Os Karas : em Busca do Condor escrita por Lala Pereirinha
O ano letivo se aproximava do fim, os professores começavam a dificultar cada vez mais nas avaliações mensais e o pior: eles falavam em inglês.
- Eu não acredito! Eu, ex-líder dos Karas, ex-presidente do grêmio estudantil, que sempre fui o aluno exemplo do colégio Elite, estou a meio passo da reprovação! Eu juro que se eu for reprovado, eu me jogo do Empire States! Ah, me jogo mesmo!
E Miguel jogou-se – não do Empire States – mas, na cama e com toda a força e raiva. E ali, deitado, largado e deprimido, fechou os olhos e assistiu ao filme que passava em sua cabeça: os dias de glória que teve com seus amigos em todas as aventuras que os Karas viveram. Lembrou de quando conheceu Peggy MacDermott e então, do dia em que seu pai veio com a infeliz notícia da mudança. Sentiu novamente a tristeza e o vazio do momento da despedida através de um simples e-mail. Relembrou o beijo que roubou de Peggy e sentiu um aperto no coração e em seguida uma forte culpa por ter posto em risco o relacionamento dela com o amigo Calu. Não entendia o porquê de ser assim. Parecia uma sina. Ele nascera para ser sozinho, para sofrer de amor, para amar a mulher dos outros, para não ser correspondido. Mas, não queria destruir relações nem ser tido como o outro. Talvez fosse melhor afastar-se da menina. Contudo, ele precisava de sua ajuda para voltar para casa. Despertou de seus devaneios ao ouvir os gritos de sua mãe:
- Miguel, filho, você tem visita. É a filha do presidente.
- Já vou mãe.
O garoto recebeu-a e fez menção para que se sentasse no sofá da sala de estar para que pudessem conversar. “Não vamos para o quarto” – pensou ele – “Aquilo não pode acontecer de novo”.
- Nossa Peggy, você sumiu. Pensei que estivesse me esquecido – ele riu.
- Que nada, eu estava de cama repousando, mas a recompensa foi grande; ou não. Descobri algo super importante e que, por outro lado, me deixou em estado de choque por uns tempos.
- Está esperando o que para me contar?
- Não posso te contar aqui. Na Casa Branca as paredes têm ouvidos. Pensei de irmos a um lugar mais calmo e distante daqui.
- Se estivéssemos no Brasil, esse local seria o Ibirapuera, mas, aqui eu não conheço nenhum lugar.
- Pois eu sei de um lugar perfeito. Amanhã, depois da aula, me espere na quadra de ginástica e eu te levarei a um lugar onde poderemos falar sobre esse assunto com mais calma, okay?
- Tudo bem então. Ah, eu queria te pedir um favor. Será que você poderia assim, meio que me ajudar numas coisas...
- Oh God! Desembucha homem!
- Eu vou ser reprovado! – Miguel fitava o chão para não encarar a face de reprovação da amiga.
- Está bem, eu estudo com você. O fato de as aulas serem ministradas em inglês dificulta bastante, não é?
O rapaz sacudiu a cabeça em assentimento.
- Entendo sua situação. Agora, preciso ir – ela beijou-o na bochecha. Ele sentiu um arrepio forte percorrer-lhe o corpo – Bye!
- Tchau. Vemos-nos amanhã, então.
****
- Com licença Excelência, a senhora primeira-dama – anunciou a secretária.
- Anne, o que a traz aqui tão cedo pela manhã?
- Wilbur...
- Oh God! Quando você me chama de Wilbur é porque lá vem bomba.
- Ora, deixe de graças, Wilbur. Precisamos fazer alguma coisa; rápido. Temo pela vida de Peggy. Já atentaram contra a vida de nossa filha uma vez. Não hesitarão em repetir o feito.
- E o que você tem em mente? Você disse que tinha um plano. Olhe, eu já acionei o FBI e a CIA a respeito disso. Até mesmo a NSA está trabalhando para cercar os caras. Não há mais nada que possamos fazer.
- Mas, Wilbur, isso não pode ficar assim. Eles estão te fazendo de bobo e...
- Já chega Anne! Eu não posso me meter em encrenca; os caras não podem nem sonhar que estamos tentando mobilizá-los. Anne, eles sabem, eles são cúmplices dos meus crimes. Eles não têm nada a perder. Podem simplesmente me entregar de bandeja para a polícia. Deixa tudo ser feito corretamente pelo menos uma vez, pois se a polícia descobre...
- I got it! Eu já entendi, está bem? Você deve saber o que está fazendo. Mas, eu só lhe digo uma coisa: se algo acontecer com Peggy eu nunca vou te perdoar Wilbur. Nunca! Tenha um bom dia.
- Oh, come on, Anne! Ah, qual é! Anne volte aqui. Vamos conversar civiliza... Oh shit! Droga! – a primeira-dama deixou o gabinete presidencial sem ao menos olhar para trás.
****
- Repassando, então, eu sou a Ave fêmea, Andrade a Ave Mor e vocês em ordem alfabética: Calu é Ave um, Chumbinho a dois e Crânio a três. Começa quando o...
- Ah Magrí, nós já repassamos o plano centenas de vezes! – bradou Chumbinho.
- Andrade, você está certo de que vai ficar? Se quiser ir eu fico.
- Não Calu. Está tudo bem, vou ficar. Aviões me assustam.
- Crânio, você tem certeza de que essas suas geringonças vão funcionar?
- Eu não sei Chumbinho. Desde que fixamos o plano venho trabalhando nisso, mas você sabe que não temos muitos recursos. Estamos em 1988. Se fosse daqui a uns 22 anos, provavelmente, eu compraria uma coisa dessas em qualquer lojinha por aí. Passei semanas com a cara enfiada em livros de eletrônica, fazendo testes e mais testes. Nunca levei tanto choque na vida. Mas, finalmente, parece que consegui. Isso tem que funcionar. Magrí, trouxe o walkie talkie?
- Sim. Andrade, o carro dele é esse branco aí da frente. Estacione ao lado – Disse Magrí.
- Crânio, você terá que ser rápido. O expediente deles termina às 18:30 e são exatamente 17:00. Não se esqueça do que eu lhe ensinei. Aja normalmente e não demonstre nervosismo – Disse Calu.
Crânio desceu do fusquinha, pôs sua mochila nas costas e andou até o fim da rua, onde ficava o Elite. Tocou a campainha, foi atendido e entrou dando a desculpa de ter se esquecido de pegar na biblioteca uns livros para um trabalho. Subiu as escadas, entrou na biblioteca para despistar o zelador, saiu, subiu ao terceiro andar, instalou na privada do banheiro masculino a bomba caseira idealizada por Chumbinho e disparou o cronômetro. Rapidamente desceu as escadas e entrou novamente na biblioteca esperando acontecer a explosão. Ao som da explosão o menino viu água escorrer para todos os lados e logo em seguida ouviu os gritos e passos desesperados do diretor em direção ao local da explosão. Acontecera exatamente como planejara e ainda mais rápido do que o esperado. Assim que o diretor se foi Crânio saiu em disparada em direção à sala do diretor. Uma vez lá dentro invadiu o sistema de segurança e pôs em prática suas aulas de eletrônica das últimas semanas. Captou o sinal das câmeras de monitoramento do colégio para que pudesse controlá-las do lado de fora da escola por um pequeno e preto e branco televisor de dez polegadas. O garoto arrumou a sala e deixou a escola tranquilamente às 18:00.
Já do lado de fora do Elite o desafio era outro. Apagar as lâmpadas de todos os postes da rua. Crânio montou toda a aparelhagem por detrás de uma grande vã estacionada a uns dez metros de distância do portão do Elite, de onde controlaria o plano. Mais uma vez pôs suas experiências autodidatas em eletrônica em ação e danificou o sistema de sensores ópticos utilizados na iluminação pública. De repente, as trevas tomaram conta da rua. Não se via mais nada a não ser quatro corpos na escuridão. Crânio ligou o walkie talkie.
- Ave fêmea na escuta?
- Positivo Ave três.
- Primeira etapa concluída. Já observo os objetos deixando o vestiário masculino da quadra de ginástica. Estão agora subindo para o térreo pelo elevador de serviço.
- Ótimo. Espero que não demorem muito.
- Objetos se dirigindo à sala do diretor, mas viram que ele não se encontra. Estão conversando com a secretária. Provavelmente dizendo que já vão para o aeroporto e mandando avisar ao homem.
- Estão sozinhos os dois?
- Positivo. Já estão com os uniformes. Um leva uma mala grande e o outro uma mala média e uma maior com uma cruz vermelha.
- Certo. São eles mesmos. Vou mandar a Ave um se posicionar do lado esquerdo da rua, então.
- Exato. Faça isso agora mesmo, pois eles já deixaram o colégio. Acabaram de sair. Estão confusos com a escuridão. Peça à Ave Mor para trancar o fusca e retirar as placas.
- Já foi feito isso. Já estamos todos de preto e encapuzados na posição.
- Preparem-se, pois eles se aproximam. No três vocês os agarram. Um, dois, TRÊS!
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