Dust Angels escrita por Nancy Boy


Capítulo 13
Capítulo 13 - The Kids From Yesterday


Notas iniciais do capítulo

Oi!
Primeiro quero agradecer a preocupação que vocês tiveram comigo ontem, vocês são uns anjos ♥ Já estou melhor agora, razoavelmente, muito obrigado mesmo.
Segundo, avisar que esse capítulo tá gigante, e é mais passado que presente (daí o título e essa música de trilha sonora, né). E também que a maior parte eu escrevi ontem, então considerando como estava meu humor, vocês vão entender porque o capítulo ficou assim.
E terceiro... boa leitura!



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 — Remote? Tudo bem? — Grace acenava na frente do killjoy, preocupada.

— Ah... tudo.

Remote Heart se levantou, ainda em transe, e ficou olhando para o desenho nas mãos da menina à sua frente.

— O que aconteceu? — Grace insistiu, tentando entender.

— Você... tem uma foto da sua mãe?

— Tenho, por quê?

— Posso ver?

Grace franziu o cenho, mas concordou. Foi até sua mochila jogada aos pés da cama e mexeu nela até tirar cuidadosamente uma fotografia antiga, rasgada em um ponto, mas fora isso bem cuidada. Entregou a Remote Heart.

Ele ofegou. Era ela mesmo. Estava ali bem mais jovem do que quando ele a conheceu, mas não havia dúvidas. Aquela era Black Flower. E a pequena menina a quem ela abraçava só podia ser Grace.

— Remote, o que tá acontecendo?

Remote Heart olhou para ela, sem saber o que dizer. O que poderia dizer? “Não é nada, só que eu acabei de descobrir que matei sua mãe”. Ele ficou parado lá, com a foto na mão, até que a voz de Party Poison chegou aos seus ouvidos e ele pôde respirar por um momento.

— Ei, vocês viram... — Party Poison deixou a frase morrer ao ver as expressões dos dois. — Que foi?

— Não sei — Grace exclamou. — Ele ficou estranho de repente.

Party Poison olhou para Remote Heart, e ele não soube mais o que poderia fazer se não se explicar.

— Grace, pode esperar lá fora um pouco? Quero falar uma coisa com o Party.

Grace o lançou um olhar desconfiado, mas concordou. Encaminhou-se para fora do quarto e fechou a porta atrás de si.

— Party... eu... — Remote Heart olhava da foto para o killjoy. — Eu não sei como dizer isso, mas... eu conheci essa mulher.

Party Poison olhou para a fotografia.

— Black Flower? Sério?

— É... vocês nunca tinham me falado o nome dela. Nem pro Pony ou para o Dr. D.

— Não gostávamos de ficar lembrando. Era difícil pra Grace e pro Jet, você sabe.

— Claro, eu entendo... eu também não gosto de lembrar da pessoa que eu perdi.

— A mulher que você teve de matar?

— É... Party, por favor, eu quero que você fique calmo agora... mas a mulher que eu tive de matar... era ela.

Party Poison arregalou os olhos. Olhou da foto para Remote Heart uma dúzia de vezes.

— Quê? Mas... como?

— Depois que vocês salvaram a Grace... Black Flower ficou em Battery City, não ficou? A BLI só pode ter feito um coisa com ela.

— Transformado ela em uma espiã? — Party Poison não parava de olhar para a mulher sorridente na imagem que Remote Heart segurava, incrédulo.

— É. A tal lavagem cerebral que eles fazem. Fizeram com ela. E depois a soltaram nas zonas, e foi quando eu a conheci... e...

— Já sei, já sei. Olha... eu não sei o que pensar disso. Sei que você não teria feito o que fez se não fosse necessário, mas Black Flower... só... Grace não pode saber disso, ok?

Remote Heart assentia quando a porta se abriu de repente. Grace andou com passos firmes até eles, totalmente diferente de quando saíra. Um manto invisível de amargura parecia ter sido jogado sobre ela.

— Grace sabe ouvir atrás da porta — ela disse friamente, e, sem aviso, arrancou a foto das mãos de Remote Heart. Guardou-a na mochila e se voltou para ele novamente. — Você matou minha mãe.

— Eu não... eu não... — Remote Heart não conseguia raciocinar para terminar a frase. Ver aquele rosto inocente com tanta raiva parecia congelar seus neurônios.

— Você matou minha mãe — Grace repetiu, mais alto. — Não precisa falar nada.

Ela pegou a mochila, o caderno e os lápis que deixara sobre a cama e foi para fora do quarto, justamente quando Fun Ghoul entrava, confuso.

— O que aconteceu aqui?

— Depois eu falo — Party Poison suspirou. — Vai atrás dela. Ela provavelmente vai ficar andando por aí, ou vai até o Dr. D. Deixa, só não a perca de vista.

Fun Ghoul não entendeu nada, mas obedeceu. Remote Heart se deixou cair na cama de Grace e enfiou o rosto nas mãos.

— Ah, meu Deus... o que foi que eu fiz?

— O que tinha de ser feito — Party Poison tentou tranquilizá-lo, apesar de ainda ter uma expressão um tanto assombrada. — Você é quem você tem de ser, lembra?

É, ele era. Mas isso era bom? Adaptar-se às situações era realmente uma vantagem?

Remote Heart levantou o olhar para o rosto de Party Poison.

— Até mesmo quando eu tenho de ser um monstro?

Party Poison olhou para o chão, pensativo. Ficaram em silêncio por um bom tempo.

— É — o ruivo disse então. — Todos temos que ser monstros uma vez na vida... ou isso ou deixamos que sejam monstruosos com a gente.

— Isso não faz eu me sentir melhor. Como pode ser bom que eu tenha que ser como meus inimigos para sobreviver?

— Eu nunca disse que é bom. É necessário.

— Necessário... — Remote Heart balançou a cabeça. — Onde fica nossa alma no meio disso tudo? Vale a pena sobreviver desse jeito?

— Não sei, Remote. Talvez não. Mas nossas almas ainda estão aqui dentro — Party Poison apontou para o próprio peito. — E enquanto estiverem aqui, temos que nos virar para mantê-las seguras. Mesmo que isso signifique deixá-las endurecer com o que fazemos.

Remote Heart ainda não conseguia acreditar, não conseguia se perdoar. A culpa pelo o que ele teve de fazer estava finalmente o abandonando, mas agora ela voltava com força total, e com uma nova forma: Grace. O rosto dela antes de sair daquele quarto ficaria gravado na mente dele para sempre, e ele sabia.

Ele foi para sua própria cama depois que Party Poison saiu do cômodo, mergulhando em pensamentos e auto-flagelação mental. Não percebeu o tempo; parecia que haviam se passado apenas alguns minutos quando a porta do quarto se abriu novamente e Show Pony entrou, devagar.

— Hey — ele cumprimentou Remote Heart, sentando-se a sua frente. — O Party me ligou, contou o que aconteceu.

— Hm. — Remote Heart não soube o que dizer, e por algum motivo não quis olhar para Show Pony.

Ficou encarando um ponto qualquer no chão por alguns segundos, até que Show Pony tentou atrair sua atenção.

— Quer conversar?

Remote Heart só negou com a cabeça. Pela primeira vez, ele desejou que Show Pony fosse embora. Não merecia aquilo, esse carinho, esse cuidado, como se ele fosse a vítima. A vítima estava lá fora, sendo seguida por Fun Ghoul. Por que Show Pony não ia atrás dela?

— Você quer conversar, sim. Eu te conheço.

— Não, Pony. Vai embora.

— Você não manda em mim.

— Não tô mandando, estou pedindo.

— Que pena, não estou me sentindo muito generoso hoje, então vou ficar aqui.

Remote Heart bufou e finalmente encontrou os olhos de Show Pony.

— É sério, me deixa sozinho, tá? Não quero falar com ninguém.

— Te deixar sozinho pra quê, pra você continuar a se afundar em culpa até não conseguir sair mais? Dá pra ver na sua cara, Remote. Você tá deixando a culpa te consumir. E eu não vou permitir isso.

— E por que não? O que você vai ganhar me ajudando?

— Eu já disse que gosto de cuidar de você.

Remote Heart olhou para o chão novamente, disposto a ignorar qualquer coisa que Show Pony fosse dizer. Mas não conseguiu ignorar o fato de ele ter se esticado para cima e se arrastado até ficar com o ombro colado ao seu, fazendo com que ele quase caísse da cama.

— É cama de solteiro, Pony, não cabe um do lado do outro.

— Claro que cabe. Só encolhe a barriga aí.

Remote Heart deu uma risadinha, logo cortada. Por que ele estava rindo? Não era para rir. Show Pony não devia estar fazendo isso.

— Olha — Show Pony começou, muito próximo, tanto que era possível sentir seu hálito. — Eu tenho que te agradecer por uma coisa. Você disse que esperaria o tempo que fosse necessário pra eu me abrir com você. Isso foi muito importante pra mim. Mas eu não sou como você. Ainda não alcancei esse grau na evolução humana.

— Besta — Remote Heart murmurou.

— É sério. Você é melhor do que imagina ser. Mas eu não, e por isso não tenho sua paciência. Não posso esperar pra que você se abra comigo. Tem que ser agora.

Remote Heart deu uma risada falsa e debochada.

— Como se fosse simples assim.

É simples assim. Você fala, eu escuto. E não vou sair daqui até que isso aconteça.

— Então vai ficar aí por um bom tempo.

— Sem problemas. Você que vai ter de dividir a cama.

Apesar de tudo, Remote Heart não pôde deixar de sorrir com a sugestão de ter de dormir com Show Pony bem ao seu lado.

Por vários minutos, eles permaneceram em silêncio. Somente quando percebeu que Show Pony não tinha nenhuma intenção de desistir é que Remote Heart decidiu falar.

— Tá, tá bom. O que você quer saber? Que eu me sinto um lixo? Que eu sou a razão de uma criança ser órfã? Que eu fui a última pessoa com quem Jet falou, mesmo tendo sido a pessoa a quem ele teria matado se soubesse da verdade? O que você quer, Pony? Tem muitas opções.

Show Pony suspirou. Tinha finalmente conseguido. Remote Heart estava desabando, através de palavras, através de lágrimas.

— Não é fácil — ele continuava. — Desde que me tornei killjoy já não era fácil viver com isso nas costas, o peso de uma vida. Mas eu tentava me sentir melhor, pensando “era só um Drac, ele mereceu”, ou “foi legítima defesa”. Mas Black Flower, ela não fez nada!

— Ela estava sendo usada pela BL/ind. Você não tinha escolha.

— CLARO QUE TINHA! Nós sempre temos escolha! Eu podia ter apontado aquela merda de raygun pra minha própria cabeça ao invés da dela!

Show Pony passou um braço por trás dos ombros de Remote Heart e o abraçou apertado. Não falou mais nada, só assentia e sussurrava um “tudo bem” enquanto Remote Heart prosseguia com as acusações e com o choro.

Depois do que pareceu uma eternidade, Remote Heart conseguiu se controlar. Respirou fundo e enxugou as lágrimas.

— Obrigado — murmurou, com a voz rouca e um pouco falha.

— De nada. Tá melhor?

— Acho que sim.

— Certo.

Ficaram em silêncio por mais algum tempo. Show Pony então suspirou profundamente e cortou o abraço lateral que dava em Remote Heart. Foi para mais à frente da cama novamente e cruzou as pernas.

— Acho que é minha vez agora.

Isso captou a atenção de Remote Heart. Ele não esperava ouvir nada de Show Pony por enquanto, e não estava realmente se importando com isso até então.

— Se você conseguiu, eu consigo — Show Pony falou e, depois de um momento de hesitação, prosseguiu: — Você quer saber porque eu não tiro esse capacete. Bem... então se acomode aí, porque tem uma história por trás disso.

Era o que Remote Heart já imaginava. Seus pensamentos se dissiparam imediatamente, e ele notou, com uma surpresa genuína, que seu interesse por Show Pony conseguia ser maior do que sua dor.

— Então... — Show Pony organizou as palavras antes de continuar. — Eu ainda estava estudando quando a BLI se revelou, estava no ensino médio. Mas o que aconteceu não teve muito a ver com ela. Ou, pelo menos, não diretamente. De certa forma, ela me ajudou a ser quem eu sou hoje.

Remote Heart arqueou as sobrancelhas.

— Não de propósito, claro — Show Pony falou, vendo a expressão cética do outro. — E a um preço. Quando eu percebi que os produtos e os remédios deles estavam invadindo todas as casas, inclusive a minha, decidi na hora que lutaria contra essa empresa. Parecia que só eu conseguia ver o que eles estavam fazendo, que logo eles tomariam o poder completamente. Então eu iria procurar outras pessoas que pensassem como eu e iria me juntar a elas. Mas antes, eu precisava fazer outra coisa.

Show Pony suspirou, e Remote Heart percebeu que a história começava agora.

— Eu escondia que era gay até então. Você se lembra como as coisas eram nessa época, as pessoas se importavam com isso. Eu já tinha que aguentar bastante merda na escola por ser afeminado. Mas eu tinha que me libertar. Então fui com tudo e assumi não só minha sexualidade, como também minha androginia, parando de me esconder atrás de bonés e roupas largas. Você imagina como foi a reação dos outros? Imaginou? Bom... foi pior. Pra começar, meus pais me expulsaram. De certa forma eu até já esperava. Peguei algumas coisas e sumi, geralmente dormindo na rua mesmo, mas vez ou outra arrumando espaço em algum daqueles abrigos imundos para sem-tetos.

“Continuei indo pra escola, mais pra comer do que para qualquer outra coisa. Só que as coisas ficaram muito piores lá. Consegui aguentar por uma semana, acho, até que desisti na primeira vez que apanhei de um grupo de meninos. Não fizeram muita coisa porque estávamos dentro da escola, não tinham escolha a não ser parar quando os professores viram. Mas conseguiram o que queriam: eu fui embora. Comecei a passar fome só pra não voltar lá.”

Remote Heart percebeu vagamente que seus punhos estavam fechados. Show Pony não notou; falava sem olhar para ele, o olhar focado em algum ponto ao lado de seu rosto, enquanto se lembrava de tudo.

— No meio disso, a BLI continuou agindo, e mais pessoas começaram a notar. Enquanto eu perambulava de um lado para o outro, eu via gente saindo de suas casas, tentando encontrar abrigo em outros países, sem saber que eles também estavam sendo dominados. Aos poucos, os boatos de que estávamos sendo feito de escravos aumentaram e se tornaram pânico geral. Battery City foi fundada e a luta começou. E eu ainda não tinha encontrado ninguém em quem pudesse confiar.

“Um belo dia, acabei topando com o grupo de meninos lá da escola. Não foi surpresa descobrir que eles estavam do lado da BLI. Eram voluntários para patrulhar os arredores de Battery City. E ficaram muito felizes em me encontrar. Um deles me segurou antes que eu pudesse correr e os outros três falaram que eles queriam mesmo entregar o primeiro killjoy deles para seu chefe. Eu ainda nem sabia o que era um killjoy, mas eles não se importaram com isso, claro. Estavam extasiados, provavelmente sob efeito das drogas da BLI, mas não tenho certeza, talvez não. Eles já eram assim mesmo.”

Show Pony parou. Permaneceu fitando o nada, perdido em pensamentos, e Remote Heart quase falou para ele continuar, mas não sabia se queria ouvir. De qualquer forma, Show Pony continuou.

— Eles não usaram nada além das próprias mãos no começo. E pés. Ficaram me socando e chutando por um tempo. Muito tempo. Às vezes... — ele fechou os olhos. — às vezes acho que ainda não pararam.

Remote Heart já sentia que podia explodir de raiva a qualquer momento, mas se mantinha em silêncio.

— Então um deles tirou um negócio do bolso, disse que o chefe deles tinha dado para eles experimentarem. Era um protótipo de uma espada a laser, só que no tamanho de um canivete. Os olhos deles brilharam quando a faixa de laser vermelha apareceu. Eles me seguraram de novo e bateram minha cabeça algumas vezes no chão, até eu ficar tonto e parar de me mexer. Então passaram o laser lentamente... bem lentamente pelo lado do meu rosto. Eu nunca tinha me queimado antes, mas ainda não tenho certeza se o pior é a dor ou o cheiro... saber que o cheiro vem de mim mesmo, que minha pele está se transformando em vapor.

“Continuando, eles pararam por um momento, pra admirar o trabalho feito. Começaram a usar o laser nas minhas roupas, para ver se queimavam com facilidade, o que é óbvio que sim. Eu estava realmente tonto, mas percebi que eles estavam interessados demais nas minhas roupas sendo destruídas, sumindo a cada passada do laser. Tentei correr de novo, só para receber mais uma leva de socos na cara. Nesse ponto eu sabia que meu rosto já estava bem deformado, e eles também. Pegaram um pedaço que haviam cortado da minha camiseta e jogaram sobre minha cabeça, dizendo que não queriam ver aquilo. Só o resto interessava pra eles.

“Então... eles pararam. Não para brincar mais ou qualquer coisa. Eles pararam porque ouviram um barulho, só que eu não soube o que aconteceu. Eu estava muito fraco, tinha perdido muito sangue, e assim que senti que as mãos deles se afastaram de mim, meu corpo desistiu de ficar acordado, e eu agradeci, pensando que finalmente tinha morrido. Não morri, como você pode ter percebido.”

Show Pony finalmente encarou Remote Heart, que tinha lágrimas contidas nos olhos.

— Foi Dr. Death — Show Pony prosseguiu, com um meio sorriso fraco. — Ele apareceu. Ele me salvou. Fez os quatro idiotas correrem... quer dizer, três. Antes, um deles descobriu pela primeira vez o que era uma raygun. Dr. D. me contou isso tudo enquanto eu estava no hospital. Ele me acompanhou durante todo o meu tratamento, pagou por ele, e me levou para casa quando não pude mais ficar lá, já que a BLI decidiu vistoriar os hospitais fora de Battery City. Foi basicamente o pai que eu nunca tive. E aí ele começou a me treinar e me ensinar a ser um killjoy. Só que por muito tempo, eu ainda estava com o rosto bem detonado. Não quis sair de casa em hipótese alguma. Não queria ser visto, não queria ser reconhecido, não queria nada. Não queria que as pessoas sequer soubessem se eu era um homem ou uma mulher. Dr. D. tentou me convencer a sair, mas quando percebeu que não conseguiria, me deu um capacete. Disse que já seria útil de qualquer jeito, me protegeria. E aí começou essa história toda. Dr. D. precisou de muita conversa pra me convencer a tirar o bendito capacete pra dormir, porque até então era o único jeito que eu conseguia pegar no sono sem passar metade da noite acordado. Eu era um típico caso de trauma não resolvido. E ainda sou.

Remote Heart não sabia o que falar. Abriu a boca, fechou de novo, gaguejou algumas palavras. Até que balançou a cabeça e suspirou.

— Pode tirar — falou finalmente.

Show Pony não respondeu e não o olhou.

— Pony. Olha pra mim. Eu estou aqui. Ninguém vai tocar em você.

— Eu sei, não sou besta.... é só dizer isso pra minha mente.

— Então diga. Você tem esse poder.

Show Pony não falou nada por um minuto. Dois minutos. Cinco. Remote Heart nunca imaginou que teria tanta paciência ao esperar alguma coisa; mas era só ver Show Pony para entender. Não tinha como apressá-lo. O momento era aquele, e demoraria quanto tempo fosse necessário.

Finalmente, Show Pony levantou os braços e tirou o capacete, as mãos um pouco trêmulas.

Remote Heart sorriu. Os cabelos negros de Show Pony caíram desalinhados sobre seu rosto e, mesmo sem querer, estavam bagunçados de uma forma sensual. O killjoy se perdeu no que via; a pele lisa, aparentemente macia, os lábios delicados e rosados... mas ele queria os olhos. Show Pony encarava o chão, claramente nervoso. Remote Heart se curvou levemente para frente e passou uma mão pelo seu rosto, sentindo-o estremecer assustado com o toque.

— Shh — Remote Heart sussurrou, continuando o movimento calmamente. Afastou os fios rebeldes do rosto de Show Pony e viu o que já esperava encontrar: uma cicatriz longa e antiga contornando seus traços.

Mas aquilo não afetava em nada em sua beleza. Era só a lembrança de algo que ele queria esquecer. Mas Remote Heart sabia que não há como esquecer o passado; só há como superá-lo.

Aproximou-se mais um pouco e beijou sua cicatriz gentilmente, constatando que a pele era, realmente, macia. Então se afastou e permitiu que seus olhares se encontrassem.

— Você é lindo — murmurou.

Show Pony deixou crescer em seus lábios um sorriso de canto. Ele observou Remote Heart por alguns segundos, procurando palavras para dizer, para agradecer, para explicar o que ele sentia. Até que percebeu que não precisava falar nada. Fitou a boca do outro por um milésimo de segundo antes de tomá-la em um beijo.

Remote Heart perdeu o ar com a surpresa, mas não se afastou. Como poderia? Estava esperando por isso até agora. Deixou seus braços criarem vontade própria e se jogarem para frente, abraçando Show Pony com força, trazendo-o para si. Show Pony o empurrou com o corpo e se deitou por cima dele, sem parar o beijo.

Remote Heart sentiu uma notinha de medo entalar em sua garganta, percebendo que eles não parariam por ali. Ele já estava ficando muito “animado” e podia notar que Show Pony também. Apesar disso, ele não queria parar, e ficou realmente desapontado quando ouviu a porta do quarto se abrir e Fun Ghoul entrar.

— Remo... ah... desculpa, eu... ahn...

Show Pony riu e se afastou, deixando que seus cabelos convenientemente cobrissem a maior parte de seu rosto. Remote Heart lançou um olhar raivoso à Fun Ghoul, que já estava parecendo um tomate de tão vermelho.

— Que foi?

— Foi mal, é que... bom, eu trouxe a Grace de volta e ela concordou em conversar com você, e... eu acabei de falar com o Party também... e ele quer ir. Na missão, sabe.

Remote Heart sentiu um balde de água fria ser jogado sobre ele ao ouvir o nome de Grace. Mas mesmo assim olhou para Show Pony, perguntando silenciosamente se ele ficaria bem sozinho.

— Pode ir — Show Pony falou com uma piscadela. — Eu vou falar com o Party e o Fun sobre a missão.

— É, sobre isso... tem certeza que quer ir? — Remote Heart estava quase suplicante. Ele estava certo agora de que não queria que o outro fosse.

— Tenho, Remote. Até porque... — ele abaixou a voz, que adquiriu um tom sombrio. — Não tenho certeza, mas... enquanto aqueles caras faziam aquilo comigo, eu acho que os ouvi falando o nome do tal chefe que os mandou pra lá.

— Qual era?

— Adivinha.

Remote Heart não precisou responder. Parecia que tudo retornava à Korse. Era sempre ele, de alguma forma, a razão das destruições nas vidas dos killjoys.

É, a missão era necessária. E seria cumprida com muito gosto.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado e que me perdoem por ter feito o Show Pony passar por tudo isso .-.
Temos que ser monstros às vezes '-'
Bom, é isso, beijos!