Nem Todo Mundo Odeia O Chris - 1ª Temporada escrita por LivyBennet


Capítulo 3
Todo Mundo Odeia Basquete


Notas iniciais do capítulo

Leiam leiam leiam leiam



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POV. CHRIS(Brooklin – 1982)

A coisa mais difícil numa escola nova era fazer amigos. Da escola que eu vinha, tinha um monte de garotos como eu, mas na Corleone eu não me encaixava. Nem com os atletas, nem com os nerds, nem com os descolados, nem com os encrenqueiros e muito menos com o grupo de teatro. E o único grupo que aparentemente me queria era o dos CDFs. Meu amigo, Greg, fazia parte desse grupo, então eu me enfiei lá mesmo.

Eu gostava muito de basquete, então eu vivia falando disso com o Greg. Ele também gostava, mas só sabia dar palpite.

“Sério. Eu to dizendo, quando Bernard King tá inspirado ele consegue encestar mais que qualquer um. Ele é incrível.”

“Eu to com uma lista de palpites pra ver quem tem a linha de ataque mais quente. Dá uma olhada.” Peguei a lista.

“Vocês gostam de basquete?” Era a Lizzy.

“Oi. Pensei que só ia falar comigo ontem. Todo mundo faz isso.” O Greg não falou nada. Às vezes acho que ele tem fobia de garotas.

“Eu não sou assim. Posso ver a lista?”

“Pode. Eu notei que você é diferente. Quantos anos você tem?”

“Treze. E vocês?”

“Eu e o Greg também.”

“Você é italiano, Greg?” Novamente o Greg não respondeu. “Por que ele não responde?”

“Não é nada.”

Uma professora passou pela gente e deu ‘bom dia’.

“Droga!” Isso foi a Lizzy.

“O que foi?”

“Vai ser teste surpresa.”

“Como você sabe?”

“O boato que corre é que ela não fala com os alunos a menos que seja teste.”

“Então eu tenho que avisar à turma pra gente estudar.” Com essa o Greg saiu.

Eu fiquei meio envergonhado de ficar sozinho com ela, mesmo que tenha sido no corredor. A verdade é que eu nunca tive uma conversa civilizada com uma garota por mais de um minuto. Ali já se iam três. Ela olhou pra mim e eu fiquei mais vermelho que um pimentão. Ainda bem que eu sou negro. Tentei gaguejar alguma coisa.

“Então... qual é a sua turma?” Graças a Deus funcionou.

“Eu mudei hoje. Vou pra classe da Srta. Morello. Qual é a sua?”

“Eu SOU da classe da Srta. Morello.”

“Legal. A gente vai estudar junto.” É impressão minha ou ela disse legal?

“Você é bem na sua, não é?”

“É. Não gosto de me misturar, mas eu gosto de aventuras e diversão.”

“Por que tá se misturando com os dois mais impopulares da Corleone, então?” Perguntei na inocência. Queria saber mesmo.

“Não sei por que, mas me deu vontade. Achei vocês legais. E também acho que perto de vocês dois tem aventura e diversão.” Nenhuma garota nunca tinha me chamado de legal. Pra quebrar o constrangimento daquela frase, eu amassei a lista que o Greg me deu e joguei no lixo do outro lado do corredor e acertei. Ela acompanhou o trajeto da bolinha com os olhos.

“Nossa, você é bom. Por que não treina?”

“Esse é o único tipo de cesta que eu consigo fazer. Cesta com bolinha de papel.” Nós rimos.

Naquele minuto o treinador tava vindo na minha direção e ela se despediu.

“Te vejo na sala.” E saiu.

“Ei, garoto.” Ele me chamou. “Qual o seu nome?”

“Chris.” Daí ele começou a dizer que tinha visto o meu impressionante arremesso e que eu agora era bem-vindo ao time de basquete.

Eu fiquei tipo, ‘o quê?’. Eu só joguei uma bolinha de papel no lixo. Ele tentou de todas as maneiras me convencer a jogar no time, mas eu não queria. Na verdade, eu não jogava. Não jogava porcaria nenhuma em esporte nenhum. Eu disse isso pra ele na cara dura, mas ele não acreditou. Acabou me colocando no time e eu nem pude argumentar. Treino às 15:30h. Droga!

***

POV. LIZZY

Por que eu falei com eles? Eu sou uma das descoladas dessa escola. Apesar do jeito que me visto: tênis, jeans, blusa e jaqueta, eu sou respeitada aqui. Muita gente tinha medo de mim. Até o Caruzo e eu adorava isso. Mas essa é outra história que depois eu conto. Eu adorava ser temida. Dá uma sensação de poder. Então, eu não precisava falar com eles de novo. Nem ele esperava isso. Mas tenho que admitir que é fácil conversar com ele. Com o Chris, por que o Greg não consegue abrir a boca. Eles são engraçados. Quer saber? Vai ser divertido. E eu ainda ganho um motivo grátis pra infernizar o Caruzo. Dei o meu sorriso mais diabólico e entrei na sala.

***

POV. CHRIS

No intervalo, eu tava indo com o Greg e a Lizzy (É. Ela tá andando com a gente agora.) comer alguma coisa, quando fomos barrados pelo time de basquete. O garoto da frente me perguntou se eu era o Chris e eu disse que sim. Daí ele me cumprimentou e me chamou pra descolar um rango com a turma do basquete. Eu não ia perder essa chance de virar popular. Ele chamou a Lizzy, mas o Greg não.

“Quer vir também, Liz?”

“Pra você é Lizzy, Ernie. E não, obrigada. Comer com você só iria me dar embrulhos no estômago.” Eu tava tão feliz por fazer parte do time que nem pensei muito nesse fora que ela deu nele. “Vem, Greg.”

No final eu fui comer com eles e depois ficamos na porta da escola, conversando. Eles estavam adorando o que eu estava dizendo sobre os jogos. Tinha até uma garota na minha, a Jennifer. E foi a primeira vez que eu vi o Caruzo me chamar pelo meu nome, mas o pessoal do time envergonhou ele. Aí o Greg veio perguntar se eu ia estudar com ele e os outros nerds. Eu me afastei da turma bem rápido e puxei o Greg.

“Greg, eu to com cara de quem quer estudar? E tem uma garota dando mole pra mim.” Voltei para o pessoal do time e o Greg foi embora.

“CHRIS!” Então eu notei a Lizzy olhando pra gente. “O que você pensa que tá fazendo?” Ela tava bem séria.

“To conversando.” Respondi na inocência.

“Lizzy.” Essa foi a Jennifer e ela falou com uma cara de desprezo...

“Jennifer.” Essa foi a Lizzy e ela falou com uma cara de nojo que me deu até medo.

“Oi, fofinha. Ainda vestindo esses trapos que você chama de roupa?” Nossa!

“Claro, Jennifer. Eu, com esses trapos, sou muito mais descolada do que você jamais sonharia em ser. E eu não estou falando com você, então fecha a boca antes que o recolhedor de lixo passe e te jogue no caminhão. Seu bafo é horrível.” Ela era boa! “Quero falar com você, Chris.” Ela me puxou e me levou para um canto separado. “Vou repetir a pergunta: o que você pensa que tá fazendo?”

“Eu disse que tava conversando.”

“Com eles? Chris, o Greg é seu amigo desde antes de você apanhar do Caruzo, praticamente desde que vocês chegaram aqui. E agora você deixa ele de lado pra ficar de papo com aqueles idiotas sem cérebro? Como você acha que ele tá se sentindo?” Ela tava falando sério e eu sabia que era verdade, mas eu não queria escutar.

“Olha, eu só te conheço a uma semana, então não tenta me ensinar como agir com o Greg.” Eu sei que fui duro, mas não queria admitir que tava errado. Agora eu era popular e eu NÃO ia perder isso.

“Então vai! Vai ficar com eles! Quer saber? Eu tava enganada quando pensei que você era diferente, Chris, mas agora eu vejo que você é igualzinho aos outros. Todos aqui comem nas mãos deles e você é igual. Eles te pisaram, te xingaram, te bateram, mas é só te dar uma oportunidade de ficar popular como eles que você esquece tudo e corre pra eles como um cachorrinho abanando o rabo!” E ela foi embora, furiosa. Todas as palavras que ela disse doeram pra caramba, mas eu fingi que não ouvi. Voltei pra turma e continuamos conversando.

***

POV. LIZZY

“Você conhece o Ernie D?” Foi o Greg que perguntou, depois do time de basquete ter levado o Chris.

“Ah! Você fala?” Nós rimos. “Não precisa ter medo de mim, Greg. Eu posso me vestir diferente das outras garotas, mas ainda sou uma garota e eu não mordo. Só às vezes.” Rimos.

“É que eu fico nervoso perto de garotas e às vezes não consigo falar.” Ele realmente tava nervoso.

“Tudo bem. Se te faz sentir melhor, pensa em mim como se eu fosse um garoto. Afinal, eu gosto de beisebol, futebol, basquete e boxe.”

“É. Talvez funcione. Mas, você conhece o Ernie D?” Ele parecia mais a vontade.

“Infelizmente. Ele é o maior galinha desse colégio. Me chamou pra sair com ele uma vez, mas eu dei o fora nele. Ele me ‘persegue’ desde então, mas eu não dou mole.”

Conversamos andando e acabamos comendo juntos. Ele era legal também, mas bem tímido. Eu me controlei horrivelmente para não rir. Ele tava todo atrapalhado, derrubava as coisa, gaguejava. Foi muito engraçado. Depois eu me levantei e disse que ia falar com a coordenadora. Quando eu voltei, fiquei parada olhando o Chris conversando com os babacas. Ele tava se achando, dava pra ver. Ele deu o maior fora no Greg e foi aí que eu entrei. Falei um monte pra ele e ele foi bem grosso comigo. Poxa! Eu to tentando ajudar e é assim que ele agradece. Esquece, então. Não falo mais NADA!

***

POV. CHRIS

Na sala, a professora entrou e mandou todos colocarem as coisas embaixo da carteira porque ia ter teste surpresa. Agora eu to ferrado! A Lizzy tava certa! Tem teste e eu não estudei com o Greg. Olhei pra ele com cara de ‘me ajuda’. Mas ele só disse ‘boa sorte’. É, ele tava magoado. Olhei pra Lizzy na cadeira do meu lado e ela devolveu o olhar com raiva. Ela também não ia ajudar. Droga!

No outro dia, fui pedir ao Drew pra ele me ensinar a jogar basquete. O problema é que eu só tinha até amanhã.

“Drew, eu entrei no time de basquete da escola e preciso que você me ensine a jogar até amanhã.”

“No time da escola? Cara, você é maluco. Você não sabe jogar.”

“Eu sei. Só preciso saber o suficiente pra fingir que sei muito.”

“Sabe desmaiar?” Por essa eu sabia que ele não ia me ajudar.

Pra piorar a situação, a professora ligou pra minha mãe e contou que eu não tinha passado no teste.

“CHRIS! Por que não contou que não passou no teste?” Pensei que eu ia morrer de um infarto fulminante! “E por você ter zerado no teste, você não vai poder jogar no jogo de basquete amanhã.”

Nunca me senti tão feliz por ter tirado um zero. Meu pai ficou muito feliz por eu estar no time de basquete. Na verdade, ele sempre tinha achado o fim eu não ser bom em nada, mas ele nunca jogava na minha cara.

“Desculpa eu ter ficado fora do time.”

“Você não ficou fora ainda.” Maluco, essa mulher só me dava noticia ruim. “Por sorte o técnico te arranjou uma segunda chamada.” Agora sim, eu vou dançar! “E é melhor passar nesse teste se não eu vou marcar 40 pontos no seu bumbum.” Ótimo! Tenho que estudar para um teste no qual eu não quero passar; se eu não passar, eu me livro to fiasco que seria o jogo, mas não vou me sentar por uma semana. Troca muito injusta!

No outro dia na escola, cheguei e encontrei a Jennifer colando adesivos no meu armário. Eles diziam ‘Swish’. Era o apelido que o treinador Brady tinha colocado em mim. Ela me deu um beijo na bochecha e saiu. Fiquei voando nas nuvens! Notei a Lizzy conversando com o Greg. Eles me olharam e foram saindo; estavam realmente com raiva. Decidi que era hora de pedir desculpas.

“Greg! Lizzy!” eles pararam. Falei primeiro com o Greg. “Greg, não quis te dispensar ontem.”

“Então por que fez isso? Por que eu não sou descolado? Até a Lizzy você dispensou.” A Lizzy tava só olhando.

“Não foi por isso. É que é bom ter uma folga das surras.” Aparentemente ele me desculpou. Já a Lizzy...

“Como você foi no teste?”

“Eu sei que eu levei bomba.”

“Talvez não tivesse se dado mal se não tivesse trocado os amigos. Ou melhor, o amigo, já que você deixou bem claro que não é meu amigo.” Ela disse e saiu, fumaçando.

“Porque a Lizzy tá com raiva de você?”

“Eu fui grosso com ela.”

“Pede desculpas, então.”

“Mas ela foi grossa comigo, também.” Não ia levar a culpa sozinho. “Se eu pedir desculpas ela tem que pedir também.”

“Tudo bem, você que sabe. Mas nunca vai descobrir se ela quer te pedir desculpas se não for pedir você mesmo.” De vez em quando saia algumas coisas boas da cabeça e da boca do Greg. “Mas, então, se você zerou o teste, não vai poder jogar.”

“Quem dera. O treinador me conseguiu uma segunda chamada e a minha mãe me fez estudar a noite toda. Se eu não passar, ela me mata.”

“E se você jogar, todo mundo vai te odiar.” Eu não sabia o que fazer.

Na hora do teste, resolvi zerar de propósito. Se minha mãe me matasse, ia ser só ela e não um colégio inteiro.

“Você passou.” O QUÊ?

“Mas eu errei tudo.”

“Está no time de basquete, não está?”

“Estou.”

“Boa sorte no jogo!” Eu não tava acreditando naquilo. Eu ia apanhar de 400 pessoas!

Quando saí da sala de teste, o time inteiro me esperava do lado de fora. Quando eu disse que passei, eles fizeram uma festa tão grande que parecia que tinham ganhado o campeonato distrital. Apesar da alegria deles eu não pude deixar de me sentir como se estivessem me levando pra guilhotina.

Na hora do jogo, eu tava mais nervoso do que padre que tem que rezar uma missa, mas não sabe latim. O colégio inteiro estava na arquibancada. Destacadamente, eu via a Jennifer, que gritava meu nome e a Lizzy. Minha família tava lá também, e isso fez eu me sentir pior. A multidão inteira gritava meu nome e isso me fez sentir só um pouquinho melhor. Todo mundo ali acreditava em mim, exceto pelo Drew. Então decidi dar uma chance pra mim.

No fim do jogo a gente perdeu de 02 x 79. Eu tinha sido um fracasso. Todo mundo tava me culpando e eu não tinha culpa de nada. Foi o treinador que não me ouviu. OK. Talvez eu tenha um pouco de culpa, mas a maior parte é dele.

Em casa eu nem conseguia olhar a cara de decepção do meu pai. Todo mundo tava triste, mas quem tava mais triste era eu. Mas pelo menos eu passei no teste de ciências.

Na escola eu tava tão desmoralizado que nem uma surra o Caruzo quis me dar. Olhando novamente pra todos os grupos que tinha na Corleone, o único no qual eu realmente me encaixava era o dos CDFs.

“Greg! Por que você não foi ver o jogo?”

“Ah, eu acho que me sentiria pior vendo você, entregar e pisar na bola, errar os passes e entregar o jogo.”

“Tem certeza que não viu o jogo?” Nós rimos.

“Oi, Greg!” era a Lizzy. Ela ainda não tava falando comigo.

“Oi, Lizzy.” Nós falamos, mas ela só olhou pro Greg.

“Lizzy, posso falar com você?” Ela me olhou e fez que ‘sim’.

“To indo, pessoal.” Foi a primeira vez que vi o Greg ser sensível.

“O que você quer?” Ela tava bem na defensiva.

“Olha, eu queria me desculpar pelo que eu te disse. Você tem sido legal comigo e com o Greg e você só disse aquilo pra me impedir de fazer uma burrada. Desculpa, eu devia ter te escutado.”

“Tudo bem, Chris. Eu também fui dura demais com você. Você é uma pessoa legal e é diferente dos outros sim. Eu falo besteira quando eu fico nervosa.” Ela sorriu.

“Tudo bem.” Ficamos olhando um para o outro e depois entramos.

Na sala, a professora entregou o meu teste e eu vi que tinha tirado zero.

“Peraí! Pensei que tinha tirado 7.”

“Pensei que estava no time de basquete.” Pode uma coisa dessas?!

Olhei pro Greg e ele sussurrou que ia me ajudar, olhei pra Lizzy e ela fez o mesmo. Naquele momento eu percebi que por menos que eu conhecesse aquela garota, ela era tão minha amiga quanto o Greg. E por mais que ela fosse branca, ela era tão negra por dentro quanto eu. E nós três sempre íamos ser amigos.

...

Por: LivyBennet



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Notas finais do capítulo

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