasse em toda sua memória uma razão plausível para estar sempre disposto a entregar seu humilde coração a ele, jamais conseguia encontrar. Só tinha uma única certeza: servia fielmente ao rei de Babel, e amava platonicamente o homem denominado Ninrode.

Seus devaneios foram cortados quando vislumbrou a imagem de seu objeto de desejo fora da cela novamente, ao passo que limpou o rosto das lagrimas e se juntou a ele. Pode perceber que a manta que trajava encontrava-se em estado deplorável, com rasgos visíveis nos braços e na altura do peito, deixando visível a pele dourada e firme de Ninrode. Urian também notou no rosto do mais velho linhas avermelhadas quase imperceptíveis da distancia que se mantinha entre eles, provavelmente fruto da resistência de sua esposa, que até onde o guarda podia recordar, estava com os pulsos presos, então procurou não divagar sobre isso e apenas seguiu seu mestre aos tropeços para o andar superior, já que a tocha havia sido perdida no meio da confusão.

- pela manhã pronunciou-se Ninrode, após uma ducha rigorosa nos aposentos reais e de ter seus arranhões tratados por um criado, estava de volta ao seu tão estimado trono.

Urian que já se retirava para deixar seu querido amo á sós parou estático.

ele a matou

- como quiser alteza. dizendo isso, Urian pôs-se a caminhar novamente.

- acaso te dispensei?- Urian parou novamente

- o que desejas meu amo? indagou sem o olhar.

- alguma vez... Ninrode silenciou-se propositalmente, prevendo a reação do guarda quando ouvisse o que tinha a dizer já te interessaste por alguém de tua natureza?

O menor congelou, entendendo com perfeição o significado daquele questionamento. Se ele já havia se interessado por outro homem? Sim. Mas obviamente nada diria a ninguém, quanto menos ao próprio imperador.

- s-sim, meu rei.

Bem contraditório. Foi assim dessa maneira que se sentiu por conta da traição de sua língua, que outrora jurara fidelidade e sinceridade em todos os momentos para com o rei.

Então passou a se martirizar e chamar muitos impropérios em voz baixa, enquanto Ninrode, esta apenas sorria, imensamente satisfeito com a resposta recebida.

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Notas finais do capítulo

*siclo de prata: moeda usada naquela época.



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