O tempo passa, às vezes indefinido, às vezes marcante, mas ele passa. Mesmo que segundos durem milênios e anos passem em borrões, o tempo passa, levando consigo um pouco de nós, de nossa vida, de nossa coragem, de nossos sonhos…

         E quando você se dá conta, de repente é o grande dia de sua vida e você não teve tempo de se preparar para ele, tudo está certo, as flores estão vivas e brancas, a grinalda cobre seu rosto e o vestido é magnífico. Mas você não está pronto para isso, ainda não…

         Então, ao se olhar no espelho, redescobre o próprio rosto e se pergunta em que momento você perdeu o controle de tudo. E para o seu pavor, percebe que não há mais tempo para uma resposta, por que o tempo continua a correr, levando muito de você e deixando dele apenas lembranças, lembranças que, mais tarde, se tornarão os sonhos de quem, como eu, não tem a capacidade de criar os seus próprios.

         O dia de hoje?

         Vinte e oito de setembro.

         O dia do meu casamento.

-Se acalme Isabella, você não pára de suar – Sue reclamou fazendo cara feia para mim.

         -Eu estou nervosa – expliquei entredentes, meu coração acelerado.

         -Eu sei, o que você quer que eu faça? – ela me perguntou com um toque de desespero.

         Sue estava mais nervosa do que eu!

         -Me deixe um pouco sozinha – pedi – Eu só vou conseguir me acalmar se estiver sozinha – mentira, nada na Terra me acalmaria naquele momento.

         -Tudo bem, eu vou ver os últimos detalhes, volto daqui uma hora…

         -Duas horas – eu pedi torcendo violentamente um lenço.

         -Tudo bem, volto daqui a duas horas. Agora, por favor, não arruíne nada, você está perfeita, só falta o vestido.

         -Pode ficar tranqüila, eu não vou fazer nada que desmanche meu cabelo nem que borre minha maquiagem – prometi.

         Não sei se ela realmente acreditou em mim ou se ela só queria sair de lá para extravasar sua ansiedade numa criada descuidada, mas ela me deixou no quarto, trancando a porta a chave (“Ele não pode te ver de jeito nenhum”, ela passara os últimos dias dizendo isso para mim).

         -Finalmente um pouco de silêncio – agradeci.

         A moça ao meu lado sorriu. Letícia tinha sido descartada do grupo de serviçais dos Black para ser minha dama-de-companhia, ou, como eu pensara no início, a espiã disfarçada de Sue. Mas a menina era incrivelmente discreta e perspicaz, e eu acabei me dando até que bem com ela.

         -A senhorita gostaria de algo para comer ou beber? – ela perguntou – Trouxe uma caixa de chocolates, caso a senhorita esteja com fome.

         -Chocolate? – meu estado de espírito melhorou consideravelmente – Sim, eu amo chocolate! Por que você não me deu de uma vez a caixa?

         -Tive a impressão que sua futura sogra não aprovaria.

         E nós duas rimos, mancomunadas. Enquanto ela ia buscar a caixa de chocolates, o computador do quarto fez seu barulho familiar e eu corri para a cadeira, me jogando sem cerimônia e digitando uma saudação. Alguma parte pequena e insignificante do meu cérebro disse que eu não devia correr e me jogar nas coisas por causa do meu penteado, mas eu não dei ouvidos a essa parte.

         -Letícia, saía do quarto, eu me viro com os chocolates – mandei pegando a caixa que ela me estendia.

         -Tem certeza senhorita?

         -Eu só vou poder fazer duas coisas aqui: comer e ir ao banheiro. Eu não preciso de ajuda para nenhuma das duas, então, por favor, vá embora, eu quero ficar sozinha de verdade.

         Ela ia dizer mais alguma coisa, mas eu lancei um daqueles olhares que aprendera com Sue quando ela dava ordens impossíveis para as meninas da limpeza e ela me obedeceu. Uma mensagem apareceu na tela “Está sozinha agora?”.

         Esperei para responder, até ter certeza que Letícia não estava atrás da porta para ouvir. Nunca se sabe quando um espião vai mostrar sua verdadeira face.

         “Tudo bem, estou sozinha”, digitei.

         E então os dois apareceram, Alice e Seth, um do lado do outro, sorrindo para mim.

         -Ah meu pai! Você está tão linda – Alice elogiou quase pulando no chão.

         -Eu sabia que esse roupão caía bem em mim – brinquei.

         -Eu não estou falando do roupão – Alice revidou impaciente.

         -Então hoje é o grande dia? – Seth perguntou sorrindo amigavelmente – Você parece meio verde, acho que vai vomitar.

         -É normal as pessoas vomitarem nos grandes dias – eu brinquei ansiosa.

         -Você está uma pilha de nervos – Alice percebeu rindo.

         Era engraçado, embora quilômetros e mais quilômetros nos separassem, de algum modo eles se contagiaram com meu nervosismo e ficaram inquietos como eu.

         -Eu suei tanto que a piscina foi por conta da casa – brinquei secando minha testa com cuidado.

         -Tem que se acalmar, garota – Alice mandou – Caramba, hoje você vai se casar! Tudo bem que é mais por seu irmão do que por qualquer outra coisa, mas mesmos assim… Hoje você se casa! Caramba!

         -Se acalma Alice, você só está deixando a Bella mais nervosa – Seth reclamou olhando para mim com preocupação.

         Nós três ficamos quietos, respirando, buscando a calma em algum lugar, mas aquilo parecia uma missão impossível. Eu não fiquei tão nervosa assim nem em Concluán!

         -Você tem certeza do que está fazendo? – Seth perguntou.

         Seth sempre fazia as perguntas certas, e normalmente eram as que eu não queria responder.

         -Nenhuma – confessei afundando ainda mais na cadeira.

         Os dois ficaram preocupados com minha fala.

         -Bella, você não pode se casar desse jeito – Alice falou sombriamente.

         -Ainda não sabemos onde meu irmão está, nem com quem ele está. Eu tenho que me casar.

         Eu esperei que Seth falasse, ele estava com a boca aberta para falar alguma coisa, mas uma caixinha surgiu pulando de um lado para o outro com os dizeres “Você recebeu um e-mail”.

         -É ele! – Seth exclamou em frenesi – Tchau Bella, bom casamento para você.

         -Espera – eu e Alice falamos ao mesmo tempo.

         Mas a imagem deles desapareceu, só o que restou foi a caixinha sinistra.

         Abri meu e-mail, havia, de fato, uma nova mensagem do seqüestrador. Cliquei em cima e esperei, incomodada. Ele já tinha mandado um e-mail naquele mês.

         -Oi Isabella, minha querida, doce e obediente Isabella, como vai você? – a voz metálica perguntou depois que o símbolo do partido aparecer e sumiu – Então finalmente é o dia do seu casamento. Estou tão feliz com isso! Eu só queria dizer que desejo muitas felicidade para você e seu adorável noivo, creio que vocês farão um casal adorável. Parabéns minha querida. Ah, e hoje não tem vídeo, mas fique tranqüila, seu irmão está muito bem, confie em mim – e riu perversamente – A partir de hoje você poderá ver seu irmão uma hora por dia, como eu prometi. Me desculpe se o horário é impróprio, mas nada como um bom vídeo as três da manhã para alegrar o seu dia. Espero que meu presente seja aceitável ao seu gosto requintado, até a próxima, meu lindo anjo.

         -Infeliz, o dia que eu te achar… – ameacei furiosa.

         Sue bateu na porta, impaciente, ela realmente não entendia o significado de “duas horas”.

         -Pode entrar – deixei ainda irritada.

         -Eu vim ver como você… Ah não, o que é que você fez Isabella, eu disse para não estragar tudo – ela gritou exasperada comigo – Letícia, chame o cabeleleiro e o maquiador aqui agora mesmo.

         Se eu não estava enganada, devia ter apenas duas mechas fora do lugar e minha testa precisando de um retoque. Mas, francamente, quem notaria esses detalhes? Eu só podia pensar numa pessoa tão perfeccionista e ela estava surtando na minha frente agora. Suspirei, lá íamos nós de novo para o cabelo e a maquiagem.

O major segurou meu braço com força, me equilibrando. Tudo ao meu redor girava num lupin violento. Eu só não estava verde porque tinha umas quatro máscaras de creme e maquiagem no meu rosto. Nem se quer a cicatriz eu tinha mais me marcando. Mas eu suava ainda mais do que antes e meu estômago girava e se contorcia, furioso.

         -Está tudo bem com você querida? – o major perguntou.

         -Sim – grasnei sem nenhuma convicção.

         -Só tente não vomitar nele nem no pregador – ele aconselhou sorrindo afetuosamente – O resto sai naturalmente.

         Claro, eu nunca vi um vômito seguido de desmaio sair forçado. Respirei fundo, mas não adiantou nada, a marcha nupcial ganhou o ar e eu senti minhas pernas fraquejarem. Eu não ia conseguir!

         -Nossa vez Isabella– o major avisou dando o primeiro passo.

         Olhei para o relógio em seu punho, oito horas e meia, fazia mais de sete horas desde que conversara com Alice e Seth. Eu queria que eles estivessem aqui, pelo menos teria mais coragem de caminhar pelo largo e longo corredor apinhado de gente e me colocar ao lado de Jacob.

         -Isabella? Vamos – o major insistiu ficando realmente preocupado comigo.

         -Eu não consigo andar – arquejei, minha respiração ofegante como se eu tivesse corrido por muito tempo.

         -Vamos lá garota, é só por um pé na frente do outro, um de cada vez. Eu estou aqui, vou te ajudar.

         Balancei a cabeça num sim mínimo, eu temia que qualquer movimento brusco abrisse a comporta de vômito que me enchia.

         Com um grande esforço nós caminhamos e chegamos ao corredor. Todos já estavam de pé e me olhavam maravilhados, como se nunca tivessem me visto antes. Na minha frente estavam os padrinhos, Sue se desfazendo em lágrimas e Jacob me olhando surpreso.

         “Vamos lá garota, um passo de cada vez” eu mentalizava com nervosismo. Os flashes disparavam sem parar, me cegando em vários momentos. Mesmo assim eu continuei até que Jacob se moveu e chegou até nós. Num gesto treinado e repetido inúmeras vezes por Sue, minha mão parou debaixo da mão de Jacob e o major falou em alto e bom som:

         -Isabellafoi a filha do meu melhor amigo, tenho ela como uma filha e desejo de todo o coração a sua felicidade. Cuide bem dela meu filho.

         -Enquanto eu viver – Jacob prometeu.

         E então ele me guiou até o magnífico altar. Atrás de nós as pessoas se sentaram e o homem a nossa frente começou a falar:

         -Boa noite amigos queridos, familiares amados, boa noite, adorável Isabella, boa noite, nobre Jacob – e sorriu para nós – Nesta noite nós saímos de nossas casas e viemos até aqui para testificar, para testemunhar o maior milagre da natureza: o amor. O amor não é um simples sentimento ou emoção que nos afeta em um momento de nossa vida, o amor é um compromisso que envolve fidelidade, respeito e proteção. Jacob, você não amará Isabelladesesperadamente todos os dias, Isabella, você não amará Jacob devastadoramente em cada segundo de sua vida, o amor não é isso. Amar alguém não significa sentir algo avassalador.

         Ele parou de falar e olhou diretamente para nós.

         -E eu não poderia estar falando sobre isso para um casal melhor do que vocês. Nós que aqui estamos conhecemos a história de vocês, sabemos como desde pequenos vocês assumiram um compromisso de fidelidade e de espera, um compromisso de amor. Eu sei que em todos esses anos em que estiveram juntos, houve momentos em que você Jacob não ardeu de amores por Isabella, e nem você Isabellapor Jacob, mas ainda sim aqui estão vocês, prontos para se unir em sagrado matrimônio, sabendo o que é o verdadeiro amor, qual é verdadeira forma de amar. Poetas do mundo todo escreveram sobre o amor, músicos cantaram o amor, compuseram o amor em diversas facetas. Mas o amor verdadeiro se resume em duas coisas: Isabellae Jacob. Para você Isabella, a partir de hoje o amor será seu esposo, a partir de hoje Jacob, o amor será sua esposa. E nós cuidamos do amor, cultivamos o amor com palavras doces, com respeito, sinceridade. Com a nossa própria vida. Na Bíblia está escrito que saí o homem da casa de seus pais e une-se a sua mulher, de modo que eles sejam apenas um, isso significa bem mais do que apenas a lua-de-mel – algumas pessoas riram com isso – Ser um significa uma só maneira de agir, uma só forma de pensar, uma só forma de amar. Mas acontece que vocês são diferentes. Jacob, você tem a mesma personalidade de Isabella?

         -Não – ele respondeu sorrindo para mim, seus olhos brilhavam tomados pela emoção.

         -Isabella, você tem a mesma personalidade de Jacob? – ele se dirigiu a mim.

         -Não – respondi.

         -Então não temos como fazer esse casamento – ele concluiu com um sorriso divertido.

         Minhas pernas tremeram e meu corpo relaxou. Estranho, parecia que fisicamente meu corpo concordava com o que ele acabar de dizer. Mas o pregador continuava sorrindo e eu sabia que ele não terminaria tudo daquela forma.

         -Casamento – ele continuou – Não significa achar alguém que é exatamente igual a você. Ser um não significa que um vai se anular para o outro comandar. Quando lemos que o homem e a mulher se unirão para se tornarem um, estamos na verdade lendo que o homem e a mulher buscarão um equilíbrio entre seus desejos, seus sonhos, seus objetivos. Casamento é uma negociação, você tem que chegar a um acordo, e isso engloba desde o que vão tomar no café da manhã até quantos filhos vão ter. Grandes casais são grandes negociadores. Mas grandes casais se separam, por que, mais do que grandes negociadores, vocês deverão aprender a cuidar do outro, a gostar do outro, a aceitar os erros do outro. Talvez a Isabellajamais aprenda a fazer seus pratos preferidos Jacob, mas você deve amá-la mesmo assim, talvez o Jacob jamais consiga acompanhar você nas compras sem reclamar, Isabella, mas mesmo assim você tem que gostar dele. Casais vencedores são aqueles formados por grandes negociadores que se gostam acima de tudo. Você quer ser feliz com ela, Jacob?

         -Claro – ele respondeu com entusiasmo.

         -Então Isabellatem que ser sua melhor amiga.

         -Quer ser feliz no seu casamento Isabella?

         -Quero.

         -Então tem que se casar com seu melhor amigo.

         Nesse momento eu e Jacob nos entreolhamos, ele um pouco pálido. Eu não precisava de ajuda para saber que ele pensava o mesmo que eu: Edward era o meu melhor amigo.

         Nosso momento de surpresa durou pouco, o pregador voltou a falar e nós olhamos para ele. Mas eu não prestei mais atenção no que ele falou, não depois daquilo. Eu só voltei a perceber o que acontecia quando Jacob tomou minha mão esquerda e começou a repetir:

         -Eu, Jacob Black, tomo você, Bella Swan, como minha esposa… prometendo amá-la, respeitá-la e lhe ser fiel… Na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, nos momentos bons, ou nas dificuldades… Por todos os dias da minha vida.

         Ele olhou para mim esperando. Agora era minha vez

         -Eu – gaguejei, minha garganta seca – Bella Swan, tomo você… – e não consegui mais falar.

         Dentro de mim tudo era confusão e guerra, meu corpo se auto combatia, lutando, me deixando confusa. Era o dia do meu casamento, mas eu não estava pronta para aquilo. Eu não queria me casar!

         -Diga o nome dele – o pregador sussurrou para mim.

         Mas eu não tinha escolha. Erick precisava daquele sacrifício.

         -Jacob Black – disse, meu corpo todo se fragmentando e meu coração virando as costas para mim, furioso com minha atitude – Como meu esposo… prometendo amá-lo, respeitá-lo e lhe ser fiel… Na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, nos momentos bons, ou nas dificuldades… Por todos os dias da minha vida.

         Jacob sorriu para mim, esplendoroso. Ele estava tão feliz…

         -É de livre e espontânea vontade que os dois proclamam tais votos? – o pregador perguntou sorrindo.

         -Sim – Jacob respondeu com exultação.

         Abri a boca para dizer qualquer coisa que confirmasse aquilo, menos um sim. O meu sim eu já tinha dado a outro. Foi quando a harmonia da cerimônia foi interrompida com um monumental e histórico berro.

         -Eu protesto!