Estamos um de cada lado do circulo se encarando, vendo quem será o primeiro a atacar. Posso ver duas sensações em seu rosto: ódio e cansaço. Me sinto igual, tudo que quero agora é acabar com isso de uma vez por todas, sair daqui e ir para... Para qualquer lugar longe daqui.

            Estou cansada de esperar pelo primeiro movimento dele então eu mesma levanto a espada e com um grito avança em sua direção. Lágrimas escorrem pelo meu rosto enquanto me aproximo.

            Ouço o barulho dos metais se chocando e só então reparo que estava de olhos fechados. Ficamos lâmina com lâmina por alguns minutos. Ambos sabemos muito bem como manejar uma espada. Creio que temos o mesmo nível o que torna tudo mais difícil.

            _Qual é um... -diz ele defendendo outro golpe. -Me deixe ganhar, será mais fácil.

            _Só se for para você! -e nesse momento consigo fazer minha espada passar por sua perna.

            Ouço ele me xingar de diversas formas enquanto bloqueia meus outros golpes. O corte que fiz não foi profundo, mas o suficiente para deixa-lo mais lerdo. Infelizmente sua habilidade com os braços seguia inalterada. Ficamos na mesma por mais algum tempo. Estamos cansados e sem nenhum tipo de acordo baixamos as armas.

            Sinto minha respiração pesada. Meu corpo todo dói e por mais que eu tente ignorar a dor ela está ali e está piorando cada vez mais. Olho para a imensidão de água que me cerca e de uma coisa tenho certeza,  prefiro morrer com uma espada em meu peito do que afogada nesse mar criado por monstros.

            Ouço um barulho forte vindo do céu e instantaneamente olho. Em cima de nós uma enorme tempestade se forma. Um raio cai bem no meio do circulo abrindo mais uma cratera que dá diretamente para o mar.

            Sei que o que estou prestes a fazer é falta de qualquer tipo de escrúpulo, mas esse jogo precisa acabar.

            Heigran ainda está olhando a chuva. Aproveito esse momento e sem pensar duas vezes para não me arrepender. Com a espada em mão corro em sua direção e cravo-a em sua barriga.

            Vejo seus olhos incrédulos se fixarem nos meus e não consigo segurar o choro. De forma alguma queria fazer isso com alguém. Eu não sou assim, essa pessoa que matou a tantos e eu odeio essa pessoa que fez isso.

            _Me desculpa... -digo tremendo enquanto olho meu antigo inimigo se dobrar no chão sem forças.

            _Não... não... não tem problema. -isso é demais para mim.

            Me sento ao seu lado e coloco sua cabeça em meu colo. Devagar afago seu cabelo até eu sentir sua respiração ir embora. Devagar fechos seus olhos. Pego a espada que está caída ao meu lado e coloco com ele. Ainda estou de joelhos olhando o garoto, menino, criança que matei. O que ele fez de tão ruim que merecesse isso? Tentou proteger a irmã? Isso eu também fiz e não tive esse fim.

            Nojo de mim mesma é o que sinto agora. Arranho meus braços até que comecem a sangrar. Deixo que o sangue caia em cima dele, Heigran não foi o único a morrer agora, eu também morri, meu sangue também ficará aqui. Aliás mal sei se realmente quero ir embora, nem casa eu tenho.

            Vejo o aerodeslizador voar em cima de mim, não quero que eles me peguem, não sou mais uma peça deles que pode ser içada sem mais nem menos. Observo a garra enorme içá-lo. Fico imaginando o que farão com ele quando chegar em seu distrito. Uma família que perdeu os dois filhos.

            Sem mais nem menos toda tempestade que estava se formando se dissipa e o sol brilha mais forte q nunca. Me ponho a postos com a espada na mão mais uma vez.

            _Queridos cidadãos de Panem gostaria de lhes apresentar a ganhadora dos primeiros jogos vorazes!

            Não consigo ouvir essas palavras, eu não ganhei nada, eu perdi tudo que tinha. Não sou vencedora... Olho para cima em desespero. Quantas outras crianças terão que participar desse jogo insano? Nenhuma família merece passar por isso. Nunca mais.

            Num ato de desespero faço a única coisa que me vem a cabeça. Pego a minha espada e numa fração de segundo cravo-a em meu estômago. Não, eu não sou a primeira vencedora dos jogos vorazes. Eu sou só mais uma vitima, uma criança morta no meio de tantas, mas o mais importante é que eu não sou só mais uma peça dos jogos deles.

            Esses jogos foram fortemente abafados pela Capital. Qualquer cidadão de Panem foi estritamente proibido de tocar no assunto. Pequenas revoltas surgiram, mas foram duramente contidas. Há uma fita guardada em segurança máxima que foi guardada. Após a rebelião final foi achada por mim, achei uma das histórias mais incríveis que já vi e merecia ser contada.

            Não o primeiro vencedor não foi do 7 e não o primeiro ato de rebelião não foi do Haymitch ou meu, foi sim de uma menina de um distrito considerado de pessoas egoístas.

            Espero que consiga fazer essa história chegar a todos, pois histórias assim devem ser contadas.

            Enquanto escrevo essa mensagem, minha filha, meu filho e meu marido me perguntam porque estou chorando. Digo a eles que daqui a pouco saberão. Estou trancada no quarto a mais de um dia repassando o vídeo para o papel. Isso me fez me sentir melhor.

            _Calma Peeta, já acabei. -digo enquanto abraço a linda família que tenho.