Save Yourself. escrita por biamcr_


Capítulo 3
Humilhação.


Notas iniciais do capítulo

Uma pequena nota aqui: escrevi grande parte desse capítulo ao som de Humiliation, escrita pelo Yoñlu/Vinícius. Ele era gaúcho (como eu) e cometeu suicídio há algum tempo, quando tinha 16 anos, e deixou umas músicas gravadas. Recomendo ouvirem no youtube, se encaixa no capítulo.



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Humilhação, culpa e raiva... Essas eram as três palavras que não saiam da mente de Gerard.

O menino encontrava-se deitado em sua cama, as cortinas estavam fechadas e era pouco o sol que entrava. Uma música baixa e melancólica podia ser ouvida ecoando dentro das quatro paredes do quarto bagunçado.

Ele sabia que, junto com o desespero, sempre vinha a humilhação. Talvez, na hora, poderia parecer a coisa certa chamar alguém e pedir ajuda, ou até mesmo contar as coisas que passava a essas pessoas... Mas, quando tudo terminava, ele sabia que havia feito uma das maiores merdas que poderia fazer.

E isso trazia a culpa. Culpa por ter, mais uma vez, se deixado levar pelo medo. Por ter gritado por ajuda e ter humilhado a si mesmo daquele jeito. Gerard sabia que demonstrar seus medos e seus sentimentos o fazia ridiculamente fraco. Aliás, a fraqueza era outra coisa que o menino dos olhos verdes temia.

Mas era como um círculo vicioso. Ele tinha raiva de si mesmo, tentava controlar-se, deixava o medo tomar conta de si, e sentia raiva novamente. Ele sempre fracassava em tentar parar essa sequência, e já pensava em, até mesmo, desistir de tudo e deixar que acontecesse.

Sabia que era como desistir de viver, mas talvez fosse mais fácil. Ele sempre soubera que desistir de viver era mais fácil que realmente viver, ou fingir que o faz – o que acontecia com ele há algum tempo.

E, finalmente, a raiva era algo que sempre estava com ele. Mesmo que estivesse na mais profunda parte de sua alma, esperando para libertar-se sem avisos prévios, e destruí-lo por dentro, levando-o a destruir-se por fora. Era tão grande que já se tornara ódio. Ódio de si mesmo.

E era como o medo. Ambos estavam dentro do menino, esperando a hora perfeita para foderem com ele. Gerard já se acostumara a conviver com os dois sentimentos, afinal. Eram os únicos que tinha. Quando um não estava lá, tornando sua vida um inferno, era substituído pelo outro. Quando não estava com medo, estava com ódio. Simples assim.

Sabia que a maior parte das pessoas ao seu redor tinha apenas um objetivo na vida: encontrar a felicidade. Por mais que não estivessem bem, elas tinham a esperança e a força de vontade suficiente para seguir em frente e reconstruir suas vidas. Mas ele era diferente, fazia tudo ao contrário. Sabia que nunca encontraria a felicidade do jeito que estava vivendo, apenas encontraria mais escuridão e infelicidade, mas não dava a mínima.

Ele já havia chegado à conclusão de que sua vida era um suicídio em progresso, apenas esperando miseravelmente pelo dia em que tudo terminaria.

Ainda deitado em sua cama, ele suspirou profundamente. Não tinha vontade de levantar dali tão cedo, porém soube que seria preciso quando ouviu o estômago roncar.

Ele vestia a roupa do dia anterior, então só precisava sentar na cama e calçar os sapatos. Sentia uma fraqueza enorme no corpo, e suas pernas doíam. Era como se sua mente estivesse muito acelerada, e seu corpo muito parado. Ele queria equilíbrio, pelo menos uma vez. Queria uma mente sã e um corpo que agisse conforme a mente, mas sabia que era impossível.

Suspirou mais uma vez antes de levantar-se por completo e dirigir-se a porta do quarto, saindo.

Sabia que já se passava das quatro horas da tarde, pois ouvia a voz do pai – que trabalhava até mesmo nos sábados – ecoar no andar de baixo.

Desceu lentamente as escadas, prestando atenção às conversas que ouvia. Podia ouvir a voz animada da mãe, as piadas do pai e as risadas do irmão. Mas ouvia algumas outras vozes que não lhe eram muito familiares.

Quando terminou de descer as escadas, chegando à sala, percebeu quem estava lá.

O amigo com o qual o pai conversava era o senhor Iero, e os dois estavam vestidos com ternos e gravatas e pareciam animados. Percebeu a mãe saindo para o jardim com a esposa do homem que o pai conversava, enquanto comentavam algo sobre flores. Seu irmão estava sentado perto do pai, rindo das piadas sem graça que o mesmo insistia em contar intermináveis vezes. Em outro sofá, exatamente do lado oposto deles, Frank olhava para os lados, com cara de tédio.

O pai notou a presença do filho, e olhou-o sorrindo.

– Venha, Gerard, sente-se conosco. – Disse Donald, acenando com a mão.

Seguiu em passos falsos até os sofás e, ignorando o convite do pai para sentar-se com seu chefe e ele, sentou-se ao lado de Frank, que assustou-se ao perceber o outro ali.

– Olá. – Disse Frank, sorrindo docemente. – Está melhor hoje?

Gerard apenas balançou timidamente a cabeça positivamente. Sentiu-se corar, não queria que os pais soubessem o que acontecera na noite anterior.

Podia-se perceber que nenhum dos dois garotos prestava atenção à conversa dos pais e do filho mais novo dos Way, ambos estavam vagando em seus pensamentos. Frank estava perdido em suas ideias, fantasiando sobre tudo. E Gerard estava tentando achar um meio de não passar por idiota na frente dos outros, de novo.

– Gerard, venha cá. – Disse Donna, adentrando a casa junto da mais nova amiga.

Dera um susto no filho, que se levantou preguiçosamente do sofá e foi até a mãe.

– Frank e Linda passarão alguns dias aqui, está bem? Apenas para não ficarem sozinhos enquanto seu pai e o senhor Iero viajam, por motivos de negócios.

Gerard não disse nada, aliás, mal ouvira o que a mãe falara. Apenas concordou com a cabeça e voltou para o quarto.

Ao entrar no quarto, dirigiu-se ao guarda-roupa, pegando algumas peças e, então, seguindo para o banheiro.

Repetira todo o ritual do dia anterior durante o banho, tendo as mesmas sensações de alívio e liberdade. Aquilo já virava rotina.

Ele Já havia terminado de se vestir e a calçava seus sapatos quando ouviu alguém bater de leve na porta. Não disse nada, apenas terminou de arrumar seus tênis e dirigiu-se a porta.

– Gerard, sua mãe pediu para eu ficar aqui enquanto eles vão levar meu pai e o seu para o aeroporto. – Disse Frank, quando a porta foi aberta.

Gerard suspirou em desgosto, provavelmente a mãe achava que ele poderia fugir ou cometer suicídio enquanto não havia ninguém na casa.

– Ah, tudo bem. Eu estava pensando em assistir um pouco de televisão... – Disse Gerard, fazendo aquilo soar como um convite, e saindo da frente da porta para o outro entrar.

Frank adentrou o quarto lentamente, prestando atenção a cada detalhe. O lugar era bagunçado, com muitas roupas e lençóis jogados pelos lados. No chão, perto de uma escrivaninha, havia uma pilha enorme de CDs e DVDs e alguns livros.

Sentou-se na cama, prestando atenção à mesa de cabeceira que tinha as gavetas abertas. Via um maço de cigarros e um isqueiro guardados ali.

– Gerard? – Frank começou, pegando o maço. – Você fu... – Parou a frase na metade, quando percebeu o que havia debaixo dos cigarros. Gerard já havia se virado para Frank, e percebeu quando ele largou o maço e pegou outras coisas dentro de sua gaveta. – O que é isso?

Ele segurava duas lâminas, completamente manchadas de sangue. O coração de Gerard começou a bater forte novamente, e, devido ao silêncio repentino no quarto, ele até chegava a ouvir o barulho do mesmo.

Passara pelos mais variados médicos do estado – forçado pelos pais, é claro – e nenhum deles descobrira que ele se mutilava, e agora um garoto idiota, que ele conhecia há menos de vinte e quatro horas, chega e descobre tão facilmente?!

Gerard sentia o descontrole chegando. Mas não devido ao medo, mas devido à raiva. Raiva de si mesmo por ter deixado as malditas lâminas em um lugar tão fácil de serem encontradas por outra pessoa.

– Nada. Não é nada. – Disse, dirigindo-se ao outro e fazendo menção de pegar os objetos de volta, porém Frank tirara-os de seu alcance.

– Não é apenas nada, Gerard.

Em um ato não proposital, quando fora tentar pegar as lâminas que o outro segurava perto de si, Gerard acabara com o rosto quase colado no de Frank. Seus rostos estavam a menos de dez centímetros de distância, e Gerard quase conseguia sentir a respiração de Frank em seu rosto.

– Por favor... Eu preciso delas. Você não entende como é...

– Na verdade, eu entendo. E digo que a sua vida será melhor sem se machucar. – Disse Frank, olhando o outro nos olhos. Um olhar profundo e sincero.

Gerard afastou-se, sentando no outro lado da cama e tentando controlar-se.

– Eu vou estar na sua casa por quatro dias, posso guardá-las na minha mochila. Se você não conseguir se controlar, eu devolvo. – Disse Frank, virando-se para o outro. – Mas apenas tente.

Gerard concordou com a cabeça, em contragosto. Mas sabia que era só fazer um escândalo no próximo dia e Frank as devolveria.

– Ótimo. – Disse Frank, sorrindo e guardando as lâminas no bolso do casaco.

O resto do dia se passara devagar. Gerard ajudara Frank e Linda a arrumarem suas coisas no quarto de hospedes, e depois jantaram e foram dormir. Gerard demorou a dormir, sentia falta do braço ardendo à noite, mas algum tempo depois acabou pegando no sono.

Mal sabia ele que o garoto do quarto ao lado também tinha dificuldades para dormir aquela noite, graças a alguém que não sabia de sua cabeça.


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