Estava alí a horas e quanto mais mexia nas coisas, mais se perdia no meio daquele monte de velharias. Esfregou os olhos que estavam começando a ficar irritados com tamanha quantidade de poeira que aquele cômodo continha. Não eram só seus olhos que estavam irritados, mas a própria menina dos cabelos rosa estava irritada por si só.

Sua mãe lhe obrigara a arrumar o sótão e separar algumas coisas para a caridade. Ela a amaldiçoava por isso.

– Ela poderia muito bem vir aqui e fazer isso sozinha. – Falou em tom de zombaria seguido de alguns espirros. Aquele pó estava matando-a.

Haviam vários objetos velhos naquele quarto, os quais Luka reconhecera de cara. Um ursinho velho o qual ela vivia abraçada, uma boneca toda remendada que ganhou de seus pais em seu quarto aniversário, algumas caixas que continham pequenas peças de lego entre muitos outros brinquedos os quais ela costumava brincar.

Isso mesmo, costumava. Agora ela já era quase independente e não tinha tempo para coisas de criança. Mas por outro lado, era difícil se desfazer delas, pois fizeram parte de sua infância.

Estava colocando-os na caixa para doação o mais rápido que podia, já que não queria continuar naquele lugar por mais algumas horas, quando deixou uma caixinha cair no chão. Ela se assustou e deu alguns passos para trás, esbarrando e deixando alguns livros caírem, quando a caixa se abriu e a cabeça de um palhaço pulou para fora.

Depois de recuperar o fôlego, a menina se virou para pegar os livros no chão e se surpreendeu com o que achou. Era um livro razoavelmente grande e havia um laço preto de camurça mantendo ele fechado. Na capa verde-claro havia o desenho de uma garotinha, alguns arabescos dourados e o título – Os Mais Belos Contos de Fadas – escrito igualmente em dourado. E, juntamente com ele, havia uma pequena caixinha dourada, com alguns detalhes verdes, combinando com o livro.

A menina mais uma vez perdeu o fôlego. Por um minuto, não acreditou no que estava vendo. Ela pensou tê-los perdido quando sua família mudou de casa, após seu pai morrer. Após sair do seu pequeno transe, a menina pegou a caixinha e abriu. Dentro dela continha uma pequena bailarina que girava enquanto uma música suave tocava.

A menina, cujos olhos estavam brilhando, abriu o livro e começou a cantar baixinho, conforme o ritmo da música na caixinha.

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Dancing bears, painted wings

Things I almost remember

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Algumas memórias começaram a aparecer em sua cabeça. Lembrou-se de seu pai, cantarolando essa música para a pequena Luka dormir.

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And a song someone sings

Once upon a December

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Lembrou-se de quando ganhou a bendita caixinha de músicas. Foi no Natal. Provavelmente o melhor que tivera. Naquela época ela tratava o objeto como seu tesouro mais precioso.

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Someone holds me safe and warm

Horses prance through a silver storm

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Lembrou-se dos dias de tempestade. Ela odiava eles com toda sua força, já que tinha medo dos raios e trovões. Mas seu pai sempre estava lá para acalma-la.

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Figures dancing gracefully,

Across my memory

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Lembrou-se também do dia em que sua família fez um baile para a menina, em seu sétimo aniversário. Seus pais eram Rei e Rainha, enquanto ela era a Princesa.

Ela sempre foi a princesinha de seus pais. Sempre ouvia histórias sobre príncipes encantados em cavalos brancos, que iriam enfrentar qualquer obstáculo para ficar com a princesa no final. E naquela época, essa era a realidade de Luka. Ela realmente acreditava que algum dia seu príncipe iria aparecer para ama-la até a eternidade.

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Far away, long ago

Glowing dim as an ember,

Things my heart used to know

Things it yearns to remember

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Naquela época, tudo era como um sonho. Ela vivia em seu mundo de conto de fadas e era extremamente feliz. Mas tudo acabou, como um passe de mágica, quando seu pai veio a falecer. Seu mundo veio abaixo. O líder do seu pequeno reino morrera e ela ficou desnorteada, assim como sua mãe.

Tudo aquilo a fez desejar com que aqueles dias voltassem a existir, porém era impossível. Quando se deu conta, seus olhos já estavam cheios d’água. Olhou pela janela e notou que já estava anoitecendo.

– And a song someone sings, once upon a December – Terminou de cantar, devagarzinho, enquanto algumas lágrimas escorriam por sua pele branca como neve.

Por fim se levantou, deixando a caixinha e o livro de lado, andou em direção a uma pequena janela que alí havia e ficou encarando o céu estrelado, desejando que aquela felicidade que obtivera quando menor a invadisse novamente.

Mal sabia que o futuro lhe preparava uma grande surpresa. Quem sabe seu príncipe encantado resolvesse tira-lá dessa vida de tristezas e pudesse, finalmente, fazê-la feliz.